Aristocracia intelecto-moral
por Cristiano Agarido (Ismael
Gomes Braga)
Reformador
(FEB) Julho 1947
Kardec estudou as formas de domínio e demonstrou
que sempre o mundo foi governado por uma aristocracia, embora muitas vezes o sentido
etimológico da palavra tenha variado.
A palavra vem do grego: aristos,
o melhor, e kratos, o poder; logo, etimologicamente, aristocracia é o poder
ou o governo dos melhores; mas os melhores, a juízo dos homens, numa classificação
humana, podem ser simplesmente os mais valentes, os mais ricos, os menos escrupulosos.
Na recente aristocracia alemã os melhores
foram enforcados pelos aliados como grandes criminosos, isto é, melhor e pior
foi questão de ponto de vista.
No interessante estudo do Mestre, aparecem como
primeira aristocracia a dos patriarcas,
como segunda a dos guerreiros e cleros, a terceira foi a do dinheiro, a quarta e atual é a da inteligência. Prevê o Codificador o
advento de uma quinta aristocracia, a que ele dá o nome de intelecto-moral, a qual consistiria dos mais inteligentes e
moralmente mais elevados.
Examinando-se bem essa classificação, vemos
que só a primeira realmente desapareceu, porque a segunda ainda exerce muita influência:
a terceira é quase onipotente e a quarta só opera conjugada com a terceira.
Portanto, estamos longe do pleno domínio da quinta, que fará o mundo feliz.
Essa classificação tem que ser examinada em diversos lugares, porque os povos não
caminham no mesmo ritmo. Talvez se possa dizer que, na França, a quarta domina
mais do que a terceira; nos Estados Unidos, a terceira é mais forte do que
todas as outras; na Alemanha, domina mais a segunda, e, no Brasil, nenhuma delas
se definiu com clareza.
De qualquer sorte, nunca dominou no mundo
uma democracia, palavra tão do gosto dos nossos contemporâneos; nem é prevista
sua existência futura por Allan Kardec. É realmente utópica a existência da
democracia. Há sempre uma elite que domina e governa, e o máximo de democracia
que conseguimos é que o povo eleja seus dirigentes dentro dessa aristocracia dominante
pelo saber, pelas armas, pelo dinheiro, pela moral, mas não que promova membros
da massa a governadores. Quando um homem saído do povo, do mais humilde nascimento,
chega a um alta posição em sua pátria, temos a impressão de que dominou a
democracia, mas na verdade tal homem era intelectualmente ou espiritualmente
mais elevado do que os outros, pertencia a uma aristocracia, não foi feito pelo
povo, este apenas obedeceu a um princípio superior: colocou no justo lugar o
homem que merecia esse posto, pelas suas qualidades demonstradas.
Como o nosso planeta é um mundo de expiações
e provas, as classes dominantes ainda não pertencem à categoria idealizada por
Allan Kardec: a de homens superiores em saber e moralidade; mas esta categoria
aparecerá, quando o planeta for promovido, como anunciam as comunicações de
Espíritos superiores há mais de setenta anos:
A recente guerra mundial contra a
"aristocracia totalitária" declarou-se como luta da democracia contra
o despotismo e pôs muito em voga o ideal democrático que realmente é o que de
mais elevado, concebemos em administração material do mundo. Pela democracia
supomos que a maioria pode governar e substituir governos pacificamente, sem o
recurso das armas; daí nosso anseio de viver num mundo democrático, de eleger
realmente os homens que hão de administrar os interesses gerais do país. Mas em
Espiritismo tomamos conhecimento com uma ordem de coisas inteiramente oposta à
democracia: a organização hierárquica no mundo espiritual.
No mundo espiritual não há eleições, o número
não tem expressão, tudo obedece a uma hierarquia infinita, que vai desde o
verme até Deus, em linha ascendente, e desce desde Deus até o verme, em linha
descendente, agindo cada indivíduo com a parcela de autoridade e responsabilidade
que lhe pertence individualmente pelo seu grau de progresso, mas independente
das opiniões alheias de eleitores, da propaganda eleitoral, das convicções
pessoais.
