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segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Em trânsito pela Terra



            Este é o mundo-escola onde ingressamos, por vontade divina e a curto prazo, para, através das duras lições que se nos deparam, aperfeiçoar nossas almas e fazer jus a moradas em esferas mais felizes, que turbilhonam, incalculáveis, na imensidão dos espaços que o Pai Celestial, amoravelmente, destinou a todas as suas criaturas.

            Daí, os obstáculos sem conta e os sofrimentos acerbos que muita vez se nos defrontam nesta nossa caminhada terrena, como recursos necessários à purificação de nossos espíritos ensandecidos pela caudal de crimes e erros clamorosos consumados em existências transatas.

            Felizes aqueles que, compreendendo a realidade espiritual e o nada das vaidades humanas, buscam praticar o bem para com os seus semelhantes, com amor e sem esmorecimentos, e vão expungindo de si, uma a uma, todas as imperfeições que os adstringem a planos inferiores. Estes, já estão a caminho da Perfeição, finalidade da nossa estada neste planeta de lágrimas.

            Mas, ai dos que se demoram nos vãos prazeres e dos que se constituem em espíritos de cizânia, obstando, assim, o progresso de outros.

            Certamente se verão na contingência de retornarem à Terra ou a outros mundos menos evoluídos, em existências dolorosas.

            Alijemos de nós, portanto, as taras milenárias que acumulámos em as nossas inúmeras descidas à carne e que nos têm distanciado de Deus, algemando-nos, ainda, a sofrimentos atrozes. Está em nós o desprendermo-nos de seus tentáculos e alçarmo-nos às regiões alcandoradas da espiritualidade onde a beleza, a paz, o amor e o trabalho nobilitante imperam em toda a sua magnitude, sem mesclas das impurezas e dos vis interesses peculiares ao mundículo em que ora habitamos.

Em trânsito pela Terra
Demetri Abrão Nami

Reformador (FEB)  Fevereiro 1979

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Parnaso Oficial (trecho)


            Desborda da Doutrina; é tal como penso; e já o afirmei por escrito: Espiritismo e Política são incompatíveis, valendo lembrar nesta oportunidade a sábia assertiva de Camilo Castelo Branco, no sentido de que a política, sob a capa da razão, cava, num palmo de terra existente entre dois irmãos, a sepultura de ambos.

            Destarte, na análise que ora faço não sou movido por nenhum objetivo partidário, ideológico ou eleitoreiro. Não me cabe alvitrar, aqui, sequer sobre o programa do Presidente da República. Muito menos comentar as medidas que tem tomado, dispensando-me a oportunidade de considerá-las certas ou erradas. Repito apenas meu ponto de vista sobre um dos aspectos dessa complexa questão; único aspecto, aliás, que um artigo nesta revista - ou em qualquer publicação séria sobre Doutrina Espírita - comporta: ninguém é Chefe de Estado por acaso.

            Alcançar a mais alta magistratura dum Pais é acontecimento que não se regista na carreira de nenhum Espírito encarnado senão com o beneplácito do Alto. É claro que isso não implica endosso permanente a tudo o que um Presidente faça. O caminho à suprema curul é aberto ao emissário e até mesmo alguns problemas lhe são contornados pelos mentores espirituais.

            Mas, depois de coroado, embora continue como qualquer criatura a ser assistido, o Presidente é deixado à sua liberdade e à sua consciência.

            No entanto, como dele dependerão indiretamente milhões de vidas outras, poderá ser afastado se não cumprir sua missão com desvelo. Ouçamos, a propósito, a palavra abalizada do superior Espírito de Emmanuel:

            “A responsabilidade dum cargo público, pelas suas características morais, é sempre mais importante que a concedida por Deus sobre um patrimônio material. Daí a verdade que, na vida espiritual, o depositário do bem público responderá sempre pelas ordens expedidas pela sua autoridade, nas tarefas da Terra” (“O Consolador”, questão 65).

            Veja-se, ainda do próprio Emmanuel, a narrativa do caso de Napoleão, em “A Caminho da Luz”, págs. 175/176 da 5ª edição:

            “O humilde soldado corso, destinado a uma grande tarefa na organização social do século XIX, não soube compreender as finalidades da sua grandiosa missão. Bastaram as vitórias de Arcole e de Rivoli, com a paz de Campo-Fórmio, em 1797, para que a vaidade e a ambição lhe ensombrassem o pensamento”. “Sua fronte de soldado pode ficar laureada, para o mundo, de tradições gloriosas, e verdade é que ele foi um missionário do Alto, embora traído em suas próprias forças”.

            Caberia uma indagação: o afastamento seria decursivo da influenciação do Alto junto aos inimigos do Presidente para que ele - por exemplo - seja deposto? Não. Evidentemente que não. O Alto só é agente do Bem. Dar cobertura a criaturas que, embora às vezes por causas nobres, empregam meios de violência, de atrito, de luta, seria inconcebível da parte dos bons Espíritos, responsáveis pelos destinos dos países. O que o Alto faz é apenas retirar a sua cobertura, deixando o Presidente sem apoio, sem amparo espiritual. Então, os que investem contra ele (e há sempre esses, em qualquer país) acabam levando de vencida seus planos e o Presidente cai, é afastado, é apeado. Por outro lado, enquanto ele estiver cumprindo seu dever com lealdade a Deus e a seu povo, enquanto estiver empenhado em promover o bem-estar social da nação sob seu comando, é claro que permanecerá sempre assistido e não vingarão contra as suas portas as ameaças e as assacadilhas dos que pretenderem derrubá-lo.

            Assinale-se porém, “en passant”, que muita vez os atos e as decisões dum Chefe de Estado são aparentemente errados ou injustos, mas intrinsecamente estão certos. O povo, não raro, desconhece a globalização dos problemas duma nação e julga seus mandatários pelo ângulo apertado da sua visão de indivíduo isolado, dissociado da coletividade, que é, afinal, a que tem de ser visada pelo Governo. E pede então o que, a rigor, não lhe pode ou não lhe deve ser dado. Tal como o faz, igualzinho, em relação a Deus, quando sofre e acha sempre que lhe é injusta ou imerecida a sua dor. Daí a lição do missionário Roustaing:

            “O Senhor não se mantém nunca surdo, bem o sabeis, às vozes de seus filhos, quando se dirigem a ele com confiança e fé. O pai da grande família nem sempre concede as graças como lhe são pedidas, porque, em vez de constituírem um bem, redundariam em confusão para o homem”. “O homem a quem o pai celeste deu bom espírito é aquele que compreende as palavras do Mestre, que se aplica em praticá-las e nunca desespera do seu amor e da sua justiça” (“Os Quatro Evangelhos”, tomo segundo, págs. 58/59 da quarta edição).

            Falei acima em coletividade a ser visada pelo Governo. Não se confunda, por favor, essa alusão, com falsas ideias coletivistas, sonhadas utopicamente pelos que leram Engels e se encantaram por desaviso. “A caridade e a fraternidade não se decretam em leis. Se uma e outra não estiverem no coração, o egoísmo aí sempre imperará” (“O Evangelho segundo o Espiritismo”, capo XXV, nº 8). O bem da coletividade deve ser objetivo de qualquer Governo honesto; mas certamente dentro das coordenadas próprias de cada nação, com suas peculiaridades humanas, suas características psicológicas, seus processos administrativos, sua produção interna, seu progresso técnico e material. Não nos empolguemos com promessas aparentemente vantajosas. “O Socialismo é uma bela expressão de cultura humana, enquanto não resvala para os polos do extremismo”. (“O Consolador”, questão 57). O bem-estar do proletário é necessário e conveniente, importante e impositivo. Mas só ele, quando queira e quando possa (não esqueçamos a implacável lei do carma), deixará de ser - se o for - proletário injustiçado. Depende mais dele do que de qualquer outra criatura, embora essa conceituação tenha de ser entendida não em termos de uma só vida, mas da pluralidade de vidas a que todos estamos sujeitos. Não adianta, pois, alterar as estruturas políticas. O problema é mais amplo e é de sistemas, não de regimes.

            Evolução é conquista individual e inalienável.

            Ninguém pode fazer nada por mim, se eu não quiser ser ajudado, se eu não fizer por onde ser ajudado. Lembremos o Cristo: “Ajuda-te e o Céu te ajudará”. Lembremos também o feliz comentário de Kardec, no capítulo XXVII, número 7, de “O Evangelho segundo o Espiritismo”: “Ele (Deus) assiste os que se ajudam a si mesmos, de conformidade com a máxima:Ajuda-te, que o céu te ajudará”; não assiste, porém, os que tudo esperam dum socorro estranho, sem fazer uso das faculdades que possui. Entretanto, as mais das vezes, o que o homem quer é ser socorrido por milagre, sem despender o mínimo esforço”.

            Falando-se porém em proletariado, complementemos a análise novamente com Emmanuel: “A verdade é que todos os homens são proletários da evolução e nenhum esforço de boa realização na Terra é indigno do espírito encarnado. Cada máquina exige uma direção especial e o mecanismo do mundo requer o infinito de aptidões de conhecimento” (“O Consolador”, questão 57).

            Ademais, quem é capaz de jurar que o homem de maiores recursos não é menos feliz do que o desafortunado? Ah ... quanto Sol não gostaria de ser vagalume...

            Mas, voltemos à noção anterior. Ninguém chega ao primeiro posto dum País, a não ser com o consenso da Espiritualidade. Repitamos: será assistido se se mantiver à altura das suas promessas feitas antes de encarnar; será abandonado se faltar aos seus compromissos...
.....................
trecho de artigo sob o título ‘Parnaso Oficial’
Luciano dos Anjos

Reformador (FEB) Fevereiro 1970

Vibrações



            Entendendo-se o conceito de vibrações, no terreno do espírito, por oscilações ou ondas mentais, importa observar que exteriorizamos constantemente semelhantes energias. Disso decorre a importância das ideias que alimentamos.

            Em muitas fases da experiência terrestre, nós nos desgastamos com as nossas próprias reações intempestivas, ante a conduta alheia, agravando obstáculos ou ensombrando problemas.

            Se nos situássemos, porém, no lugar de quantos nos criem dificuldades, entraríamos em novo câmbio de emoções e pensamentos, frustrando descargas de ódio ou violência, angústia ou crueldade que viessem a ocorrer em nossos distritos de ação.

            Experimenta a química do amor no laboratório do raciocínio.

