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segunda-feira, 6 de junho de 2011

'Um gosto e 4 vinténs'




‘Um gosto e 4 vinténs’

por  Luciano doa Anjos
em Reformador (FEB) Janeiro 1970
           
Ensina-nos a Doutrina Espírita, ser a universalidade do ensino uma das condições para que se conheça se os Espíritos ‘são de Deus ou não’. É claro que não é esta nem a principal nem a mais importante das exceptivas. Um ensinamento nocivo pode, tanto quanto um honesto ensinamento, ser universalizado pelos agentes das trevas. Os Espíritos, livres que são, tem a natural capacidade de se movimentar na Espiritualidade a ponto de ‘ensinarem’ do Além, através de vários médiuns, em muitos pontos da Terra, que Deus não existe. Na Inglaterra, por exemplo, são numerosíssimas as comunicações, em diversos e diferentes locais, ‘ensinando’ a mentira da lei da reencarnação. Lembro-me da última linha do notável romance ‘Um gosto e seis vinténs’, onde Somerset Maugham diz que ‘o diabo pode sempre citar a Escritura em proveito próprio’...
Logo, a universalidade do ensino há de ser sempre um dos aspectos da autêntica Revelação, mas jamais o “punctum saliens”. A lógica, o bom senso, o exame cuidadoso da matéria, eis os elementos de maior prevalência e melhor supremacia. Há na intimidade de cada ser um critério indefinível e fundamentalmente subjetivo que conduz ao entendimento das grandes e transcendentes verdades. Tal como a certeza de que Deus existe, nascida indiferentemente no espírito do silvícola ou no do gênio. É fundamental partirmos dessa premissa, pelo menos nós, os deístas, pois que do contrário jamais teremos recursos para entender o critério de verdade. Problema, aliá, de extrema gravidade, o critério de verdade preocupou sempre todos os filósofos de todos os tempos. A grande maioria deles forma ao lado da corrente de pensamento cartesiana, segundo a qual esse critério estaria na evidência. Seja como for, é essencial que, pelo menos nós, os espíritas, não apenas comunguemos também dessa solução cartesiana (por ser sem dúvida a melhor, em face inclusive da natureza da Revelação Espírita, toda ela assentada na evidência de fatos), mas além disso raciocinemos com Bezerra de Menezes, quando nos diz que o melhor  critério de verdade está na medida com que exalçamos ou minimizamos a magnificência do Criador (vide meus artigos “O Dogma Espírita”, publicados em ‘Reformador’ de Janeiro e Fevereiro de 1964.
Ora, se o problema da verdade reúne tamanha complexidade e tão embaraçosa dificuldade, não poderia, no campo de estudo da Revelação, estra definido apenas através da lei da universalidade do ensino. seria simplório demais. E, convenhamos, tanto o Cristianismo de jesus, quanto o Espiritismo de Kardec, não nos bastam à alma e ao raciocínio porque tiveram mais de um divulgador. Ambos, ainda que através duma única voz, atenderiam sem dúvida à nossa ânsia de saber d evoluir, porque trazem, na medula da sua mensagem, a lógica, o bom senso, a razão, a evidência e a autarquia.
