A Lição Máxima
do Cristo
Rodolfo
Calligaris
Reformador (FEB) Outubro 1961
A ocupação da Palestina pelo império
romano, nos albores de nossa era, ensejava constantes motivos de irritação para
os judeus.
É que ali, como em todas as regiões
que havia conquistado, a soldadesca romana impunha aos vencidos uma dependência
odiosa e intolerável, tantas as humilhações e os vexames por que os fazia
passar.
Era comum, por exemplo, um oficial
romano dirigir-se de um ponto a outro da Judeia ou da Galileia e, nessas
viagens, obrigar os camponeses judeus que trabalhavam no campo a interromperem
seus afazeres para carregar-lhe pesados fardos, montanhas acima.
Da mesma forma, quem saísse de casa,
com um destino qualquer, nunca poderia ter a certeza de que chegaria ao local
desejado, pois se lhe acontecesse encontrar, pelo caminho, algum representante
das autoridades dominantes, poderia ser obrigado a retroceder ou a mudar
completamente de direção, para levar uma carta ou prestar qualquer outro
serviço que lhe fosse exigido.
Tentasse alguém reagir contra essas
arbitrariedades e conheceria logo o preço de sua ousadia:
o sarcasmo e crueldades inomináveis. É de calcular-se, portanto, a amargura com que
os judeus tinham de curvar-se em homenagem às bandeiras romanas, sempre que as
viam passar conduzidas pelas tropas do César, e com que ardor aguardavam o dia
em que pudessem sacudir o jugo romano.
*
Certa feita, achava-se Jesus
ensinando o povo, nas cercanias de uma cidade que era sede de uma guarnição
romana, quando a vista de uma companhia de soldados fez que seus ouvintes
evocassem a amarga lembrança do opróbrio que pesava sobre Israel.
O Mestre relanceou o olhar pelos que
o circundavam e, em suas faces, viu estampado, de forma indisfarçável, o anseio
de vingança que se aninhara em cada coração.
Percebendo que todos o fitavam
ansiosamente, esperando fosse ele aquele que houvesse de lhes dar o poder, a fim
de esmagarem o opressor, contristou-se, pois bem diferente era a sua missão, e,
retomando a palavra, ordenou-lhes com brandura:
"Não
resistais ao mal; mas, se qualquer vos bater na face direita, oferecei-lhe -
também a outra. E se alguém vos obrigar a caminhar uma milha, ide com ele
duas."
Será que, expressando-se desta
maneira, estaria o Cristo endossando as violências com que a tirania militar da
época se acostumara a supliciar os vencidos?
Certamente que não. O que ele quis
ensinar, nessa oportunidade, como aliás o fez durante toda a sua vida
terrestre, foi que, malgrado a regra estatuída por Moisés - "olho por olho
e dente por dente" - a Lei Divina,
que viera revelar, proibia terminantemente as desforras, as vinditas, por serem
contrárias ao sentimento do Amor.
A corroboração de ser este o
verdadeiro sentido de suas palavras, ele mesmo a forneceu quando logo em
seguida sentenciou:
"Tendes
ouvido o que foi dito: amarás o teu próximo e aborrecerás o teu inimigo; mas eu
vos digo: amai a vossos inimigos, fazei bem ao que vos tem ódio e orai pelos
que vos perseguem e caluniam."
Compreende-se, pois, à luz da
doutrina cristã, que ninguém será justificado na vingança. Aos indivíduos ou às
nações que transgridam os mandamentos da Lei Divina lhes será dado o ensejo de
se corrigirem.
A oportunidade e a importância
desses princípios estabelecidos pelo Mestre ressaltam ainda hoje. Fosse
permitido a cada qual fazer justiça por suas próprias mãos, agindo ao sabor de
sua vontade pessoal, e a vida em sociedade seria muito difícil, tais os
desmandos e excessos que se verificariam.
Talvez se indague: pessoalmente,
teve o Cristo ocasião de exemplificar tão sublime ensinamento?
Sim! Foi oprimido e não abriu a
boca; cuspiram-lhe na face e não revidou o ultraje; ofereceu as costas aos
açoites sem malquerer os que o feriam, e, através dos séculos, chega até nós,
da cruz do Calvário, a oração que proferiu por aqueles que lhe davam a morte:
"Pai,
perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem!"
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