            Se alguém te fere, coloca-te, de imediato, na condição do agressor e reconhecerás para logo que a compaixão deve envolver aquele que se entregou inadvertidamente ao ataque para sofrer em si mesmo a dor do desequilíbrio.

            Se alguém te injuria, situa-te na posição daquele que te apedreja o caminho e perceberás sem detença que se faz digno de piedade todo aquele que assim procede, ignorando que corta na própria alma, induzindo-se à dor do arrependimento.

            Se te encontras sob o cerco de vibrações conturbadoras, emite de ti mesmo aquelas outras que se mostrem capazes de gerar vida e elevação, otimismo e alegria. Ninguém susta golpes da ofensa com pancadas de revide, tanto quanto ninguém apaga fogo a jorros de querosene.      

            Responde à perturbação com a paz.

            Ante o assalto das trevas, faze luz.

            Se alguém te desfecha vibrações contrárias à tua felicidade, endereça a esse alguém a tua silenciosa mensagem de harmonia e de amor com que lhe desejes felicidade maior.

            Disse-nos o Senhor: “Batei e abrir-se-vos-á.” “Pedi e obtereis”.

            Este mesmo princípio governa o campo das vibrações.

            Insiste no bem e o bem te garantirá.
‘Vibrações’
Emmanuel por Chico Xavier

Reformador (FEB) Fevereiro 1970

A Técnica da Paciência



            A paciência é virtude muito ensinada, mas dificilmente vivida nos momentos em que ela se torna imprescindível.

            Recomenda-se lhe o uso desde tempos imemoriais.

            Dela tratam as religiões, as filosofias e, hodiernamente, a psicologia.

            Evidentemente, para que algo possa ser conscientemente usado é necessário que seja conhecido.

            Já é tempo de aprofundar-se o estudo desse estado emocional produtivo, a fim de que seus benefícios sejam dilatados.

            Ante difícil problema, forte emoção, profunda tristeza ou qualquer frustração, o antídoto recomendado é: - paciência!

            Mas, como encontrar a paciência?

            Deverá ser buscada interiormente ou exteriormente?

            Muitas são as questões que o tema propõe.

            Evidentemente não pretendemos equacioná-los.  Todavia, urge comentá-lo, analisá-lo com maior profundidade.

            Começamos nossa ilação interrogando: paciência encontra-se ou se desenvolve?

            Acreditamos que a paciência é um estado mental positivo que se desenvolve.

            Porém, esse desenvolvimento, em face do próprio processo evolutivo a que o espírito está subordinado, pode ser natural, espontâneo, empírico, por isso mais lento; ou planejado, estudado, preparado e exercido conscientemente, no processo da auto-educação, - consequentemente mais rápido.

            Como o homem, através do estudo e da técnica, pode melhorar o rendimento até do vegetal, o que não alcançará ele se a mesma coisa fizer na estruturação da sua felicidade?

            Portanto ensaiemos em torno da paciência. Absolutamente não pode ela ser confundida com o desanimo, a inércia, o desinteresse, a acomodação ou outros estados emocionais que, exteriormente indicam certa tranquilidade por parte daquele que enfrenta exacerbada dificuldade.

            Não é paciente aquele que ignora propositadamente o problema.

            Exige uma atitude positiva, verdadeira e realista ante o fato, ato, sentimento ou emoção frustrante.

            É preciso conhecer o problema, suas causas e efeitos. Delimitá-lo em seu real território. Consequentemente, a paciência é a conscientização que, clarificando o obscuro e aterrador, proporciona visão clara e posição íntima, serena, para a movimentação de forças solucionadoras.

            Ela pode ser: ativa ou passiva.

            Ativa quando, para a solução do problema, ela determina comportamento e atitudes atuantes na remoção do obstáculo, de forma enérgica, persistente e confiante.

            Passiva, quando a omissão e a inércia se impõem a fim de que o comportamento e a atitude ante o fato obstruidor não seja irracional, infringindo os princípios equilibrantes da Lei Divina.

            Diante dessas duas formas de dispor da energia mental é que reside a importância de “como” ser paciente. Nessa aplicação torna-se necessário profundo estudo para conhecer: se houve liberação de forças instintivas, oriundas da animalidade irracional, ou forças superiores conscientemente aplicadas para o engrandecimento do homem.

            Outro aspecto que merece analisado é a reação interiormente sentida, sob a forma de irritação, revolta, despeito, cólera e, até mesmo, ódio ante o evento desagradável.

            Isto porque, às vezes, a causa do desajustamento não está no exterior; fato, acontecimento ou pessoa, mas em raízes neuróticas que a personalidade traz em si. Então, essa causa faz explodir, na personalidade, as reações improdutivas, egoísticas e destruidoras.

            Por isso, é necessário que, ante o problema, a reação por ele produzida seja “facionalmente” compreendida (se tem um sentido construtivo ou destrutivo).

            O que jamais ocorre é a paciência constituir-se em emoção imponderável. Ela é um feixe de energias mentais positivas e atuantes. _

            Concluímos que a paciência é uma posição mental construtiva, a ser conquistada. Para tal, caminharemos ganhando terreno aos poucos, pois, como verdadeira técnica, exige esforço, persistência e prática.

            Não é conquistável de uma vez, nem por um “golpe de força de vontade”.

            Até sua conquista definitiva e exercício natural, conforme a situação, ela será exercida ou não de modo perfeito ou imperfeito.

