As Negações de Pedro
26,69
Enquanto isso, Pedro estava sentado no Pátio. Aproximou-se dele uma das
servas, dizendo: Também tu estavas com Jesus, o Galileu!
26,70 Mas, ele negou publicamente, nestes termos: -
Não sei o que dizes!
26,71 Dirigia-se
ele para a porta a fim de sair, quando outra criada o viu e disse aos que lá
estavam: Este homem também estava com Jesus de Nazaré!
26,72 Pedro, pela
segunda vez, negou
com juramento: -Eu não conheço tal Homem!
26,73 Pouco depois, os que ali estavam, aproximaram-se de Pedro e disseram:
Sim, tu és daqueles. Teu modo de falar te dá a conhecer.
26,74 Pedro, então,
começou a dizer imprecações, jurando que nem sequer conhecia tal Homem. E,
neste momento, cantou o galo.
26,75
Pedro recordou-se do que Jesus lhe dissera: “Antes que o galo cante,
negar-Me-ás três vezes! E, saindo, chorou amargamente.
Os Instrumentos da Perfeição
“Naquela noite,
Simão Pedro trazia à conversação o espírito ralado por extremo desgosto.
Agastara-se com parentes descriteriosos
e rudes. Velho tio acusara-o de dilapidador dos bens da família e um primo
ameaçara esbofeteá-lo na via pública.
Guardava, por
isso, o semblante carregado e austero. Quando o Mestre leu algumas frases dos
Sagrados Escritos, o pescador desabafou. Descreveu o conflito com a parentela e
Jesus o ouviu em silêncio.
Ao término do
longo relatório afetivo, indagou o Senhor:
-E que fizeste,
Simão, ante as arremetidas dos familiares incompreensivos?
-Sem dúvida,
reagi como devia! - respondeu o apóstolo, veemente. - Coloquei cada um no seu
lugar próprio. Anunciei, sem rebuços, as más qualidades de que são portadores.
Meu tio é raro exemplar de sovinice e meu primo é mentiroso contumaz. Provei,
perante numerosa assistência, que ambos são hipócritas, e não me arrependi do
que fiz.
O Mestre refletiu
por minutos longos e falou, compassivo:
-Pedro, que faz
um carpinteiro na construção de uma casa?
-Naturalmente
trabalha - redarguiu o interpelado, irritadiço.
-Com quê? -
tornou o Amigo Celeste, bem humorado.
-Usando
ferramentas.
Após a resposta
breve de Simão, o Cristo continuou:
-As pessoas com as quais nascemos e vivemos
na Terra são os primeiros e mais importantes instrumentos que recebemos do Pai,
para a edificação do Reino do Céu em nós mesmos. Quando falhamos no
aproveitamento deles, que constituem elementos de nossa melhoria, é quase
impossível triunfar com recursos alheios, porque o Pai nos concede os problemas
da vida, de acordo com a nossa capacidade de lhes dar solução
A ave é obrigada
a fazer o ninho, mas não se lhe reclama outro serviço. A ovelha dará lã ao
pastor; no entanto, ninguém lhe exige o agasalho pronto. Ao homem foram concedidas tarefas, quais sejam as do amor e da
humildade, na ação inteligente e constante para o bem comum, a fim de que a paz
e a felicidade não sejam mitos na Terra. Os parentes próximos, na maioria das
vezes, são o martelo ou o serrote que podemos utilizar a benefício da
construção do templo vivo e sublime, por intermédio do qual o Céu se
manifestará em nossa alma. Enquanto o marceneiro usa suas ferramentas, por
fora, cabe-nos aproveitar as nossas por dentro. Em todas as ocasiões, o ignorante representa para nós um campo de
benemerência espiritual; o mau é desafio que nos põe à prova; o ingrato é um
meio de exercitarmos o perdão; o doente é uma lição à nossa capacidade de
socorrer.
Aquele que bem se conduz, em nome do Pai,
junto de familiares endurecidos ou indiferentes, prepara-se com rapidez para a
glória do serviço à Humanidade, porque, se a paciência aprimora a vida, o tempo
tudo transforma.
Calou-se Jesus e,
talvez porque Pedro tivesse ainda os olhos indagadores, acrescentou
serenamente:
-Se não auxiliarmos ao necessitado de perto,
como auxiliaremos os aflitos, de longe?
se não amamos o irmão que respira conosco os mesmos ares, como nos
consagraremos ao Pai que se encontra no Céu?
Depois dessas
perguntas, pairou na modesta sala de Cafarnaum expressivo silêncio que ninguém
ousou interromper.”
Para
Mt (26,69-75) -O Fracasso de Pedro-, encontramos
em “Elucidações Evangélicas” de Antônio Luiz Sayão, o que se segue:
“Pedro confiara
demais nas suas próprias forças e não procurará o único ponto de apoio que o
pudera sustentar: a prece. Deixara-se
levar pela confiança em si mesmo e, malgrado ao aviso de Jesus, não se pudera
em guarda.
Grande foi o seu
remorso, pois que nele houve apenas fraqueza e não culpa.
Houve apenas
falta de previdência, de desconfiança de si mesmo, e não traição premeditada,
fruto da covardia e do egoísmo.
Ao deixar a casa
do sumo sacerdote, ele reconheceu o seu erro e se dispôs a repará-lo. Essa a
distinção que se deve fazer entre a fraqueza e a culpabilidade.
Dificilmente pode o culpado reparar, no
curso de uma existência, a falta durante ela cometida; ao passo que o fraco
pode adquirir a força de que careça.
Eis por que são quase sempre
temerários os nossos juízos. Eis como e por que às vezes condenamos o que o
Senhor desculpa e desculpamos o que Ele reprova.
Quando o galo
cantou, Jesus não estava perto de Pedro.
Mas, naquele
instante, o apóstolo experimentou uma impressão fluídica que, por efeito de
mediunidade, lhe recordou as palavras do Mestre, fazendo-o ao mesmo tempo ver o
semblante doce e calmo deste, que se limitava a dirigir-lhe um olhar triste,
quando com a ingratidão era pago da afeição que lhe testemunhara.
Houve, da parte
de Jesus, ação magnética a distância e, da de Pedro, vidência.”
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