Prêmios
por Lino
Teles (Ismael Gomes Braga)
Reformador
(FEB) Maio 1943
Para
que as crianças estudem, cumpram suas tarefas escolares, os pais e mestres
estabelecem notas e prêmios para as provas. O estudante esforça-se, cansa-se,
luta, não para adquirir ciência, mas para adquirir prêmios, louvores, boas
notas nos exames. Só muito mais tarde, ao aplicar sua ciência na vida prática,
percebe o estudioso que o único prêmio real é o conhecimento mesmo que ele
adquiriu e não as medalhas e diplomas, que passaram a ser quinquilharia inútil.
Nos
cultos religiosos, dá-se o mesmo com os adultos em corpo, mas crianças em espírito.
O homem estuda sua religião, frequenta-lhe as solenidades, pratica-lhe a moral,
recebe os sacramentos, a fim de receber prêmios, de salvar a alma, obter as
boas graças de Deus e dos seus anjos. Interessam-lhe somente os prêmios que lhe
são apontados fora e depois do culto e não o culto em si mesmo; o culto não lhe
parece uma compensação, mas, ao contrário disso, uma tarefa para obter prêmios.
A prece não é um prêmio, mas o meio de pedir o prêmio. O prêmio deve ser mais
material, mais concreto do que a alegria da alma ao elevar-se ao seu Deus. Longe
de nós pensar que os prêmios escolares ou as promessas das religiões sejam inúteis
ou desnecessários. São absolutamente necessários e utilíssimos, porque a
inteligência da criança é demasiado limitada para alcançar as finalidades
superiores do estudo que está fazendo e desanimaria, se não visse uma
compensação imediata para os seus esforços. Igualmente a concepção da vida
espiritual é muito vaga para a maioria dos habitantes da terra, que não a
julgariam digna de seus esforços e sacrifícios, se não pudessem conceber um prêmio
mais próximo e mais concreto como pagamento de seus esforços. Lutam por um salário
e querem concebe-lo bem claro e bem próximo. São ilusões necessárias. Muletas
indispensáveis. Retira-las fora deixar ao desamparo, sem rumo, sem forças, em
pleno desespero, as pessoas que só com elas podem movimentar-se e orientar-se.
A
finalidade do Espiritismo não é arrancar essas muletas a quem quer que seja,
mas simplesmente socorrer aqueles que já as perderam e se sentem desalentados.
Mais cedo ou mais tarde, todos as perdem, assim como o adulto perde o interesse
pelos prêmios escolares que o entusiasmavam tanto na infância. Nesse momento, o
Espiritismo apresenta-se como a grande tábua de salvação. Não promete prêmios,
porque ele mesmo é o prêmio.
Com
o conhecimento do Espiritismo, tudo se esclarece e a segurança se estabelece
para todos. Em vez de contemplarmos uma curta existência de dores e erros,
vemos uma longa, interminável série de existências, da qual esta, penosa e
triste, é pontinho morto que se perderá para sempre na eternidade futura, é o
minuto que voa e desaparece para sempre, num passado que nunca mais há de voltar.
Tudo
se transforma a luz do Espiritismo, de cultura, Porque o ponto de observação se
eleva para o eterno e o infinito. As coisas mais odiosas, capazes de
desencadear todas as fúrias, quando encaradas do ponto de vista limitado de uma
encarnação, passam a ser compreendidas como processos necessários de evolução e
proveitosas em seu conjunto eterno. Deixam de ser o mal e transformam-se em
bem, talvez um bem conquistado com muitas dores, mas por fim um bem real.
Figuremos
um exemplo.
Certo
povo julga-se de uma raça superior e por isso invade o território de outro
menos armado, faz-lhe guerra de extermínio, apropria-se de suas terras,
escraviza os sobreviventes da raça vencida e estabelece novo império,
aparentemente todo seu, sobre os escombros do território conquistado. A raça
vencida desaparece, sobrevivendo somente a vencedora, como se deu em quase
todos os territórios de nossas Américas. Do ponto de vista materialista da existência
única; houve uma injustiça imensa, irreparável em toda a história. Mas, o Espiritismo
nos demonstra que essa injustiça é apenas aparente, porque a raça extinta continua
vivendo e progredindo em seus antigos domínios, somente em outros corpos. Os invasores
e vencedores orgulhosos, que exterminaram os vencidos, que jamais permitiriam a
um deles viverem em seus lares, vão pagar o tributo à lei universal da harmonia.
