O
Lugar Do Evangelho
Vinélius
Di Marco
(Indalício
Mendes)
Reformador
(FEB) Julho 1962
- Digo-te que te precipitas, Yala.
Não deves condenar ninguém por simples suposição.
- Não é suposição. É certeza.
Disse-me Beraida que ouviu o que de mim se falou, pois estava presente. Ninguém
mais digno de crédito do que ele, Benaisar.
- Esse mesmo juízo faço eu da pessoa
que tu acusas. Ouve, amigo: Às vezes somos levados a admitir coisas que nos iludem
os sentidos, embora estejamos convencidos de que ocorreram realmente conforme
acreditamos. Tua informante pode ter sido vítima de um equívoco, tanto mais que
a ocorrência se verificara em ambiente agitado.
- Julgas-me louco? Não! Não! Tenho
certeza absoluta do que houve e meu julgamento está feito. Sou um homem de
grandes virtudes, como sabes, Benaisar, e não mereço ser tratado assim.
Já que tendes tanta certeza nada
mais tenho a fazer aqui. Retirar-me-ei, porque não desejo discutir contigo.
Todavia, acho-te intolerante e bom seria que te recordasses daquela passagem do
Evangelho que diz: “Não julgueis para não
serdes julgados; porquanto sereis julgados conforme houverdes julgado os
outros; empregar-se-à convosco a mesma medida de que vos tenhais servido para
com os outros”...
- Lembro-me bem dessas palavras,
Benaisar. Deverias, então, ensiná-las a quem disse mal de mim...
-Evidentemente, eu o faria se
tivesse a mesma certeza que tens. De qualquer forma, Yala, medita um pouco a
respeito desta outra frase do Mestre: “Atire
a primeira pedra aquele que estiver sem pecado”...
Depois do rápido diálogo, cada qual
tomou o seu rumo.
Dias depois, encontraram-se de novo
e Yala retornou ao assunto, com a mesma disposição de espírito:
- Cada vez tenho mais certeza do que
te disse, Benaisar.
E repetiu as mesmas razões
anteriormente defendidas. O amigo as ouviu em silêncio, falando em seguida:
Continuo a pensar que te
precipitaste no julgamento feito, Yala. Robusteceu-se em mim a convicção de que
estás alimentando um mal-entendido, porque, na realidade, ninguém falou mal de
ti.
- Então duvidas de mi?! Que amigo
és? – exclamou, irritado, fazendo um gesto nervoso, o amigo de Benaisar. – Não perdoarei
jamais o que de mim foi dito. Não o mereço, porque sou um homem de grandes
virtudes!
- Está bem, Yala, está bem. Eu
deveria dizer antes: Está mal, Yala, está mal, porque desperdiças uma
oportunidade magnífica de exemplificar as lições sublimes do Evangelho. Assemelhas-te
àquela personagem para quem disse Jesus: “Como
é que vedes um argueiro no olho do vosso irmão, quando não vedes uma trave no
vosso olho? Ainda que fosse expressão da realidade o que supões, não
deverias ser tão extremado. Yala, porque cada vez mais te distancias do
Evangelho, que conheces e tens o dever de respeitar? Lamento-o por ti.
Louvas te numa opinião que não pode ter o dom da infalibilidade. Hoje sei que
nada se passou como o afirmas. Neste caso, os papéis estão invertidos: és tu
quem está em falta, porque insistes no erro de sancionar um equívoco...
- Já que discordas de mim, sigamos caminhos
diferentes. Minha convicção é inabalável e jamais apagarei com o perdão essa
nódoa às minhas virtudes. És um falso amigo; abandonas-me na hora em que sou
humilhado.
- Entrego-te à tua consciência,
Yala. Ela será teu juiz, no amanhã que se aproxima. Antes que te vás, porém,
faço minhas estas palavras de um cristão de verdades reais: “Queres ser feliz um instante? Vinga-te. Queres ser feliz para sempre? Perdoa.
“Posso dizer-te, concluindo, que, pelo outro lado, há muito que estás
perdoado...
Retomando seu caminho, Benaisar
murmurou tristemente:
- É bem mais fácil ter o Evangelho
nos lábios do que no coração... que é o seu verdadeiro lugar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário