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quarta-feira, 31 de outubro de 2018

A Vida no Mundo dos Espiritos



A Vida no Mundo dos Espíritos
Octávio Caúmo Serrano
in ‘Trovas da Codificação ‘
(Ed. ‘Sal da Terra’ – 1ª Ed 1998)

Em muitos mundos nascemos
Nesta transitoriedade,
Neles nos demoraremos
Buscando a maioridade.

Unem-se os desencarnados
Como nos juntamos nós,
Em grupos organizados,
Pra viver contras e prós.

Dependendo do que gostam,
Assim serão suas conversas.
Em muitas coisas apostam,
Cada um nas mais diversas.

O Espírito adiantado
Só fala de coisa séria.
Mas o inferior, coitado,
Se perde em qualquer matéria.

Quando a gente vai voltar
E decide o que vai ser,
Todos vêm nos ajudar
A escolher como fazer.

Quem foi um rico avarento,
Melhor que renasça pobre,
Porque com o sofrimento
Irá regressar mais nobre.

Se pobre do que não ama,
Volta pobre, em meio ao povo.
Porque aquele que reclama
Repete tudo de novo.

Quem valoriza a vida,
Seja pobre ou seja rico,
Ganha degraus na subida
E chega depressa ao pico.

Quando chegam os feriados
Que homenageiam os mortos,
Dias chamados Finados,
Só se chora pelos corpos.

Pobre daquele imortal
Que ficasse enclausurado,
Como se fora um mortal
Dentro da cova enterrado.

Nós vamos ao cemitério
Levar vela, levar flor,
Mas declaro, sem mistério,
Ele precisa é de amor.

Amor que nasce da alma,
Que brota no coração,
Que lhe infunde grande calma
E alumia a escuridão.     


sábado, 27 de outubro de 2018

Justiça Social



Justiça Social
A Redação 
Reformador (FEB) Junho 1991

              
            Desde a Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra nos meados do século XVIII, a questão social passou a preocupar os espíritos sensíveis à sorte dos menos favorecidos economicamente, em face do desequilíbrio crescente entre a acumulação de capital, de um lado, e a proletarização do trabalho, de outro.
            Enquanto o liberalismo econômico firma-se como doutrina dominante, a ele se contrapõem as correntes socialistas, que buscam a justiça social por caminhos diferentes: o socialismo espiritualista tenta soluções através da cooperação do capital e do trabalho, ao passo que o socialismo marxista propugna pela destruição do capitalismo mediante a luta de classes.
            O ano de 1848 é um marco histórico. Surgem novas abordagens da questão social a partir das revoluções operárias na França e na Alemanha. O socialismo de Proudhon, em luta aberta com a filosofia individualista, propões a mutualismo como forma ideal de organização econômica. Karl Marx e Friedrich Engels publicam, em fevereiro desse mesmo ano, o seu Manifesto Comunista. E, em 31 de março, eclodem os fenômenos mediúnicos de Hydesville (EUA), com os quais se inicia uma outra revolução: a Revolução Espiritual.
            É nesse ambiente que o Codificador do Espiritismo cumpre a sua missão perante as correntes de pensamento em conflito.
            Questões sobre trabalho, crescimento demográfico, uso e gozo dos bens terrenos, desigualdades sociais e das riquezas, direito de propriedade, justiça, amor e caridade, e tantas outras mais, de cunho eminentemente social, são abordadas pela Doutrina Espírita objetivando o homem como Espírito Imortal, regido pelo livre-arbítrio e pela lei de causa e efeito, com responsabilidades e culpas adquiridas no passado, em vidas sucessivas, através da reencarnação.
            “A Doutrina Espírita, que tem visão global dos problemas sociais, não apresenta a menor tendência extremista.”[1]
            A justiça social, que sensibilizou o Papa Leão XIII no final do século XIX, levando-o a editar a “Rerum Novarum”, em 15 de maio de 1891, como resposta e crítica da Igreja aos excessos do liberalismo econômico e ao comunismo, já estava equacionada desde 18 de abril de 1857, 34 anos antes daquela Encíclica Papal, em “O Livro dos Espíritos”, que representa o Manifesto da Espiritualidade encaminhando a solução dos problemas do homem e da sociedade, entre os quais os de ordem econômica.
                “A nova geração marchará, pois, para a realização de todas as idéias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver chegado. Avançando para o mesmo alvo e realizando seus objetivos, o Espiritismo se encontrará com ela no mesmo terreno. Aos homens progressistas se deparará nas idéias espíritas poderosa alavanca e o Espiritismo achará, nos novos homens, espíritos inteiramente dispostos a acolhê-lo.”[2]

[1]  Deolindo Amorim - “O Espiritismo e os Problemas Humanos”, pág. 170, edição da Gráfica Mundo Espírita S.A., Rio de Janeiro (RJ), 1948.
[2] Allan Kardec - “A Gênese, págs. 416/417 da 33ª Ed. FEB


sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Fala Roustaing



Fala Roustaing:
Reformador (FEB) Fevereiro 1944

            "Li o "Livro dos Espíritos". Nas páginas desse volume encontrei: uma moral pura, uma doutrina racional, de harmonia com o espírito e progresso dos tempos modernos, consoladora para a razão humana; a explicação lógica e transcendente da lei divina ou natural, das leis de adoração, de trabalho, de reprodução, de destruição, de sociedade, de progresso, de igualdade, de liberdade, de justiça, de amor e de caridade, do aperfeiçoamento moral, dos sofrimentos e gozos futuros.

            Em seguida, deparei com explicações judiciosas acerca da alma no estado de encarnação e no de liberdade; do fenômeno da morte, da individualidade e das condições de individualidade da alma após a morte; do que se chamou anjo e demônio; dos caminhos e meios, dos agentes secretos ou ostensivos de que se serve Deus para o funcionamento, o desenvolvimento, o progresso físico dos mundos; do progresso e desenvolvimento físico, moral e intelectual de todas as suas criaturas.  

            Encontrei ainda a explicação racional da pluralidade dos mundos, da lei do renascimento presidindo, pelo progresso incessante não só da matéria como da inteligência, à vida e à harmonia universais, no infinito e na eternidade.

            Compreendi mais do que nunca, diante da pluralidade dos mundos e das humanidades, assim como de suas hierarquias; da pluralidade das existências e da respectiva hierarquia, que os homens, no nosso planeta, são de uma inferioridade moral notória; de uma inferioridade intelectual acentuada relativamente às leis a que estão sujeitos na Terra os diversos reinos da Natureza e às leis naturais a que obedecem os mundos e as humanidades superiores, por meio das quais aquelas leis se conjugam na unidade e na solidariedade.  

            Sim, essa ignorância é imensa, quanto aos meios de apropriação das leis de um planeta superior a um planeta inferior, quando um messias, enviado por Deus em alta missão, toma um corpo de conformidade com a sua natureza espiritual e relativamente harmônico com uma esfera inferior, qual a Terra, para aí se manifestar entre os homens, para lhes traçar as diretrizes da regeneração humana, para lhes trazer a luz e a verdade veladas e destinadas a serem descobertas progressivamente, conforme aos tempos e às exigências de cada época.

            Compreendi a necessidade das revelações progressivas, vindo sucessivamente levantar, pouco a pouco, o véu e patentear aos olhos dos homens, de modo a iluminá-los sem os deslumbrar, a luz que os tem de guiar nas suas indagações e ajudar a progredir na trilha da verdade.

            Li em seguida o "Livro dos Médiuns", e nele se me deparou uma explicação racional: da possibilidade das comunicações do mundo corpóreo com o mundo espiritual; das vias e meios próprios para essas comunicações; das aptidões e faculdades mediúnicas no homem; da mediunidade e das condições de moralidade e de experiência para seu exercício útil e proveitoso nas relações do mundo visível com o mundo invisível, sempre e exclusivamente com o objetivo da prece, da caridade de além túmulo, do ensinamento moral, da instrução que os bons Espíritos, na era nova que começa, têm a missão de dar e que é invariavelmente proporcionada e adequada ao desenvolvimento intelectual e moral do homem. Achei, enfim, a explicação racional das vantagens e inconvenientes da mediunidade, dos escolhos e perigos a evitar e dos caminhos a seguir para praticá-la."

(Trecho extraído do prefácio da monumental obra de Roustaing).

O Corpo Fluídico na Bíblia



O Corpo Fluídico na Bíblia
I. Pequeno (Antônio Wantuil)
Reformador (FEB) Março 1944
                                 
            Quando Esdras foi autorizado pela Sinagoga Magna a rever e compilar os Livros Sagrados, os Hebreus não tinham, no seu Catálogo, o livro de Tobias, escrito em caldaico pelo próprio Tobias e por seu filho.

            Atualmente, não existe qualquer exemplar nessa língua, tanto assim que a versão latina, de S; Jerônimo, foi feita da versão grega, da qual se diferencia em alguns pontos de pequena importância.

            As edições populares da Bíblia, distribuídas pelos Protestantes, não incluem o Livro de Tobias, que, no entanto, faz parte das edições católicas, e mereceu aprovação dos teólogos e dos Concílios.

            Nesse Livro, encontraremos o anjo Rafael, que sob a forma humana viveu vários meses entre os familiares de Tobias, com o nome de Azarias (socorro de Deus).

            Depois de cumprida a missão, Azarias, confessando ser ele o anjo Rafael, desapareceu de diante deles, que não mais o viram.

            Antes, porém, de efetuar a desmaterialização dos fluidos com que formara o seu corpo, disse-lhes:

            "A vós parecia-vos que eu comia e bebia convosco, mas eu me sustento de manjar invisível e de bebida que não pode ser vista pelos homens. É pois tempo que eu volte para Aquele que me enviou.”

            Como vemos, Rafael formou o seu corpo fluídico, viveu alguns meses entre os homens, e desmaterializou-se em presença da família a que viera proteger e encaminhar.

            Esse fato nos demonstra que os Espíritos não criaram uma nova teoria, quando transmitiram, pela mediunidade mecânica da Sra. Collignon, as explicações de todos os versículos dos Evangelhos, na obra “Os Quatro Evangelhos” de Roustaing, obra única e incomparável no gênero, por ser a única que nos faz compreender o Cristo, nem Deus, nem homem, mas, como enviado daquele que lhe entregou a direção do    nosso planeta.

O Livro de Tobias



O Livro de Tobias
Reformador (FEB) Junho 1944  

            Em seus eruditos comentários e prefácios aos Livros da Bíblia, informa-nos o Rev. Abade Delaunay:

            "Os Hebreus no seu catálogo das Sagradas Escrituras não contavam o livro de Tobias; e isto, ao que parece, porque dele não tinha tido notícia Esdras, quando, autorizado pela sinagoga magna, reviu, coordenou e compilou os livros sagrados, depois da soltura do cativeiro de Babilônia. Mas a Igreja do Cristo sempre teve o livro de Tobias por um dos livros divinos, Do que são boas provas, por uma parte, os catálogos de S. Inocêncio II, de Gelásio I, de S. Agostinho e de S. lsidoro de Sevilha; por outra, as frequentes citações que deste livro, como de um livro canônico, fizeram os padres dos primeiros séculos, a saber, S. Policarpo, S. lrineo, S. Clemente, S. Cipriano, S. Hilário, S. Ambrósio.

            "Foi este livro originalmente escrito em caldaico; e pelo que se diz no Cap. XI, verso 20, segundo a versão grega, os mesmos Tobias pai e filho foram seus autores.

            "Hoje não existe exemplar algum caldaico deste livro; mas é notório que o exemplar de que se formou a versão grega era mui diverso daquele de que, muitos tempos depois, formou S. Jerônimo a versão latina que hoje temos, e que foi feita por ele sobre a fé de um Judeu, que lho interpretara do caldaico."

            Até ai os comentários do Rev. padre Delaunay. Esse desconhecimento do livro por parte de Esdras deu o lamentável resultado de haver sido o livro julgado apócrifo e excluído das edições protestantes da Bíblia. Como são estas edições protestantes que levam as Sagradas Escrituras a todas as bibliotecas e a todos os lares, segue-se que um dos mais interessantes livros do Velho Testamento fica desconhecido da imensa maioria dos estudiosos. Nosso desejo neste momento é sugerir que se faça uma edição popular do interessante livro, conforme a tradução católica do padre Antônio Pereira de Figueiredo, somente modernizando a ortografia, para que o público não fique privado dessa parte da Bíblia.

            A nós outros, estudantes de Espiritismo, o Livro de Tobias interessa por dois motivos:
           
            1º - Pela moral cristã que encerra, apresentando a Caridade acima de tudo; o que não é comum no Velho Testamento. Na verdade, a caridade só é apresentada como condição única de salvação no Novo Testamento, hoje confirmado pelos ensinamentos dos Espíritos.

            2º - Pela aparição de um Espírito materializado que é tomado por um homem e convive com o jovem Tobias, guia-o em longa viagem, salva-o de muitos perigos, casa-o, cura-lhe a cegueira de seu velho pai; tudo isso sob o nome de Azarias, filho de Ananias. Depois de completa sua missão junto aos Tobias pais e filho, revela então sua identidade espiritual, dizendo, conforme o capítulo XII, versos 8 a 21:

            “É boa a oração acompanhada do jejum e da esmola mais do que ajuntar tesouros de ouro; porque a esmola livra da morte, e ela é a que apaga os pecados e faz achar a misericórdia e a vida eterna. Mas os que cometem pecado e iniquidade são inimigos de suas almas.

            "Eu pois vos descubro a verdade, e não vos ocultarei o que está em segredo. Quando tu oravas com lágrimas, e enterravas os mortos, e deixavas o teu jantar, e ocultavas os mortos em tua casa de dia, e os enterravas de noite, presentei eu as tuas orações ao Senhor.
            "E porque tu eras aceito a Deus, por isso foi necessário que a tentação te provasse. E agora me enviou o Senhor a curar-te, e a livrar do demônio a Sara, mulher de teu filho; porque eu sou o anjo Rafael, um dos sete que assistimos diante do Senhor.
            “E o anjo lhes disse: A paz seja convosco, não temais, porque eu estava convosco, eu o estava por vontade de Deus: bendizei-o e cantai-lhe convosco.
            “A vós parecia-vos que eu comia e bebia convosco: mas eu sustento-me de um manjar invisível e de uma bebida que não pode ser vista por homens.
            É, pois, tempo que eu volte para aquele que me enviou; vós porém bendizei a Deus e contai todas as suas maravilhas. E tendo dito estas palavras, desapareceu de diante deles, e eles não o puderam ver mais."

            Como se vê desta breve transcrição, o Livro de Tobias merece atento estudo dos espiritistas. Há na Bíblia outros casos de Espíritos que tomam corpo aparentemente humano para cumprirem missões entre os homens, numa materialização mais duradoura e mais densa do que as materializações estudadas na experimentação dos espiritas e metapsiquistas. Passam por homens de carne e osso entre os homens e só ao desfazerem seus corpos, fica-se sabendo que eram Espíritos desencarnados. A mais gloriosa dessas manifestações é a do Divino Mestre que também na opinião dos homens, comia e bebia com eles, não só antes, como até depois de sepultado seu corpo.

            São numerosos os episódios evangélicos que revelam essa natureza diferente do corpo de Jesus; corpo que marchava sobre as águas, desaparecia do meio da multidão, desapareceu do túmulo, atravessou portas fechadas, etc. Esses tópicos ficaram incompreendidos até a vinda da Terceira Revelação. Só os fenômenos do Espiritismo vieram esclarecer-nos sobre essas formações a que os metapsiquistas deram o nome de formações ectoplásmicas, e só na obra recebida por João Batista Roustaing, através da mediunidade mecânica de Mme. Collignon - Os Quatro Evangelhos - foi minuciosamente revelado o processo pelo qual os Grandes Espíritos podem condensar a matéria e formar para si mesmos esses corpos aparentemente de carne e ossos, mas que podem desmaterializar-se repentinamente.

            Os fenômenos dessa natureza são eternos, encontram-se relatos nas literaturas profanas e sagradas de todos os tempos e nas tradições dos povos selvagens, de aparições e desaparições de deuses, anjos, espíritos, demônios, o que é sempre a mesma coisa. Não foram inventados nem mesmo descobertos pelo Espiritismo; somente estão sendo melhor estudados presentemente.

            Como o nosso século é de cego e orgulhoso materialismo, a vaidade humana tem tido a arrogância de negar tais fatos universais e eternos. Essa audácia do materialismo orgulhoso e impenitente domina tão imperiosa em nosso tempo que até pessoas que se dizem espíritas, não raro abrem campanha contra a grande obra mediúnica dada a J. B. Roustaing, e aparecem nos jornais e no rádio e no livro, fazendo tremenda obra de descrédito contra a Terceira Revelação, aliás, contra a mediunidade, que é sua base.

            É evidente que tais pessoas, mesmo quando bem intencionadas, são os únicos inimigos perigosos do Espiritismo, pois que se dizem espiritas e apenas atacam uma parte da literatura mediúnica; mas se essa parte caísse, com ela -cairiam as outras partes de igual base, isto é, toda a literatura mediúnica. Nalguns países, tais inimigos têm conseguido as mais funestas consequências contra o Espiritismo. Felizmente, no Brasil esses infelizes demolidores não têm logrado seus tenebrosos intentos; a obra de Roustaing continua de pé, e, por isso mesmo, ainda não atacaram a de Kardec e as demais obras mediúnicas. Nos lugares, porém, onde eles venceram a obra de Roustaing, imediatamente lançaram a dúvida sobre toda a literatura mediúnica e, finalmente, conseguiram reduzir todo o brilhante movimento regenerador do Espiritismo a simples núcleos de "científicos", isto é, de experimentadores e discutidores eternos, que nada constroem, sempre se aborrecem e finalmente se dispersam sem deixar coisa alguma, além da dúvida nas almas e o desespero nos corações.

            Infelizmente, até a pátria de Kardec e Roustaing sofreu imensos prejuízos dessa campanha dos inimigos internos.

            Divulgar o Livro de Tobias, a nosso ver, é um dos passos necessários na obra de defesa do Espiritismo contra esses perigosos inimigos internos; por isso está sendo preparada uma edição popular dessa preciosidade da literatura sacra.



A Busca



A BUSCA
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Agosto 1954

            Todo desejo é rogativa endereçada às Forças Sublimes que governam a vida; e toda realização, em nosso caminho, é oração atendida por semelhantes poderes.

            Toda aquisição, porém, exige pagamento e toda conquista tem o preço que lhe corresponde.

            Acharás o que procuras - disse o Senhor - mas pagarás igualmente pelo que receberes...

            Pede a beleza física e te-la-ás realmente, todavia, as tentações de natureza inferior multiplicar-te-ão os anseios.

            Roga a riqueza material e, de certo, atingir-lhe-ás o patrimônio amoedado na Terra, mas a tua aflição, na defesa da posse, reduzirá o teu círculo de alegria.

            Solicita o brilho da fama e, sem dúvida, a popularidade fulgurará em teu nome; entretanto, a tua paz sofrerá golpes rudes.

            Insiste na materialização de teus propósitos pessoais, nas linhas obscuras da leviandade ou do egoísmo e, incontestavelmente, receberás a experiência que exiges; contudo, em teus erros encontrarás o elixir amargo, destinado à própria cura.

            Aprendamos, assim, a procurar a nossa felicidade, não propriamente conosco, mas em companhia do Cristo, nosso Mestre e Senhor.

            Logicamente, junto d'Ele, padronizando a nossa busca pelos seus moldes divinos, nem sempre marcharemos entre aplausos e flores, mas conheceremos, de perto, a luta, a renunciação, a dor e o sacrifício, terminando o nosso roteiro pela flagelação e pela cruz; todavia, nessa estrada pedregosa e sublime, escura e luminosa cheia de feridas e resplendores, encontraremos a alegria divina e a ressurreição eterna, de vez que estaremos buscando em todos os ângulos de nossa jornada a santificante Vontade de Deus.


No Princípio



No Princípio
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Agosto 1954

            Em artigo publicado sexta-feira santa do corrente ano, sob a epígrafe "O Cristo Redentor", nas colunas dum jornal profano, citando o versículo inicial do Evangelho de João, dissemos que a locução "no princípio", ali empregada, refere-se à formação da Terra pelo influxo do verbo do Cristo, expressão genuína do verbo de Deus, e não ao Universo, constituído de incalculáveis multidões de galáxias que povoam o espaço infinito, - porque aquele jamais teve princípio, como não terá fim.

            Assim afirmamos amparados pela razão e pela revelação espírita.

            Da revelação espírita faz parte uma série de mensagens mediúnicas ditadas à Sociedade Espírita de Paris, em 1862 e 1863, pelo sábio Espírito de Galileu, versando
sobre Uranografia geral, e que constituem o capitulo VI do livro “A Gênese”, os milagres e as predições de Allan Kardec. Destacamos, de uma delas, os elucidativos ensinamentos seguintes:

            "Existindo, por sua natureza, desde toda a eternidade, Deus criou desde toda a eternidade, e não poderia ser de outro modo. Visto que, por mais longinqua, que seja a época a que recuemos, pela imaginação, os supostos limites da criação, haverá sempre, além desse limite, uma eternidade – ponderai bem nesta ideia -, uma eternidade durante a qual as divinas hipóstases, as volições infinitas, teriam permanecido sepultadas em muda letargia inativa e infecunda, uma eternidade de morte aparente para o Pai eterno, que dá vida aos seres; de mutismo indiferente para o Verbo que os governa; de esterilidade fria e egoísta para o Espírito de amor e vivificação.
.....................................................................................
            "Transportando-nos a alguns milhões de séculos somente, para trás da época atual, verificamos que a nossa Terra ainda não existe, que mesmo o nosso sistema solar ainda não começou as evoluções da vida planetária; mas que, entretanto, já esplêndidos sóis iluminam o éter, já planetas habitados dão vida e existência a uma multidão de seres, nossos predecessores na carreira humana, e que as produções opulentas de uma Natureza desconhecida e os maravilhosos fenômenos do céu desdobram, sob outros olhares, os quadros da imensa Criação, Que digo! Já deixaram de existir esplendores que, muito antes, fizeram palpitar o coração de outros mortais, sob o pensamento da potência infinita! E nós, pobres seres pequeninos, que viemos após uma eternidade de vida, nós nos cremos contemporâneos da Criação!"

            Esta revelação é plenamente confirmada pela Astronomia, que nos atesta a existência atual e pretérita dos mundos inumeráveis de sóis que já se extinguiram há milênios, mas cuja luz ainda brilha no firmamento.

            A Gênese moisaica não mais pode ser invocada para elucidar a transcendente questão da criação primária do nosso mundo, e multo menos do Cosmos, porque a autoridade de que se revestia já há muito foi superada pelos fatos e conquistas da Ciência.

            Esse venerável monumento da Revelação antiga satisfez as exigências mentais e as aspirações religiosas duma época, em que a Humanidade acreditava piamente estar a Terra fixada no centro do Universo, iluminada durante o dia pelo disco do Sol, que surgia no Oriente, percorria a abóbada celeste e se punha no Ocidente, para passar por baixo dela e reaparecer no Oriente, iluminando o novo dia. Essa época compreende o longo período histórico, que se conta desde Moisés até o século décimo sétimo da era cristã, quando o insigne Galileu foi obrigado a abjurar de joelhos, perante o Santo Oficio, porque afirmava, como verdade, que a Terra é que gira, em movimento diuturno, em redor do Sol.

            Moisés era, sem dúvida, um médium vidente poderoso e, como missionário, teve a visão retrospectiva da formação da Terra, na fase em que, cessado o estado fluido incandescente, começara a arrefecer e solidificar-se, oferecendo condições propícias à vida de seres orgânicos , mas, quem nos garante que o que ele realmente viu, foi o que se acha narrado na Gênese? - uma vez que, para representar a sua visão, serviu-se de caracteres ideológicos, e não da escrita alfabética que era então desconhecida.

            O vidente, por certo, contemplou a Terra ainda aquecida, envolta em cerrado nevoeiro que interceptava a passagem dos raios solares, parecendo-lhe que "era sem forma e vazia, e havia trevas à face do abismo" (1-2). Diluindo-se o nevoeiro, pelo gradativo arrefecimento das águas, pode, através dele, coar-se a luz do Sol, e deu-se a "separação entre a luz e as trevas" (?), distinguindo-se o dia da noite (1-3 a 5). Com a progressão do resfriamento da terra e das águas, chuvas torrenciais caiam sobre elas, e, estiadas estas, pesadas nuvens apareciam suspensas na atmosfera, operando-se, aparentemente, a separação "das águas que estavam por baixo do firmamento das que estavam por cima" (1-6 a 8). Corno surgissem, mais tarde, o Sol e a Lua por entre as nuvens, Moisés, na compreensível ignorância em que estava do nosso sistema planetário, supôs que Deus criara, depois da Terra, "dois grandes luminares; - o luminar maior para governar o dia e o luminar menor para governar a noite; e as estrelas" (1-14 a 18).

            Ora, sem esta, ou semelhante, interpretação dada pelo Espiritismo, a Gênese moisaica não resiste à crítica: será relegada para o rol das lendas antigas como já a consideram os corifeus da ciência materialista.

            Assim também, as figuras de Adão e Eva não representam, em face da revelação espíritas, as primeiras criaturas humanas das quais toda a Humanidade descende e sim, entidades alegóricas, simbolizando uma numerosa falange de Espíritos intelectualmente adiantados, degredada por seu desmedido orgulho, de um planeta mais evolvido (paraíso perdido), do sistema da Capela, onde se tinham constituído entrave ao progresso, e, vindo encarnar na Terra, transformaram-se em fator eficiente do desenvolvimento mental e cultural dos povos. Não se concebe, aliás, que a primeira mulher se tivesse formado da costela de Adão - como pretendem os que interpretam a figura, simbólica ao pé da letra, porque, no capítulo 1º, versículo 27, está consignado que Deus, ao sexto dia, criou o homem macho e fêmea. Assim se explica porque, tendo Caim matado a Abel - como narra o capítulo 4º e, arrependido, desejasse morrer, lhe foi posto um sinal para que ninguém o matasse, prova de que já havia então mais gente, além de seus pais- o que se torna mais evidente por ter ele casado e fundado uma cidade, como consta do versículo 17.

            Donde poderiam provir a mulher de Caim e a população da cidade senão dos seres humanos que já haviam sido criados macho e fêmea?

            Ao enunciar estes esclarecimentos, guiados pela razão e o bom-senso, mas sem a menor pretensão à infalibilidade que seria estultícia, não nos move, a nós espíritas, senão secundariamente, a intenção de fazer prosélitos.

            Sentimo-nos felizes e confortados com a nossa fé esclarecida, racional e consoladora, e desejaríamos que todos compartilhassem da nossa felicidade; desejaríamos que todos compreendessem Deus, como nós o compreendemos. Pai de amor e justiça, que "enviou seu Filho ao mundo, não para o condenar e sim para salvá-lo", e que sendo a suprema sabedoria, a suprema bondade, não iria eternizar o mal em sua obra, criando um inferno de sofrimentos sem fim, satanás e a condenação eterna pois temos a serena convicção de que dá a seus filhos, por mais perversos e ignorantes que sejam, a oportunidade de se tornarem sábios e bons, mediante o cadinho purificador das vidas sucessivas,

            Não queremos porém, de modo algum, desviar ninguém da religião, seja qual for, em que se sinta bem e confortado, desde que faça por ser bom e fraterno, procurando pôr em prática a recomendação de Jesus, de não fazer aos outros o que não queira que lhe façam, - uma vez que a finalidade do Espiritismo é a de promover a reforma moral dos indivíduos, para que possam reinar, neste mundo, a paz, o amor e a harmonia, sem exigir que todos rezem pela mesma cartilha.

Desvio de Milênios


Desvio de Milênios
por Antônio Túlio
Reformador (FEB) Jan 1956

            Num precioso livro com o título “Heilung durch den Geist” (Cura através do espírito), Stefan Zweig estuda a arte de curar através dos tempos e demonstra que a medicina primitiva achava-se estreitamente ligada à religião e à moral. Sentia-se que a doença era consequência do pecado, castigado pelos deuses, e só os sacerdotes tinham poder de curar, repacificar o pecador com os deuses ofendidos.

            O tratamento do doente era sempre ato religioso.

            Depois de tal demonstração histórica, o autor nos mostra o renascimento dessa velha convicção em três escolas modernas, sem ligação entre si, que tratam os doentes por processos espirituais, sem drogas nem remédios materiais.

            A primeira citada por ele é de Mesmer, de cura pelo magnetismo, por meio de passes e de sugestão. A segunda é de Mary Baker Eddy, que surgiu nos Estados Unidos com o nome de “Christian Science; (Ciência Cristã) e cura pelo estudo da Bíblia e do livro moral da autora. A terceira é a do médico austríaco Sigmund Freud, Psicanalista, que atribui as enfermidades a recalques morais e os trata por processos morais.

