Autodomínio
por Vinícius (Pedro de Camargo)
Reformador
(FEB) Janeiro 1952
"Pela
paciência possuireis as vossas almas."
Os homens incidem em muitas faltas e
cometem mesmo delitos graves, não propriamente por maldade ou instintos
perversos, mas por fraqueza. Após consumado o ato pecaminoso, advêm
naturalmente as consequências funestas, as quais, recaindo sobre o agente,
despertam-lhe o senso de responsabilidade fazendo refletir sobre o sucedido.
Se o indivíduo já possui certa dose
de discernimento, tira das primeiras experiências a devida lição, precavendo-se
para o futuro. Caso contrário, as quedas se repetem em caráter progressivo, agravando
suas condições, precipitando-o, de ruína em ruína, às profundezas do abismo, de
onde não sairá senão mediante inauditos e penosos esforços.
Conhecedor desses percalços
relativos aos vários processos de operar-se a evolução humana, o sábio Mestre de
Nazaré preconiza o culto da paciência, virtude essa mediante a qual o homem
chega a possuir-se a si mesmo, realizando, destarte, a maior das conquistas,
aquela que lhe assegurará, a vitória sobre os arrastamentos da matéria e de
todas as paixões inconfessáveis que procedem da animalidade.
Paciência é perseverança, é ânimo
sereno nas contingências difíceis, é energia moral capaz de nos manter
equilibrados diante das conjunturas adversas, sejam elas quais forem. Tais
predicados só se logra mediante a educação da vontade, metódica e continua,
esse atributo do espírito, infelizmente, muito desdenhado em nosso meio.
É comum vermos os indivíduos
irritarem-se e até mesmo perderem de todo a compostura, alegando em seguida que
tiraram-lhe a paciência, ou, então, que esta se esgotou em vista de certo
conjunto de circunstâncias em que se acharam envolvidos.
A justificativa invocada, no
entanto, não procede. Paciência é autodomínio, condição esta que, uma vez
adquirida, não se esgota, nem é possível perder-se. O impaciente, o irritadiço
é um fraco cuja vontade não prevalece sobre os desejos desordenados e sobre os
gestos impulsivos.
É lamentável que deixe de figurar
nos programas oficiais de ensino a educação da Vontade, assim como a instrução cívica
e moral.
Mas, ainda mais lamentável é a
lacuna que se verifica em nosso setor de divulgação propaganda doutrinária,
onde pouco se tem cogitado da criação de escolas e educandários espíritas ao
lado das obras de assistência social, tão justificada e carinhosamente
cuidadas, quando aquela é a modalidade por excelência dentre todas as demais.
Esse descuido explica o motivo por que o Espiritismo vai, dia a dia,
estendendo-se em superfície sem ganhar profundidade.
No entanto, já é tempo de considerar
que as ideias e as doutrinas são como as plantas: enquanto as raízes não
aprofundam o solo onde nascem, não oferecem estabilidade nem podem assegurar
messes promissoras.
*
Quanto ao subido valor do
autodomínio, vamos transcrever, como fecho desta crônica, as palavras de Amado
Nervo:
"Se
volveres os olhos aos que te cercam; se souberes contemplá-los, verás que
alcançaram alguns bens, alguns aparentes favores da vida, porém que nenhum
logrou o bem por excelência, a saber - a conquista de si mesmo. Este deseja, aquele
se encoleriza, outro está escravizado a certos vícios.
Eu mesmo, que ora escrevo sobre o
assunto, não tenho conseguido aquela conquista.
Se tu puderes realizá-la,
se fores senhor absoluto de ti mesmo, já nada mais te será difícil.
Onde puseres teus intentos, a obra
se consumará. Onde semeares tua vontade, o milagre se produzirá.
Queres ser rei e o serás,
certamente. Queres ser milionário, e o serás. Queres possuir o mundo e o
possuirás!
Porém, seguramente, uma vez que
tenhas conseguido a plena posse de ti mesmo, já nada desejarias e terias um imenso
desprezo por todas aquelas coisas!"
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