Preocupações religiosas
por I. Pequeno (Antônio Wantuil)
Reformador
(FEB) Julho 1944
Três são as religiões que atualmente contam
com o maior número de adeptos no Brasil: o Catolicismo, em que todos os
socorros espirituais são tabelados, variando o preço conforme o aparato da
cerimônia; o Protestantismo, no qual os mesmos socorros são mais ou menos
gratuitos, porque os pastores só percebem ordenados mensais; e o Espiritismo,
única religião do mundo em que o médium nada percebe, sob qualquer forma, visto
que todos vivem de atividades outras que não a religiosa, da qual ainda tiram
meios para oferecer socorro material aos que apelam para a sua interferência
espiritual.
Essa verdade é conhecida hoje em todos os
meios sociais do País. Se algum indivíduo, que se diz espírita, cobra qualquer
preço pelo seu trabalho espiritual, todos sabem que tal criatura tanto tem de
espírita como aqueles que, de quando em vez, são agarrados pela polícia,
vestidos de padres, apesar de jamais terem pertencido ao quadro do clero. Uns e
outros não são espíritas ou católicos. São, simplesmente, exploradores da
credulidade do povo.
No entanto, apesar de o Espiritismo ser a
única religião que segue o preceito evangélico do "dai de graça o que de graça recebestes", o reverendo padre
Luis Salamero, C. M. F., em sua revista católica, publicou um longo artigo sob
o título “A constância confirmada dos truques
do espiritismo", no qual, defendendo naturalmente a não diminuição das
suas rendas, escreve os seguintes trechos:
“... (os espíritas) se valem de uma suposta
aparição ou revelação dos espíritos, para ganhar dinheiro".
“ ... os médiuns fazer evocações ou chamadas
por dinheiro".
“... e nunca faltam alguns incautos para dar o
grude aos espertos evocadores".
O artigo do reverendo está repleto de termos
da gíria, Assim, antes de o analisarmos, devemos informar os nossos leitores de
que grude, para o reverendo, e ali pela Favela, quer dizer – dinheiro.
Vê-se claramente, pelos trechos acima citados
e por todo o resto da descompostura do reverendo, que a sua maior preocupação é
o desvio do dinheiro, até então canalizado para o seu e para o bolso os seus
colegas.
Lamentamos, de fato, que assim venha sucedendo.
O padre Salamero não tem outra profissão e os seus paroquianos já lhe não
oferecem o suficiente para a continuação da vida confortável que sempre tiveram
os “representantes” d’Aquele que surgiu num estábulo e não possuía um lugar
onde recostar a cabeça.
A culpa não é nossa, reverendo, e o senhor está
perdendo tempo e errando o alvo. O dinheiro que lhe foge das mãos não está conosco.
Procure-os entre os órfãos, velhos e viúvas
que socorremos ou entre aqueles que se dizem católicos e empregam as suas
sobras em deleites pessoais.
Como preocupação religiosa, reverendo, não lhe
fica bem essa preocupação monetária, As ameaças do seu artigo, suplício eterno,
fogo eterno e todas as outras, não mais produzem efeito. Os próprios católicos
já não têm medo dessas tranquibernices (trapaças). É necessário, reverendo, mudar o disco da
vitrola.
Se o Rev. Luis Salamero, C. M. F., acredita
realmente em Jesus, e, se deseja segui-lo, peço-lhe aceite o maior de todos os
conselhos: leia os Evangelhos, mas faça-o com o espírito, sem essa execrável
preocupação "religiosa" de pensar no bolso...
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