            Segundo Stefan Zweig, esses três processos diferentes de tratar doentes demonstram que o materialismo da Medicina foi um desvio milenário, consequente do triunfo das ideias materialistas no mundo científico, mas não deu resultados satisfatórios e a Humanidade tende a regressar ao método primitivo de ligar medicina com moral e atribuir as enfermidades a erros morais.

            O novo livro de André Luiz – “Nos Domínios da Mediunidade” - não só confirma essas suposições de Stefan Zweig, como vai muito mais longe, porque, conhecendo a reencarnação, pode explicar as doenças e deformidades de nascença as causas remotas das enfermidades, sempre com base em erros morais ou pecados. É o regresso em cheio à medicina primitiva, porém com inteira luz sobre os casos de enfermidades.

            Não só as doenças como todos os outros males que afligem a Humanidade são produtos do pecado, são maus hábitos velhos ou novos que têm de ser corrigidos para que o homem entre no caminho da saúde e da felicidade reais.

            Quando toda a Humanidade conhecer estes ensinamentos e os aceitar integralmente, como terá de ser um dia, mais cedo ou mais tarde, medicina e moral se fundirão num só grupo de conhecimentos práticos para criar a Humanidade nova do porvir.

            Não importa que o materialismo médico já tenha milênios de existência e que tenha feito belas e úteis descobertas. O Materialismo tem que desaparecer, porque o futuro pertence ao Espírito, como nos diz Emmanuel no prefácio do mesmo livro, e essas belas aquisições da Ciência irão auxiliar a compreensão da parte espiritual das enfermidades.

            Não haverá a dualidade Ciência e Religião de hoje, mas um só grupo de conhecimentos de aplicação prática na vida. Moralidade será sinônimo de saúde e imoralidade terá o mesmo sentido de doença. Sacerdote, médico, moralista, será o mesmo Mestre.

            Quem aceite os ensinos de André Luiz no livro “Nos Domínios da Mediunidade” não tem que esperar essa evolução da Ciência para mudar sua conduta; ao contrário, tem que ser pioneiro da nova ideologia e demonstrar que à transformação moral corresponde o melhoramento na saúde, salvo quanto às fundas raízes no terreno escuro do passado que não poderão ser removidas subitamente, porque terão ainda que produzir seus penosos esforços. Por haver mudado de conduta, o criminoso não fica absolvido dos crimes do passado, pelos quais já esteja condenado, apenas não cometerá novos crimes para o futuro e poderá receber diminuição da pena, levada em conta sua boa conduta na penitenciária. Isto na justiça humana. Na Justiça Divina se dará coisa ainda melhor: o condenado cumprirá com perfeita resignação o resto da pena, recebendo desde já alegrias novas e maiores energias pela perfeita observância ativa da Lei.  

            O Espiritismo não é somente a delícia de encantadores conhecimentos que nos levam à adoração, como a Astronomia, é mais: é um Código de conduta obrigatório para todos.


Assombração - um fenômeno muito sério




Assombração: Um fenômeno Muito SérioParte 1
Hermínio C. Miranda
Reformador (FEB) Agosto 1976

           
Com alguma experiência e certa dose de paciência tudo se encontra nos sebos; para onde refluem os livros velhos que, num passado distante ou mais recente, foram novos e até causaram impactos consideráveis. As vezes, somos premiados com uma raridade esquecida e preciosa, como, por exemplo, o exemplar de “Les Phénomènes de Hantise”, de Ernesto Bozzano, em tradução de Charles de Vesme (Librairie Féllx Alcan, Paris, 1920) que enseja esta apreciação.

Em português, hanter corresponde a assombrar sendo que não conheço a emigração da mesma raiz para o nosso rico idioma. Em inglês diz-se to haunt, conservando o mesmo sentido básico de FREQUENTAR certo lugar ou pessoa insistentemente. Há, até em francês, o ditado! "Dis-moi qui tu hantes, je ti dirai qui tu es." ("Diga-me com quem andas (ou quem frequentas) que te direi quem és.") Por isso, tanto em francês como em inglês, o verbo é empregado para descrever as frequentes visitas de fantasmas a determinados locais. Les Phénomènes de Hantise, seriam, pois, fenômenos de assombramento, com as conotações da língua.

Seja como for, o livro de Bozzano cuida da interessantíssima fenomenologia que, em linguagem popular, denomina-se assombração, no Brasil.

*

O notável pesquisador italiano estudou 532 casos, do quais classifica 374 como de assombração propriamente dita e 158 como "poltergeist". E aqui damos com outra palavra assombrada, desta vez sacada à língua alemã e que se compõe de duas expressões: poltern, fazer barulho e geist, espírito.

Daí se depreende que "poltergeist" são fenômenos de efeito físico, geralmente acompanhados de ruídos e deslocação de objetos.

E já que estamos nas definições, vejamos a de Bozzano: os fenômenos de assombração compreendem esse conjunto de manifestações misteriosas e inexplicáveis cujo traço característico essencial é o de ligarem-se de maneira especial a um local determinado.

Segundo sua meticulosa metodologia, o autor classifica os fenômenos em auditivos, visuais, táteis, olfativos e físicos. Os auditivos e visuais são subdivididos em duas categorias: coletivos e eletivos. São coletivos aqueles percebidos por todos os presentes nos locais em que ocorrem, eletivos os que são percebidos apenas por algumas pessoas, com exclusão de outras. Isso parece indicar que alguns sejam objetivos e outros subjetivos, mas o competente cientista italiano não se cansa de advertir que essas classificações são mais para efeito didático, pois a fenomenologia não se enquadra rigidamente nos esquemas que imaginamos para ela. Acrescenta, por isso, com a honestidade que caracteriza o homem na busca da verdade, que a classificação deve "ser considerada provisória e convencional".

Acha ele, ainda, que os fenômenos subjetivos parecem ser, preferentemente, de natureza telepática, enquanto os objetivos ou físicos são de natureza mediúnica.

Que hipóteses poderiam ser formuladas para explicar tais fenômenos?

Bozzano oferece quatro. A primeira delas é de autoria de Adolphe d'Assier, apoiada na concepção positivista do universo. Admitindo, ante provas incontestáveis, a existência do fenômeno, realiza ele um grande esforço no sentido de testificar que tais fenômenos não implicam sobrevivência da alma. Segundo essa doutrina esdrúxula, a natureza do fantasma seria efêmera, e, em pouco tempo, ele estaria desagregado sob a ação de forças físicas, químicas e atmosféricas que o obrigariam a decompor-se, molécula por molécula, e a ser absorvido no meio ambiente.

Embora a hipótese seja acolhida com deferência, Bozzano liquida-a sumariamente, ao lembrar não ser nada científico imaginar "que a alma sobreviva somente para morrer de novo". Além do mais, acrescenta ele, são conhecidos casos em que Espíritos persistem em manifestar-se durante vários séculos. Só isso bastaria para infirmar a hipótese materialista de d'Assler.

Restam-nos três eleições.

A primeira identifica os fenômenos de assombração com os de telepatia entre vivos. É a hipótese de Frank Podmore. Nesse caso, as manifestações seriam resultantes da ação telepática de pessoas encarnadas residentes ou não na casa assombrada, e que, conhecedoras dos fatos aí ocorridos, transmitiriam as imagens às testemunhas. Bozzano não a recusa sumariamente, porque poderia servir para explicar alguns fatos, embora jamais pudesse revestir-se da amplitude que Podmore imaginou para explicação de todos os fatos, como veremos.

A segunda teria seu apoio numa "lei da física transcendental” conhecida sob o nome de persistência das imagens". Estaríamos aqui no domínio dos "clichês astrais" dos ocultistas e das gravações "akásicas" dos teósofos ou da “telestesia retrocognitiva" de Myers. Os fantasmas não seriam, pois, nada mais do que "uma espécie de emanação sutil dos organismos vivos perpetuados num ambiente habitualmente inacessível aos nossos sentidos". Também essa hipótese não é de todo refugada por Bozzano, que a considera digna de exame, em sua identificação com a psicometria.

- Não obstante - escreve o autor -, ela também está bem longe de ser aplicável à maior parte dos fenômenos de assombração.

Vemos, assim, que das possibilidades examinadas, uma é totalmente inaceitável - a de d' Assier - e as outras poderiam ser admitidas para explicar alguns fenômenos, mas não todos.

- A terceira escolha - escreve Bozzano - é a espírita, sem dúvida a mais Importante, a única em condições de explicar todos os casos, cuja (s) causa (s) são anteriores são insuficientes para perceber; ela é capaz de vencer todas as dificuldades, desde que, todavia, se renuncie à versão popular da referida hipótese, segundo a qual, nos casos de assombração, se trata, sempre da intervenção direta e da presença real de "Espíritos assombradores"...

Procuremos entender bem a ressalva levantada pelo autor. Indubitavelmente, a explicação oferecida pelo Espiritismo - ele prefere chamá-la de hipótese espírita - é a sua predileta, e ele o diz claramente. Acha, no entanto, que nem sempre se verifica a presença real do Espírito manifestante quando o fenômeno se produz. Aliás, é bem mais radical ao declarar que "tudo tende a fazer supor que, na grande maioria dos casos, a intervenção dos "Espíritos assombradores'' toma a forma de transmissão telepática - consciente ou inconsciente - dos seus pensamentos, intensamente voltados, naquele momento, para os lugares onde eles viveram, e para os acontecimentos trágicos que ali se desenrolaram".

Que isso seja possível, não se discute, mas talvez Bozzano "estique" demais a sua hipótese telepática para aplicá-la à "grande maioria dos casos". É que os fenômenos de telepatia costumam ser, na sua própria classificação, subjetivos e seletivos, e dificilmente se apresentam acompanhados de efeitos físicos (sons, deslocamentos de objetos, etc.). Isto quer dizer que o percipiente os veria subjetivamente, como uma visão interior; e mais, alguns percipientes, mais sensíveis, com exclusão de outros (seletividade). E não parece que neste quadro fosse possível encaixar a maioria das manifestações de assombramento.

Não resta dúvida, no entanto, para o autor, quanto a solidez indiscutível da chamada hipótese espírita, pois, logo abaixo, ao concluir sua Introdução, quando busca encontrar o elo de ligação para toda a fenomenologia sob exame, declara que: - "Em nesse caso, o elemento comum a todos os fenômenos é fácil de ser reconhecido: é o espírito humano na sua dupla condição, encarnado e desencarnado.” (Destaques no original.)

*

Segue-se um capítulo - o segundo - sobre os fenômenos de assombração propriamente dita, seção auditiva.

O primeiro caso é extraído de um relatório da "Society for Psychical Research", de Londres, e foi examinado por uma comissão da qual fazia parte Frank Podmore. Cuida de ruídos espantosos observado num Vicariato inglês pelo pastor e sua esposa. Parecia que a casa vinha abaixo, sempre às duas horas da manhã, aos domingos. A manifestação provou ser inteligente, porque reagia com inaudita violência quando o pastor deblaterava contra ela. Era também eletiva, porque se verificou depois, que podia, às vezes, ser ouvida pelos hóspedes do casal e não pelos donos da casa. Por outro lado, as manifestações prendiam-se à casa e não às pessoas, porque os fenômenos já eram conhecidos na redondeza por haverem ocorrido com outras famílias que ali haviam residido. Há casos, como se sabe, em que os fenômenos acompanham as pessoas.

Um número maior de casos semelhantes - que são raros - poderia, segundo Bozzano, conter grande valor teórico e favoreceriam consideravelmente a hipótese espírita.

O episódio seguinte, muito complexo pela variedade da fenomenologia apresentada, foi retirado dos "Annales des Sciences Psychiques" (1892-1893), e está muito bem documentado por vários testemunhos de valor irrecusável. O relato é feito pelo proprietário de um castelo assombrado localizado na região de Calvados, na França, cuja cidade mais importante é Caen.

As manifestações ocorreram por algum tempo, entre 1861 e 1868, e cessaram. Em 1875, recomeçaram com redobrada intensidade. Viviam no castelo o casal, um filho menor, um abade que desempenhava as funções de mestre do menino, o cocheiro, o jardineiro, a arrumadeira e a cozinheira. Os barulhos eram percebidos por todos e ocorriam durante a noite. Eram pancadas nas paredes e nas portas. Gritos e gemidos lancinantes, desesperados, ruídos de móveis que estariam sendo arrastados e tombados ao chão, corpos pesados que caiam pareciam descer de degrau em degrau pelas escadarias ou subi-las com incrível rapidez, objetos que se deslocavam, desapareciam e reapareciam. Certa ocasião, em que a senhora subia com o abade para verificar a origem de um ruído, ao se aproximar de uma porta, a chave girou na fechadura, desprendeu-se e atingiu-lhe a mão, ferindo-a. Medalhas e crucifixos trazidos por um sacerdote que veio exorcizar a casa, desapareceram sem deixar traço.

Dois ou três dias depois - os exorcistas já se haviam retirado –a dona da casa escrevia qualquer coisa em seus aposentos quando um enorme embrulho contendo as medalhas e os crucifixos caiu diante dela, em cima da mesa.

Há também um fenômeno muito curioso, que ficou sem explicação. Um dia, o dono da casa executou algo no harmônio (instrumento musical semelhante ao órgão), por longo tempo. Ao fechar o Instrumento, uma parte das árias que havia tocado repetiu-se no canto oposto do salão.

Neste caso, os fenômenos eram coletivos - todos os percebiam nitidamente -, predominantemente auditivos porque os ruídos não eram provocados por nenhum corpo ou objeto visível. E também de efeitos físicos pois os objetos se deslocavam, sumiam e reapareciam inexplicavelmente.

É uma pena que em tais circunstâncias não se tenha realizado uma sessão mediúnica para estudar as causas do fenômeno, e, talvez até resolver o conflito espiritual do qual, evidentemente, ele resulta. Veremos um ou dois casos em que isso foi feito.

No caso há pouco relatado, há um pormenor interessante. O castelo em que ocorreram as manifestações havia sido construído a 150 metros do antigo, que estava em ruínas. Como o antigo castelo fosse também assombrado, Bozzano admite a hipótese que os fenômenos tenham sido transferidos através dos móveis e dos materiais de demolição reutilizados. É de se perguntar se as vibrações psicométricas ligadas aos móveis e aos aludidos materiais teriam energia suficiente para produzir tal variedade de fenômenos, os estrondos, que abalavam até as paredes, os gritos e por fim, os efeitos físicos de deslocamento, bem como desmaterialização e rematerialização de objetos concretos de metal e madeira. Tudo leva a crer na existência, atrás dessas manifestações, de espíritos bem versados na manipulação de leis muito importantes da física transcendental.

