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segunda-feira, 13 de junho de 2011

O Diabo



O  Diabo

Ernani Cabral
Reformador (FEB)  págs. 161-162  Julho 1952

            A crença de que o diabo é um ser incorrigível, sempre dedicado ao mal, é pueril ou absurda, e contrária à misericórdia de Deus.
            O Pai Celestial que é bom, absolutamente perfeito, não iria criar um ser eternamente fadado ao mal. Seria admitir que Ele mesmo engendrasse um rival à sua obra, para guerreá-la sempre.
            Mas, em verdade, se o diabo existe, não é com o sentido apavorante que lhe dão outras religiões, jungidas à interpretação literal dos textos bíblicos; assim, pode-se chamar diabo ou demônio a um Espírito mau, certo embora de que ele se arrependerá algum dia, “porque Deus não quer que alguém se perca, mas que todos se salvem e tenham vida eterna”.
            Assim, todo Espírito atrasado é perfectível; a ignorância ou a perversidade são estados transitórios da alma.
            Não se deve crer que o Justo, o Sábio, o Pai de amor e de misericórdia, nos criasse para jogar-nos no inferno, transformando-nos em monstros espirituais, por toda a eternidade! Máxime tendo onisciência, sabendo, de antemão, qual o destino que teríamos...
            A Bíblia fala, realmente, em Satanás. Mas, lendo-a com atenção, vê-se que Satanás não existe como um ser, é apenas o símbolo do erro, tanto assim que Jesus chamou a Pedro, de uma feita, Satanás, dizendo enfaticamente: “Para trás de mim, Satanás!” (Mat 16:23 e Mar 8:33). Nem Pedro (um dos apóstolos queridos) era Satanás, nem podia estar apossado de Satanás; apenas, naquele momento, expressava um sentimento errado, pois que não compreendia ainda, devidamente, “as coisas que são de Deus”.
            Esta interpretação dos textos bíblicos, de que não há condenação eterna, não isenta, porém, os maus do sofrimento, pois foi Jesus mesmo quem afirmou que “a cada um segundo as suas obras.”(Mat 16:27) Tal assertiva, aliás, concilia-se com o Velho Testamento, em inúmeras passagens, dentre elas: Isaías 59:18; Job 34:11; Sal 62:12; Prov 24:12; Jeremias 32:19. etc.
           O que erra, voluntária e conscientemente, será responsabilizado pelos seus atos, conforme a intensidade do dolo, a maior ou menor perversidade de sua conduta e seja qual for o grau da culpa, pois, está escrito, “O Senhor é o Deus de sabedoria, e por Ele são as obras pesadas na balança”. (I Sam 2:3). Mas isto não quer dizer que as penas sejam perpétuas, pois a eternidade das penas implicaria na falta de misericórdia de Deus, o que seria negar-lhe um dos mais belos atributos.

            O inferno a que a Bíblia se refere (Mateus 10:28) são os lugares inferiores, onde a condenação não é perpétua, mas relativa como o pecado ou as imperfeições humanas, cominada com justiça e proporcionalidade.
            Foi Zoroastro, o profeta do Irã, quem inventou o diabo, embora o Budismo também conhecesse algo semelhante, sob a denominação de Mara. “Com o decorrer dos tempos, desempenhou o diabo relevante papel na história das religiões, como o chefe supremo das potências do mal. Teria sido mesmo criado por Zoroastro (Zaratustra) pela capital necessidade de incutir no povo ódio contra os atos indignos, ou melhor, o temor de os praticar.”
            Assim, o diabo representou uma concepção histórica, um papel interessante, em certas religiões de mente primária, isto é, naquelas como o Judaísmo, que ensinam os homens a temer a Deus, em vez de amá-lo, que deve ser o sentimento único para com o Criador.
            Todavia, há criaturas que ainda precisam crer no “príncipe das trevas”, porque esse temor às forças, supostamente ocultas, é também um freio a espíritos infantis, que se ofuscariam com a luz da verdade, talvez sem se aproveitarem dela. É por isso que há tantas religiões e todas necessárias aos graus de entendimento das diversas categorias de Espíritos encarnados. Mas surge a ocasião em que a mente humana anseia pela verdade, querendo libertar-se dos tabus da intolerância religiosa ou do terror do dogma; então, terá de aproximar-se do Espiritismo, que encerra em si a revelação maior, aquela que tira, “da letra que mata, o espírito que vivifica”, como diria Paulo de Tarso.
            As revelações são dadas, gradativamente, aos homens. Moisés surgiu séculos antes do Cristo, porque a Humanidade daquele tempo, endurecida e atrasada como era, não estava apta a conhecer a lei de amor, a doutrina generosa do meigo Nazareno. Assim também o Espiritismo, o Paracleto prometido, como religião ou como revelação, somente poderia surgir alguns séculos depois de Jesus, isto porque, como diz o Eclesiastes (3:1), “tudo tem o seu tempo determinado”. Moisés expressaria a Justiça; Jesus, o Amor; e o Espiritismo, a Verdade. Eles se complementariam como obra divina, como um todo religioso indestrutível.
            Jesus, sem revogar a lei, cortou as arestas do Judaísmo; o Espiritismo, sem condenar os outros ramos do Cristianismo, porque os considera útil a muitas criaturas, veio dar a interpretação mais precisa dos textos, diversos dos quais tinham sido deturpados pela interpretação literal, pelo desejo de dominação ou pela ignorância dos homens, sendo que alguns destes ainda se proclamam infalíveis. Nós, porém, não nos consideramos assim; acreditamos nas palavras dos Mensageiros do Senhor, que se têm manifestado em toda a Terra, através de uma doutrina lógica, sensata e profundamente cristã. E, então, o diabo que Zoroastro criara, ficticiamente, desapareceu nas trevas, ante a luz da verdade maior! Ficamos sabendo que o mal é transitório, assim como as imperfeições dos Espíritos.
            Quem erra, entra em sintonia com as vibrações más; contudo, delas se afastará algum dia, atraído pela misericórdia divina que, quando tarda, vem em caminho.
            O Divino Mestre ensinou que devemos pedir ao Pai Celestialnão nos deixar cair em tentações”, porque elas existem, sejam como expressão das coisas mundanas ou como influência dos maus Espíritos. Contudo, nós e eles, mais cedo ou mais tarde, nos arrependeremos, pois que estamos fadados à regeneração. Temos a eternidade na frente; assim, por maior que seja a culpa ou o endurecimento no mal, há sempre a possibilidade da reparação, nesta ou em outra existência. Devemos evitar é persistir no erro, a fim de não aumentarmos a densidade de nosso karma, como dizem os teosofistas. Senão, o fogo do sofrimento será mais intenso, mais duradouro, até queimá-lo.
            Todavia, seja qual for o grau da culpa, aceitando-se Jesus, “O Cordeiro Imaculado que tira o pecado do mundo”, e havendo sinceridade de propósitos, despontará o homem novo, desaparecerá o diabo, surgindo o anjo em formação.
            Parodiando Emmanuel, o fulgurante Espírito, de tão maravilhosos ensinamentos, poderemos dizer: os animais, através dos séculos, humanizam-se; os homens e os diabos, com Jesus, divinizam-se, elevam-se para Deus, imã supremo que a todos atrai, foco perene da luz eterna, meta suprema de nossa redenção!  


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