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quinta-feira, 11 de junho de 2015

Reflitamos

                   O findar de um ano e o início de outro caracteriza-se por grande número de festividades. Dentre estas destacam-se as cerimônias de formatura que simbolizam o término de mais uma etapa em nossas vidas e o começo de uma outra mais importante, onde aplicaremos aquilo que pensamos ter aprendido. Além da oportunidade do acontecimento social, que significa tal fato na realidade, para o formando espírita? Que espera a sociedade de um jovem espírita que acabou de subir mais um degrau na escala do aperfeiçoamento intelectual? Que esperamos de nós mesmos?

            A oportunidade de desfrutarmos uma condição intelectual mais favorável acarreta-nos responsabilidade que não pode resumir-se num simples diploma ou juramento. Não nos encontramos aqui de primeira vez; estamos, ao contrário, repetindo o ano na escola da vida e, no mais das vezes, fazemo-lo por termos abusado das nossas capacidades intelectivas em detrimento do bem. Crescemos em ciência enquanto diminuímos em amor.

            Em qualquer estágio intelectual em que nossos estudos acadêmicos nos tenham situado, a responsabilidade adquirida é tríplice. Assumimos deveres para conosco, para com o próximo e para com o Criador.

            Deveres para conosco no sentido de saber se estamos cumprindo aquilo que um dia, por acréscimo de misericórdia, Deus nos concedeu, a fim de que pagássemos as nossas dívidas. A par disso junte-se a responsabilidade do conhecimento doutrinário a nos obrigar à honestidade total.

            Quando escolhemos uma carreira, fazemo-lo quase sempre de acordo com as nossas necessidades de aperfeiçoamento espiritual. Assim, ao profissional leigo é ainda compreensível que se deixe levar pela ambição desvairada, pela irresponsabilidade profissional, pelo desmazelo. Dizemos compreensível mas não admissível, porque a toda conquista pessoal correspondem deveres que hão de superar os direitos. Se o leigo não tem a Doutrina a guiar-lhe os passos, tem contudo a voz da consciência a fazê-lo, a orientá-lo. E ninguém conseguirá jamais sufocá-la, nesta ou em qualquer outra existência, porque tudo o que passamos ficará eternamente gravado na nossa memória integral, na memória perispiritual. Para o profissional espírita, à voz da consciência acresce ainda a consciência doutrinária adquirida ao contato com a Terceira Revelação.


            Por isso nestas horas de intensas alegrias para todos, sejamos humildes o suficiente e sábios bastante para compreendermos que à medida que crescemos em intelectualidade, diminuiremos em saber se não tivermos a guiar-nos a luz poderosa do Evangelho. O intelectualismo exagerado levou o mundo ao estado em que está. Cabe a nós espíritas, a quem foi dada a oportunidade de penetrar um pouco no imenso conhecimento divino, a tarefa difícil e extenuante de adubar a ciência que um dia ajudamos a secar com nosso orgulho e egoísmo. Poderemos fazê-lo através do trabalho desinteressado ante qualquer situação, através do desempenho profissional calcado na linha do dever incondicional.

            Ergamos nosso pensamento a Deus para agradecer a oportunidade oferecida. Para pedirmos forças a fim de que não sucumbamos outra vez nos mesmos erros pretéritos. Muita vez, ao fazermos a nossa escolha profissional, começamos a retrilhar os mesmos caminhos em que falimos, por nos deixarmos levar pelo corcel desenfreado da glória. O perigo se nos apresenta então através das facilidades que encontramos para desempenharmos a nossa "nova tarefa". A ocasião de queda se nos depara mais uma vez e é necessário que o jovem espírita se imbua de suas responsabilidades perante todos e principalmente diante de si.

            Em que sentido, ao subirmos mais uma etapa no desenvolvimento intelectual, temos obrigações com Deus?
           
            Criados à Sua feição e semelhança, ignorantes e perfectíveis, temos por obrigação primordial da nossa consciência a de sermos bons e a de nos aperfeiçoarmos no difícil caminho da evolução com o Cristo. Já travamos contato com a doutrina do amor e sabedoria indestrutíveis e por isso estamos cônscios da responsabilidade advinda do fato de que, se muito nos foi dado, muito nos será pedido. As ocasiões de queda serão muitas, mas serão contornadas e quiçá vencidas se pautarmos nosso proceder pelo do Mestre.