Em outro caso, três estudantes de medicina pactuam: se um deles morresse, os outros poderiam ficar com o esqueleto para objeto de estudo, desde que os ossos ficassem sempre em poder de algum amigo. Se não fosse possível satisfazer tal condição, o esqueleto deveria ser sepultado.

Quando um deles morreu, um dos sobreviventes ficou com o esqueleto e, através dos anos, e várias peripécias, sempre que o esqueleto era relegado a uma condição vexatória, em desacordo com o pacto, começavam os fenômenos de assombração: ruídos de passos que iam e vinham, batidas, barulho ensurdecedor de garrafas que se chocavam,  que se quebravam e caiam ao chão, sem nenhum fenômeno físico, ou seja, as garrafas lá estavam intactas.

Bozzano não tem dúvida alguma em indicar a hipótese espírita. Há uma correlação perfeita entre as declarações feitas pelo jovem estudante e os fatos póstumos. Cada vez que seus ossos eram tratados de maneira diferente do combinado, ele evidentemente, protestava, de maneira inequívoca.

*

No capítulo 3, cuida o autor das manifestações visuais que, como todas as relatadas por Bozzano, são escrupulosamente bem documentadas. O de número 4, por exemplo, desenrolou-se numa casa construída em 1860, e que durante 16 anos foi ocupada pelo seu proprietário. Nesse lapso de tempo, morreu a primeira esposa, e, sufocado pelo desgosto, ele passou a beber desregradamente. Dois anos depois, casou-se, em segundas núpcias, com uma jovem disposta a curá-lo, mas que, infelizmente, também adquiriu o vício da bebida. Em julho de 1876, deu-se a separação e a esposa foi viver em outra cidade. Meses após, ele morreu e, em setembro de 1878, ela também. Estavam assim desencarnadas as três personagens da tragédia. A casa em que viveram foi adquirida por um velho que logo morreu também. Quatro anos depois, o imóvel foi comprado pelo capitão Morton, pai da moça que fez a narrativa à "Soclety for Psychical Research", que Bozzano reproduz, em essência.

Em abril de 1882, a nova família instalou-se na residência fatídica, ignorando os boatos que corriam a respeito. Dois meses depois, Miss Morton conta seu primeiro encontro com o fantasma:

- "Acabara de me recolher ao meu quarto, mas ainda não me deitara quando percebi que alguém se aproximava da porta. Pensando tratar-se de minha mãe, fui abri-la. Não vi ninguém mas, saindo para o corredor, percebi uma senhora alta, vestida de preto, parada no patamar da escada. Quando cheguei perto dela, ela começou a descer e eu a segui, curiosa de saber quem era. Infelizmente, a lamparina que eu levava apagou-se de repente, obrigando-me a voltar. Conseguira ver, no entanto, uma forma feminina muito alta, não produzindo qualquer ruído ao caminhar, vestida de lã preta. Sua fisionomia ocultava-se atrás de um lenço que ela segurava com a mão direita. A mão esquerda estava parcialmente escondida na ampla manga na qual se via uma braçadeira negra, distintiva de seu luto de viúva. Ela estava sem chapéu, mas era visível sobre a cabeça uma touca envolvida num véu. Não pude observar mais nada mas em outras ocasiões consegui perceber uma parte de sua testa e de seus cabelos.”

Nos anos seguintes, de 1882 a 1884, Miss Morton viu o fantasma cinco ou seis vezes. Outras pessoas da casa também o viram três vezes isoladamente: sua irmã, a empregada e enfim, seu Irmão, juntamente com outro menino. O fantasma costumava descer a escadaria, entrar no pequeno salão e permanecer de pé ao canto direito da varanda, onde se demorava algum tempo. Em seguida, voltava sobre seus passos e percorria o longo corredor até a porta do jardim, onde desaparecia.

A moça, era destemida e estava disposta a desvendar o mistério da aparição. Em 29 de Janeiro de 1884 teve oportunidade de encontrar-se com ela face a face. O momento ficou documentado em carta que ela escreveu, na época, a uma amiga: - "Abri suavemente a porta do pequeno salão - diz a narradora - e me introduzi ali junto com ela. Ela, porém, adiantou-se, alcançando o sofá, onde permaneceu imóvel. Abordei-a logo e lhe perguntei em que poderia ser-lhe útil. A essas palavras, ela estremeceu ligeiramente e parecia disposta a falar, mas apenas emitiu um ligeiro suspiro. Em seguida, dirigiu-se à porta e, quando alcançou a soleira, eu repeti minha pergunta, mas parece que ela não queria mesmo falar. Foi até o salão e prosseguiu até à porta do jardim, onde desapareceu, como de costume.”

Em outras ocasiões, a moça tentou tocá-la, mas o fantasma parecia sempre fora de seu alcance; se a seguia até um canto do cômodo, ela desaparecia, subitamente.

Convivendo, assim, praticamente durante mais de dois anos com um fantasma, foi possível observá-lo bem, e, como assinala Bozzano, embora o caso não tenha nada do sensacionalismo de tantos outros, presta-se a uma autenticação indiscutível, pois foi presenciado por várias pessoas sadias e idôneas, em diferentes oportunidades, ora sozinhas, ora acompanhadas. A visão, às vezes, era eletiva - vista por uma ou mais pessoas à exclusão de outras - e às vezes coletiva, ou seja, percebida por todos os presentes, como na noite de 12 de agosto de 1884, quando foi vista pelas duas irmãs, ao mesmo tempo e, mais uma vez, Miss Morton tentou inutilmente falar com o Espírito. Obviamente sem conhecer nada da fenomenologia mediúnica, a narradora informa, contudo, que em presença do fantasma, sentia "perder algo, como se a forma retirasse dela uma força". Parece evidente que a moça fornecia ectoplasma para a materialização parcial do Espírito, que, assim, podia objetivar-se e produzir uma manifestação coletiva. De outras vezes, porém, sem recorrer ao ectoplasma, a forma aparecia apenas aos médiuns videntes e, por isso, recaia na classificação de manifestação eletiva proposta por Bozzano.

*

No caso número 4, algumas irmãs veem simultânea ou sucessivamente o mesmo Espírito, ao ar livre, sempre em determinado ponto do caminho, com a mesma roupa antiquada. Bozzano elimina a hipótese da alucinação patológica porque a vestimenta do Espírito vista por diferentes pessoas era sempre a mesma e desconhecida de todas as testemunhas.

Em outro caso narrado por Robert Dale Owen em seu Iivro "The Debatable Land" também não se trata de simples fenômeno de assombração, porque o Espírito apresenta evidentes sinais que o identificam pessoalmente.

*

O caso nº 7 merece um relato mais pormenorizado, m vista das implicações teóricas que Bozzano expõe depois de narrá-lo.  Trataremos de resumi-lo, sem prejuízo do conteúdo. A Sra. O'Donnell chegou a Brighton (lnglaterra) em 22 de março de 1898, em companhia da filha para passar alguns dias em repouso. Instalaram-se numa pensão, em cômodos amplos e confortáveis. Eram excelentes as perspectivas de tranquilidade e despreocupação mas, à medida que a tarde caia, uma desagradável sensação de angústia começou a oprimir a Sra. O'Donnell. A noite, quando se recolheu ao leito, adormeceu para acordar pouco depois sobressaltada por uma terrível barulheira no andar superior. Teve a "impressão de que seu quarto estava cheio de gente". Como o barulho durasse a noite toda, ela não conseguiu dormir, e, pela manhã, exausta e nervosa, queixou-se à arrumadeira de que os hóspedes do andar superior não tinham consideração alguma por ninguém, mas lhe foi assegurado que os cômodos lá em cima estavam desocupados.

Durante o dia continuou a sentir-se deprimida e inquieta e, na noite seguinte, repetiu-se o tumulto que novamente durou até a madrugada. No terceiro dia, totalmente esgotada e insone, foi deitar-se às 23 horas, depois de despedir-se da filha, que dormia no cômodo ao lado. Logo começaram os passos no andar de cima, e, durante cerca de uma hora, ela continuou em estado de tensão insuportável a contemplar a chama da lareira que havia feito acender.

- Depois - conta ela - senti necessidade de me virar e, então, com um pavor inexprimível, percebi ao meu lado um espectro horrível que, com uma das mãos, me indicava o quarto contíguo e com a outra apontava para mim, quase me tocando.

Ao contrário da Miss Morton, a quem há pouco nos referimos, a Sra. O'Donnell entrava em pânico facilmente. Escondeu a cabeça sob as cobertas, tentando convencer-se de que aquilo era pura imaginação, mas ao olhar de novo, lá estava o espectro.

Reunindo a coragem que ainda lhe restava, estendeu a mão, na esperança, talvez, de que aquilo fosse realmente uma espécie de miragem, mas tocou "uma coisa substancial". Qual não foi seu horror, no entanto, ao sentir-se "agarrada pela mão gelada do morto"!

Diz ela que, a partir desse momento, de nada mais se lembra. Pela manhã quando a filha veio vê-la havia perdido a voz, que, depois recuperou.

Para a quarta noite, trocou de quarto com a filha mas o fantasma voltou. Cerca de meia-noite, ela viu-o abrir a porta, que estava fechada à chave, e entrar. Era um jovem de pequena estatura, tez morena, maneiras distintas e. tal como já o vira na noite anterior, tinha a roupa suja e em frangalhos. Parecia mais um espantalho do que um ser humano,

Dessa vez ele falou:

- A senhora está ocupando agora o quarto do escocês?

Sorriu, amavelmente (diz ela) e voltou sobre seus passos, saindo do quarto como havia entrado.

Na manhã seguinte, a pobre Sra. O'Donnell estava desesperada. Embora a dona da pensão continuasse a negar que sua casa fosse assombrada, uma investigação pela redondeza revelou que ali se suicidara há pouco tempo um jovem, o que, aliás, a dona da pensão acabou confirmando. Tinha 24 anos, era franzino, de pele morena e bem-educado. Sofria de bronquite crônica e estava muito deprimido. Certa manhã declarou que se sentia melhor, mas, assim que se encontrou sozinho, atirou-se pela janela e espatifou-se no pátio interno de onde foi recolhido ainda com vida, sujo e com a roupa dilacerada como a Sra. O"Donnell o vira. Era verdade, também, que no quarto ao lado se hospedara um escocês, amigo dele. Daí sua observação à Sra. O'Donnell.

O caso foi minuciosamente investigado pela "Society for Psychical Research" e comentado por Frederick Myrs. Descobriu-se que o jornal local - "The Sussex Daily News” - anunciara realmente o suicídio de um jovem por nome Walter Overton Luckman, na casa de número 58, à York Road, onde se hospedara a Sra. O'Donnell com a filha.

Observou-se, também, que a moça nada ouvira de todo o barulho e não viu fantasma algum, o que toma uma aparição eletiva, na classificação de Bozzano. É certo também que ele conseguiu identificar-se nitidamente, materializar-se o suficiente para agarrar a Sra. O'Donnell, falar com ela e dar-lhe uma informação que ela não podia conhecer, ou seja, a de que ela estava dormindo no quarto do escocês. Quanto ao fenômeno da porta, parece ter sido subjetivo, ou seja, a porta não foi aberta de fato, mesmo porque fora encontrada depois fechada à chave, como antes. Isso não quer dizer que, às vezes, os fantasmas materializados não abram portas. Isso fazem, e deixam-nas abertas para verificação posterior, produzindo, portanto, um fenômeno objetivo.

Pois, com tudo isso, Myers, que, aliás, aceita perfeitamente a sobrevivência (veja-se sua obra clássica intitulada "Humann Personality"), nega a objetividade da maioria das aparições, admitindo apenas que, em certo número de casos, há "uma modificação qualquer no espaço" onde se localiza o fantasma. Se entendo bem, isto quer dizer que não se trataria de uma presença real do Espírito naquele ponto, mas de uma "modificação no espaço", promovida talvez telepaticamente ou, como diz ele, "no mundo metaetérico", e não no mundo da matéria.

Bozzano promete comentar a tese da manifestação telepática mais adiante no livro, mas não deixa de fazer uma observação absolutamente válida e pertinente: é que, em inúmeros exemplos, a aparição do fantasma é precedida por uma impulsão mais ou menos irresistível de parte do percipiente para voltar-se e olhar na direção onde se encontra o ser manifestado. Isso acontece, de fato, nas manifestações que ele classifica como telepático-subjetivas, porque, mesmo que o fantasma não esteja localizado num ponto específico do espaço físico, como acontece nas percepções objetivas, a visão interior provocada por um impulso telepático não se fixa no espaço físico como a manifestação objetiva de um espírito materializado, ou pelo menos suficientemente provido de ectoplasma para ser visto, simultaneamente, por várias pessoas, mas bem pode dar-se no mundo metaetérico, com localização própria, a partir do impulso gerador.

Não e fácil, porém, remover a teimosia dos céticos, porque os partidários da telepatia teorizam um pouco mais para dizer que, no caso de uma percepção coletava, se todos veem o fantasma caminhar da mesma maneira e fazer os mesmos gestos, ou dizer as mesmas palavras, isso se deve a que o agente transmitiu aos percipientes as mesmas impressões mentais. Assim não é possível!

Na realidade, a teoria não encontra o menor apoio na bem documentada experiência de inúmeros casos analisados, pois cada observador percebe o fantasma "em plena correspondência com as leis da perspectiva isto é, de frente, de perfil ou de costas, segundo a posição que ocupe relativamente ao percebido, exatamente como acontece com as percepções objetivas."

A despeito disso, porém, Bozzano é de opinião que o problema da objetividade ou subjetividade dos fantasmas está longe de ser resolvido, pois as manifestações são, às vezes, algo desconcertantes pelo fato de conterem elementos de uma e de outra forma concomitantemente. Um bom exemplo, como vimos, é o próprio caso que acabamos de resumir. O fantasma é, ao mesmo tempo, suficientemente objetivo para falar com a Sra. O'Donnell e até mesmo agarrá-la pelo braço, e. no entanto, entra por uma porta fechada à chave que permanece fechada, como depois se verificou.



Assombração: Um fenômeno Muito SérioParte 2
Hermínio C. Miranda
Reformador (FEB) Agosto 1976

Para o caso número 9, Bozzano informa que a "hipótese espírita é a única que se revela capaz de explicar os fatos de modo satisfatório".

