A
jovem viera de um sanatório.
Ali, na singela sala do agrupamento
espírita-cristão, revelava-se inquieta, irrequieta, músculos em contrações que
prenunciavam agressividade, ríctus dolorosos que, entremeados com sorrisos, lhe
deformavam a juvenil fisionomia.
Afirmava-se incurável e, ao mesmo
tempo, inconformada com o seu estado.
Queria curar-se.
Avizinhava-se de violenta crise.
Somente a Misericórdia Divina, em
nos conhecendo as fraquezas, a favorecia com o temporário equilíbrio,
permitindo-nos o diálogo em que ela relatava os seus problemas interiores,
algumas das torturas de suas noites de pesadelo.
Trincando os dentes, informou:
- E o médico me assegurou que a
minha cura estará em eu reunir todas as pessoas com quem não simpatizo, e com
as quais tenho divergência, e lhes dizer, a todas juntas, tudo o que sinto e
penso delas.
À afirmativa amargosa, inda juntou:
- Tenho tanto ódio...
Essa odioterapia sempre nos
assombra!
Cada caso que se repete,
espanta-nos.
Refletimos bastante sobre tais
recomendações.
Diante de quadros que são efeitos
justamente do desencadeamento do rancor, do ódio trabalhado em múltiplas
experiências reencarnatórias, da cólera cultivada nos espetaculosos duelos
mentais em que nos conflitamos com os semelhantes - onde falha o eletrochoque,
onde falece a insulina, temos recolhido essas soluções verdadeiramente mágicas
de odioterapia, violência-terapia, vingança-terapia, quais remanescentes das
atitudes brutais dos que faziam de honra a máxima: “Não leve desaforo para casa.”
O infeliz enfermo, confiando-se ao
conselho desesperado de seu orientador, provocará uma reação em cadeia:
extravasando o rancor, recolherá rancor; distribuindo ódio e acumulando ódio,
raramente se desvinculará das fichas que fazem o seu calendário de frequência
nos sanatórios.
A falsa-sensação de alívio que o
bilioso diz experimentar, após suas indisciplinadas manifestações de rancor,
logo após “dizer tudo o que pensa e tudo o que quer”, é sempre seguida de um
agravamento do mal, agravamento este que a sabedoria popular define com
profunda grandeza: “Quem diz o que quer, ouve o que não quer.”
O parecer, distribuído a esmo,
fatalmente induzirá o doente a sustentar, por tempo indefinido, a posição em
que hiberna o seu senso moral: “a de vítima de um mundo que o não compreende”,
distanciando-o daquele esforço indispensável de romper a cristalização do
egoísmo em que se enclausura a sua alma.
Haverá menos desajustados com Evangelhoterapia.
A alma que se confia à sábia
orientação do Senhor Jesus, ao sol de seu Evangelho, ter mina
por abrir frestas na sua auto prisão, liberando-se do auto martírio a que se
confia dolorosamente e, aí sim, criando condições ideais para seu alevantamento
espiritual.
Ninguém aniquila tiririca, semeando
tiririca.
Impossível acabar com pernilongos,
promovendo o pântano.
Drena-se o charco com água corrente
e não com lama.
Terrenos incultos serão ninhos de
serpentes.
Na certa que a recomendação
espírita-cristã nem sempre é acolhida de bom ânimo por nós, doentes da alma,
porque não corresponde à nossa ânsia de ódio, à nossa fome de vingança, aos
nossos ensaios de rancor. Incomoda-nos, inclusive, por revelar a nossa autêntica
posição, nos quadros da vida: a de algozes e não a de vítimas. Parece-nos menos
eficiente, por apelar para sentimentos de fraternidade, de compreensão, de
harmonia. Não tem o sabor fantasioso de soluções mágicas e nem fala por
linguagem cabalística, mas nos aponta a urgência de nosso ajustamento às Leis
Espirituais que nos regem a vida.
É a recuperação de nosso deteriorado
sentimento religioso, cuja pureza se diluiu, no escoar de milênios, sob a ganga
de dogmas e rituais, paramentos e sacerdócio.
Espiritismo é negação da
odioterapia.
Odioterapia
J. Alexandre
Reformador (FEB) Maio 1970
Nenhum comentário:
Postar um comentário