Casamento
espírita?
Editorial
Reformador
(FEB) Dezembro 1919
O matrimônio não tem, nem pode ter
para os crentes do Espiritismo, o caráter de sacramento, que lhe atribui a teologia
católica.
Ele representa, contudo, o cumprimento
de uma lei natural, e pela magnitude das responsabilidades que acarreta,
constitui um dos atos mais sérios, senão o mais sério, da vida terrena.
Assim sendo, não pode nem deve ser
realizado, conscienciosamente, à revelia da sanção divina.
E sendo de espíritos que não de corpos
a união, na mais lata acepção do termo, é claro que essa união dispensa
formalidades quaisquer além das que a legislação civil criou e a que todos nos
devemos submeter, pois que O Cristo mandou dar a César o que era de César.
Para dar a Deus o que a Deus pertence,
fica ao espírita a liberdade de o fazer como bem lhe aprouver e a ninguém é
licito tolher os reclamos do seu foro íntimo.
Nada mais natural, portanto, de que
para esse ato, em perfeita comunhão de ideias e sentimentos, os crentes se
reúnam, e, em testemunho de sua própria Fé, exorem a benção de Deus e a proteção
de seus Guias para que fortaleçam a união de duas almas que se propõem
progredir juntas, dando frutos de amor e exemplos de virtude, através de todos
os percalços da vida de relação.
Esse procedimento, só se justifica, entretanto,
pela intenção e aos que o tenham como brado espontâneo d'alma, não há de que os
increpar. Preciso é, contudo, dizer que ele não se torna indispensável e pode
ser nocivo e perigoso fazendo-nos resvalar para os domínios de um ritualismo inócuo,
sem outro alcance que o de satisfazer vaidades e preconceitos sociais oriundos
de ancestral atavismo pagão.
De fato, melhor que os frutos ocasionais
de cerimônias de convenção, ainda mesmo as mais singelas, o que santifica o
matrimônio são os sentimentos e os atos os que o contraem, procurando cumprir
o dever comum dentro da moral evangélica, à face de Deus e dos homens.
Ora, para superar todas as vicissitudes
da vida conjugal - e importa dizer que elas são, muitas vezes intrínsecas,
representando sagrados compromissos de anteriores encarnações - sabemos que de
nada valem as consagrações formais de um ato inicial, mas preciso se faz o esforço
constante de todos os dias na escola real da abnegação, da renúncia, do
sacrifício recíprocos - padrão legítimos, que são do verdadeiro amor na
constituição da lídima família espiritual.
Subentendido que o casamento é de
espíritos, que o seu ascendente é de ordem espiritual e moral, claro fica que
não há nem pode haver cerimônias e ritos que o legitimem.
Esta, a noção que corresponde a índole
da Doutrina, pela pureza da qual nos cumpre velar, afim de não incidirmos na
imitação grosseira de seitas que tudo materializam, num esdrúxulo hibridismo de
fórmulas pagãs e preceitos religiosos.
Em suma: é necessário que o amor às
formulas não desvirtue o amor aos princípios.
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