O Nascimento das Grandes Coisas
por Antônio Túlio
Reformador (FEB)
Fevereiro 1948
Em sua “Conclusão” do "Livro dos Espíritos",
Allan Kardec faz as seguintes considerações:
“Quem, de magnetismo terrestre, apenas conhecesse o
brinquedo dos patinhos imantados que, sob a ação do imã, se movimentam em todas
as direções numa bacia com agua, dificilmente poderia compreender que ali está
o segredo do mecanismo do universo e da marcha dos mundos. O mesmo se dá com
quem, do Espiritismo, apenas conhece o movimento das mesas, no qual só vê um
divertimento, um passatempo, sem compreender que esse fenômeno tão simples e
vulgar, que a antiguidade e até os povos semi-selvagens, conheceram, possa ter ligação
com as mais graves questões de ordem social. Efetivamente, para o observador
superficial, que relação pode ter com a moral e o futuro da humanidade uma mesa
que se move? Quem quer, porém, que reflita se lembrará de que uma simples
panela a ferver e cuja tampa se erguia continuamente, fato que também ocorre de
toda a antiguidade, saiu o possante motor com, que o homem transpõe o espaço e
suprime as distâncias.
“Pois bem! sabei vós que não credes senão no que pertence
ao mundo material, que dessa mesa que gira e vos faz sorrir desdenhosamente
saiu uma ciência, assim
como a solução dos problemas que nenhuma filosofia pudera ainda resolver.”
Os contemporâneos do Mestre só viam no Espiritismo a
mesinha girante e a inteligência deles não lhes permitia refletir sobre coisa
tão banal. Os tempos já mudaram. Muita gente hoje vê no Espiritismo um meio de
curar suas mazelas. Lembram-se dos médiuns receitistas ou curadores, quando
sofrem uma enfermidade, e mandam então procurar uma receita ou pedir passes nalgum
grupo espírita. Nenhuma outra finalidade alcançam além dessa, tão
terra-a-terra, de obter remédios e
conselhos médicos, nem podem conceber as finalidades de associações espíritas que
não dão receitas, nem aplicam passes.
Desprezam por incompreensão tudo o que há de grande e
belo no Espiritismo, para confundi-lo com uma das múltiplas escolas que disputam
entre si o direito de curar enfermos: alopatia, homeopatia, naturismo, etc.
De modo semelhante, os contemporâneos de Jesus preferiam
ver nele o homem que multiplicava os pães e curava enfermos, a reconhecê-lo como
portador de uma doutrina que os libertaria de todos os seus males morais. Essa
mentalidade inferior ficou registrada em João, 6:26, nos seguintes termos;
“Jesus respondeu-lhes e disse: Na.
verdade, na verdade, vos digo que me buscais, não pelos sinais que vistes, mas
porque comestes do pão e vos saciastes.”
A inteligência do homem é demasiado curta para prever o
futuro, mesmo o mais lógico. Pouquíssimos possuem logica bastante para se entusiasmarem
pelas grandes coisas em seu nascimento e por elas trabalhar. Todas as grandes descobertas, todas
as grandes invenções, todas as grandes reformas tiveram que lutar contra o
espírito de rotina, que pretende modelar o futuro pelo passado e toma armas
contra quem ouse prever um porvir diverso do presente.
O Espiritismo ainda se acha, para a imensa maioria dos
homens, no rol das coisas novas e incompreendidas. Seu caminho vai sendo aberto
penosamente pela floresta virgem da indiferença, esbarrando a cada passo com os
espinheiros da oposição violenta.
No entanto, é inegável que progride e interessa a um número de pensadores sérios,
que aumenta dia a dia. Como índice disso, vemos a divulgação das obras doutrinárias,
sempre melhores, sempre mais procuradas. O público ledor já se interessa pelo
estudo da doutrina, já vê no Espiritismo muito mais do que um passatempo ou um
processo de curar doenças.
No entanto, a reforma moral que o Espiritismo exige dos
homens é muito grande, talvez demasiado grande para se efetuar sem uma remodelação,
completa da atual sociedade. Só podemos conceber a moral espírita em ação, num mundo
confraternizado, onde reine a lei de Deus.
Mas, não tenhamos dúvida de que esse mundo novo está em
formação. O mundo velho se esboroa com todas as suas pirâmides multi seculares
de injustiças e crimes. Depois dele virá o mundo ideal. Paradoxalmente, é o
desenvolvimento do egoísmo que produz o altruísmo. A insegurança, a angustia, a
febre, o inferno que o egoísmo produz,
forçam o homem a apoiar-se em seus irmãos, a solidarizar-se com eles para sua
própria felicidade. O homem será levado à fraternidade e ao altruísmo por amor à
sua própria segurança, à sua felicidade.
Só a incompreensão de seus mais altos interesses pode
fazer dele um egoísta a criar para si um inferno de ódios e sofrimentos. A compreensão
o libertará e essa compreensão se vai estabelecendo a pouco e pouco. Em vez de
lutar para construir a sua felicidade à custa da ventura alheia, o homem
chegará a compreender que só será feliz quando trabalhar pela felicidade de todos,
pensando menos em sua minúscula pessoa.
Nesse mundo, em que todos se esforcem pela felicidade de
todos, em que o homem veja e sinta que sua felicidade é uma parcela da
felicidade de sua pátria e da humanidade, que fica sacrificada toda vez que a pátria
ou a humanidade sofram, haverá o clima necessário ao pleno desenvolvimento da
moral espírita, ou, antes, da moral cristã eterna, agora renovada pelos ensinos
dos Espíritos de luz que estão baixando a Terra.
Segundo repetidas mensagens do Além, já estão a postos os
prepostos de Jesus para prepararem esse mundo novo, em que reinará a lei de
Deus nas consciências. Num futuro talvez bem próximo, portanto, a moral
espírita encontrará na face da terra as condições necessárias ao seu pleno
vigor, à sua compreensão e prática. Nesse tempo, o Espiritismo terá entrado em
todas as consciências, não como um passatempo, não como processa terapêutico,
mas, na verdade, como
regra de conduta para todos os homens.
Trabalhemos e esperemos, ajudando por todos os meios ao
nosso alcance a marcha do progresso em todas as suas múItiplas modalidades.
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