Não raro me perguntam como situar os espíritas em face dos acontecimentos políticos que se desenrolam no Brasil. E ainda: qual a posição do Espiritismo dentro do processo histórico brasileiro.
Minha resposta é sempre a mesma e me advém da própria Doutrina Espírita. Divido-a em dois aspectos fundamentais. Vejamos o primeiro. Espiritismo e Politica são incompatíveis. É inútil tentar um paralelo entre ambos. Ou a criatura faz Política ou faz Espiritismo, o que não invalida, é lógico, a hipótese de o político ser espírita. E é até bom que seja. Mas saberá sempre, com mais razão, que não se pode servir a dois Senhores ao mesmo tempo, tal como prescrevem os Evangelhos.
Recordemos, a propósito, a tentativa farisaica no sentido de envolver Jesus politicamente nos acontecimentos da sua época. Quiseram mesmo fazê-lo o líder do movimento de libertação material dos judeus. O Mestre não apenas se furtou à manobra, mas situou clara e explicitamente a sua presença entre nós, alheando-se à politica de César e tão somente preparando os homens para a redenção espiritual. A alusão ao seu Reino, que não era nem é deste mundo, desestimularia qualquer jogada política, de quem quer que fosse.
Não se infira disso tudo que a Política é um mal. Claro que não. Encarada apenasmente como a arte de governar, ela tem a sua razão de ser e há inúmeros políticos de ilibada moral e imaculado comportamento. Contudo, a cada um o seu mister. Isto porque, a Política obriga às vezes a tomadas de posição que não são imorais nem ilegais, mas acabam fazendo gerar incompreensões, intolerâncias, radicalismos, extremismos, para não dizer vaidades e presunções. Ela exige, não raro, atitudes em bloco, de bancadas nem sempre capazes, nos seus fins, de reunir o endosso consciencial da unanimidade. No entanto, é preciso votar. E votar partidariamente, não individualmente. Mas seria isto um crime? Não, claro que não. O sistema partidário implica essas nuanças. Todavia, a Religião (ipso facto, o Espiritismo) não pode subjugar-se a compromissos de qualquer outra natureza que não seja o da aproximação da criatura com o seu Criador. Qualquer sistema que vise mais ao Homem do que ao Espírito extrapola da Doutrina de Allan Kardec. Por isso tudo é que o Espiritismo não é contra a Política, mas prefere que ela seja feita pelos políticos. Aos espíritas, pois, cabe fazer Espiritismo e nada mais.
Vejamos agora o outro aspecto fundamental da minha resposta, referido no início deste artigo. Sem interferir na Política nem praticá-la em nome do Espiritismo, os espíritas confiam, entretanto, em que os políticos brasileiros, cedo ou tarde, farão do Brasil o "Coração do Mundo", isto é, um pais onde afinal impere o bem-estar social, o progresso amplo e generalizado, a fraternidade em todos os seus sentidos. Esta confiança e esta convicção nos advém duma obra ditada ao maior médium psicógrafo do mundo, o generoso missionário de Pedro Leopoldo, Francisco Cândido Xavier. Humberto de Campos inspirou, através da sua faculdade psíquica, trabalho interessantíssimo, a que chamou "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", o qual foi editado pela Federação Espírita Brasileira, em 1938, e pode ainda hoje ser encontrado em sua livraria, na Avenida Passos, 30.
O inesquecível escritor maranhense, transposto o limiar da Eternidade, foi prestes chamado a colaborar na tarefa de divulgação da Terceira Revelação, isto é, o Espiritismo, e, dentre outras mensagens, enviou-nos essa verdadeira sinfonia de esperança, a encantar-nos a alma com um aceno imarcescível à espiritualização dos homens, dos povos e das nações! Segundo o que se contém em "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", nosso pais está fadado à mais bela missão terrestre. Sua gente - em cuja preferência o Espiritismo, segundo todas as estatísticas, é a religião que mais cresce - há de transformar-se no ideal modelo de harmonia e compreensão para todas as outras gentes, já podendo ser divisados esses horizontes nas muitas dádivas naturais com que temos sido prodigalizados, além dos processos que marcam nossa evolução histórica, quase sempre incruentos e desfigurados dos ódios e das crueldades.
Não é à-toa que - sem blague - dizem haver no outro plano Espíritos sabidões preocupados em conseguir pistolões para reencarnar no Brasil. Ignoram, é claro, que ante a Grande Lei o único pistolão válido é unicamente o do merecimento ou o da necessidade.
(Ext. do “Diário de Notícias", de 20 de Maio de 1970)
Espiritismo e Política
Luciano dos Anjos
Reformador (FEB) Julho 1970
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