O
findar de um ano e o início de outro caracteriza-se por grande número de
festividades. Dentre estas destacam-se as cerimônias de formatura que
simbolizam o término de mais uma etapa em nossas vidas e o começo de uma outra
mais importante, onde aplicaremos aquilo que pensamos ter aprendido. Além da
oportunidade do acontecimento
social, que significa tal fato na realidade, para o formando espírita? Que
espera a sociedade de um jovem espírita que acabou de subir mais um degrau na
escala do aperfeiçoamento intelectual? Que esperamos de nós mesmos?
A oportunidade de desfrutarmos uma
condição intelectual mais favorável acarreta-nos responsabilidade que não pode
resumir-se num simples diploma ou juramento. Não nos encontramos aqui de
primeira vez; estamos, ao contrário, repetindo o ano na escola da vida e, no
mais das vezes, fazemo-lo por termos abusado das nossas capacidades
intelectivas em detrimento do bem. Crescemos em ciência enquanto diminuímos em
amor.
Em qualquer estágio intelectual em
que nossos estudos acadêmicos nos tenham situado, a responsabilidade adquirida
é tríplice. Assumimos deveres para conosco, para com o próximo e para com o
Criador.
Deveres para conosco no sentido de
saber se estamos cumprindo aquilo que um dia, por acréscimo de misericórdia,
Deus nos concedeu, a fim de que pagássemos as nossas dívidas. A par disso
junte-se a responsabilidade do conhecimento doutrinário a nos obrigar
à honestidade total.
Quando escolhemos uma carreira,
fazemo-lo quase sempre de acordo com as nossas necessidades de aperfeiçoamento
espiritual. Assim, ao profissional leigo é ainda compreensível que se deixe
levar pela ambição desvairada, pela irresponsabilidade profissional, pelo
desmazelo. Dizemos compreensível mas não admissível, porque a toda conquista
pessoal correspondem deveres que hão de superar os direitos. Se o leigo não tem
a Doutrina a guiar-lhe os passos, tem contudo a voz da consciência a fazê-lo, a
orientá-lo. E ninguém conseguirá jamais sufocá-la, nesta ou em qualquer outra
existência, porque tudo o que passamos ficará eternamente gravado na nossa memória
integral, na memória perispiritual. Para o profissional espírita, à voz da
consciência acresce ainda a consciência doutrinária adquirida ao contato com a
Terceira Revelação.
Por isso nestas horas de intensas
alegrias para todos, sejamos humildes o suficiente e sábios bastante para
compreendermos que à medida que crescemos em intelectualidade, diminuiremos em
saber se não tivermos a guiar-nos a luz poderosa do Evangelho. O intelectualismo
exagerado levou o mundo ao estado em que está. Cabe a nós espíritas, a quem foi
dada a oportunidade de penetrar um pouco no imenso conhecimento divino, a tarefa
difícil e extenuante de adubar a ciência que um dia ajudamos a secar com nosso
orgulho e egoísmo. Poderemos fazê-lo através do trabalho desinteressado ante
qualquer situação, através do desempenho profissional calcado na linha do dever
incondicional.
Ergamos nosso pensamento a Deus para
agradecer a oportunidade oferecida. Para pedirmos forças a fim de que não
sucumbamos outra vez nos mesmos erros pretéritos. Muita vez, ao fazermos a
nossa escolha profissional, começamos a retrilhar os mesmos caminhos em que
falimos, por nos deixarmos levar pelo corcel desenfreado da glória. O perigo se
nos apresenta então através das facilidades que encontramos para desempenharmos
a nossa "nova tarefa". A ocasião de queda se nos depara mais uma vez
e é necessário que o jovem espírita se imbua de suas responsabilidades perante
todos e principalmente diante de si.
Em que sentido, ao subirmos mais uma
etapa no desenvolvimento intelectual, temos obrigações com Deus?