Não é raro lermos em bons pensadores espíritas
a opinião de que o Espiritismo é uma democracia. Devemos entender essa
expressão no sentido de que não temos um clero, não há privilegiados em nosso
movimento, todos temos os mesmos deveres e os mesmos direitos e cumprimos
deveres ou exercemos direitos em plena liberdade, sem coação alguma exterior,
guiados somente pela nossa consciência; todos os nossos pregadores e mestres
são leigos e pertencem à massa popular com a qual trabalham; independemos de
autorizações ou diplomas, de ordenações ou direção humana... Nesse sentido
dizem que o Espiritismo é uma democracia, como poderiam dizer os idealistas da
anarquia, que ele é a realização perfeita da anarquia, no bom sentido do termo;
porque os anarquistas imaginam um mundo sem tiranias e classificam toda autoridade
de tirânica. Os anarquistas sonham com uma liberdade que em parte nós
realizamos em Espiritismo, mas enganam-se em seu ideal de liberdade ilimitada
no tempo e no espaço, porque também nós temos superiores hierárquicos que nos
privam da liberdade absoluta, limitam nosso livre arbítrio por períodos mais ou
menos longos, em nosso próprio benefício.
Tanto se poderia dizer que o Espiritismo é uma
democracia, como se poderia dizer que é uma anarquia, mas sempre limitando
muito o sentido dessas palavras cunhadas para expressar outras ideias, senão,
as palavras induziriam a erros tremendos. Em certo sentido ele é a negação
absoluta de democracia e de anarquia. De democracia, porque o processo
característico da democracia é elevar o homem para o poder, retirando-o da
massa, de baixo para cima sempre, pela força dos votos; em Espiritismo toda autoridade
vem de cima para baixo, por hierarquia, dominando sempre as minorias aristocráticas.
Em outras palavras: os espíritas não podem eleger seus Guias, não podem
substituir o Governador do planeta, não podem criar médiuns nem destituí-los,
são obrigados a aceitar uma hierarquia espiritual antidemocrática. De anarquia,
porque o livre arbítrio é estreitamente condicionado, as autoridades
espirituais aplicam leis inflexíveis, existe um governo espiritual perfeito e
rigoroso, logo, todo o ideal de liberdade ilimitada dos anarquistas encontra
barreiras tremendas no Espiritismo.
Se tanto democracia como anarquia aplicadas
a Espiritismo podem induzir a graves erros, também aristocracia e hierarquia,
embora mais próximas da verdade, podem levar-nos a ideias falsas pelas noções
humanas aplicadas a essas palavras. O mais seguro será dizermos que Espiritismo
é Espiritismo mesmo e nada mais.
Quanto à organização do movimento espírita sobre
a Terra, temos que seguir os princípios democráticos em tudo que concerne à
administração material: eleger diretorias, decidir por maioria, mas
esforçando-nos o máximo possível por entender e seguir o Plano superior dos
Altos Dirigentes do movimento, os Espíritos superiores que ditam livros
doutrinários e superintendem a propaganda da Doutrina. Esse Plano superior no Brasil
é profundamente cristão e o percebemos em toda a literatura mediúnica publicada
no país. Estaríamos, pois, errados e nossas decisões mesmo por maioria ficariam
sem efeito, se decidíssemos coisas como:
1º - Atacar a maior obra evangélica recebida
mediunicamente, a que comenta versículo por versículo os quatro Evangelhos; daí
a não prosperarem no Brasil todas as instituições e pessoas que abrem luta
contra a obra de Roustaing, como se nota nos 70 anos de nossa propaganda.
2º - Proclamar que o Espiritismo é somente
ciência e não religião.
3º -
Abolir o emprego da prece.
Tais decisões, contrárias ao Plano superior
exposto pelos Guias em seus livros, não têm o apoio do mundo espiritual
superior e por isso fatalmente falham. Portanto, em nossas decisões "democráticas",
por maioria, devemos lembrar sempre que o Espiritismo é dirigido pelos Espíritos
e não pelos homens, como sempre insistiu Kardec, e que nossas deliberações só prevalecem
quando estejam em harmonia com a Alta Direção do movimento, com essa Aristocracia
Intelecto-Moral que ainda não existe em nosso mundo, mas já governa o mundo
espiritual.
Todas as tentativas de organização, de trabalho,
mesmo obtidas por unanimidade de votos humanos, quando desprezam a orientação
superior dos Guias, têm falhado sempre. Logo, nossas decisões
"democráticas" são bem limitadas em seu alcance, porque dependem da
aprovação dos Guias, e, quando previamente vetadas por eles, por estarem em
oposição ao seu Plano de trabalho, já nascem mortas. Muitas decepções e
desilusões teriam sido evitadas por entusiastas do nosso movimento, se
houvessem auscultado primeiramente os Guias e obedecido às diretrizes gerais
dos Dirigentes espirituais do movimento
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