O endemoninhado
geraseno
por Rodolfo Caligaris Reformador (FEB) Fevereiro 1966
"'Tendo
atravessado o mar, desembarcaram no país dos gerasenos e, mal Jesus descera da barca, veio ter com ele um homem possuído
do espírito imundo, homem esse que ninguém
conseguia dominar nem mesmo com correntes, pois muitas vezes estivera com ferros
aos pés e preso por cadeias e as quebrara. Vivia dia e noite nas montanhas e
nos sepulcros, a gritar e a flagelar-se com pedras. Ao ver Jesus, ao longe, correu
para ele e o adorou, exclamando em altas vozes: Que tens tu comigo, Jesus, filho
do Deus Altíssimo? Eu te suplico, não me atormentes. Isso porque Jesus lhe ordenara:
Espírito imundo, sai deste homem. Perguntando-lhe
Jesus: Como te chamas? - respondeu: Chamo-me
Legião, porque somos muitos.
Ora,
havia ali uma grande vara de porcos pastando na encosta do monte, e os demônios
faziam a Jesus esta súplica: manda-nos para aqueles porcos, a fim de entrarmos eles.
E como Jesus lhes desse permissão para isso, os Espíritos impuros, saindo do
possesso, entraram nos porcos; toda a manada saiu a correr impetuosamente e foi
precipitar-se no mar, onde se afogou.
Os
que a apascentaram fugiram e foram espalhar na cidade e nos campos a notícia do
que se passara. Logo acorreram muitos até onde estava Jesus e, encontrando o
homem que ficara livre dos demônios sentado a seus pés, vestido e de perfeito
juízo se encheram de temor. Ouvindo, então, dos que presenciavam o fato, a narrativa
do que sucedera ao possesso e aos porcos, todos pediram a Jesus que deixasse
aquelas terras.” (Dos Evangelhos)
Temos
aqui um caso impressionante de possessão, cuja vítima, subjugada por uma falange
de Espíritos perversos, tornara-se o terror dos sítios em que vivia.
Pelo
relato dos evangelistas, bem podemos imaginar-lhe a terrível figura: seminu e coberto de feridas sangrentas, olhos
esfogueados, cabelos longos e em desalinho, pedaços de corrente a lhe penderem
das pernas, mais haveria de parecer uma fera do que propriamente uma criatura
humana.
Compadecido
do infeliz, Jesus liberta-o de tão má influência, com o que lhe restitui de pronto
a razão, e domínio de si mesmo, e, convidando-o a sentar-se junto de si, põe-se
a edifica-lo com seu verbo terno e esclarecedor, preparando-o para que viesse a
ser mais um arauto da Boa Nova, e, ao voltar para a companhia dos familiares,
ao contar-lhes que coisa estupenda o Senhor fizera por ele, estivesse habilitado
a anunciar-lhes também a doutrina de Amor, de Tolerância e de Justiça que
estava sendo trazida ao mundo, cuja observância é o mais seguro remédio contra
todos os males que afligem e infelicitam a Humanidade.
Quanto
aos Espíritos obsessores, não entraram nos porcos, como supuseram os circunstantes,
coisa que hoje melhor se compreende; apenas se fizeram visíveis aos suínos e
estes, espavoridos, se precipitaram do monte para baixo em tão desabalada carreira
que, não podendo estacar ao chegarem à
praia, introduziram-se no mar, perecendo afogados.
O
episódio em tela, ao mesmo tempo que ressalta o extraordinário poder de Jesus (baseado
na perfeição de seu caráter) e sua incomensurável piedade para com os sofredores,
põe em relevo, por outro lado, a mesquinhez de muitos homens, para os quais o interesse
material a tudo sobreleva.
A
cura daquele possesso que os trazia em sobressalto deveria ser, para os gerasenos,
motivo de se regozijarem e se mostrarem agradecidos àquele que operara tal maravilha.
Ao invés disso, porém, só levaram em conta a perda de seus animais e, receosos de
novos prejuízos pecuniários, despediram de suas terras, qual se fora um intruso
indesejável, o próprio Filho de Deus que os honrara com sua augusta presença.
Agora
meditemos.
Nós
outros não estaremos agindo, ainda hoje, de igual maneira? Não continuamos colocando
as conveniências mundanas acima dos galardões espirituais?
Conquanto
nos pese reconhecê-lo, todas as vezes que contrariamos a Doutrina Cristã, porque
seguir lhe os preceitos nos custaria o sacrifício de algum lucro temporal, é
como se, visitados pelo Mestre, o puséssemos para fora de nossa porta!
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