Curas
8,1 Tendo Jesus descido da montanha, uma grande multidão o seguiu.
8,2 Eis que um leproso aproximou-se e prostrou-se diante dele dizendo: -Senhor, se queres, podes curar-me!
8,3 Jesus estendeu a mão, tocou-o e disse: “ -Quero. Sê limpo!”No mesmo instante, a lepra desapareceu.
8,4 Jesus, então, lhe disse: “ -Vê que não o digas a ninguém. Vai, porém, mostrar-te ao sacerdote e oferece o dom prescrito por Moisés em testemunho de tua cura.”
“Na acepção etimológica, a palavra milagre (de mirari, admirar) significa: admirável, coisa extraordinária, surpreendente.. A Academia definiu-a deste modo: Um ato do poder divino contrário às leis da natureza, conhecidas.
Na acepção usual, essa palavra perdeu, como tantas outras, a significação primitiva. De geral, que era, se tornou de aplicação restrita a uma ordem particular de fatos. No entender das massas, um milagre, implica a ideia de um fato extranatural; no sentido teológico, é uma derrogação das leis da Natureza, por meio da qual Deus manifesta o seu poder. Tal, com efeito, a acepção vulgar, que se tornou o sentido próprio, de modo que só por comparação e por metáfora, a palavra se aplica às circunstâncias ordinárias da vida.
Um dos caracteres do milagre propriamente dito é o ser inexplicável, por isso mesmo que se realiza com exclusão das leis naturais. É tanto essa idéia que se lhe associa, que, se um fato milagroso vem a encontrar explicação, se diz que já não constitui milagre, por muito espantoso que seja. O que, para a Igreja, dá valor aos milagres é, precisamente, a origem sobrenatural deles e a impossibilidade de serem explicados. Ela se firmou tão bem sobre esse ponto, que ao assimilarem-se os milagres aos fenômenos da natureza constitui para ela uma heresia, um atentado contra a fé, tanto assim que excomungou e até queimou muita gente por não ter querido crer em certos milagres.
Outro caráter do milagre é o ser insólito, isolado, excepcional. Logo que um fenômeno se reproduz, quer espontânea, quer voluntariamente, é que está submetido a uma lei e, desde então, seja ou não conhecida a lei, já não pode haver milagres.”
“Foram fecundos em milagres os séculos de ignorância, porque se considerava sobrenatural tudo aquilo cuja causa não se conhecia. À proporção que a Ciência revelou novas leis, o círculo do maravilhoso se foi restringindo; mas, como a Ciência ainda não explorara todo o vasto campo da Natureza, larga parte dele ficou reservada para o maravilhoso.”
“Expulso do domínio da materialidade, pela Ciência, o maravilhoso se encastelou no da espiritualidade, onde encontrou o seu último refúgio. Demonstrando que o elemento espiritual é uma das forças vivas da Natureza, força que incessantemente atua em concorrência com a força material, o Espiritismo faz com que voltem ao rol dos efeitos naturais os que dele haviam saído porque, como os outros, também tais efeitos se acham sujeitos a leis. Se for expulso da espiritualidade, o maravilhoso já não terá razão de ser e só então se poderá dizer que passou o tempo dos milagres.”
“O Espiritismo, pois, vem, a seu turno, fazer o que cada ciência fez no seu advento: revelar novas leis e explicar, conseguintemente, os fenômenos compreendidos na alçada dessas leis.”
“Uma vez que estão no quadro dos fenômenos da natureza, os fenômenos espíritas se hão produzido em todos os tempos; mas, precisamente, porque não podiam ser estudados pelos meios materiais de que dispõe a ciência vulgar, permaneceram muito mais tempo do que outros no domínio do sobrenatural, donde o Espiritismo agora os tira. Baseado em aparências inexplicadas, o sobrenatural deixa livre curso à imaginação que, a vagar pelo desconhecido, gera as crenças supersticiosas. Uma explicação racional, fundada nas leis da Natureza, reconduzindo o homem ao terreno da realidade, fixa um ponto de parada aos transviamentos da imaginação e destrói as superstições. Longe de ampliar o domínio do sobrenatural, o Espiritismo o restringe até aos seus limites extremos e lhe arrebata o último refúgio.”