Eis porque, meu caro leitor, nada contribuiria mais para desmerecer a ‘Revelação da Revelação’, de J.B. Roustaing, se porventura a verdade ali contida tivesse ficado apenas no trabalho mediúnico da extraordinária médium Collignon. Nada obstante, não foi o que ocorreu. Sabe-se hoje que até o aspecto (embora subsecivo) da universalidade do ensino veio também fortalecer a transcendental mensagem. O próprio Allan Kardec desceu das plagas do Infinito, através duma das mais seguras médiuns da atual geração, para confirmar que Jesus tivera um corpo fluídico (vide “Diário dos Invisíveis”, de Zilda Gama, pág. 202, 2ª edição da editora ‘O Pensamento’); Emmanuel revela idêntico ponto de vista (vide o prefácio de “Vida de Jesus”  de Antônio Lima, e “O Consolador”, questões nºs 243, 277, 283 e 287); Humberto de Campos toma igual posição em “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”, capítulo XXII; Guerra Junqueiro, em “Os Funerais da Santa Sé”, poema “O Corpo de Jesus”, página 69 da 3ª edição da FEB; e, entre os líderes do movimento espírita brasileiro, há que registrar os nomes respeitabilíssimos de Guillon Ribeiro, Bezerra de Menezes, Manuel Quintão, Antônio Luiz Sayão, Leopoldo Cirne, Pedro Richard, Bittencourt Sampaio, Ismale Gomes Braga, Júlio César Leal, Frederico Fígner, etc.  Essa galeria deveria, data vênia, liquidar qualquer assunto, mas os anti rustenistas geralmente são de incrível impermeabilidade, sobre quem, repetindo Somerset Maugham, ‘somente a fé dum poeta ou dum santo pode esperar que surjam lírios no asfalto da rua’...
Por isso mesmo, neste artigo, quero ir mais longe e tratar da posição daqueles que, na minha opinião (quiçá na de todos os espíritas), embora materialmente não passando de 4 vinténs, são hoje os 4 mais evangelizados, mais conscienciosos, mais dedicados, mais disciplinados e mais humildes médiuns que se conhece. Refiro-me, por ordem alfabética, a Divaldo Pereira Franco, Francisco Cândido Xavier, Olímpio Giaffoni e Yvone  A. Pereira. Contribuição deles em prol da propagação da Doutrina dos Espíritos, pautada no trabalho reservado, silencioso, sumamente cauteloso, está demonstrada através de anos e anos de esforço ininterrupto, passível de fazer de cada qual o fiel agente de nobre e sublime mediunato.
Qual, pois, a posição de cada um deles em face da personalidade fluídica de Jesus, em face da ascensão em linha reta do Nazareno, isto é, sem nunca ter encarnado até atingir as esferas de luz em que já se encontrava ‘antes que o mundo fosse’ (João, 8:58).
Divaldo Pereira Franco, o primeiro vintém, por mais de uma vez fez a mim, pessoalmente a afirmativa de que não há como explicar os Evangelhos senão à luz da ‘Revelação da Revelação’. Seria uma posição reservada, apenas para meu conhecimento particular? Claro que não. Antes que tudo porque os homens de bem não tem por vezo, sob nenhum pretexto, formar posições dúbias, uma pública e outra para os amigos particulares. Esse comportamento anfibológico não cabe nos espíritos de boa moral. Depois, porque a mesma afirmativa o estimado médium baiano já a fez da tribuna, a plenos pulmões, do alto da autoridade e da retumbância que lhe reconhecemos e que tanto tem servido à iluminação espiritual de nós todos, espíritas do Brasil e de fora do Brasil. Para prova-lo, transcrevo a seguir ‘verbo ad verbum’, as mais recentes palavras de Divaldo Pereira Franco pronunciadas do alto da tribuna do Grupo Espírita Fabiano (um dos mais sérios e bem orientados grupos que existem na Guanabara), na noite do dia 6 de Outubro de 1969, estando como de costume superlotado o auditório. Eis o trecho da memorável alocução, gravada em fita magnética, com o conhecimento do orador:

