O
gesto de Bartimeu, o cego mendigo de Jericó, «lançando de si a sua capa», ao ir
ter com
Jesus, nos sugere a ideia de ação premeditada para desembaraçar-se de algo que
lhe atrapalharia
a liberdade de movimento.
Para o filho de Timeu, o uso daquela
peça teria grande serventia. Provavelmente, seria com ela que ele se protegeria
das intempéries do tempo. Nem por isso, ao atender ao chamado do Mestre, pensou
em levá-la consigo. Atirou-a para um lado, lépido e resoluto.
Capa arremessada, por importuna e
supérflua, é o que cabe considerar.
Quem de nós não terá alguma coisa de
que desvencilhar-se para sair ao encontro de Jesus? Conhecer nossas inibições,
para atirá-las bem longe de nós - tal o indeclinável desiderato que nos compete
concretizar em benefício próprio.
Realizar esta ingente tarefa, é
solucionar gloriosamente o nosso problema de liberação espiritual.
Bartimeu, depois de arremessar fora
a capa, levanta-se, segue em direção ao Excelso Benfeitor, dele obtém a dádiva
da recuperação da vista e permanece em Sua companhia. Deixa um acessório, até
então utilizado, por um bem genuíno, essencial, que seria a razão de ser de sua
felicidade.
Quantas vezes, pela nossa posição
espiritual, fazemos lembrar o cego mendigo de Jericó, também, como ele,
carregando alguma carga incomodativa e inconveniente!
E como é penoso este nosso fardo e
esmagador o seu peso!
Quase sempre o que nos dificulta a
marcha ascensional e gloriosa, para o Calvário de nossa redenção, está
representado em pequenas coisas que se nos afiguram de somenos importância e,
por assim entender, aparentemente insignificantes.
O empecilho aparece quando queremos
que ele desapareça. Muita vez, vamos surpreendê-lo, incrustado em nossos
hábitos, como ostras grudadas à pedra, em situações de que mal suspeitamos.
Em trivialidades domésticas, a que
nos entregamos desapercebidamente. Numa
pronunciada tendência à desconfiança de tudo e de todos. Num pendor à crítica
demolidora. Numa inclinação à malquerença, congelando amizades por
insignificâncias que vimos e ouvimos, exagerando lhes a importância.
Na adesão a atitudes íntimas,
veladas a olhos alheios, mas patentes à nossa consciência, de cujas algemas nos
fazemos prisioneiros voluntários.
Ao nos levantarmos em busca do
Celeste Enviado, sejam quais forem as nossas cargas sobressalentes,
arremessemo-las fora; deixemo-las, depois de arrebanhados para o Redil do
Senhor, como trastes desprezados e desprezíveis . Serão no caso:
-
a obcecação pela posse inescrupulosa das posições sociais de evidência e dos
bens materiais;
-
a obsessão pelos prazeres malsãos do mundo;
-
o atrativo pelos assuntos, falados ou escritos, de essência venenosa;
-
o fascínio por situações escabrosas, ainda que habilmente aparentadas com as
melhores intenções;
-
a subjugação à intemperança mental e verbal;
-
a escravidão aos desequilíbrios emotivos e sentimentais.
Seja neutralizando a resistência
daqueles que se nos opõem à caminhada para Deus, seja superando impedimentos próprios,
seja vencendo relutâncias íntimas ou circunstanciais, seja transpondo
obstáculos buscados por nós ,ou atirados à nossa frente por outrem, seja a
força de suores e lágrimas, necessariamente teremos que consumar o nosso
trabalho liberativo.
E não há tempo a perder; e hoje
ainda; e agora mesmo.
Desvencilhemo-nos do desperdício do
tempo e da saúde, do abuso do poder e da autoridade, da aplicação desajustada
do talento e da cultura, da ação imposicionista dos nossos dons físicos e
espirituais, de nossa desalmada exploração do próximo, que tudo isto são capas
tremendas que poderão asfixiar-nos sob o seu peso.
Amigos, desembaracemo-nos da
inibições, para não virmos a terminar a existência amortalhados por elas.
Libertação
por Passos Lírio
Reformador (FEB) Setembro 1970
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