“As curas instantâneas não são mais milagrosas do que os outros efeitos, dado que resultam da ação de um agente fluídico, que desempenha o papel de agente terapêutico, cujas propriedades não deixam de ser naturais por terem sido ignoradas até agora.”
“A intervenção de inteligências ocultas nos fenômenos espíritas não os torna mais milagrosos do que todos os outros fenômenos devidos a agentes invisíveis, porque esses seres ocultos que povoam os espaços são uma das forças da Natureza, força cuja ação é incessante sobre o mundo material, tanto quanto sobre o mundo moral.”
“...fatos reputados milagrosos, ocorridos antes do advento do Espiritismo e que ainda no presente ocorrem, a maior parte, senão todos, encontram explicação nas novas leis que ele veio revelar. Esses fatos, portanto, se compreendem, embora sob outro nome, na ordem dos fenômenos espíritas e, como tais, nada tem de sobrenatural.”
“ Quanto aos milagres propriamente ditos, Deus, visto que nada lhe é impossível, pode fazê-los. Mas, fá-los? Ou, por outras palavras; derroga as leis que dele próprio emanaram? Não cabe ao homem prejulgar os atos da Divindade, nem os subordinar à fraqueza do seu entendimento. Contudo, em face das coisas divinas, temos, para critério do nosso juízo, os atributos mesmos de Deus. Ao poder soberano reúne ele a soberana sabedoria, donde se deve concluir que não faz coisa alguma inútil. Por que, então, faria milagres ? Para atestar o seu poder, dizem. Mas, o poder de Deus não se manifesta de maneira muito mais imponente pelo grandioso conjunto das obras da criação, pela sábia providência que essa criação revela, assim nas partes mais gigantescas, como nas mínimas, e pela harmonia das leis que regem o mecanismo do Universo, do que por algumas pequeninas e pueris derrogações que todos os prestímanos sabem imitar?”
“Não é pois da alçada do Espiritismo a questão dos milagres; mas, ponderando que Deus não faz coisas inúteis, ele emite a seguinte opinião:
Não sendo necessários os milagres para a glorificação de Deus, nada no Universo se produz fora do âmbito das leis gerais. Deus não faz milagres, porque, sendo, como são, perfeitas as suas leis, não lhe é necessário derrogá-las.
Se fatos há que não compreendemos, é que ainda nos faltam os conhecimentos necessários.”
Para Mt (8,3) - Quero, sê limpo! - reportamo-nos ao livro “Segue-me!” de Emmanuel por Chico Xavier:
“Mãos estendidas!...
Quando estiveres meditando e orando, recorda que todas as grandes idéias se derramaram, através dos braços, para concretizarem as boas obras. Cidades que honram a civilização, industrias que sustentam o povo, casa que alberga a família, gleba que produz são garantidas pelo esforço das mãos. Médicos despendem largo tempo em estudo para a conquista do título que lhes confere o direito de orientar o doente; no entanto vivem estendendo as mãos no amparo aos enfermos. Educadores mergulham vários lustros na corrente das letras adquirindo a ciência de manejá-las; contudo gastam longo trecho da existência estendendo as mãos no trabalho da escrita. Cada reencarnação de nosso espírito exige braços abertos do regaço maternal que nos acolhe. Toda refeição, para surgir, pede braços em movimento.
Cultivemos a reflexão para que se nos aclare o ideal, sem largar o trabalho que no-lo realiza.
Jesus, embora pudesse representar-se por milhões de mensageiros, escolheu vir ele próprio até nós, colocando as mãos no serviço, de preferência em direção aos menos felizes.
Pensemos Nele, o Senhor. E toda vez que nos sentirmos cansados, suspirando por repouso indébito, lembremo-nos de que as mãos do Cristo, após socorrer-nos e levantar-nos, longe de encontrarem apoio repousante, foram cravadas no lenho de sacrifício, do qual, conquanto escarnecidas e espancadas, ainda se despediram de nós, entre a palavra do perdão e a serenidade da bênção.”
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