Vejamo-lo, em resumo. O fantasma de uma idosa senhora pequenina e frágil é visto várias vezes, tanto pelas crianças como pelo pai, que, a princípio, imponente e agressivo coma tantos incrédulos, acaba recebendo o Impacto de uma visita do fantasma em seu gabinete de trabalho, a plena luz de gás. (Os fenômenos passam-se em 1854, na Inglaterra e foram investigados minuciosamente por Gurney, por conta da S. P. R.)  A dona da casa vê, além da senhora, o fantasma de um homem. Ouvem-se ruídos, cantos, choro de um recém-nascido e gritos lancinantes.

Algo, porém, ainda intriga Bozzano: é a persistência das manifestações.

- Nada de mais misterioso no fenômeno de assombração - diz ele à pág. 92 - do que esse prolongamento através dos séculos, e, se é verdade que não existem hipóteses naturalistas capazes de explicar o mistério, não se diria que a tarefa houvesse de ser fácil para a hipótese espírita.

Essa persistência parece realmente embaraçar o eminente pesquisador italiano, pois ele menciona-a em outros pontos de sua obra. Como o fenômeno da assombração está, em sua esmagadora maioria, ligado ao problema da morte, parece-lhe difícil admitir que o fantasma possa ficar durante tão largo tempo preso a um determinado local, onde viveu, sofreu, foi assassinado, ou cometeu algum crime, ou onde se encontram seus bens. No entanto, isso é indiscutível, pois a fixação do Espírito desencarnado a certos locais está na razão direta da intensidade daquilo que o próprio Bozzano classifica de monoideismo. Por anos e anos, e até por séculos, ele não consegue pensar noutra coisa senão em seu drama íntimo, nas tragédias que viveu, nas vinganças que pretende exercer, perambulando nos locais onde sofreu, alienado, fixado, obcecado pelas suas angústias.

Tivemos disso um exemplo extremo, certa vez, na experiência mediúnica. O Espírito manifestante ainda estava preso ao contexto da Roma dos Césares e, diante de nós, orou a Diana, a Júpiter e a Apolo. Sentia, ainda a aflição respiratória causada pela lança que o matara há séculos, e contou-nos, mais tarde, já em melhor estado, que continuava preso àquelas ruínas, onde vagava atormentado pelos impiedosos comentários dos turistas que visitavam aqueles locais onde ele vivera e sofrera na inconsciência de muitas loucuras.

Para o Espírito desencarnado o tempo não conta como para nós, e não está separado metodicamente em minutos, horas, dias, anos e séculos ou milênios, e muitos são os que perderam de vista os pontos de referência que permitem avaliar o deslocamento na direção do futuro.

*

Como disse e repito, é impraticável reproduzir e comentar todos os notáveis casos relatados por Bozzano. Mesmo selecionando pouco mais de três dezenas de episódios dos 532 que estudou, Bozzano escreveu mais de 300 páginas.

Vamos, pois, apenas mencionar alguns, como o caso em que a aparição se reflete num espelho, outro em que, apesar de estar diante de um espelho, a aparição não se reflete nele. Ou daquele outro, este entre vivos, em que um jovem cochila na poltrona de um clube e "sonha" que chega à casa, abre a porta e sobe a escada às pressas, a fim de vestir-se para o jantar. Ao subir, volta-se e vê o pai que o contempla. Nesse ponto, desperta e, verificando que é tarde, vai às pressas para casa, onde constata que seu pai havia assistido ao seu "sonho" e sua mãe estranhou que ele tivesse passado à porta do seu quarto sem cumprimentá-la, como de costume.

Bozzano arrisca uma classificação, a meu ver, inaceitável: clarividência telepática em sonho. Mas não parece satisfeito com a sua própria teoria, e propõe outra, dizendo; "a menos que desejemos considerá-lo como um caso de “bilocação durante o sonho", hipótese perfeitamente válida, pois, a meu ver, o Espírito do jovem desprendeu-se e foi a sua casa onde foi visto pelo pai e entrevisto ou ouvido pela mãe, pois também provocou efeitos sonoros ao abrir a porta e caminhar.

Há um caso semelhante passado na Escócia, onde uma senhora sonhava constantemente com uma casa, sempre a mesma, que ela acabou conhecendo nos seus mínimos detalhes. Tempos depois, o marido alugou uma casa e, quando trouxe a esposa, esta reconheceu a casa dos seus sonhos. Há, porém, um aspecto ainda mais curioso: a proprietária da casa reconheceu na sua nova inquilina o espectro que vinha causando ali contínuos fenômenos de assombração.

- Ah! - diz a proprietária, ao vê-la - a senhora é a dama que assombrava meu quarto de dormir...

Bozzano lembra que a telepatia não pode explicar este episódio.

Em outro ensejo, os fenômenos de assombração (ruídos, estrondos, queda de objetos pesados, arrastamento de móveis) levam duas senhoras a realizar uma pequena sessão mediúnica, na qual o Espírito manifestante diz apenas que se trata de uma advertência e declara, tudo pela tiptologia, chamar-se Lewis. No dia seguinte, os jornais noticiam que um homem desconhecido foi morto por um trem. Alguém informa depois, a uma das senhoras que conheceu o morto e que ele se chamava Lewis. Três dias depois do acidente, em nova sessão, ele se manifesta novamente e diz que não pudera ter sossego enquanto não identificaram seu cadáver.

Em caso ocorrido na Itália, dois amigos combinam uma forma de manifestação post mortem como, por exemplo, quebrar alguma coisa na sala em que conversam, como a luminária que pende sobre a mesa. Se o dono da casa morrer primeiro, ele irá à casa do outro fazer coisa semelhante. Como combinado, morre um e vem quebrar o objeto com "golpes secos, de um timbre especial, como se provocados pelas juntas dos dedos da mão". Bozzano opina que a experiência possui o valor de uma prova de identificação espírita, tendo sido realizada "conforme a promessa feita pela entidade comunicante”, quando viva, ou seja, encarnada. Neste, como em tantos outros exemplos, a teoria telepática é inaceitável, pois a “mensagem” seria incapaz de quebrar um objeto sólido. Ficamos, pois, com "a intervenção direta e a presença real da entidade comunicante", como diz Bozzano.
Ao conclui esta longa exposição e análise dos casos apresentados, dos quais oferecemos apenas uma discricionária amostragem, Bozzano declara ter provado o seguinte: 

     1)  Que todas as formas de manifestações características de fenômenos de “assombração propriamente dita" são idênticas nos fenômenos de telepatia entre vivos".

     2) que, analisando os casos de “telepatia entre vivos", se descobre a via de transição pela qual os fenômenos telepáticos se transformam em casos de "assombração propriamente dita";

     3) que disso ressalta evidente a origem comum dos dois tipos de fenomenologia e, por conseguinte, que os fenômenos de "assombração propriamente dita" podem ser, em grande parte, explicados pela teoria 'telepático-espírita";

     4) que os automatismos dos fantasmas assombradores encontram perfeita correspondência, nos automatismos dos "fantasmas telepáticos" o que confirma, ulteriormente a origem telepática dos primeiros e refuta a opinião daqueles que, ante o fato do automatismo, concluem pela inexistência de ligações causais entre defuntos e fantasmas;

      5)  que os fenômenos telepáticos ensinam-nos que o automatismo dos fantasmas depende do fato de que frequentemente o agente ignora que transmite ao percipiente a visão de seu próprio fantasma donde deriva logicamente que as andanças automáticas correspondente a dos fantasmas assombradores deveriam ser atribuídas à ação do pensamento inconsciente dos defuntos que se manifestam;

      6) que as formas de manifestação tão frequentemente vulgares e absurdas das duas espécies de fenomenologia explicam-se pelo fato de que mais comumente eles procurem o "curso de menor resistência" percorrido pela mensagem supranormal para saltar do subconsciente para a consciência ou, também, para se projetarem sob forma objetiva, o que nos levaria a dizer que as manifestações de assombração não tem senão um valor de anúncio ou lembrança, com que os defuntos se esforçam por atrair a atenção dos vivos;

      7) que a teoria e as regras expostas, como todas as regras e todas as teorias, não são absolutas, mas relativas, e comportam numerosas exceções.

            Muito teríamos a comentar aqui mas receio que o artigo se prolongue demais, especialmente sobre a brilhante e irrefutável análise crítica que o autor faz a seguir das teorias de Podmore. Não resisto à imposição de citar algumas frases: não é lícito nem lógico converter em “regra” uma “exceção", para, em seguida, servir-se dela a fim de explicar fenômenos de assombração e negar as manifestações dos defuntos em geral.

       Logo adiante, ao iniciar o capítulo 5, declara o ilustre autor que não é possível aplicar tais conclusões (anteriormente esboçadas e aqui reproduzidas) aos fenômenos de assombração sem lançar mão da hipótese espírita...

       Ou, ainda à página 149: não há razão para não admitir que um "espírito desencarnado" não esteja sujeito às mesmas leis psicológicas que um "espirito encarnado" e, por consequência, que não haveria motivos para não admitir que, desde que a consciência de um agonizante esteja perturbada por emoções ou preocupações ansiosas, ele não pudesse constituir certas formas de "monoideísmos post mortem" análogas às a que estão sujeitos os vivos. Daí os fenômenos de assombração.

A tese de Bozzano aqui é a mesma defendida alhures no seu magnífico livro “Animismo ou Espiritismo?” (edição da FEB), ou seja, a de que os Espíritos desencarnados podem provocar fenômenos idênticos ou semelhantes aos que produzem os encarnados, pois o animismo confirma o Espiritismo.

É preciso deixar bem claro que ele chama de monodeísmo post mortem às fixações do Espírito desencarnado que leva anos ou séculos a pensar repetidamente, obsessivamente, as mesmas ideias, a evocar as mesmas lembranças, a revolver as mesmas cenas, a sofrer as mesmas dores.
           

Assombração: Um fenômeno Muito SérioParte 3
Hermínio C. Miranda
Reformador (FEB) Agosto 1976


Com o capítulo 6 penetramos pelo fascinante domínio da psicometria, que Bozzano considera como uma das hipóteses dignas de consideração no estudo dos fenômenos de assombração, em alguns casos específicos. Veremos isso.

Sempre preocupado com o espaço, creio desnecessário recapitular aqui as noções acerca da psicometria, questão, aliás, tratada pelo próprio Bozzano em um dos seus muitos trabalhos, também editado pela FEB, sob o título "Os Enigmas da Psicometria".

Lamenta o autor a impropriedade do termo psicometria, mas reconhece que ele está de tal forma implantado que seria prejudicial recomendar outro. Diz mais: que o fenômeno se reporta - se bem que com ligeira diferença - ao que os ocultistas chamam de "clichês astrais", os teósofos, de "impressões akásicas", e Myers, de "telestesia retrocognitiva", e, outros pesquisadores, de "persistência das imagens".

- Segundo a hipótese da psicometria - escreve Bozzano -, a matéria inanimada teria a faculdade de registrar e conservar em estado potencial toda sorte de vibração e emanação física, psíquica e vital, da mesma forma que a substância cerebral possui a propriedade de registrar e conservar em estado latente as vibrações do pensamento.

Haveria, pois, além da memória cerebral, uma espécie de memória cósmica que documentaria, como num vídeo tape, os acontecimentos verificados pelo universo afora. Acha Bozzano que a analogia é perfeita e que nada do ponto de vista científico, como as leis físicas ou fisiopsíquicas formuladas pela ciência, contrariam a hipótese.

O tema é deveras atraente e se presta a pesquisas e especulações que raiam pelo campo da ficção científica. A impressão que se tem é a de que este setor do conhecimento humano, ainda pouco explorado, guarda surpresas espetaculares em que teremos de nos haver com os próprios e misteriosos mecanismos do tempo. Mas isso é outra história.

Lembra Bozzano as especulações de Paracelso, Schopenhauer e Fechner sobre o assunto, e, de maneira mais específica, o Dr. Buchanan e seu discípulo Dr. Denton, que, com a esposa deste, fizeram interessantíssimas experiências, relatadas no livro "The Soul of Things" ("A Alma das Coisas") e em "Nature's Secrets or Psychometric Researches" ("Segredos da Natureza ou Pesquisas Psicométricas").

Recorda, a seguir, a hipótese formulada por Monsenhor Benson (publicada em "Light", de 1912, pág. 460), segundo a qual as tragédias, como um assassinato, impregnariam a substância das coisas materiais com vibrações de intensa emotividade emanadas das violentas cenas ali desenroladas, o que possibilitaria a visão posterior naqueles locais por pessoas dotadas de sensibilidade apropriada. Embora reconhecendo a força da hipótese, que é a da psicometria, ainda que não com esse nome, Bozzano declara-a insustentável, dado que existem inúmeros episódios aos quais ela não se adapta, e uma hipótese somente é aceitável quando nela cabem todos os fatos da mesma natureza.

Há, no entanto, algumas experiências curiosas que parecem justificá-la. Uma delas foi narrada à Sociedade Biológica de Paris, em 10 de fevereiro de 1894, pelo Dr. Luys.

Andava ele experimentando com uma espécie de coroa de aço imantada que colocava na cabeça de pacientes seus em estado de hipnose. A coroa circundava o crânio, deixando livre a região frontal. Certa vez, uma coroa fora utilizada na cabeça de uma mulher em estado de profunda melancolia, com ideia de perseguição, agitada e com tendência ao suicídio. O tratamento foi realizado cinco ou seis vezes com a referida senhora, e, em vista das melhoras que ela apresentou, o Dr. Luys deu-lhe alta após dez dias. Cerca de duas semanas depois ele colocou a mesma coroa na cabeça de outro paciente, um homem que sofria crises frequentes de histeria e letargia. Qual não foi sua surpresa ao verificar que o seu paciente, em estado sonambúlico, queixava-se dos mesmos sintomas da senhora que ele tratara anteriormente. Falava de si mesmo como se fosse do sexo feminino e mencionava perseguições, assumindo, enfim, a personalidade da doente que lhe precedera no uso da coroa imantada.

O Dr. Luys conclui que a coroa teria "conservado a lembrança de seu estado anterior". Embora ele afirme ter reproduzido esse fenômeno muitas vezes, por vários anos, com esse paciente e outros, não me parece muito conclusivo o seu trabalho. Não é de se desprezar a hipótese de que o homem, tido por histérico, com crises constantes de letargia, não fosse mais do que um médium a incorporar o mesmo espírito que se apossara da mulher doente, caso em que a coroa imantada seria apenas um suporte material da manifestação. É preciso, no entanto, evitar especulações ociosas com base em fatos escassamente documentados. De qualquer forma, não é fora de propósito a teoria de que os espíritos se ligam por tempo indeterminado a certos objetos ou locais, pois isso constitui a verdadeira essência do fenômeno de assombração.

