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sábado, 10 de janeiro de 2015

Os Espinhos da Mediunidade


                     Do Blog: Muitos autores de artigos publicados em Reformador (FEB) o fizeram sob cognomes. 
Este também foi o caso da Yvonne Pereira. 
A curiosidade no caso é que ela adotou um nome masculino.


Os Espinhos
da Mediunidade

Frederico Francisco / (Yvonne A Pereira)
Reformador (FEB) Fev 1971

            Todos nós sabemos da grande responsabilidade que se assume no dia em que
participamos de uma sessão espírita pretendendo o posto de intérprete dos Espíritos. É natural o desejo de ser médium, de praticar o intercâmbio com o mundo dos Espíritos, de sustentar conversações com os nossos Guias Espirituais ou os nossos seres amados que partiram para o Além. Mas, o que muitos de nós ignoram é que os frutos bons que a mediunidade venha a dar dependem, dentre muitos outros quesitos importantes, do modo pelo qual ela é desenvolvida.

            Em verdade, a mediunidade não carece de ser provocada. Ela se apresentará naturalmente, em época oportuna, suave ou violentamente, conforme as faixas vibratórias que então nos envolvam, trate-se de espíritas ou de adeptos de outras religiões. Tratando-se de pessoa ponderada, estudiosa, fiel à ideia de Deus, dotada de boas qualidades morais, a mediunidade desponta, frequentemente, com suavidade, pelos canais da fé e do auxílio ao próximo. Vemos, então, profitentes de quaisquer credos religiosos, o espírita inclusive, impondo as mãos sobre o sofredor e transmitindo o fluido generoso da cura, do alívio ao angustiado, da esperança ao aflito, sem que seja necessária a busca sistemática do desenvolvimento, a qual, se imprudente, na maioria dos casos tende a prejudicar o médium para sempre. E vemos também manifestações fortes, conflitos, enfermidades e até obsessões, cujo advento se processa, evidentemente, à revelia do indivíduo que lhes sofre os influxos. Em tal acontecendo, é só orientar a mediunidade, instruir o médium, se ele desconhecer os princípios legados pela Doutrina Espírita; tratá-lo, se estiver doente, e deixá-lo praticar o bem com o dom recebido da Natureza.

            Todos esses exemplos, que diariamente se apresentam em nossos caminhos, pois conhecemos pessoas de outros credos religiosos que também curam com a imposição das mãos, são lições que devemos acatar. Indicam que esses são os médiuns mais seguros porque espontâneos, cuja faculdade floresceu em tempo preciso, sem necessidade dos longos períodos, incômodos e muitas vezes contraproducentes, das provocações do desenvolvimento.

            Ora, frequentemente somos solicitado por candidatos ao exercício da mediunidade para esclarecimento sobre a sua própria situação de pretendentes ao intercâmbio com o Invisível. Sentem-se confusos, inquietos, vacilantes, sem nada obterem de positivo depois de um, dois e mais anos de esforços para o desenvolvimento, fato por si só bastante para indicar os pouquíssimos recursos mediúnicos do candidato, que entretanto é sincero e bem assistido pelo seu Espírito familiar, não se deixando enlear pela auto sugestão. Que esforços, porém, faz ele? Apenas a presença à mesa de sessões, a insistência aflitiva para que possa escrever mensagens, coisas belas, ou fazer oratórias que satisfaçam. Muitas vezes, senão de modo geral, o desenvolvimento advém não propriamente da faculdade mediúnica, mas da própria mente do médium, que assim se estimula, e então se dá o menos desejado: a subconsciência do médium a agir por si mesma, excitada pelo esforço e a vontade, como sendo um agente desencarnado; sua mente a externar-se em comunicações apócrifas, que só servem para empanar a verdadeira faculdade e empalidecer o brilho desse dom sublime outorgado por Deus ao homem. Muitos dos que insistem no desenvolvimento mediúnico asseveram que determinado Espírito lhes afiançou que são médiuns dessa ou daquela especialidade: psicógrafos, de incorporação, de vidência, etc. No entanto, os mestres da Doutrina Espírita, com Allan Kardec e Léon Denis à frente, e os Instrutores Espirituais que merecem fé (porque há os pseudo mentores espirituais) desde sempre observaram que “não há nenhum indício pelo qual se reconheça a existência da faculdade medi única. Só a experiência pode revelá-la.” Mesmo que tal faculdade seja de psicografia, de incorporação ou outra qualquer. Poderemos, certamente, experimentar as nossas potencialidades. Mas, a prática tem demonstrado que a experiência não deverá ultrapassar de alguns poucos meses, caso nada se obtenha nesse período, justamente para que a faculdade eventual seja protegida contra a invasão de fenômenos outros, também psíquicos, mas não mediúnicos ; fenômenos que o linguajar moderno trata de “parapsicológicos”, e aos quais nós outros até agora temos denominado de animismo, personismo, auto sugestão, etc.