            O que importa é seu conhecimento e aplicação pois a paciência constitui condição para a saúde mental e processo de desenvolvimento espiritual.  

A técnica da paciência
Airton Paiva

Reformador (FEB) Fevereiro 1970

Instruir divertindo



A preparação da criança para a assimilação da Doutrina Espírita é tarefa muito delicada, a ser conduzida com tato excepcional, considerando-se a idade dos pequeninos irmãos sob a atenção dos adultos. Parece-nos óbvio que semelhante trabalho deve estar sempre entregue a pessoas do sexo feminino, principalmente àquelas que possuem algum tirocínio pedagógico. Não é aconselhável, pois, deixar as criancinhas ao arbítrio de qualquer adulto de boa vontade, que é importante, mas não basta. Sem os requisitos imprescindíveis à compreensão da mentalidade infantil; sem a habilidade de compreender a sutileza de certas indagações, que não devem ser deixadas sem resposta esclarecedora; sem sentir bem o temperamento dos pequenos, suas tendências, preferências e idiossincrasias, não será possível vencer o labirinto em que tudo isso se constitui e alcançar o objetivo desejado.

            Uma organização espírita tem o dever de procurar dirigir inteligentemente a atenção das crianças para o nosso programa doutrinário, devidamente dosado, com textos curtos, explícitos, de rigorosa feição pedagógica, suscetíveis de despertar e sustentar o interesse dos pequenos frequentadores de aulas de evangelho e moral cristã-espírita, por meio de recursos áudio visuais. As aulas não devem ser demoradas. É bom andar devagar, nesses casos, para se andar depressa. Exigir-se a atenção prolongada da criança é antipedagógico. Compreende-se que a criança possui muita volubilidade, porque sua vontade se dispersa, porque ainda não tem um discernimento definido das coisas que vê, ouve e sente, conforme a sua variável capacidade perceptiva.

            A mestra deve descer à mentalidade do aluno e atender integralmente à sua curiosidade, sem esquecer nenhum pormenor, de maneira que a criança se mostre realmente satisfeita. Sua curiosidade deve ser tomada sempre como demonstração de interesse pelo assunto em estudo. Ensinamentos e explicações leves, simples e ilustrados, sempre que possível, com desenhos e imagens, em ambiente informal, alegre, para que a criança fique à vontade, desejosa de participar das aulinhas, avivará sua disposição de continuar. A criança vive num mundo muito diferente do mundo dos adultos, no qual a realidade se mistura com a fantasia. Eis uma situação a considerar. Se ela se mostrar, por qualquer motivo, enfastiada ou indisposta, será preferível deixar que se retire a forçá-la a permanecer na aula.

            A formação de ligeiros diálogos, ligeiros e simples, animados com "sketchs" engraçados, em que entrem bichinhos domésticos, à maneira dos de Walt Disney, com a dupla finalidade de divertir, instruindo, de educar, divertindo. Historietas chistosas, fábulas com fundo doutrinário, com as quais se desperte o interesse da criança para exemplos de moral, em relação, não apenas aos animais e às plantas, mas também relacionados com outras crianças, com os pais, os velhos, os adultos em geral, concorrerão para manter a aula num clima propício ao melhor aproveitamento. Pequenas canções alegres, em ritmo adequado, levarão os pequeninos ao fim que se tiver em mira, uma vez que se atenda com especial cuidado a certas exigências psicológicas. A criança deve ter, em determinados casos, a impressão de que age por si mesma, embora esteja sendo dirigida num dado sentido.

            As aulas devem ser constituídas de poucos alunos, divididas conforme a idade mental de cada grupo. O processo de ensino, evidentemente, deve variar de alguma forma, de grupo para grupo. Certas perguntas devem ser formuladas com extrema cautela; outras, devem ser evitadas até que a criança haja adquirido conhecimentos que a permitam compreender as perguntas, sempre relacionadas com os temas já estudados. Perguntar a uma criança quem é e o que é Deus, o que é Espírito, o que é Encarnação ou Desencarnação, etc., antes do tempo conveniente, seria dificultar-lhe a compreensão natural que a resposta deve demonstrar. Em outras ocasiões, a mestra deve recorrer a metáforas, através de linguagem figurada, de comparações simples, de exemplos baseados na vida doméstica, enxertando os ensinos com esclarecimentos doutrinários e evangélicos.

            Vê-se que o critério pedagógico é muito importante. A instrução espírita deve ser ministrada lenta e persistentemente. Não há criança que não goste de ouvir histórias de cachorrinhos, gatinhos, ursinhos, passarinhos, etc. Desde que recorramos ao processo de ideias afins, de adaptações explicativas, embora muito elementares, que possam ser encontradas na ambiência do lar, a criança será a primeira a querer frequentar a escolinha, onde irá preparar seu coração para a bondade e o amor necessários à sua vida futura, tendo Jesus como exemplo primordial.

            Se há uma seara difícil de ser conduzida, é essa, da infância. Entretanto, é a mais importante, razão pela qual justifica todos os sacrifícios, todos os recursos da inteligência, da paciência, da dedicação, da ternura e do amor dos adultos. Aliás, o nobilíssimo Espírito Emmanuel adverte, numa de suas extraordinárias mensagens do Além - "Pontos perigosos para os pais", que não devemos pedir à criança trabalho e cooperação fora de suas naturais possibilidades. E outro admirável Espírito - André Luiz, no mesmo livro, lembra que "cada aluno recebe lições conforme o entendimento que evidencia".
Instruir Divertindo
Percival Antunes / Indalício Mendes

Reformador (FEB) Fevereiro 1970

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Cartazes do Caminho



“Passar por lama não é
Fracasso de alma vencida;
Fracasso é fazer da lama
A razão da própria vida.”