Um caso desses é relatado por Katharine Bates, em seu livro "Seen and Unseen" ("Visível e Invisível").

Miss Bates hospedou-se numa pensão à Rua Trumpington, número 35, em Cambridge, em maio de 1896, e, embora estivesse viajando com uma amiga, ficou só por uma noite, pois a amiga fora a Shelford. Naquela noite, duas vezes durante a semana, ela teve o mesmo sonho, no qual lhe aparecia com insistência um homem que em tempos idos tivera com ela um profundo envolvimento emocional e que agora vinha queixar-se por não tê-lo permitido esposá-la. Ela despertava angustiada e, ao readormecer, o mesmo homem lá estava a queixar-se dela. O quarto parecia realmente assombrado. Miss Bates pôs-se tenazmente a investigar o caso, pois seu antigo amado havia estudado em Cambridge durante dois anos. Parecia, no entanto, algo fantástico que após 28 anos, em visita à cidade, ela fosse hospedar-se no mesmo quarto que ele ocupara então. E, no entanto, isso era estritamente verdadeiro, como ela apurou por processos que seria longo relatar aqui.

Mesmo assim, não sei se o episódio pode ser explicado como um fenômeno de psicometria. Acho que não, pela simples razão de que ela não vê ali o desenrolar de cenas que teriam ocorrido, como se o ambiente guardasse a memória dos acontecimentos, como é da essência do fenômeno psicométrico, mas, sim, ela vê, em sonhos - ou seja, desdobrada pelo sono - um ser humano que a censura por não ter concordado em casar-se com ele. Encontra-se ele, pois, num contexto atual, a reclamar de um evento passado, ocorrido há muito tempo. Ao que parece, o antigo namorado - que ela não esclarece se estava encarnado ou não à época do "sonho" - aproveitou a oportunidade de estar a sua amada em local no qual viveu para interpelá-la. Honestamente, não vejo aí as características da psicometria.

O caso seguinte, é relatado pela Senhora Denton, num dos seus livros já mencionados.

Aguardava ela, em companhia do marido e dos filhos pequenos, um trem que os levaria à cidade de Peru, no Estado de Illinois, nos Estados Unidos. Quando o trem parou, uma voz gritou aos passageiros, alertando-os de que dispunham de 20 minutos para jantar, e eles se precipitaram para a plataforma. Ela apanhou as crianças pela mão, enquanto o marido cuidava da bagagem. Grande foi sua surpresa ao ver que, ao contrário de sua expectativa, o vagão estava ainda cheio de gente. "Muitos passageiros - diz ela - continuavam sentados e imóveis como se lhes fosse indiferente acharem-se naquela estação, enquanto que muitos outros se preparavam para descer. Quanto a estes, eu os via confusamente."

No entanto, ela vira, pouco antes, todos descerem para jantar! Estava disposta a procurar outro vagão, quando observou que as figuras imóveis nos bancos começaram a se desfazer, deixando-a ainda com tempo para observar fisionomias e detalhes de suas vestes. Quando os companheiros de viagem voltaram do jantar, ela pode conferir algumas faces e as mesmas roupas que já havia visto.

Que se passou aqui? A hipótese da Sra. Denton é perfeitamente cabível. Ela acha que uma pessoa imobilizada durante algum tempo, no mesmo local, irradia em torno de si uma "espécie de fluido que, de alguma sorte, fixou-se na atmosfera e aí imprimiu sua imagem".

Isto parece confirmado por pesquisas recentes que, por meio de filmes especiais, conseguem obter fotografias ainda algo imprecisas mas suficientemente nítidas para mostrarem o contorno de figuras humanas que não se acham mais no local fotografado.

*

Os dois episódios seguintes, embora reproduzidos no capítulo dedicado à hipótese psicométrica, são extremamente complexos do ponto de vista teórico, como o próprio autor reconhece.

O primeiro foi narrado à Sra. Sidgwick, em documento datado de 7 de fevereiro de 1882, por uma das testemunhas oculares dos fatos.

A narradora havia ido à igreja da sua pequena cidade em companhia de uma irmã e da empregada.  A cerração velava um tanto a visão das coisas mas a lua aparecia circundada por um halo. Ao regressar a casa, depois da cerimônia religiosa, a narradora viu que uma pessoa caminhava em sua direção com a respiração sibilante. Aliás, ouviram-na mesmo antes de vê-la. Ela passou ao lado da irmã, e seguiu em frente. Pouco depois ela distinguiu outra pessoa que caminhava atrás de sua irmã, sem produzir o menor ruído ao caminhar. Como a irmã não a havia notado, ela puxou-lhe a manga e sussurrou-lhe, já algo assustada:

- Deixa esse homem passar.      

Enquanto dizia isso, viu o homem "desaparecer no corpo" de sua irmã. Embora caminhassem as três juntas, lado a lado, as outras não viram o homem, mas, ao cabo de alguns instantes, começou desenrolar-se, diante dos olhos atônitos das três, um espetáculo inesquecível e fantástico. A rua povoou-se instantaneamente de figuras apressadas: homens, mulheres, crianças e cães que se entrecruzavam, surgindo de todas as direções, e desaparecendo misteriosamente nas margens da estrada. Alguns vinham sós, outros em grupos, mas nenhum deles produzia o menor ruído, e todos se apresentavam com aquela mesma cor cinzenta que envolvia toda a paisagem, e desapareciam nas margens da estrada cobertas por uma vegetação rasteira. Com frequência, porém, as formas humanas sumiam também ao penetrar o corpo de uma das senhoras; enquanto outras pareciam surgir das margens da estrada para juntarem-se ao estranho e silencioso movimento. A medida que prosseguia a caminhada das três, renovava-se a multidão de seres. Alguns destes atravessavam-nas e ressurgiam do outro lado, seguindo sempre seu inexplicável destino. As formas eram de pequeno porte, quase anãs, exceto uma delas, que era de um homem de elevada estatura e que caminhou o tempo todo ao lado delas. As vestimentas dos homens eram antigas, bem como o penteado das mulheres, os xales, os casacos, as saias amplas. Para certificarem-se daquela fantasmagórica realidade, as mulheres começaram a trocar impressões em voz baixa, conferindo assim as visões. Quando uma delas apontava para um homem, por exemplo, as outras duas viam também um homem tal como descrito e assim por diante. O ar, acima, estava relativamente claro e os fantasmas caminhavam todos com os pés no chão, como gente normal. Em mais de uma oportunidade, viram dois homens estranhíssimos que traziam em torno do rosto uma auréola cintilante e que as encaravam com olhar zombeteiro. Um deles era uma figura repugnante, insuportável até de olhar-se. Enquanto isso tudo sucedia, o homem maior caminhava impassível ao lado delas, sem uma palavra, um ruído, nada. Os outros vultos continuavam a se entrecruzarem e a se perderem nas sombras do caminho. Se elas apressavam o passo, ele também o fazia, nunca, porém, voltando os olhos para elas. Ao chegarem à alameda que conduzia à casa onde moravam, as visões desapareceram, exceto a do homem grande.

- Tinha ele – escreve a narradora – um aspecto diferente dos outros fantasmas e era extremamente repugnante. Caminhava de maneira característica e era duas vezes maior do que os demais. Dir-se-ia que tinha um objetivo determinado, o que não parecia ocorrer com os outros fantasmas.

Ao entrarem pelo caminho que levava à casa delas, o fantasma do homem grande seguiu pela estrada, para imenso alívio das pobres e assustadas senhoras, passando por elas com o seu passo medido e firme.

- Quando nos viramos para olhar pela última vez, era ele a única forma visível.

O documento foi atestado pela irmã da narradora e minuciosamente investigado pela S.P.R. inglesa.  

                                                   *

Como afirma Bozzano, o episódio é "muito curioso" e profundamente embaraçante, dado que nenhuma hipótese conhecida consegue explicar todo os fenômenos testemunhados. Trata-se de uma visão coletiva, desenrolada “cinematograficamente”, como dizia Bozzano, o que torna a hipótese alucinatória “absolutamente insustentável”, pois, ao se entrecruzarem de um lado para outro, mostravam-se às observações sob ângulos diferentes a cada uma.

A hipótese psicométrica não tem melhor sorte, em vista da ação caótica da multidão fantasmal, mas principalmente porque não poderia explicar, como lembra Bozzano, as estranhas figuras com os rostos faiscantes, a estatura quase anã de praticamente todos eles e o comportamento do gigante que caminhou ao lado das testemunhas o tempo todo, ao contrário dos outros, que pareciam caminhar a esmo. Ao passo que o fenômeno psicométrico é, em essência, um “replay” de acontecimentos passados, de cujas vibrações impregnou o local ou o objeto que os presenciaram, há na manifestação, há pouco narrada, fenômenos incompreensíveis dentro da hipótese, como as figuras envolvidas em fagulhas, ao mesmo passo em que o caminhar deliberado do fantasma grande, ao lado das senhoras, implica, obviamente, uma ação presente e não passada.

A hipótese telepática também não serve, porque as dificuldades de acolher todos os pormenores são intransponíveis.

Diante disso, Bozzano não se arrisca a uma formulação teórica, e o caso permanece inexplicável.

Assombração: Um fenômeno Muito SérioParte 4
Hermínio C. Miranda
Reformador (FEB) Agosto 1976

            O outro caso, para o qual ele (Bozzano) propõe, mesmo antes de resumi-lo, a hipótese psicométrica, combinada com a que ele chama de “telepático-espírita", é não menos complexo nem menos fascinante do que as experiências anteriores.

O episódio tem sido mencionado com frequência na literatura espírita e consta in extenso do livro "An Adventure" ("Uma Aventura"), publicado em Londres, em 1911, pela editora Macmillan. A obra foi escrita pelas suas duas protagonistas sob os pseudônimos de Elizabeth Morison e Frances Lamont, e despertou o mais vivo interesse do público e da imprensa à época, em longos trabalhos especulativos, como no sisudo "Times", no "Mornlng Post" e no "Daily Telegraph".

As duas jovens inglesas foram, em agosto de 1901, a Versailles pela primeira vez, e, de lá, ao Petit Trianon, onde contemplaram cenas e paisagens com personagens que não existiam mais, e que, no entanto, haviam existido à época da Revolução Francesa.

Somente uma semana após a fantástica experiência é que as duas moças começaram a desconfiar de que havia algo estranho na visita ao famoso palácio, mas levaram três meses para se convencerem da sua realidade. Empenharam-se, daí em diante, numa pesquisa histórica das mais meticulosas para reunir todos os elementos de que necessitavam para documentar os fatos que presenciaram. Somente ao cabo de 9 anos de estudos sentiram-se em condições de escrever o livro... Como eram filhas de sacerdotes da Igreja Anglicana, não estavam habituadas a práticas espíritas nem a pesquisas metapsíquicas, muito embora tenham demonstrado com a notável experiência que viveram, evidentes dom mediúnicos. Estavam, no entanto, bem preparadas intelectualmente para a tarefa nada fácil de relatar com fidelidade o caso, em narrativas independentes, sumarizadas três meses após os fatos observados. A essência do episódio, não obstante, já havia sido fixada dentro de uma semana, em carta que Miss Morison escrevera a uma de suas amigas.

- Vamos tentar um resumo, com base no relato de Miss Morison.

Após visitarem Versailles, as duas decidiram ir também ao Petit Trianon. Parece que, nesse ponto, mergulharam no passado. Dirigiam-se a dois guardas de aspecto sombrio e preocupado, vestidos de libre verde e com chapéus tricórnio, para pedir informações e seguiram caminhando e conversando animadamente. De certo ponto em diante, porém, Elizabeth Morison começou a experimentar inexplicável e crescente sensação de opressão. No ponto em que a trilha que seguiam cruzava outra, encontraram-se diante de um pequeno bosque à sombra do qual havia um quiosque circular e uma cascata.

Ao lado dessa pequena construção estava um homem sentado. Não havia ali bonitos gramados nem belas árvores; o chão estava coberto de mato e folhas mortas. As árvores pareciam sem vida, como as de um cenário de teatro. A inexplicável sensação de opressão intensificou-se quando o homem fixou nelas seu olhar. Tinha um “ar” repugnante, a expressão de “ódio", a aparência rude. Enquanto e decidiam por que caminho seguir ouviram ruído de alguém que corria desabaladamente pela trilha, mas, voltando-se, para ver do que se tratava, não viram ninguém; notaram, porém, atrás delas, outro homem, este de aparência distinta, alto, olhos grandes, cabelos encaracolados, chapéu de abas largas. Elas o acharam multo belo e semelhante a uma gravura antiga. Estava, extremamente excitado e se dirigiu a elas em alta voz, dizendo que não era preciso passar por lá. E estendendo o braço, acrescentou com vivacidade:

- Por que aqui? Procurem a casa.

Miss Morison não podia atinar com os motivos de tanta excitação no jovem e simpático cavalheiro, mas como o roteiro indicado por ele coincidia com o que ela havia escolhido, elas seguiram em frente.

O desconhecido ainda as olhou "com um estranho sorriso". Quando ela virou-se para agradecer, o homem havia desaparecido. Ao se aproximarem da "casa", indicada pelo informante, ou seja, o "Petit Trianon", as moças viram outra figura humana (Maria Antonieta?);

- Sentada sobre a relva, de costas para o terraço, havia uma senhora ocupada em olhar atentamente um cartão que segurava com o braço estendido. Supus que ela se divertia fazendo um esboço do grupo de árvores que se encontrava diante dela. Quando passamos por ela, ela virou-se para nos olhar. Não era muito jovem, e, a despeito de ser bonita, não me atraiu.

Segue-se a descrição dos trajes da senhora com as minúcias de que somente outra mulher é capaz. Eram roupas completamente fora de moda.

Persistiam as estranhas sensações, especialmente intensificadas depois que as jovens subiram para o terraço onde Elizabeth Morison teve a impressão de "encontrar-se num ambiente de sonho." Reinava ali um silêncio mortal que lhes parecia opressivo e anormal. Novamente olhou para a senhora sobre o gramado, agora de costas, e observou que seu vestido era verde-pálido. Quando atravessavam o terraço, abriu-se uma porta e por ela saiu um jovem que a fechou em seguida com certo ruído. Tinha as maneiras desenvoltas, mas não se vestia de libré. Dirigiu-se as moças e deu as indicações de que elas precisavam para  encontrar a "Cour d’honneur” do palácio.