“Sem dúvida, o Grupo Espírita Fabiano está assinalado pelo selo da Mansidão de Jesus. A mais alta honra a que o espírita pode aspirar. O selo da Mansidão do Cristo, como está no Evangelho: Alegrai-vos por terdes o vosso nome escrito no Livro do Reino dos Céus! Durante muito tempo eu não entendia. Eu fui a Roustaing, que é minha fonte inexaurível de estudo evangélico! Há quase vinte anos que eu leio o benfeitor João Baptista Roustaing, meditando na sua palavrazinha, nas belas informações da Sra. Collignon, provindas da Espiritualidade. Mas é de uma interpretação maravilhosa! Alegrai-vos por terdes vosso nome escrito no Livro do Reino dos Céus! Que seria aquilo? E um dia, um dia eu me apercebi. Não foi pelo processo dedutivo racional; foi pelo processo intuitivo da penetração na fonte do pensamento divino!”

Bem, acho que basta. vejamos agora o entendimento do segundo vintém, o bondoso médium Francisco Cândido Xavier, o vitorioso e abençoado missionário de Pedro Leopoldo. Já não quero lembrar que foi Chico Xavier quem psicografou “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho” e “O Consolador”, obras nas quais Humberto de Campos (Irmão X) e Emmanuel coonestam a “Revelação da Revelação”. Poderia essa lembrança fazer supor, ao menos como hipótese, embora remota, que aqueles Espíritos são a favor de Roustaing mas o médium não o seria... Por isso valho-me aqui apenas da apreciação pessoal do Chico, confessadas em duas oportunidades; junto a mim e junto ao erudito e honrado conferencista Newton Boechat.
Junto a mim o fato se deu na capital de São Paulo, numa churrascaria típica do centro da cidade, onde em 1965 jantávamos após algumas laboriosas atividades doutrinárias. Á mesa se encontravam, além de nós dois, mais 8 confrades, um dos quais, sabendo-me a opinião indisceptável sobre o importante assunto, e como falasse de recente artigo meu publicado nesta revista, tentou através disso atingir a FEB. Comentou, com ar de irônico remoque:
- Artigo sobre Roustaing?
Expliquei a negativa. Mas ele se aproveitou:
- Você tem coragem de ainda defender o corpo fluídico de Jesus?
Revejo a cena como se estivesse sendo reproduzida, em projeção, diante de meus olhos. O Chico interferiu e, tocando o braço de companheiro, ressaltou no seu inconfundível tom de voz, melífluo e abemolado|:
-Ah... isso não. Luciano está com a razão...
Ao mesmo tempo, outro dos presentes acenava com a cabeça, em sinal de endosso. Meu interlocutor não esperava a interferência do Chico, muito menos para me apoiar e dar razão. Abriu um sorriso anêmico  e eu somente cuidei de, estendendo a mão na direção do Chico, acrescentar:
- Está vendo...
A farofa serviu de pretexto à ‘plaisante’ que me interpelara. Encheu a boca e enquanto não  não podia falar... o assunto morreu.
Se se pretender, totalmente, afirmar que o Chico com isso não afirmou nada (a intransigência enceguece e suscita todo tipo de “saída”, aqui vai a narrativa do encontro havido em 1950 entre o Chico e o Newton Boechat, encontro que estou devidamente autorizado a reproduzir.
Achavam-se ambos palestrando na Fazenda Modelo, em Pedro Leopoldo, quando o generoso médium chamou a atenção do amigo para as apreciações de Emmanuel sobre a elaboração do corpo de Jesus e da sua linha evolutiva, apreciações essas acabadas de sair do prelo e feitas ao ensejo das questões contidas em ‘O Consolador’ e já referidas aqui neste artigo.
Narrou-me o Newton Boechat (espírita que – sabemo-lo todos muito bem – não falsearia absolutamente sequer uma entonação desse diálogo) narrou-me que o Chico Xavier, então, lhe confessara ser esse também o seu pensamento a respeito do aparecimento de Jesus na Terra. Fora mais longe. Contara que, certa feira, durante reunião havida no Centro Luiz Gonzaga, em Pedro Leopoldo (30 de Novembro de 1948), alguns meses antes do surgimento do livro ‘Elos Doutrinários’ de Ismael Gomes Braga, anotou a presença do Espírito de Júlio Cassiano, ‘entidade lirial, luminosíssima, que seria Guia Espiritual de um nosso confrade’. Júlio Cassiano, como se sabe, é provavelmente o fundador do Docetismo, doutrina do século II que apresentava Jesus como manifestado apenas em aparência entre os homens, e esse fato está registrado, resumidamente, na pág. 119 da 2ª Edição do livro ‘Elos Doutrinários’.
