Ingenuidade dos Espíritas
Boanerges
da Rocha (Indalício
Mendes)
Reformador
(FEB) Junho 1964
Em certos casos, isso é até motivo
para sorrir e devemos sorrir mesmo, porque estão perdendo tempo precioso, em
lugar de se dedicarem ao estudo sério de assuntos dignos de atenção.
Foi publicado, em 1962, que um
psiquiatra norte-americano viria ao Brasil estudar a reencarnação. Veio de fato
e a imprensa noticiou, meses depois, que algumas personalidades do grande país
do norte se interessavam de perto pelos problemas psíquicos e por seu
desenvolvimento em nosso País. Em 1963, outros estiveram aqui e alguns chegaram
mesmo a visitar o médium Arigó, consultando-se o Espírito Dr. Fritz, por ele
recebido. Dispensamo-nos de maiores considerações, pois os jornais divulgaram
os resultados obtidos por duas dessas personalidades, uma das quais fora
operado pelo Dr. Fritz, depois de haverem os médicos de sua terra se negado a
fazê-lo, por se tratar de intervenção cirúrgica numa zona corpórea excessivamente
melindrosa.
Há de haver negadores da realidade,
até que a luz da compreensão, filtrada pelo estudo imparcial, faça cair as escamas
do preconceito ou da ignorância, que cobrem os olhos dos obstinados.
Os espíritas não são tão crédulos quanto
assoalham seus adversários. Todos desejamos rigor nas experiências e nas observações,
e exigimos que elas sejam sempre cercadas de cuidados, a fim de se tornar
impossível qualquer mistificação, porque esta existe sempre onde está o homem
pouco afeito à conquista simples da verdade perseguida pelo homem honesto.
Há algum tempo, lemos um telegrama
de Niamei, na Nigéria (África), que “uma jovem nigeriana, de 25 anos,
ressuscitou 24 horas depois de haver sido enterrada. A moça, chamada Badiza, vivia
num povoado da selva, a 150 quilômetros de Niamei. Cega de nascimento, caiu
doente e faleceu. Seu corpo foi envolto em tiras de pano, como é costume na região,
e imediatamente inumado. No dia seguinte ao da cerimônia, sua irmã foi à sepultura,
para ali depositar as roupas que haviam pertencido à defunta, e teve a enorme
surpresa de verificar que a terra da tumba havia sido removida, deixando
descoberto o corpo de Badiza. Ao
perguntar a si mesma, em voz alta, razão do mistério, ouviu, do fundo da terra,
sua irmã responder: “Sou eu, Badiza; estou procurando sair daqui. Assustada, a
moça correu ao povoado e avisou a população, que foi ao cemitério, donde retirou
Badiza. Para os habitantes locais, trata-se de um caso de ressureição milagrosa,
tanto mais que a jovem passou a contar o
que vira no outro mundo, onde os animais falam, os grãos de trigo são tão
grandes como cabeças humanas, etc. Para os médicos, porém, tudo não passou de
uma crise de letargia, ou catalepsia.” (O Globo, Rio, de 39-5-1962.)
Os espíritas recusam a ressurreição
do corpo físico. Tal fato constituiria uma derrogação das leis naturais, que
são imutáveis. “como imutável é a vontade de Deus, que as formulou desde
toda a eternidade. Deus, portanto, nunca as derroga” (‘Os Quatro
Evangelhos’, de Roustaing, III, p. 499). Os apóstolos creram na ressurreição
de Jesus, porque, afinal, não estavam em condições de admitir outra coisa. “A
crença dos apóstolos tinha que servir e serviu de base às controvérsias e às
contradições humanas que se suscitaram no correr dos tempos. Essas
controvérsias, que atualmente só conduzem ou à fé cega, ou à incredibilidade,
prepararam, através dos séculos, os espíritos para receber e suportar a
revelação nova. A crença numa ressureição corporal, pela volta do Espírito de
Jesus a um corpo material humano, igual aos vossos, tornado cadáver
por efeito da morte real, qual a sofreis, essa crença, transitória por
natureza, como todas as opiniões e interpretações humanas, produziu seus frutos.
“Hoje, constitui erro manifesto, em face dos
progressos realizados, e se tornou inadmissível, condenada como está pelo princípio
da imutabilidade das leis da Natureza, por todos os fatos evangélicos que
iluminados com a luz da ciência espírita, servem de base e de fundamento
à nova revelação para explicar, segundo o espírito, em espírito e verdade,
o que foi a “ressurreição” de Jesus, como se operou aquele corpo, formado, segundo
a letra, por obra do Espírito Santo, isto é: excluídas toda e
qualquer ação, toda e qualquer obra humana, pela aplicação e
apropriação de leis naturais diversas das que presidem á reprodução na Terra”
(Ob. Cit. Ibidem, págs. 498/9).
Consequentemente, o fato ocorrido em
Niamei pode ser explicado como letargia ou catalepsia, nunca, porém, como ressurreição,
pois fazer retornar a vida um corpo já desprendido do Espírito, isto é, um
corpo realmente morto, é impossível, por significar uma derrogação das leis de
Deus.
É preciso não esquecer estas palavras
do filósofo Leibnitz, repetidas neste trecho do estupendo livro “Bases
Científicas do Espiritismo”, de Epes Sargent, traduzido e editado pela
Federação Espírita Brasileira: “Nenhuma fé, diz Leibnitz, pode ser real ou inteligível,
se não tiver a sua base na razão humana. A religião divorciada da razão do
homem não pode firmar-se e sustentar-se.” A isto, acrescenta Epes Sargent: “A
glória do Espiritismo está no seu apelo feito à razão por meio da Ciência, e no
fato de nos fornecer elementos de uma religião, velha como o mundo, mas ao
mesmo tempo, racional, científica e emocionante. Essa religião, porém, deve
pelo próprio indivíduo ser deduzida dos fatos e ser assim considerada realmente
dele, e não como um fruto da árvore da vida plantada por outro homem.” (p. 175)
Não há razão, portanto, para se
pensar que todos os espíritas ouvem cantar o galo sem saber onde. Supor sejamos
ingênuos e incapazes de pensar, analisar e julgar, constitui prova evidente de que
os que assim nos apontam vivem mais no mundo da fantasia do que no mundo da
realidade, em que supõem encontrar-se.
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