- Quando chegamos à soleira - escreve ela - reencontramos subitamente nosso bom humor.

Agora, algumas observações necessárias: nenhuma das pessoas vistas existia, bem como uma parte considerável da paisagem, inclusive o quiosque e a cascata diante da qual haviam parado para falar com o primeiro informante, o belo cavalheiro distinto. O mais estranho, porém, é que os jardins do Petit Trianon estavam àquela hora abertos à visitação pública e, por certo, animados pelas vozes e risos de muitas pessoas que caminhavam pelas aleias. Em suma: as moças viam o que não existia e não viam o que existia em torno delas.

Segue-se uma longa é cuidadosa análise de Bozzano que acrescenta outros pormenores à fascinante narrativa de Miss Morison.

- Foram necessários nove anos – escreve Elizabeth Morison - de laboriosas pesquisas para acumular os dados que demonstram as peculiaridades da nossa experiência, justificando nossa convicção de que, do momento em que colocamos o pé à soleira do Trianon, caminhamos sobre terreno encantado.

Como explicar tudo isso, de uma realidade inegável? Seria uma transmissão telepática do espírito sobrevivente de Maria Antonieta, como parece admitir a autora? Um fenômeno psicometria durante o qual as jovens sensitivas desentranharam daqueles locais as esquecidas, mas indeléveis vibrações de um dramático passado? Como explicar, porém, ante essas duas hipóteses, o fato de que elas se encontraram com pessoas que as olharam, deram indicações precisas sobre roteiros a seguir? E o aspecto algo artificial das árvores da primeira cena?

O professor Hyslop, citado por Bozzano, após analisar o caso, conclui tratar-se de uma nova ilustração da possibilidade para os vivos de tomarem conhecimento de fatos ocorridos num passado distante, e isto, provavelmente, em virtude de “ligações telepáticas com os defuntos” interessados nos acontecimentos em questão.

Bozzano conclui observando que esse parágrafo contém a hipótese telepático-espírita que tenho defendido neste livro e que se prestará, sem dúvida alguma, a explicar os fatos de maneira bastante mais satisfatória.

Para Bozzano, a coisa parece tão óbvia por si mesma que se dispensa do trabalho de demonstrar a futilidade de hipóteses formuladas por eminentes autores como Willian James e Théodore Flournoy (1), que se prevaleceram da psicometria, certos de que ela seria capaz de explorar todas as manifestações supranormais de ordem inteligente, de modo a substituir ou, pelo menos, a tornar supérflua a necessidade de recorrer às intervenções espirituais.”

(1) Ver, sobre Flournoy, o artigo “Das índias ao Planeta Marte”, Reformador e novembro de 1972

Na segura observação do meticuloso pesquisador italiano, os ramos da metapsíquica são ligados entre si por um elemento causal comum, de sorte que a hipótese que não resolve os mistérios de um deles não resolve em nenhum deles.

Resta, ainda, um longo capítulo sobre fenômenos de poltergeist, que se estende da página 209 à 294, Bozzano inicia sua exposição com uma longa teorização, uma vez mais lembrando que, embora o fenômeno se apresente sob forma objetiva ou mediúnica, a classificação geral das manifestações supranormais entre objetivas e subjetivas é meramente convencional, dado que, na maioria das vezes, os fenômenos observados não se prestam nitidamente à separação numa ou noutra forma. Diria, pois, que uns seriam manifestações predominantemente telepáticas e os outros predominantemente mediúnicas, mas que, "no fundo, a inteira fenomenologia é uma só".

Os fenômenos de poltergeilt em tanto à noite como durante o dia, “parecem ser regulados por uma forma qualquer intencional que se concretiza, às vezes, em uma personalidade oculta capaz de entrar em ligação com os assistentes”. É possível, por isso, dialogar com tais personalidades por meio de um código convencionado - batidas, sinais etc. - e com frequência se percebe que elas são capazes de ler o pensamento dos assistentes. Os fenômenos, por outro lado, estão sempre relacionados com a presença de um sensitivo, mais frequentemente uma jovem adolescente, às vezes, um rapazinho.

Acresce que, devido a certa espetaculosidade, que é da própria essência do fenômeno, os casos de poltergeist rapidamente viram noticia e começam ao ser investigados, quase sempre, por equipes policiais despreparadas, voltadas apenas para a ideia fixa de apanhar o "engraçadinho" que se empenha em promover aquelas "brincadeiras de mau gosto". Enquanto isso, o público leitor que segue as notícias aceita a versão policial e sorri com superioridade daqueles que se dedicam, em seriedade, a pesquisar as causas do fenômeno. De certa forma, porém, esse quadro tem seus méritos, porque, a despeito de toda a vigilância e interesse em apanhar o autor das proezas, os fenômenos continuam a ocorrer e acabam por ficar muito bem documentados nos relatórios da polícia, e nas reportagens sensacionalistas.

Outra característica do fenômeno - lembra Bozzano, é a sua grande uniformidade, "que se mantém em todos os tempos e em todos os lugares". Distinguem-se dos fenômenos normais de assombração por serem de curta duração, enquanto que aqueles, às vezes, duram séculos. Parece também haver neles uma causa local, além de mediúnica, pois frequentemente eles cessam quando se afasta o médium. Como muito bem observa o eminente cientista italiano, as manifestações são nitidamente intencionais. Inúmeros fenômenos parecem indicar uma clara intenção de criar dificuldades a fim de assustar e acabar expulsando de uma casa os habitantes que os desencarnados parecem considerar como intrusos.

É fácil de compreender tais disposições em seres que desencarnaram, mas não se desprenderam da paixão da posse de seus bens e continuam "do lado de lá" a se sentirem donos de suas casas e dos objetos e móveis com os quais conviveram. Por isso, o fenômeno é localizado.

Cabe referir, ainda, que Bozzano lembra aqui também a possibilidade de tais ocorrências resultarem não apenas de manifestações essencialmente espíritas, como também anímicas, o que as levaria à classificação de fenômenos de telecinesia, na terminologia parapsicológica. Uma hipótese não exclui a outra, porque elas se completam e podem até coexistir. Em outras palavras: se o Espírito desencarnado é capaz de provocar efeitos físicos, o Espírito encarnado também pode fazê-lo.

Creio, porém, que não se deve atribuir demasiado valor às condições locais, como se elas pudessem predominar até sobre a própria condição da mediunidade ou seja, como se pudessem ocorrer fenômenos de efeito físico sem a presença de alguma forma de mediunidade específica.

A coletânea de fenômenos de poltergeist bem observados e bem documentados é muito grande, respeitável e mesmo indiscutível, exatamente por ser um tipo de manifestação amplamente conhecido através do tempo, em inúmeros locais, sob as mais variadas condições. O comportamento dos corpos materiais, no bojo dessa interessante fenomenologia, é totalmente incompreensível se nos amarrarmos inarredavelmente às leis conhecidas da física. Objetos sólidos pesados, como pedras, talheres e pratos, por exemplo, descrevem trajetórias totalmente inabituais, param no ar, deslocam-se em linha ondulada e ou quebrada, aceleram ou diminuem velocidade da queda, parecem surgir do nada, caem abundantemente em torno de várias pessoas sem ferir ninguém (às vezes ferem deliberadamente também). Enfim, uma gama enorme de efeitos surpreendentes somente explicáveis se admitirmos que forças conscientes manipulam tais objetos com um fim deliberado. As manifestações são às vezes acompanhadas de vozes, de sons, de música, de gritos, de risos, como também ocorrem em desrespeito às leis de propagação do som. Corpos sólidos atravessam outros corpos sólidos, sem rompê-los. As pedras e objetos comumente apresentam-se mornas ou extremamente quentes como se tivessem passado por um violento processo de desintegração e reintegração, à custa de incalculáveis  dispêndios de energia física.

Resisto bravamente ao impulso de reproduzir alguns casos interessantes de poltergeist relatados por Bozzano, a fim de não prolongar ainda mais este artigo, mas não posso deixar de referir dois dos mais interessantes e bem documentados, ambos, aliás, recolhidos pelo eminente pesquisador russo Alexandre Aksakof.

O primeiro foi incluído em um livro de Aksakof sob o título de "Os Precursores do Espiritismo nos últimos 250 Anos". O caso passou-se numa pequena cidade russa e, por se ter desenrolado num imóvel de propriedade do governo, foi minuciosamente e escrupulosamente investigado e posteriormente relatado em documentos oficiais.

Em janeiro de 1853, um certo Capitão Jandachenko comandava um destacamento milltar em Lipsty, residindo com a esposa numa casa de 4 cômodos, cedida pelo governo local ao comandante da unidade. Além do casal, moravam na casa duas empregadas e três soldados, um dos quais era o ordenança do capitão.

Em 4 de janeiro, a coisa começou. Quando os servidores apagaram a luz, para dormir, ouviram-se várias batidas, enquanto alguns copos de madeira foram atirados em várias direções, na cozinha.

Quando a luz se acendeu novamente os objetos continuaram a voar daqui para lá, movendo-se, no entanto, quando ninguém os olhava.

No dia seguinte, o capitão procurou o sacerdote local para contar o ocorrido, e, no dia 6, o sacerdote lá foi à casa com alguns acólitos. Logo ao entrar, uma pedra precipitou-se no corredor. Em seguida, uma terrina cheia de sopa caiu-lhe aos pés, embora - diz ele - eu estivesse rodeado pelos acólitos munidos de ícones. (1)

(1) o ícone é uma Imagem ou um quadro representando o Cristo, a Virgem ou algum santo da Igreja ortodoxa grega ou russa.

Ouviram-se, depois, várias batidas. O capitão acrescentou que, ao ser aspergida a água benta, uma acha de lenha destacou-se da pilha e foi lançada com grande estrépito sobre a porta.

Outro sacerdote que visitou a casa, dias depois, assistiu a nova série de fenômenos, como o de uma garrafa de verniz que voou pelos ares e espatifou-se na porta do corredor. A garrafa, segundo testemunho do capitão, estava fechada a chave num armário do salão.

A exibição não desanimou os bravos sacerdotes. Voltaram no dia seguinte com o que o autor da narrativa classifica de "artilharia pesada" de seu ministério, reforçados com um terceiro padre, muitos acólitos, numerosos ícones e, naturalmente, nova provisão de água benta. Seria um ritual religioso dos mais completos e solenes.

Mal começaram, uma pedra estilhaçou o vidro da janela da cozinha. Depois disso, um pedaço de pau e um balde d’água levantaram voo a partir da cozinha e a água do balde derramou-se à vista dos pobres sacerdotes. O pior, porém, aconteceu quando uma pedra, vinda não se sabe de onde, precipitou-se, sem a menor cerimônia, dentro da vasilha que continha água benta! A água foi aspergida com certa pressa e os sacerdotes trataram de abandonar prudentemente a casa, deixando seus assustados moradores entregues à própria sorte.

Os fenômenos continuaram, a despeito de outro ritual de exorcismo requisitado pelo aturdido capitão. No dia seguinte ao do exorcismo, o leito em que dormia o casal pegou fogo. E enquanto eles o apagavam de um lado, o fogo recomeçou do outro. Ao mesmo tempo, dois pedaços de tijolo chocavam-se continuamente contra a janela, reduzindo quatro vidros a cacos.

Nessa altura, o capitão resolveu abandonar a casa, mas tentou, antes, um quarto exorcista que parece ter obtido algum êxito, porque os fenômenos se reduziram por algum tempo a certos gemidos lúgubres. Ao cabo de alguns dias, tudo recomeçou. Dia 22 o capitão convidou vários amigos e os fenômenos se realizaram na presença de todos. O ordenança, soldado Vasil, foi ferido ligeiramente por uma faca que voou na sua direção. As coisas iam de mal a pior. A casa ficou sob vigilância permanente de soldados, mas tudo em vão, até que, a 23, após a meia-noite, o teto incendiou-se e em pouco tempo o imóvel ficou totalmente destruído. Foi impossível conter o fogo, porque os bombeiros eram recebidos por "nuvens de fumaça densa e fétida atiradas ao rosto".

Os fenômenos, porém, acompanharam o capitão na sua nova residência. Os objetos continuaram a voar de um lado para outro. Dia 24 de junho, às oito horas da manhã, o teto pegou fogo, mas foi possível extinguir as chamas. As três horas da tarde, novo incêndio, iniciado no celeiro, também foi extinto graças à bravura e iniciativa de um soldado, mas, às cinco horas, as chamas irromperam novamente de vários pontos do teto e não somente a casa do capitão, mas quatro outras foram totalmente destruídas.

Rigorosa investigação oficial foi então realizada, mas serviu apenas para registrar os fatos e documentá-los com o selo da fé pública, pois nada havia a fazer. Três anos depois, nova sindicância inútil, do ponto de vista prático, pois não havia o que julgar, condenar ou absolver na justiça comum, e os juízes concluíram inconclusivamente, se assim podemos dizer, que "nenhuma suspeita existia contra quem quer que fosse". O processo foi remetido ao arquivo e lá é que o ilustre sábio e Conselheiro de Estado Aksakof foi consultá-los para o seu relato.

*

O outro caso foi aproveitado por Aksakof em seu livro "Animismo e Espiritismo" e se passou na residência de um senhor Shchapoff, na cidade de Iletsky, nos Urais, Rússia. O relato de que se serve Bozzano é do próprio Shchapoff.

Chegando a casa em 16 de novembro de 1870, após ausência de alguns dias, este senhor encontrou a esposa profundamente impressionada com alguns estranhos fenômenos ocorridos na casa, o que ele procurou levar à conta de brincadeira. A família compunha-se da esposa, uma criança de peito, a mãe do dono da casa e a sogra, bem como uma cozinheira e mais dois empregados.

Na noite do dia 14, como a menina se mostrasse inquieta e agitada, a jovem senhora havia pedido à empregada que tocasse um pouco de acordeão para acalmá-la. Pouco depois, com a menina já adormecida, a Sra. Shchapoff conversava com uma vizinha quando tiveram a impressão de ver passar por elas um vulto, diante da janela aberta. Iam sair para verificar, quando irrompeu num cômodo da casa o som do acordeão executando a mesma música que a empregada tocara antes, desta vez, porém, acompanhada de danças. Pensaram, naturalmente, que a artista doméstica estivesse a exercitar-se, embora aquela hora imprópria, mas encontraram-na dormindo profundamente. Desperta, ajudou os outros habitantes da casa, e mais a vizinha, na busca infrutífera por toda parte, enquanto a música e as danças prosseguiam, e na verdade prosseguiram pela noite a dentro, até madrugada, não deixando ninguém dormir.