Seus filhos bem amados vão ser os mesmos Espíritos dos vencidos, reencarnados em
suas esposas, irmãs e filhas. Todo o passado fica esquecido. As ternas
crianças, hoje tratadas carinhosamente nos lares suntuosos dos vencedores, nada
mais são do que os vencidos do passado agora em novos corpos.
Surge
realmente um novo mundo nesses territórios; mas, uma parte grande de sua população
é a mesma antiga. As duas raças se fundem em uma única, cada uma colaborando com
o fruto de suas experiências para o bem comum.
A
reencarnação vence todas as veleidades de raça, de fortuna, de cor.
Ainda
outro exemplo.
Uma
raça realmente superior vive dispersa pelo planeta, sem pátria, sem segurança,
ajudando o progresso de todos os povos e por todos eles perseguida. Sua vida é
dolorosa missão através dos séculos e milênios: é o sal da terra; mas, a sua
superioridade desperta ciúmes, rivalidades, perseguições, injúrias. De tempos a
tempos surgem verdadeiros organizadores da perseguição para aumentar as dores
da raça missionária.
Parece
que ficam impunes os perseguidores; dispõem de força e fazem quanto lhes apraz.
Puro engano! Esses perseguidores nascem na mesma raça perseguida, sofrem a
justa punição de suas faltas e colaboram inconscientemente com ela para o
progresso de todos.
Passam
pelas mesmas dores que já fizeram sofrer, são incompreendidos, mas aprimoram-se
em moral e fazem jus à felicidade real e inalterável dos Espíritos superiores,
quando terminam suas penosas tarefas.
A
variedade infinita de caráteres, de graus de cultura, de inclinações morais,
demonstra que a raça perseguida realmente já é a fusão de muitas ou de todas as
raças do planeta. Só lhe resta da primitiva um número muito limitado de indivíduos,
os condutores, guias da raça; a grande massa, porém, já é toda formada de
antigos perseguidores vindos de todas as raças e reencarnados na perseguida e
benfeitora.
Nenhuma
injustiça fica sem reparação, porque a salvação é universal. Todos os filhos de
Deus tem que ser salvos, porque essa é a lei; por isso mesmo nenhum pode
permanecer sempre no pecado. A reparação da injustiça é a reabilitação. Vem
fatalmente, inevitavelmente, através muitas vezes de pungentes dores, mas vem.
O
conhecimento do Espiritismo nos enche a alma de serenidade e paz, dá-nos a
segurança de que nenhum mal é sem remédio e que fatalmente o bem triunfa, de
que uma justiça perfeita reina mesmo onde nos parece só haver caos e confusão,
de que o nosso futuro será inevitavelmente feliz e tranquilo. Tudo melhora em
torno de nós à luz do Espiritismo. A morte perde todo o seu terror e entra a
ser vista como boa amiga. A pobreza, a desonra, humilhação, a enfermidade, a dor
em todas as suas múltiplas modalidades, perdem seu aspecto lúgubre para quem sabe
que tudo isso, como seus opostos, é passageiro e desaparecerá rapidamente,
restando-nos sempre na frente a eternidade inteira e inalterável qual no-la
apresenta o Espiritismo.
O conhecimento deste nos coloca
acima da aprovação ou reprovação do mundo, dando-nos, por isso, uma paz de
espírito que se não pode comparar a todos os bens da terra.
Se
as crenças do passado nos prometiam prêmios e esses prêmios eram necessários, o
Espiritismo, abrindo-nos as cortinas que estavam cerradas sobre o mundo espiritual,
não necessita prometer-nos nenhum prêmio, porque esse conhecimento mesmo é o maior
de todos os prêmios. O espiritista não deveria nunca orar para pedir; deverá
orar sempre para agradecer o muito
que está recebendo, porque na verdade está recebendo mais do que todos os
outros bens reunidos. Agradecer sempre até à mão benfazeja que nos fere, porque
essa mão nos está reintegrando na lei de Justiça perfeita, nos está impelindo à
felicidade. Agradecer a quem pelo homicídio
nos restitui à Pátria espiritual. A vida do espiritista deveria ser um hino
constante de reconhecimento ao Criador, uma constante adoração. Se assim não acontece,
é porque ainda somos muito pouco espíritas, ainda não sabemos avaliar o tesouro
que recebemos.
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