Dito isso, passemos agora ao terceiro vintém, o médium Olímpio Giffoni. Trata-se do mais antigo membro do Grupo Ismael, grupo este incumbido dos trabalhos mediúnicos da Federação Espírita Brasileira. Duma humildade tocante, Olímpio Giffoni é tanto mais abalizado e respeitado quanto se lhe impõe, a si próprio, a preocupação de se apagar e se mirrar. Por seu aparelho fonador e por seus dedos desfilam semanalmente os pensamentos iluminados e cristalinos de Bezerra de Menezes, Antônio Luiz Sayão, Pedro Richard, Guillon Ribeiro, Bittencourt Sampaio e muitos outros pioneiros do movimento espírita na Terra do Cruzeiro. Mas, acima de tantos benfeitores, há ainda o Espírito alvinitente de Ismael, o Guia Espiritual do Brasil, aquele a quem estão confiados os destinos do Coração do Mundo. Pois bem, é exclusivamente através do médium Olímpio Giaffoni que se tem manifestado (embora, é claro, rarissimamente), o Espírito de Ismael. Não que o Excelso Benfeitor não pudesse manifesta-se noutras agremiações; não que inexistam médiuns menos conhecidos mas tão evangelizados quanto o nosso Giffoni; não que um Chico Xavier, ou uma Yvone Pereira, ou um Divaldo não consigam sintonizar coma faixa vibratória do empíreo Ismael. Não! Mas quer com isso testemunhar, o glorioso Espírito, que os canais de recepção do seu programa e da sua orientação estão instalados na Casa Mater do Espiritismo, na veneranda Federação Espírita Brasileira. Apenas isso. Apenas por isso Ismael se esquiva a ditar quaisquer mensagens que não o sejam através do Grupo Ismael. Ora, se o Olímpio Giffoni é o principal médium do Grupo e reúne as condições morais e psíquicas à manifestação, torna-se óbvia, assim, a exclusividade determinante do bom Anjo Ismael.
E qual é a posição de Olímpio Giffoni sobre a obra de Roustaing, isto é, sobre a particularidade do corpo fluídico de Jesus? Para princípio de conversa diga-se que no Grupo Ismael os minutos de estudo doutrinário que precedem à confabulação com os Espíritos são dedicados unicamente aos 4 tomos de ‘Revelação da Revelação’. Cada membro do Grupo é responsável, semanalmente, às quintas-feiras, pelos comentários da lição do dia. Assim, quando chega a vez do Giffoni (afirmo-o não por ouvir dizerem, mas como membro que também sou do Grupo), ele ardorosamente defende Roustaing, aprecia lhe os ensinamentos, disserta sobre o ponto e advoga sincera e entusiasticamente a tese do corpo fluídico de Jesus. Creio que não preciso alinhar mais nada. Quem duvidar, que lhe pergunte...
Chego, assim, ao nome do quarto vintém, Yvone A. Pereira, a humilde e modesta médium que tanta colaboração tem prestado à edificação da Doutrina de Kardec. Serva laboriosa e dedicada, sua vida tem sido um apostolado, durante a qual os Espíritos de Charles, Bezerra de Menezes, Leão Tolstoi e Camilo Castelo Branco se aproveitaram para ditar-nos excepcionais trabalhos mediúnicos, de diretriz moral e conforto espiritual.
Conversei duas vezes com a Yvone sobre Roustaing. Duas conversas brevíssimas, mas bastantes. A primeira vez foi em casa do Vice-Presidente da FEB, Dr Armando de Oliveira Assis. A Yvone, provocada por mim, acabou dizendo:
- Olhe, Luciano, antigamente eu sentia muita dificuldade de entender Roustaing. Depois compreendi melhor e agora estou mais tranquila.
A segunda vez foi durante palestra do Divaldo Pereira Franco , quando este médium fez a apologia de Roustaing, do alto da tribuna. A Yvone estava na primeira fila, ao meu lado, e comentou para mim, numa espécie de desafogo, como quem passava a ter certeza de que não era apenas ela quem razoava na mesma linha de raciocínio de Bezerra De Menezes, quanto ao corpo fluídico de Jesus:
- Ah, agora estou mais descansada!...
Aliás, não podia ser outra a posição da medianeira de ‘A Tragédia de Santa Maria’ e ‘Dramas da Obsessão’, tal a sua íntima ligação com o Espírito superior e altamente esclarecido de Adolfo Bezerra de Menezes. Afinal, foi “Max” uma das mais fervorosas atalaias do corpo fluídico de Jesus. E... “Max” não era nem é Espírito de se deixar enganar ou de enganar alguém...
Eis, amigo leitor, os quatro testemunhos que achei de bom aviso levar ao público conhecimento, antes que desencarnassem. Contra essas opiniões, que temos a opor? A do médium lá da esquina, que alterna a mesa mediúnica com a vida profana e cheia de vão tumulto? A do médium lá do grupo dos místicos e fanáticos, interesseiro e invigilante, incapaz de apanhar duas palavras autenticas de qualquer mentor iluminado? Ou daquele célebre e infeliz médium que ‘recebeu’ uma mensagem do Roustaing, médium que funcionava num centro extinto pelas desarmonias internas e que – pobre coitado... – acabou à porta da Federação Espírita Brasileira,  em dolorosas crises etílicas e em andrajos, pedindo esmolas e desgraçadamente abandonado pelos próprios companheiros do grupo... Aliás, os arautos de extrema ortodoxia allankardecista, aqueles que acham (contra Kardec!) que a doutrina não evolui, às vezes lembram o herói de Somerset Maugham e, cegos por sua ‘arte’, chegam a deploráveis situações..
Perdoe-me o leitor que discordar, mas, “nemine discrepante”, prefiro ficar com os 4 vinténs: Chico, Divaldo, Yvone e Giffoni. Questão de... questão de 1 gosto apenas.

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