Cartazes do Caminho (Trovas)
José de Castro por Chico Xavier

Reformador (FEB) Abril 1973

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Kardec. Na carne e fora dela.


              "Devido às minhas relações, naturalmente possuo a respeito (história do Espiritismo) os documentos mais numerosos e autênticos que existem, pois pude acompanhar a doutrina em todo o seu desenvolvimento, observar-lhe as peripécias todas, como prever lhe as consequências. Para o homem que estuda esse movimento, a evidencia final é que o Espiritismo marcará uma fase da humanidade. É, pois, necessário que, de futuro, se saiba das vicissitudes que teve de atravessar, os obstáculos encontrados, quais os inimigos que tentaram inutilizá-lo, de que armas se serviram para o combater. Importa também saber por que meios pode triunfar, e quais as pessoas que, por seu zelo, devotamento e abnegação, terão eficazmente contribuído para a sua propagação. Aqueles cujos nomes e atos merecerem ser assinalados para o reconhecimento da posteridade - é um dever que me impus - terão seus nomes inscritos nas minhas fichas" (‘Revue Spirite’, junho, 1862, pp. 182/3 - "Voilà comment on écrit l'histoire!'')  Allan Kardec  


História do Espiritismo
(O pensamento de Kardec em 1862 e, já desencarnado, em 1869)
Reformador (FEB) Fevereiro 1976

                                                                       *

            "Quando eu me achava corporalmente entre vós, disse muitas vezes que havia de fazer aí uma história do Espiritismo que não seria destituída de interesse. É este, ainda agora, o meu parecer e os elementos que eu reunira para esse fim poderão servir um dia à realização da minha ideia. É que eu, com efeito, me encontrava mais bem colocado do que qualquer outro para apreciar o curioso espetáculo que a descoberta e a vulgarização de uma grande verdade provocara" (Revue Spirite, dezembro 1869, pp. 358/60; "Obras Póstumas" - Os desertores -, pp. 254/6, 15ª Edição, FEB, 1975).  Allan Kardec, Espírito




Mensagem de Kardec
Médium mecânico: Fernando de Lacerda
Mensagem recebida em 6 de maio de 1907,
conforme obra "Do Pais da Luz", Volume 2,
publicada no Reformador (FEB) em Março de 1945

            Companheiro. É incontroverso que depois que da Terra saí, alguma coisa aprendi mais do o que nela sabia. Este novo pecúlio de saber seria talvez proveitoso à refundição da minha obra aí.

            Tenho refletido muito nisso, por vezes. Sempre que encontro na Terra um médium bom, crio desejos de fazê-lo - e, agora, que tenho assistido o desabrochar das tuas faculdades, mais uma vez pensei, com interesse, na possibilidade de fazer esse trabalho de melhoramento, de aperfeiçoamento.

            Penso, porém, ao mesmo tempo, que me devo contentar com o que deixei feito.

Assim como é, tem servido bem para o fim a que a destinaram os Espíritos que a ela presidiam, e os que se me seguirem aí, que busquem, no campo especulativo, o que por mal meu e dela lhe possa faltar ainda.

            No campo experimental, ilustres e prestantíssimos sábios se lhe tem avantajado em muito.

            A parte experimental é, porém, efêmera. Boa para a conquista, não tem, todavia, qualidades de estabilidade e de conservação. Como fenômeno experimentado, entra na ordem das coisas concretas, e para estas coisas, o aperfeiçoamento é mais sensível, porque a natureza delas é mais precária.

            Uma obra experimental de grande atualidade e verdade hoje, daqui a dez anos será velha, se a não acompanhar, como parte integrante e auxiliar, a feição abstrata e ideal.

            Os meus livros, no que têm de prático, sob o ponto de vista experimental, estão antiquados e suplantados, de há muito, por dezenas de outras obras de mais incontestado e incontestável valor, daquela ordem de estudos. O que, porém, neles existe da parte moral e de ensinamento, ainda não foi nem será facilmente sobrepujado. É que, neste campo, eles estão com a verdade e a verdade, apresentada sob que aspecto for,  é sempre a verdade. É tão nova hoje, como no tempo de Cristo, como no tempo dos profetas, como em qualquer tempo.

            Como disse Littré na sua comunicação: -Sobre Filosofia, o homem está hoje tão adiantado como há milhares de anos.

            Ora, a Filosofia é a verdade espiritual na Terra. Sendo assim, para que hei de mexer na minha obra?

            O que tem de bom, há de ser bom para sempre. O que não é bom já está destruído pelo tempo e substituído vantajosamente por todos os trabalhos dos que, com mais valor, me sucederam.

            Se, porém, eu reconhecer necessidade e oportunidade para dizer alguma coisa de novo e de útil, o farei; assim como, terei sempre grandíssimo prazer em te responder sobre qualquer assunto, ou sobre qualquer detalhe, em que me dês a satisfação de me consultares. Digo-te isto despretensiosamente. Não me ofereço. Conselhos não se oferecem. Ponho-me à tua disposição para te utilizares de meu préstimo e da minha experiência, se nisso vires alguma vantagem; mas não me magoarei se me utilizares.