            O imoderado desejo de ser médium vai às vezes ao ponto de se “exercitar a vidência”. Ora, a vidência é a faculdade melindrosa por excelência, que não poderá suportar tal tratamento sem sofrer sérios distúrbios. De modo algum pode ser provocada, a menos que se deseje “tomar gatos por lebres”, isto é, sugestionar-se de que está vendo alguma coisa, elaborando então os chamados “clichês mentais”, a “ideoplastia” (idéia plasmada na mente pela vontade). É bom não esquecer que o pensamento é criador, constrói, realiza, mesmo que não concretize materialmente aquilo que mentaliza (ver o capítulo VllI de “O Livro dos Médiuns”).

            A respeito desses espinhos que às vezes laceram os que tentam a mediunidade, fez o sábio analista Ernesto Bozzano preciosas observações em seu elucidador livro “Pensamento e Vontade”; Léon Denis, o continuador de Kardec, em seu compêndio “No Invisível”, brinda-nos com esclarecimentos substanciosos, enquanto Allan Kardec, além das lições gerais, diz o seguinte sobre a vidência, no capítulo XIV, nº 171, de “O Livro dos Médiuns”: - “A faculdade de ver os Espíritos pode, sem dúvida, desenvolver-se, mas é uma das que convém esperar o desenvolvimento natural, sem o provocar, em não se querendo ser joguete da própria imaginação. Quando o gérmen de uma faculdade existe, ela se manifesta de si mesma.  Em princípio, devemos contentar-nos com as que Deus nos outorgou, sem procurarmos o impossível, por isso que, pretendendo ter muito, corremos o risco de perder o que possuímos. Quando dissemos serem frequentes os casos de aparições espontâneas (nº 107), não quisemos dizer que são muito comuns. Quanto aos médiuns videntes, propriamente ditos, ainda são mais raros e há muito que desconfiar dos que se inculcam possuidores dessa faculdade. É prudente não se lhes dar crédito, senão diante de provas positivas.

            Da advertência do mestre insigne deduzimos, portanto, que é absurdo (e a experiência vem demonstrando que assim é) fazer exercícios visando ao desenvolvimento da vidência, bem como entregar-se a “professores de vidência”. A vidência é manifestação, espírita como qualquer outra e, portanto, os seus registros devem ser examinados por pessoas competentes e experientes, que os passará pelo crivo da razão e do bom senso, a fim de serem aceitos.

            Pouco sabemos ainda sobre a mediunidade. Intensamente, porém, sentimos e presenciamos os seus efeitos. Achamo-nos ainda nas preliminares da questão, não obstante datar a mediunidade de todos os tempos, o que revela ser ela um dom outorgado por Deus. Mas, o que dela se sabe, apesar da ignorância em que nos encontramos a seu respeito, já cabe em vários volumes, como realmente vem cabendo, pois diversos livros existem sobre o magno assunto.

            Uma das mais importantes faces da mediunidade, e que não podemos ignorar, porque o Alto disso nos esclarece e a observação confirma, é que a prática da Caridade e do Amor para com o próximo não somente é indispensável ao bom desenvolvimento da faculdade, mas também garantia poderosa ao seu exercício feliz. Não, certamente, a prática de uma caridade de fachada, interesseira, mas sim inspirada no verdadeiro sentimento do coração. Desse modo, o candidato à intérprete do mundo espiritual deve iniciar o seu compromisso não só pela frequência às sessões mediúnicas, mas pela prática do Bem, pelo auxílio ao sofredor, além do estudo consciencioso e do empenho em prol da reforma moral gradativa de si mesmo. Assim agindo, no momento em que advenham os sinais indicadores de que realmente possui faculdades a desenvolver, estas se apresentarão suavemente, sem choques, por se acharem protegidas pelas faixas vibratórias da Caridade.

            E será bom repisar: convém não precipitar o desenvolvimento mediúnico. O seu progresso é lento; a mediunidade, ao que tudo indica, desdobra-se, indefinidamente, e um médium nunca estará completamente desenvolvido, mormente nos dias penosos da atualidade, quando mil problemas se entrechocam ao seu derredor. Quanto mais a cultivarmos, com submissão às leis divinas, mais ela se ampliará, crescerá no rumo dos conhecimentos espirituais. Não existem, pois, “médiuns extraordinários”, não existem eleitos na mediunidade, Por conseguinte, não nos devemos fanatizar pela mediunidade, endeusando os médiuns como se fossem homens e mulheres à parte na escala humana. Eles são apenas instrumentos, ora bons, ora maus, das forças invisíveis do Além, consoante o modo pelo qual dirijam os próprios atos cotidianos. E deixarão de ser médiuns se os Espíritos não mais puderem ou quiserem se servir deles.

            Convém, pois, que os candidatos ao mediunato meditem bastante ao se aprestarem para o papel que representarão na seara de Jesus, o Mestre por excelência. A mediunidade é, certamente, um dom, entre os muitos que Deus concede às almas criadas à sua imagem e semelhança. E a um dom de Deus devemos, necessariamente, amar, respeitar e cultivar com sensatez e prudência.


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