Criados à Sua feição e semelhança,
ignorantes e perfectíveis, temos por obrigação
primordial da nossa consciência a de sermos bons e a de nos aperfeiçoarmos no
difícil caminho da evolução com o Cristo. Já travamos contato com a doutrina do
amor e sabedoria
indestrutíveis e por isso estamos cônscios da responsabilidade advinda do fato
de que, se muito nos foi dado, muito nos será pedido. As ocasiões de queda
serão muitas, mas serão contornadas e quiçá vencidas se pautarmos nosso
proceder pelo do Mestre.
Coloque-mo-nos na posição de aprendizes, porque nesta vida ninguém é tão pobre que não tenha nada a dar, nem tão rico que não possa receber. E o pseudo-ignorante quantas lições maravilhosas nos prestará, pois hauriu seus conhecimentos na universidade do sofrimento da vida. Por isso, "nunca deixeis que os vossos inferiores, sejam de que natureza forem, percebam que tendes consciência da vossa superioridade. Nunca lhes deixeis compreender que dais justo valor ao serviço que lhes prestais, ao amor que lhes dedicais, porque esse serviço lhes pesaria e esse amor os chocaria" ("Os Quatro Evangelhos", J. B. Roustaing, 3º volume, nº 261).
No plano moral de sua jornada, ao
estudante espírita foi dada a ocasião de contato com a religião que faz da fé
raciocinada o seu único "dogma". Seus princípios universais e
imortais do amor ao próximo, da caridade, da fé com obras, não entram em
conflito com os saberes universitários. Muito ao contrário, eles os iluminarão.
O ingresso em níveis educacionais
mais altos não deve significar o abandono da Doutrina pelo jovem universitário
espírita.
Se os conhecimentos doutrinários
adquiridos até então não estão nos fornecendo a base necessária para vencer a
dialética materialista recebida nos bancos escolares, empenhemos a bandeira da
pesquisa científica ou da pesquisa filosófica dentro do contexto
evangélico-doutrinário e partamos para um debate aberto e amoroso. Façamo-lo
com o coração cheio do mais puro amor, traduzido na verdadeira vontade de vê-lo
iluminado pelas luzes espirituais.
Ante tanta sabedoria divina, ergamos
nosso pensamento intelectualizado, mas humilde, aos Espíritos Superiores a fim
de que nos amparem nesta tarefa hercúlea de iluminação da ciência com o
Evangelho do Mestre, governador do planeta. Entretanto, sejamos humildes, para
que, na ânsia desse objetivo, não acabemos obscurecendo a Doutrina.
Para com o próximo temos a
responsabilidade de dar sempre o melhor de nós, de colocar os nossos deveres
sempre acima dos nossos direitos. Em qualquer ramo do conhecimento humano
encontraremos exemplos magnânimos destas atitudes. Na maioria das
vezes, exemplos foram oferecidos por ateus ou profitentes de outras religiões.
Se eles foram capazes disso, por que nós não o seremos? O nosso proceder
profissional terá um farol divino a guiar-nos: o Mestra amado. E, dentro desta perspectiva, o que o nosso
próximo espera de nós é a oferta do melhor do que de melhor possuímos.
Independentemente de situações geográficas, interesses pecuniários ou
políticos, o nosso irmão de jornada terrena espera de nós somente amor,
caridade, simbolizados pelo zelo profissional. Jesus foi o profissional mais
completo, o intelectual mais gabaritado que já conviveu conosco; contudo que
salário lhe pagamos? O da cruz infamante que ele, com o seu imenso cabedal de
amor, transformou no madeiro da redenção para os seus algozes.
Nestes momentos decisivos de nossas
vidas, volvamos o nosso pensamento penhorado de humildade, de amor, de respeito
e de reconhecimento ao Criador de todas as coisas. Àquele que por especial
assentimento de Sua parte, nos concedeu tantas oportunidades e que sem o Seu
consentimento amoroso, nem do pó teríamos saído.
Neste momento marcante de nossas
vidas, sejamos com o pensamento do apóstolo Paulo: “A ciência incha, mas o amor
edifica”. (I Coríntios, cap. 8 – v.1).
Reflitamos
Tânia de Souza Lopes
Reformador (FEB) Fevereiro 1973
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