           
A nós estudantes espíritas, muito nos foi dado nos dois planos da vida. No puramente material, a pequena iluminação intelectual que dispomos coloca-nos no papel de farol para aqueles a quem, nesta vida, não foi dada a oportunidade de altos estudos intelectivos. Sejamos humildes ao ensinar: "Quando socorrerdes o pobre, cuja inteligência se ache mergulhada em trevas, não lhe deixeis perceber até onde chega a vossa luz. Não o ofusqueis, nem o humilheis. Dizei-lhe: "Meu irmão, bem pouco sei; mas estou pronto a te ensinar o que sei, se o ignorares. Faze outro tanto comigo, pois bem me podes recompensar do mesmo modo" ("Os Quatro Evangelhos", J. B. Roustaing, 3º volume, nº 261). 

                Coloque-mo-nos na posição de aprendizes, porque nesta vida ninguém é tão pobre que não tenha nada a dar, nem tão rico que não possa receber. E o pseudo-ignorante quantas lições maravilhosas nos prestará, pois hauriu seus conhecimentos na universidade do sofrimento da vida. Por isso, "nunca deixeis que os vossos inferiores, sejam de que natureza forem, percebam que tendes consciência da vossa superioridade. Nunca lhes deixeis compreender que dais justo valor ao serviço que lhes prestais, ao amor que lhes dedicais, porque esse serviço lhes pesaria e esse amor os chocaria" ("Os Quatro Evangelhos", J. B. Roustaing, 3º volume, nº 261).

            No plano moral de sua jornada, ao estudante espírita foi dada a ocasião de contato com a religião que faz da fé raciocinada o seu único "dogma". Seus princípios universais e imortais do amor ao próximo, da caridade, da fé com obras, não entram em conflito com os saberes universitários. Muito ao contrário, eles os iluminarão.

            O ingresso em níveis educacionais mais altos não deve significar o abandono da Doutrina pelo jovem universitário espírita.

            Se os conhecimentos doutrinários adquiridos até então não estão nos fornecendo a base necessária para vencer a dialética materialista recebida nos bancos escolares, empenhemos a bandeira da pesquisa científica ou da pesquisa filosófica dentro do contexto evangélico-doutrinário e partamos para um debate aberto e amoroso. Façamo-lo com o coração cheio do mais puro amor, traduzido na verdadeira vontade de vê-lo iluminado pelas luzes espirituais.

            Ante tanta sabedoria divina, ergamos nosso pensamento intelectualizado, mas humilde, aos Espíritos Superiores a fim de que nos amparem nesta tarefa hercúlea de iluminação da ciência com o Evangelho do Mestre, governador do planeta. Entretanto, sejamos humildes, para que, na ânsia desse objetivo, não acabemos obscurecendo a Doutrina.


            Para com o próximo temos a responsabilidade de dar sempre o melhor de nós, de colocar os nossos deveres sempre acima dos nossos direitos. Em qualquer ramo do conhecimento humano encontraremos exemplos magnânimos destas atitudes. Na maioria das vezes, exemplos foram oferecidos por ateus ou profitentes de outras religiões. Se eles foram capazes disso, por que nós não o seremos? O nosso proceder profissional terá um farol divino a guiar-nos: o Mestra amado.  E, dentro desta perspectiva, o que o nosso próximo espera de nós é a oferta do melhor do que de melhor possuímos. Independentemente de situações geográficas, interesses pecuniários ou políticos, o nosso irmão de jornada terrena espera de nós somente amor, caridade, simbolizados pelo zelo profissional. Jesus foi o profissional mais completo, o intelectual mais gabaritado que já conviveu conosco; contudo que salário lhe pagamos? O da cruz infamante que ele, com o seu imenso cabedal de amor, transformou no madeiro da redenção para os seus algozes.

            Nestes momentos decisivos de nossas vidas, volvamos o nosso pensamento penhorado de humildade, de amor, de respeito e de reconhecimento ao Criador de todas as coisas. Àquele que por especial assentimento de Sua parte, nos concedeu tantas oportunidades e que sem o Seu consentimento amoroso, nem do pó teríamos saído.

            Neste momento marcante de nossas vidas, sejamos com o pensamento do apóstolo Paulo: “A ciência incha, mas o amor edifica”. (I Coríntios, cap. 8 – v.1).

Reflitamos
Tânia de Souza Lopes

Reformador (FEB) Fevereiro 1973

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