            E que Deus te ilumine sempre a estrada a percorreres.   Allan Kardec




Saudação de Allan Kardec
página psicografada pelo médium Júlio Cesar Grandi Ribeiro,
na noite de 2-1-1984, na FEB, em Brasília, DF, por ocasião
da solenidade comemorativa do I Centenário da Casa-Máter
do Espiritismo no Brasil e transferência de
sua Sede Central para Brasília.)
Reformador (FEB) Março de 1984

Espíritas brasileiros.

            Eis que vos trago o amplexo de permanente estima e sincero louvor!

            Estima que mais se amplia no convívio abençoado dos serviços no Bem em nome do Senhor e Mestre. Louvor ante a grandiosa obra que empreendeis em nome da Caridade!

            Contudo não vos apresento, na solenidade de profundo significado espiritual para tantos corações, senão o estandarte das vitórias parciais até aqui alcançadas, o qual empunharemos com dignidade e respeito, consciência e bom ânimo, prosseguindo disciplinados em nosso desiderato, rumo ao futuro de sublimadas metas.
           
            Certo, rugem ainda sobre vossas cabeças as línguas de fogo que vos experimentarão nos testemunhos indispensáveis.

            A palavra de ordem imperiosa e divina ainda e sempre é AMOR!

            E a recomendação inolvidável para as defensoras do movimento regenerador das almas é INSTRUÇÃO!

            Amor que reúne e unifica corações em torno da obra grandiosa que é a evangelização do Homem.

            Instrução que identifica interesses comuns nos mesmos ideais, frutificação do estudo nobilitante que sempre defenderá os sagrados patrimônios da VERDADE!

            Eis que os legítimos, leais e prestimosos servidores da Seara estão a postos em seus misteres esquivando-se à estagnação das rivalidades improdutivas e fugindo às discórdias vexatórias, quão danosas, fulcro de sombras.

            Os méritos dos operários fiéis ao Senhor estão arrolados no acervo das responsabilidades que os situam na incansável batalha pela regeneração da Humanidade.

            Apressam-se os tempos...

            Cumprir-se-ão todas as afirmativas proféticas!

            O homem de bem herdará a Terra!

            Nada de novo poderei acrescentar aqui ao que já vos tem sido amplamente enfatizado pelos arautos da grandiloquente revelação. A Codificação Espírita ainda se vê essencialmente desconhecida de tantos corações que se rotulam de espiritistas, conquanto o movimento regenerador de almas permaneça lucidamente de pé em terras brasileiras.

            Saúdo-vos, portanto, espiritistas irmãos, deste bendito Cenáculo da Federação Espírita Brasileira, almejando-vos, junto ao Mestre e Senhor, permanentes e infatigáveis esforços pela evolução espiritual e pelo avanço evolutivo do próprio orbe onde vos domiciliais na incomensurável Casa do Pai.

            Aqui compareço tão somente na condição de um servidor a mais na causa do Bem.


            Deixando-vos a cordialidade do meu apreço, saúdo-vos uma vez mais respeitoso e gratificado.      Allan Kardec



domingo, 13 de setembro de 2015

Jovens e Adultos



             No momento atual do mundo, quando se repetem por todos os recantos os impositivos de revisão do tratamento em favor da juventude, é razoável se aplique o mesmo critério para a madureza.

            Nem conceituação de irresponsabilidade para os jovens.

            Nem alegação de inutilidade para os adultos.

            Em se corporificando na Terra, o Espírito inicia uma viagem que vale por estágio educativo; e, num estágio educativo, todas as fases são importantes.

            Ninguém conquista certificado de competência numa faculdade de ensino superior, sem haver passado nas letras primárias, e ninguém consegue caminho seguro em semelhante iniciação sem apoio naqueles que amadureceram na escola da experiência.

*

            Os jovens pedem a liberdade de crer em sua própria capacidade de realização.

            Os adultos devem acreditar em sua capacidade própria de valorizar e aperfeiçoar as realizações da vida.

            Na esfera do acatamento reciproco, os jovens podem criar campanhas de ação construtiva e os adultos precisam estabelecer campanhas contra a inação destrutiva, na qual muitos deles se põem a esperar improdutivamente a morte do corpo físico, qual se houvessem perdido a possibilidade e a obrigação de trabalhar.

            Os jovens podem improvisar a formação de novos padrões para a existência e os adultos são naturalmente chamados a selecioná-los para que se conservem os que se mostrem bons, - tudo isso nas bases do respeito mútuo.

*


            Não vemos qualquer conflito mais grave agora que noutras épocas, entre os mais moços e os menos moços.

            O que existe é o anseio da juventude no sentido de se edificar segundo a sua própria vocação, tanto quanto anotamos na madureza a necessidade de aproveitar, com mais segurança e com espírito mais amplo de reconhecimento a Deus, os benefícios que a Providência Divina lhe propicia, através da ciência humana, a fim de proteger o veículo físico e salvaguardar a alegria de viver, com vistas à permanência, tanto quanto possível, mais longa e mais útil nos quadros de serviço terrestre.

