Tramas e
insídias da treva
da Redação
Reformador (FEB) 16 de
Novembro de 1925
Para dominar os homens a treva desperta neles a latência
das más paixões. Aqui insinua a maledicência, ali a cizânia e mais além a discórdia.
É o reinado da confusão, o caos das forças maléficas, capazes de transformar os
homens negligentes em monstruosas potências de destruição.
Esse estado por excelência propício ao governo dos Espíritos
que se rebelaram contra a luz e a quem apraz ver a humanidade afundar-se no mar
das misérias morais.
Surgem então a desconfiança e a dúvida entre os, a
insubmissão e o despeito dos filhos contra os pais, o rancor e as rixas entre
irmãos, a deslealdade e a perfídia do amigo. O mal não se circunscreve, porém,
aí, invade o seio das famílias, outrora unidas, e o despeito, a malquerença, a inveja
e o ciúme as separam por muralhas espessas. Estende o polvo mais além os seus tentáculos
e vamos escutar a desdenhosa palavra - racca
- entre os companheiros que, no próprio santuário da fé, não se estimam e se
apartam do convívio salutar da comunidade, levando n'alma a cisão, a inimizade e
a prevenção.
Onde existia a união, o amor fraterno, a dedicação, o carinho
e a caridade, vê-se desunião, a malevolência, a indiferença, a rispidez e a intriga.
Onde se fruía a paz, sofre-se a guerra; aí não mais os corações se alentam no ambiente
das afeições nobres e delicadas, mas se embebedem de fundas agonias.
Tudo isso porque o homem trancou as portas da razão, da cordura,
dos sentimentos cristãos e abriu os alçapões das negras paixões. Tudo porque
não soube ser sóbrio, discreto e justo no pensar, no sentir, no obrar. Veio-lhe
o sono da negligência e, em seguida os pesadelos sombrios o agitam no seu leito
de pecado. No auge do delírio, suas palavras imprudentes, frívolas e venenosas
que mudam em farpas que ferem; os pensamentos se casam com a onda das emoções e
em torno desse nectário as mortais vespas voam em bando ávidos. E o coração do
homem se transforma em colmeal da iniquidade!
A medida que esses males crescem, os aborrecidos da luz encontram
campo mais largo e aberto para combater a obra de Jesus Cristo, que é a
salvação do espírito humano. E, porque a humanidade é constituída de Espíritos
atrasados e impuros, levianos e indiferentes, maus e bons, onde o joio nasce ao
lado do trigo, não é de se admirar que a treva nela estabeleça morada e aí tenha
aliados, instrumentos seus de perturbação e desordem.
Assim sendo, não é de causar espanto o rendilhado das injustiças
que o homem urde nos teares da cegueira moral. Contudo, não lhes atiremos pedras,
porque não sabemos até quando permaneceremos no bom caminho. Se alguma coisa
podemos fazer em seu proveito, sejam as obras da piedade, da paciência, da humildade
e da perseverança nos bons propósitos, porque poderoso é Deus para converter as
pedras em filhos de Abrahão.
Como fazer, porém, calar a celeuma dos ódios e apagar os
rastilhos da discórdia? Como impedir a carreira veloz dos que aborrecem a paz e
estraçalham o manto da fraternidade? Como vencer o tresloucado que se arroja de
encontro ao Bem, que é a obra de Deus?
Escutemos o Divino Mestre:
“É impossível, diz Ele, que não venham escândalos, mas ai
daquele por quem vem os escândalos. A esse melhor fora lhe atassem uma mó de
moinho no pescoço e o lançassem no mar, do que escandalizar a um desses pequeninos.
“Se a vossa mão ou o vosso pé vos for motivo de escândalo,
cortai-os e lançai-os longe de vós. Mais vale entreis na vida coxo ou
estropiado do que com duas mãos e dois pés e ser lançado no fogo eterno. Se
vosso olho for motivo de escândalo, arrancai-o e atirai-o longe de vós: mais
vale entreis na vida com um só olho do que com dois e ser lançado na geena do
fogo. (1)
(1) Lucas e
Mateus – Cap. XVII e XVIII, v. 1 a 2 e 6 a 9.
Aquele que
escandaliza a uma criança, dizem os Espíritos reveladores, aquele que, pelas
palavras e exemplos, arrasta um de seus irmãos, por mais íntimo que o julgue, a
praticar o mal, seja por atos, seja por pensamentos, se torna culpado perante
Deus, não só da falta em que, assim procedendo, incorreu, mas também das em que
tenha feito incorrer os outros e as expiará.
“Destruí em vós todas as raízes do pecado, isto é, tudo o
que vos leve a infringir a lei divina; arrancar de vossos seres tudo o que vos
possa, de qualquer maneira, induzir ao mal.
Tratai de compreender bem o sentido figurado das palavras
de Jesus: - destruí nas vossas almas todas as causas do mal, qualquer que seja
o sofrimento humano que vos possa isso causar. Mais vale que sofrais durante
algum dia da vossa miserável existência, rompendo com os vícios, do que vos
arriscardes a sofrer, por séculos, na vida errante do Espírito culpado.
Considere que o fogo, que devora, não se extingue e que o verme, que rói, não
morre.
“Imagens são estas de uma dor ardente, incessante, que
consome o Espírito, sem jamais o reduzir a cinzas; de uma tortura de todos os
instantes da sua vida na erraticidade, sem que lhe sorria a esperança de
ver-lhe o fim. A esperança é gota d’água que cai nas terras áridas, é o maná
que o faminto apanha no chão, é o bálsamo que se deita na chaga sangrenta. O
culpado não a pode sentir até que o arrependimento lhe aja aberto o coração
para animá-la.”
Falemos nesta linguagem viva aos que ainda se comprazem
no fomento dos escândalos e se aliaram aos Espíritos infelizes. Ela de certo os
esclarecerá. Mostremos em todas as suas cores reais, o que aguarda os escravos
das más paixões na vida de além túmulo, onde só o remorso os perseguirá para
qualquer parte que se voltem. Clamemos sem cessar para que o homem destrua “as
raízes do mal” que no seu coração se embebem, e que servem de nutrição copiosa
aos Espíritos que se acotovelam na humanidade, sempre prontos a propagarem o
vírus das misérias morais e a firmarem aí seu império.
Que os corações sejam os lugares estéreis por onde
vagueiam os infelizes do espaço, à procura de pousada, sem poderem penetrar
neles por encontra-los limpos de pecado e ornados de virtudes.
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