“Espiritismo Cristão” e “Espírita
Cristão”
A
Redação
Reformador
(FEB) Maio 1955
“É de
fato indubitável que o Espiritismo é mais estorvado pelos que o compreendem
mal, do que por aqueles que dele nada entendem e até mesmo pelos seus inimigos
declarados; e os primeiros tem geralmente a pretensão de compreenderem melhor
que os outros. Esta pretensão, que denuncia orgulho por si mesma uma prova evidente
da ignorância dos verdadeiros princípios da Doutrina." – ALLAN KARDEC.
No Brasil, graças à Federação Espírita
Brasileira, à direção que sempre lhe deu a ela o Espírito de Ismael, o
Espiritismo predominante é aquele que se orienta pelos ensinamentos do Cristo,
interpretados segundo o espírito que vivifica, qual o recomendou o próprio
Cristo e qual o fez o grande e iluminado Codificador: Allan
Kardec.
Há por aqui, não há dúvida, mas em pequeníssimo
número, confrades que do Espiritismo só querem os prodígios, os
"milagres", os fenômenos psíquicos, e que enfaticamente se dizem
adeptos do a que chamam Espiritismo científico. Para esses o fenômeno é tudo, e
nele quase sempre ficam sem se preocuparem com a finalidade
dessa
mesma fenomenologia. Estacionam e não querem ir além, à procura de alguma coisa
mais. Pouco lhes importam as deduções filosóficas e as conclusões religiosas a
que ela conduz, julgando-se todos esses confrades uns superespíritas, hiper-científicos,
os únicos de bom senso e equilíbrio mental.
A maioria, porém, a grande maioria, a quase
totalidade dos espíritas brasileiros felizmente já não pensam de igual modo.
Esses oram e têm o estudo do Evangelho como uma necessidade e um dever mesmo...
Estranha, no entanto, é a atitude daqueles
"fenomenistas", pois constantemente se nos apresentam como defensores
de Kardec e neste procuram, através de interpretações vagas, incoerentes e por
vezes capciosas, provar que o Codíficador disse isso e aquilo, citando-lhe
trechos isolados, com a finalidade tão só de justificarem o
ponto de vista dessa meia dúzia de confrades.
Dizendo-se baseados naquele iluminado filho
de Lyon, de quando em vez voltam, por exemplo, a repetir que o Espiritismo nada
tem de comum com o Cristianismo e que errados andam desde muito os homens da
Federação Espírita Brasileira e errados andam também Emmanuel e outros elevados
mensageiros da Espiritualidade, quando
empregam, com espírito de deturpação - frisam aqueles confrades - as expressões
que servem de título a esta croniqueta.
Vejamos, porém, o que de próprio punho nos
legou Allan Kardec.
Três anos antes de sua desencarnação,
escrevia ele em sua Revue Spirite, 1866, pág. 114:
"Inscrevendo
no frontispício do Espiritismo a lei suprema do Cristo, abrimos o caminho do
Espiritismo cristão; sob este ponto de vista tratamos, então, de desenvolver os
princípios bem como os caracteres do verdadeiro espírita."
Já em 1861, nessa mesma revista, à página
377, Kardec considerava:
“ ...ora,
nem um nem outro estaria no caminho do verdadeiro Espiritismo, isto é, do
Espiritismo cristão. Aquele que acredita possuir uma opinião mais justa que a dos outros, mais
facilmente a tornará aceita pela doçura e pela persuasão; o desabrimento seria
de sua parte uma péssima cartada."
Nesse mesmo ano, afirmava o mestre a
páginas 341, 343 e 384 da citada publicação:
Pág. 341: ''Porque, pois, o Espiritismo, que outra coisa não é que o
desenvolvimento e a aplicação da ideia cristã, não triunfaria de alguns escarnecedores, ou de antagonistas, que
até o presente, apesar de seus esforços, apenas lhe têm oposto uma negação
estéril?"
Pág. 343: "O lado mais belo do Espiritismo é o lado moral; é por suas consequências
morais que ele triunfará, porque aí está a sua força e por ai é invulnerável. Ele inscreveu em
sua bandeira: Amor e Caridade, e ante este paládio, mais poderoso que o de
Minerva, porque vem do Cristo, a própria incredulidade se inclina."
Pág. 384: "Que seja, então, uma escola, já que eles assim o querem; nós nos
ufanamos de inscrever no frontispício: -École du Spiritisme moral, philosophique et chrétien e para
aí convidamos todos os que tomam por divisa: amor e caridade. Àqueles que
seguem essa bandeira, dedicamos todas as simpatias, e a nossa cooperação jamais
lhes faltará."
E anteriormente, em 1860, escreveu na
página 300 da quase centenária Revue
Spirite o trecho com que terminaremos essas transcrições:
"Há,
senhores, três categorias de adeptos: uns se limitam a crer na realidade das
manifestações, e buscam antes de tudo os fenômenos; para esses o Espiritismo é
simplesmente uma série de fatos mais ou menos interessantes.
"Os
segundos veem algo mais que os fatos: reconhecem neles o lado filosófico;
admiram a moral que deles resulta, mas não na praticam: para esses a caridade
cristã é uma bela
máxima, e nada mais.
"Os
terceiros, afinal, não se contentam em admirar a moral: eles a praticam,
aceitando-lhe todas as consequências. Certíssimos de que a existência terrestre
é
uma prova
passageira, eles tratam de aproveitar esses curtos instantes para avançar na via
do progresso que os Espíritos lhes traçam, esforçando-se por fazer o bem e
por reprimir seus
maus pendores; a caridade é em tudo a regra de conduta deles; esses são os verdadeiros
Espíritas, ou melhor, os Espiritas cristãos."
Todo esse trecho, com alguns acréscimos
todavia, se acha reproduzido n"O livro dos Médiuns", item 28. E cerca
de dez meses após a publicação desta obra, num longo trabalho sobre a
"Organização do Espiritismo", dado à luz na Revue Spirite de Dezembro de 1861, Kardec relembrava, com novas
adições, a mencionada distinção dos espíritas, declarando-lhe a importância
para o tema de que se ocupava. Aí, na Revue
Spirite de 1861, o mestre acrescenta, depois dessas últimas palavras -
"ce sont les vrais Spirites, ou
mieux, Ies Spirites chrétiens":
"Se se compreendeu bem o que precede,
compreender-se-á também que um grupo exclusivamente formado de elementos dessa
última classe estaria em melhores condições, porque é somente entre pessoas que
praticam a lei de amor e de caridade que um laço fraternal verdadeiro pode
estabelecer-se. "
Como vemos, o Codificador, talvez na
supervisão das coisas, esclareceu de maneira inconfundível de como se deveria,
para o futuro, qualificar aqueles que se dissessem adeptos da nova Revelação...
Não cabe, portanto, à Casa Máter do
Espiritismo no Brasil, e nem a respeitáveis médiuns, a criação "anti-doutrinária",
conforme dizem, das expressões que servem de epígrafe a esse despretensioso
artigo. Foi, como vimos, o próprio mestre da 3ª Revelação quem as cunhou pelas
julgar necessárias e procedentes.
Se a palavra do Codificador Iionês merece
algum respeito, esperamos que esses nossos amigos e confrades não continuem a
repetir suas próprias ideias, torcendo, desvirtuando o pensamento do excelso
missionário do Espiritismo cristão.
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