            Concluindo, reconhecemos que tão livre e robusta é a mocidade para zelar, disciplinadamente, pelos seus próprios interesses, quanto robusta e livre é a madureza para defender a sua própria felicidade, pela aceitação da lei do trabalho que nos cabe a todos, em qualquer lugar, tempo, circunstância e condição, desde que se mostre agindo ponderadamente.

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            E, com relação a jovens e adultos que se transviam, desertando dos compromissos que assumem ou caindo no desrespeito à própria consciência, isso é outro problema, que não interfere com os nossos estudos, em torno da evolução.

Jovens e Adultos
Emmanuel por Chico Xavier

Brasil Espírita / Reformador (FEB), Agosto 1971

Práticas Exorcistas


 - As fórmulas de exorcismo tem 
qualquer eficácia sobre os maus Espíritos?
- Não. Estes últimos riem e se obstinam, 
quando veem alguém tomar isso a sério.

(Questão nº 477 de “O Livro dos Espíritos" )

            A história é antiga e o Evangelho a registra. Nos Atos dos Apóstolos (capítulo XIX), vamos encontrar aqueles judeus que pretendiam imitar Paulo de Tarso, repetindo os feitos extraordinários que decorriam do notável magnetismo e da excepcional estatura moral do apóstolo dos gentios. Conta-se que Sceva, reunido com seus sete filhos, realizou uma prática espírita. Certo Espírito imperfeito, entretanto, manifestando-se através de um dos jovens, tornou-se furioso, agredindo a todos e deixando-os nus e feridos. Em determinado momento, como que para caracterizar que o judeu não dispunha de condição evolutiva para lhe dirigir palavras de correção, o Espírito falou com clareza:

            - Eu conheço Jesus e sei quem é Paulo de Tarso. E vós, quem sois?

            Para facilitar o raciocínio, procuremos em Cândido de Figueiredo definição para a palavra “exorcismo”: “Oração ou cerimônia religiosa para livrar alguém dos Espíritos maus”.

            Ora, a Doutrina Espírita nos ensina que as obsessões, não raro, derivam de mediunidade contrariada ou viciosa, e que, quando essa mediunidade se disciplina e se torna proveitosa no sentido do bem, baseando-se no estudo e amparando-se na renovação moral, passa a ser útil, favorecendo o contato com os Espíritos do Senhor e distanciando os brincalhões e irresponsáveis do Mundo Espiritual.

            Quando apelamos para o exorcismo, com invocações impróprias, sempre ocorrem fatos desagradáveis, conduzindo-nos tais práticas a indesejáveis amizades espirituais, que, no futuro, virão a nos proporcionar “dores de cabeça”...

            O Espiritismo dispensa a superstição e movimenta-se da boca para dentro, vivendo pela força do coração. É doutrina sem dogmas, sem liturgia, sem símbolos e sem sacerdócio organizado. Não adota vestes especiais, não usa incensos, não emprega altares ou imagens, não atende a interesses mundanos, não admite qualquer tipo de pagamento, não prescreve talismãs ou amuletos, não concede indulgências, não confecciona horóscopos, não admite quaisquer atos materiais oriundos das velhas e primitivas concepções religiosas. Andaram certos os Reveladores dizendo a Kardec que os Espíritos imperfeitos acham graça da nossa infantilidade, quando apelamos para as fórmulas exorcistas, pretendendo libertar-nos de problemas decorrentes das nossas próprias afinidades espirituais.

            A fórmula exata, aquela que o Codificador recomenda, é a da renovação moral, do aperfeiçoar dos sentimentos e do acréscimo de conhecimentos espirituais. A assistência do Alto, então, se firmará conosco; as práticas exorcistas se tornarão inúteis; desaparecerão as angústias e as dores, enquanto as alegrias do Amor e as esperanças na vitória do Bem passarão a constituir a tônica de nossa vida.

            Na antiguidade, com efeito, empregavam-se estranhas cerimônias para enfrentar os maus Espíritos, mas, nos dias atuais, em razão dos ensinos espíritas, tal combate necessita se processar em outras bases, recorrendo-se à renovação moral e ao exercício do bem.

            Práticas exorcistas
Arthur da Silva Araújo

Brasil Espírita / Reformador (FEB) Agosto 1971

Massificar a Doutrina


             A  Doutrina espírita é intimista.

            Ela se dirige a cada criatura, em particular, revolvendo o mais íntimo de seus sentimentos, fazendo germinar as sementes do homem-espiritual que dormem em cada coração.

            Todas as características da ação espírita, no campo de sua expansão - já temos repetido -, escapam aos padrões religiosos a que nos viciamos, no curso de milênios.

            Fala-nos de hierarquia, mas noutro conceito.

            Aqui, ninguém é diretor de alma alheia.

            Cada um toma a sua própria rédea e dirige a si mesmo.

            Kardec não criou um tipo ideal de homem-moral.

            Apontou Jesus por modelo, destacando, ao longo de sua obra, que, dentro de nossa relatividade evolutiva, marcharemos gradativamente para o centro desse fulcro radiante e de atração magnética irresistível, porque seu pensamento nos envolve a todos.

            Evoluímos sem saltos, superando deficiências.

            A conquista de nosso mundo interior, com o despertar das qualidades inatas
através da prática do amor ao próximo, é a maneira segura, natural, de nos definirmos como indivíduos diante da Vida.

            Não somos conclamados a anular-nos.

            A conscientização espiritual é o objetivo.