Na noite seguinte, às dez horas, recomeçou o estranho baile, que varou a noite, sem que alguém pudesse descobrir a causa do fenômeno.

O Sr. Shchapoff, no entanto, não estava convencido. Fez uma prelação à esposa sobre os riscos da superstição, e não pensou mais no assunto. A noite, após o chá, a casa posta na maior tranquilidade, apanhou um livro para ler. Após duas horas de leitura, começou a música e o bailado fantasmagórico, sendo que o som parecia provir de um ponto debaixo da cama da sua esposa, aliás, profundamente adormecida. Enquanto ele se achava cautelosamente investigando o assunto, ouviu pancadas ritmadas sobre o vidro da janela, no quarto dela, como se tamborilados por alguns "dedos carnudos". Pouco depois o som tornou-se mais nítido, batido agora - supunha ele - pelas unhas. Nesse momento, ouviu-se um golpe violento que acordou a jovem senhora e, enquanto conferiam suas impressões, pois ele lhe perguntava se fora ela quem fizera o ruído, ouviram bater à janela do quarto contíguo. Foi ele para lá e escondeu-se perto da janela, em tensa expectativa, a olhar para fora, sob o luar claro da noite. Foi quando soaram dois golpes do lado de dentro, na parede, à altura de seus ouvidos, tão violentos que - diz ele - "ecoaram pela casa toda como um terremoto".

Nesse ponto, ele pôs um agasalho, chamou o jardineiro, apanhou o fuzil e foram dar uma batida em torno da casa, acompanhados dos cães soltos, a fim de apanharem o culpado. Nada! A lua brilhava tranquila e claríssima sobre o manto de neve, onde não havia rastro nem de gente nem de animal.

Ao retornarem a casa, foram informados de que a dança não se interrompera. Subiram à mansarda, de onde parecia provir, e tudo silenciou, mas nada encontraram. Quando desciam a escada, o balé fantástico recomeçou.

No dia seguinte, as manifestações foram menos violentas e, após dois dias, cessaram por completo.

No dia 20 de dezembro, porém, o Sr. Shchapoff teve a ideia de pedir à empregada que tocasse seu acordeão e dançasse um pouco para algumas visitas, e, mal começou ela a "performance", o ritmo passou a ser acompanhado pelas batidas habituais nos vidros da janela. Os fenômenos duraram até cerca de meia-noite. Na noite seguinte, recomeçaram, desta vez acompanhados por deslocamentos de objetos, que voavam daqui para ali e se chocavam contra o chão, as paredes ou o teto. Havia uma particularidade nesses choques: objetos macios chocavam-se com estrépito, enquanto objetos mais pesados e sólidos, caíam mansamente, sem ruído.

Em 8 de janeiro, a senhora viu sair um pequeno globo luminoso de sob a sua cama, crescer de tamanho e desaparecer. Na noite seguinte, os fenômenos duraram até às 3 horas da manhã e pareciam agora acompanhar a jovem senhora, pois aconteciam sempre à sua volta.

Ante aquela série impressionante de manifestações, a família resolveu abandonar a casa por um mês, deixando apenas os empregados. Tudo voltou à calma. Certo dia em que o Sr. Shchapoff visitava a casa em companhia de um amigo, pediu à empregada para tocar e dançar, mas nada aconteceu.

Em 21 de janeiro, voltaram e, com eles, os fenômenos. Assim que a esposa deitava-se para dormir começavam os golpes e os objetos disparavam a voar de um lado para outro. Com receio de algum acidente mais sério, pois uma faca foi atirada com grande violência, trancaram os talheres num armário, mas, mesmo assim, eles eram misteriosamente retirados e continuavam a voar em todos os sentidos.

Dia 24, à noite, certificaram-se de que o fenômeno era inteligente, pois acompanhava os diferentes ritmos de algumas canções que cantaram com um amigo da família. A resposta era inteligente, até mesmo para os ritmos "modulados mentalmente". Estabeleceu-se então o seguinte diálogo precário, mas suficiente para se formular um juízo:

- Você que se manifesta é um homem?

Silêncio.

- É um Espírito?

Um golpe.

- Bom?

Silêncio.

- Mau?

Dois golpes violentos.

Ao tentar identificar o Espírito por um nome, os circunstantes não foram muito felizes, mas, depois de muita hesitação e temor, o dono da casa pronunciou o nome do demônio e deu-se um rebuliço terrível ao recuarem todos espavoridos ante o tremendo golpe sobre a porta.

Houve outros diálogos com "a força", mas Bozzano salta sobre eles para prosseguir a sua longa citação deste caso tão interessante. Uma comissão de três pessoas de excelente nível intelectual foi designada pelo Governador da Província para investigar a fenomenologia. Instalaram-se em casa do Sr. Shchapoff com seus aparelhos e, sem tardança, as manifestações começaram: objetos voadores, ruídos, diálogos codificados com "a força". Shchapoff e a esposa consentiram em ser observados na cidade, por dois médicos, um dos quais, o Dr. Dubinsky, não conseguia aceitar a validade do fenômeno. Primeiro, disse que a pobre senhora produzia os ruídos com a língua, mas, ao obrigá-la a ficar com a língua de fora, verificou que os sons continuavam. Depois, achou que eram as batidas do coração dela! Como se sabe, até hoje, vale tudo em matéria de "explicação", para muita gente.

A influência de Dubinsky sobre a comissão foi decisiva, ao declarar que fenômenos semelhantes já haviam sido investigados antes e acabavam sempre em revelações mais ou menos engenhosas de fraude. A comissão, que estava inclinada a atestar os fatos, recuou, e a família Shchapoff teve o desprazer de ler no jornal local um relato assinado pelos três membros - um dos quais era o próprio diretor do jornal -, declarando que os fenômenos eram devidos a ação exclusivamente humana. Logo em seguida, recebeu o Sr. Shchapoff um ofício do Governador, dizendo que a investigação havia apurado que os fenômenos eram perfeitamente explicáveis e, por conseguinte, ficava ele advertido de que incorreria em punições severas se eles voltassem a produzir-se.

Qual não foi, pois, a aflição da família, quando, aí pela altura do mês de março, recomeçou o espetáculo, mesmo na ausência da jovem esposa que parecia ser a geradora de energias que alimentavam a fenomenologia. Um incidente algo espetacular ocorreu logo de início: o sofá, em que estava sentada a velha senhora Shchapoff, deu quatro saltos no assoalho, deixando-a em pânico, enquanto o filho presenciava a inusitada cena, em plena luz do dia.

Daí em diante, os fenômenos se intensificavam. Certa noite, destacou-se de um lavabo na sala uma fagulha azulada que deslizou rapidamente em direção ao quarto da senhora e lá ateou fogo num "peignoir" de algodão que se encontrava sobre uma pequena mesa de canto. As chamas foram extintas pela sogra do dono da casa, que ali se achava providencialmente.

Enquanto o Sr. Shchapoff passou dois dias na cidade, confiando a guarda da sua casa a um vizinho e amigo, repetiram-se os fenômenos luminosos com fagulhas deslizando daqui para ali. Numa dessas oportunidades as vestes da senhora pegaram fogo e, ao socorrê-la, o vizinho ficou com as mãos gravemente queimadas. De outra vez, foi o leito dela que se incendiou.

Em outra oportunidade, estavam a conversar o vizinho e um dos empregados, quando ouviram um grito desesperado no interior da casa. Acudiram espavoridos e deram com a senhora envolta numa coluna de fogo, que a cercava por todos lados. Novas queimaduras para o dedicado vizinho, que conseguiu extinguir o fogaréu. Desmaiada, com a roupa carbonizada, foi ela conduzida para um leito, mas sem queimaduras.

Era o fim. Nessa mesma noite deixaram a casa fatídica e foram dormir na vizinhança, com uma família de cossacos, onde ficaram por algum tempo. A casa assombrada foi vendida, e quando a família mudou-se para outra os fenômenos felizmente não a acompanharam.

O Sr. Shchapoff relata ainda fenômenos curiosos de materialização de mãos em várias oportunidades.

Observa-se, portanto, neste caso, uma grande riqueza de fenômenos: efeitos sonoros, luminosos, materializações, deslocamentos de objetos, além dos diálogos, o que leva Bozzano a ressaltar, mais uma vez, "a unidade fundamental de todas as manifestações metapsíquicas, sejam elas espontâneas, como nos fenômenos de assombração, seja nas provocadas como nas sessões experimentais".

Ao analisar o caso com a sua costumeira precisão e clareza, Bozzano mais uma vez insiste numa das poucas teses com as quais não me sinto muito à vontade, ou seja, a da causa local.

Como os fenômenos não se produziram mais na nova residência, conclui ele que a causa suficiente das manifestações não estava na mediunidade da jovem senhora. E prossegue:

- Pode-se, portanto, concluir que os fenômenos de assombração se produzem quando se combinam dois fatores igualmente necessários: a presença de um sensitivo num ambiente mediunizado.

Não me parece que a questão deva ser colocada de maneira tão dogmática, embora seja de admitir-se considerável influência do ambiente. Não, porém, pelas razões que invoca o eminente pesquisador, pelo menos a meu ver. Ao que suponho, ele não examinou uma hipótese inteiramente válida, que explicará muito melhor o fato, mesmo porque, em inúmeros exemplos, os fenômenos acompanham as pessoas em novas residências, como vimos, há pouco, no caso do Capitão Jandachenko. Nas manifestações que acabamos de relatar, parece bastante evidente que um Espírito desencarnado (ou mais de um) desejava apenas expulsar a família daquela casa. Conseguido seu intento, ele deixou em paz seus ex-inquilinos. Quanto à óbvia mediunidade da Sra. Shchapoff, nada mais se diz dela, mas é de esperar-se que a faculdade permaneceu com ela, ainda que inativa. Não vejo razão para invocar a teoria do ambiente mediunizado para explicar o fenômeno, de vez que o ambiente é apenas cenário passivo da ação desenrolada e não componente ativo desta.

É notável, ainda, neste caso, o fato de que as chamas que atingem a senhora não lhe causam dano algum, ao mesmo tempo que provocam graves queimaduras na pessoa que a socorre por duas vezes.

Conclui Bozzano que "a origem espírita dos fatos não deixa dúvida alguma".

Há, ainda, um caso misto que o autor extrai do livro de Robert Dale Owen, intitulado "Footfalls on the Boundary of Another World", em que fenômenos físicos se mesclam a fenômenos intelectuais, além de notável manifestação de voz direta, em repetidas ocasiões, no seio de uma família inglesa.

*

Segue-se um capítulo final de conclusões, do qual extrairemos apenas os últimos períodos, por mais que nos atraiam as inteligentes discussões do autor:

- Recapitulemos, portanto, dizendo que, segundo a análise comparativa aplicada aos fenômenos de assombração, conseguimos colocar em evidência que a hipótese espírita, compreendida sob as duas formas de transmissão telepática do pensamento entre mortos e vivos e de manifestações de defuntos pela mediunidade, é a única verdadeiramente suscetível de explicá-los na maior parte dos casos, ao passo que as hipóteses da "telepatia entre os vivos" e da "psicometria" e a do "animismo", se é que são necessárias à plena compreensão dos fatos, não podem ser consideradas senão como hipóteses complementares. (O destaque é da tradução francesa.)

Pouco restaria a dizer, mas é preciso ressaltar, ainda uma vez, que não faltam pesquisas sérias e extremamente bem documentadas sobre enorme gama de fenômenos mediúnicos. É mais fácil rir dessas manifestações, e até mesmo ridicularizar os pesquisadores que a elas se dedicam, do que contestar as conclusões de um trabalho de fôlego, como o de Bozzano. Vemos, aliás, que, em muitos dos casos relatados, encontramos o chamado "espírito forte", o qual plantado, pelo menos de início, numa posição de olímpica superioridade, procura descartar o fenômeno com uma atitude muito cômoda de descrença ante tais "superstições populares". A muitos desses, o sorriso morreu cedo nos lábios, amarelo de medo, de surpresa ou de perplexidade. Outros preferiram ficar do lado mais tranquilo, junto aos que não querem investigar o assunto para continuarem a desempenhar com seriedade o papel de "espíritos fortes". É importante, porém, observar que não falta hoje, para o estudioso de boa-vontade, material para exame e meditação. Varia, porém, ao infinito a reação das criaturas. Mesmo entre aqueles que se convencem da realidade dos fenômenos encontramos os que preferem arquivar o assunto na memória ou numa gaveta de coisas sem importância, dizendo que são vulgares e inúteis os fenômenos. Bozzano responde também a estes.        

De fato, é vulgar, em si, o fato de uma faca de cozinha ou uma pedra voar de um, lado para outro. É vulgar a resposta de uma "força inteligente" que deseja passar pelo demônio. No fundo, porém, a própria vida é vulgar, quotidiana, rotineira, sem grandes e espetaculares lances. Além do mais, são vulgares muitos dos Espíritos desencarnados, tal como muitos dos reencarnados. O grande argumento de Bozzano, não obstante, é o de que os fenômenos de assombração escolhem sempre a linha de menor resistência, numa espécie de economia energética, o que é bastante provável.

É tolice, porém, dizer que são inúteis, porque, na vulgaridade da sua aparência, revelam eles uma essência de tremenda importância para todos aqueles que buscam respostas claras e aceitáveis às indagações humanas, desde o mistério da vida até os segredos da "morte".

O livro da vida está aberto diante de nós, as palavras nele escritas fazem sentido e nos contam a história fascinante da evolução humana em direção à paz espiritual. Agora, se bocejamos e dormimos em cima dele, quando acordarmos, um dia - onde? quando? como? -, descobriremos, constrangidos e decepcionados conosco mesmos, que o relógio cósmico seguiu em frente e nós ficamos.

Enquanto escrevo isto, lembro-me do pungente depoimento do nosso amado Emmanuel. Um dia, como orgulhoso senador romano, recebeu o convite à vida dos lábios do próprio Cristo. Resolveu "deixar para depois"... E, por isso, somente após um punhado de séculos acordou para descobrir que o tempo havia passado, a glória efêmera se dissolvera e era preciso recomeçar tudo de novo, pois até então estivera a caminhar e viver como um sonâmbulo...