terça-feira, 4 de agosto de 2020

Tramas e insídias da treva





Tramas e insídias da treva
da Redação
Reformador (FEB) 16 de Novembro de 1925

            Para dominar os homens a treva desperta neles a latência das más paixões. Aqui insinua a maledicência, ali a cizânia e mais além a discórdia. É o reinado da confusão, o caos das forças maléficas, capazes de transformar os homens negligentes em monstruosas potências de destruição.

            Esse estado por excelência propício ao governo dos Espíritos que se rebelaram contra a luz e a quem apraz ver a humanidade afundar-se no mar das misérias morais.

            Surgem então a desconfiança e a dúvida entre os, a insubmissão e o despeito dos filhos contra os pais, o rancor e as rixas entre irmãos, a deslealdade e a perfídia do amigo. O mal não se circunscreve, porém, aí, invade o seio das famílias, outrora unidas, e o despeito, a malquerença, a inveja e o ciúme as separam por muralhas espessas. Estende o polvo mais além os seus tentáculos e vamos escutar a desdenhosa palavra - racca - entre os companheiros que, no próprio santuário da fé, não se estimam e se apartam do convívio salutar da comunidade, levando n'alma a cisão, a inimizade e a prevenção.

            Onde existia a união, o amor fraterno, a dedicação, o carinho e a caridade, vê-se desunião, a malevolência, a indiferença, a rispidez e a intriga. Onde se fruía a paz, sofre-se a guerra; aí não mais os corações se alentam no ambiente das afeições nobres e delicadas, mas se embebedem de fundas agonias.  

            Tudo isso porque o homem trancou as portas da razão, da cordura, dos sentimentos cristãos e abriu os alçapões das negras paixões. Tudo porque não soube ser sóbrio, discreto e justo no pensar, no sentir, no obrar. Veio-lhe o sono da negligência e, em seguida os pesadelos sombrios o agitam no seu leito de pecado. No auge do delírio, suas palavras imprudentes, frívolas e venenosas que mudam em farpas que ferem; os pensamentos se casam com a onda das emoções e em torno desse nectário as mortais vespas voam em bando ávidos. E o coração do homem se transforma em colmeal da iniquidade!

            A medida que esses males crescem, os aborrecidos da luz encontram campo mais largo e aberto para combater a obra de Jesus Cristo, que é a salvação do espírito humano. E, porque a humanidade é constituída de Espíritos atrasados e impuros, levianos e indiferentes, maus e bons, onde o joio nasce ao lado do trigo, não é de se admirar que a treva nela estabeleça morada e aí tenha aliados, instrumentos seus de perturbação e desordem.

            Assim sendo, não é de causar espanto o rendilhado das injustiças que o homem urde nos teares da cegueira moral. Contudo, não lhes atiremos pedras, porque não sabemos até quando permaneceremos no bom caminho. Se alguma coisa podemos fazer em seu proveito, sejam as obras da piedade, da paciência, da humildade e da perseverança nos bons propósitos, porque poderoso é Deus para converter as pedras em filhos de Abrahão.

            Como fazer, porém, calar a celeuma dos ódios e apagar os rastilhos da discórdia? Como impedir a carreira veloz dos que aborrecem a paz e estraçalham o manto da fraternidade? Como vencer o tresloucado que se arroja de encontro ao Bem, que é a obra de Deus?

            Escutemos o Divino Mestre:

            “É impossível, diz Ele, que não venham escândalos, mas ai daquele por quem vem os escândalos. A esse melhor fora lhe atassem uma mó de moinho no pescoço e o lançassem no mar, do que escandalizar a um desses pequeninos.
            “Se a vossa mão ou o vosso pé vos for motivo de escândalo, cortai-os e lançai-os longe de vós. Mais vale entreis na vida coxo ou estropiado do que com duas mãos e dois pés e ser lançado no fogo eterno. Se vosso olho for motivo de escândalo, arrancai-o e atirai-o longe de vós: mais vale entreis na vida com um só olho do que com dois e ser lançado na geena do fogo. (1)

                (1)  Lucas e Mateus – Cap. XVII e XVIII, v. 1 a 2 e 6 a 9.  

            Aquele que escandaliza a uma criança, dizem os Espíritos reveladores, aquele que, pelas palavras e exemplos, arrasta um de seus irmãos, por mais íntimo que o julgue, a praticar o mal, seja por atos, seja por pensamentos, se torna culpado perante Deus, não só da falta em que, assim procedendo, incorreu, mas também das em que tenha feito incorrer os outros e as expiará.  

            “Destruí em vós todas as raízes do pecado, isto é, tudo o que vos leve a infringir a lei divina; arrancar de vossos seres tudo o que vos possa, de qualquer maneira, induzir ao mal.
           
            Tratai de compreender bem o sentido figurado das palavras de Jesus: - destruí nas vossas almas todas as causas do mal, qualquer que seja o sofrimento humano que vos possa isso causar. Mais vale que sofrais durante algum dia da vossa miserável existência, rompendo com os vícios, do que vos arriscardes a sofrer, por séculos, na vida errante do Espírito culpado. Considere que o fogo, que devora, não se extingue e que o verme, que rói, não morre.

            “Imagens são estas de uma dor ardente, incessante, que consome o Espírito, sem jamais o reduzir a cinzas; de uma tortura de todos os instantes da sua vida na erraticidade, sem que lhe sorria a esperança de ver-lhe o fim. A esperança é gota d’água que cai nas terras áridas, é o maná que o faminto apanha no chão, é o bálsamo que se deita na chaga sangrenta. O culpado não a pode sentir até que o arrependimento lhe aja aberto o coração para animá-la.”

            Falemos nesta linguagem viva aos que ainda se comprazem no fomento dos escândalos e se aliaram aos Espíritos infelizes. Ela de certo os esclarecerá. Mostremos em todas as suas cores reais, o que aguarda os escravos das más paixões na vida de além túmulo, onde só o remorso os perseguirá para qualquer parte que se voltem. Clamemos sem cessar para que o homem destrua “as raízes do mal” que no seu coração se embebem, e que servem de nutrição copiosa aos Espíritos que se acotovelam na humanidade, sempre prontos a propagarem o vírus das misérias morais e a firmarem aí seu império.

            Que os corações sejam os lugares estéreis por onde vagueiam os infelizes do espaço, à procura de pousada, sem poderem penetrar neles por encontra-los limpos de pecado e ornados de virtudes.

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