            Sublimar a personalidade, sem empaná-la, o propósito.

            Toda e qualquer tentativa de massificar a Doutrina, colocando-se alguém na
posição de condutor e os demais na de adeptos passivos, amorfos, redundará em clamoroso fracasso, desiludindo-se os que buscarem inspirar-se na técnica de massas de correntes religiosas diversas.

            Dois fatores determinam essa frustração maravilhosa:

            1 - por querer, o massificador, colocar-se por cima das demais criaturas, reencenando um poder sacerdotal e de liderança que reaparece com outras roupagens, mas que, fundamentalmente, nasce do mesmo ímpeto de querer gerir vidas alheias pelas ideias que se alastram em seu coração;

            2 - pelo conflito que se abre contra o gênio da Doutrina Espírita, cujas induções são libertadoras e fraternalistas, num rompimento ostensivo com as carcomidas fórmulas da tradicional hierarquia sacerdotal.

            Na massificação, os Espíritos omitem-se.

            Eles se negam a colaborar na realização de um programa que repelem pela base. Mesmo que argumentássemos sobre a urgência ou a tendência da massificação doutrinária, pela explosão numérica de prosélitos, a nossa ação não deixaria de ser de caráter salvacionista. Apenas estaríamos inscrevendo mais uma forma de salvação de almas, à semelhança das existentes noutras províncias de fé: umas salvam pelos dogmas, outras pela crença e, na área espírita, poderíamos querer conduzir por um simulacro de raciocínio.

            Atualmente se cogita muito de massificação.

            Segundo os que lhe esposam os princípios, o nível de cultura tende a baixar na mesma proporção em que se amplia o número de educandos.

            É um barateamento de cultura.

            Um pouco para muitos e não muito para poucos.

            Na contingência atual, não poderemos vencer, no campo da instrução não-doutrinária, esse nivelamento circunstancial. Há de convir-se, contudo, que essa contingência é circunstancial e não o ideal, o ponto de chegada.

            A deformação da instrução, sob pressão da tecnologia, quando o homem está sendo examinado como um elemento do Estado, desconsiderado em seu valor individual, não pode ser transferida para a Doutrina. Nesta há uma valorização efetiva do homem como indivíduo, como mundo definido em si mesmo, dentro dos princípios gerais de intimidade que Jesus enunciou com justeza no: "O Reino de Deus está dentro de vós".

            Cada um somos um mundo.

            O princípio de massificação, para apropriar o homem a determinados padrões de reação e conduta, é artificioso. Cada um há de crescer individualmente e individualmente há de definir-se como co-herdeiro da criação divina.

            Agir em contrário é chocar-se contra a Lei Natural.

            O respeito ao degrau evolutivo, ao modo de enfocar a parcela da verdade pelo poliedro da visão pessoal, tem sido a tônica predominante nos Espíritos elevados que se comunicam conosco, desde Kardec. Se popularizam noções maiores, não o fazem no sentido de encantar, agregar  cegamente, impor suas soluções aos nossos problemas.

            É bem verdade que eles, por vezes, nos criam apreensões, com vistas ao aceleramento da difusão dos princípios doutrinários. É verdade que a questão de entender tais impactos, reservando as entrelinhas para nossas opções, poderá esmagar nossa alma com temores.

            É que eles objetivam o indivíduo.

            O reerguimento de alma por alma, com conhecimento claro e respeito profundo ao que cada uma sente e pensa, é tão importante para os lídimos Mentores Espirituais, e contraria tanto a nossa ânsia de predomínio ou de imposição de soluções padronizadas, que só podemos atribuir a essa queda de nosso padrão de preferências a origem do receio e da apreensão que nos dominam.

            Classificamos de corajosa a manifestação de Emmanuel.

            Quando, em janeiro, se reuniu o Conselho Federativo Nacional da FEB, em Brasília, no encerramento, através do médium Francisco Cândido Xavier, esse Espírito asseverou: "Faze-nos observar, por misericórdia, que Deus não nos cria pelo sistema de produção em massa e que por isto mesmo cada qual de nós enxerga a vida e os processos da evolução de maneira diferente. Ainda assim, induze-nos a registrar que, embora às nossas disparidades de interpretação diante dos fenômenos que nos cercam, todos podemos e devemos ser cada vez mais irmãos uns dos outros nas áreas de vivência e solidariedade, ação e tolerância."

            Isso define o intimismo espírita.

            Se ajustar-nos a tal conceito (que não é inovação de Emmanuel, mas uma síntese da própria Codificação), concluiremos que é de renunciar ao desejo de padronização de conduta, de nivelação de conhecimentos, da invasão do domicílio psíquico de nosso companheiro, para impor-lhe a nossa visão da verdade, e de reconhecer que, se a Doutrina Espírita tivesse vindo para criar uma nova casta sacerdotal, com criaturas autorizadas à massificação dos demais irmãos de caminhada, não valeria emprestar-lhe colaboração porque, a breve tempo, seria mais um covil de raposas.

            Espiritismo é valorização do homem.

            É um diálogo do mundo maior com Você, conosco, com cada um de nós em particular, porque somos filhos do Pai e não simples conglomerado informe e inconsciente a entregar, de novo, as rédeas de nosso destino a tutores de nossa evolução.

Massificar a Doutrina
Roque Jacintho

Reformador (FEB) Abril 1973