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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Em que ano nasceu Jesus?




Em Que Ano Nasceu Jesus?


Roberto G. Bratcher
Reformador (FEB) 12. 1953
           
            Abaixo transcrevemos grande parte do notável estudo publicado em “Diário de Notícias” pelo Sr. Roberto G. Bratcher, que replica as opiniões emitidas por um outro culto estudioso de tais assuntos:

            Deve ser esclarecido, desde logo, que a opinião dos eruditos bíblicos é que Dionísius Exiguus, o monge do século VI que introduziu o sistema cristão de datas, errou nos seus cálculos do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo.

            Em vez de 754 A.U.C. (ab Urbe condita, isto é, ‘da fundação de Roma’), Cristo nasceu no ano 749 A.U.C. mais ou menos; isso é, em vez do Cristo ter nascido no ano 1 da era cristã, ele nasceu no 5 (ou 6) a.Cr. - por absurdo que pareça. Diga-se logo, entretanto, que o aparente absurdo não é culpa dos Evangelistas, senão de Dionísius Exiguus, que errou nos seus cálculos.

            Como diz o cônego Heládio Correia Laurini, no seu estudo sobre cronologia neo-testamentária em ‘Introdução Geral ao Novo Testamento’(1): ‘Dionísio, o Exíguo, instituiu a contagem da era cristã com erro enorme: datou para o nascimento de Jesus o dia 25 de Dezembro do ano 753 ‘ab Urbe condita’ ou da fundação de Roma. Ora bem, como Jesus nasceu ‘nos dias do rei Herodes (O Grande)’ e Herodes morreu em Março ou Abril do ano 750, como está bem demonstrado, o fato miraculoso se deu menos 4 anos antes de 753’ (pág. 351)

            Diz ainda o cônego Laurini: ‘Parece que o ano que oferece as maiores probabilidades é o 747 de Roma e 7 A.C., isto é, antes da era cristã erroneamente marcada por Dionísio e seguida ainda hoje. ‘La Sacra Biblia’, do Instituto Bíblico de Roma, prefere o ano 5. A.C. ou 5’ (pág. 352) 

            Não é necessário multiplicar citações para demonstrar que os eruditos bíblicos católicos e protestantes rejeitam o cálculo do monge Exíguo como errôneo.

            Examinemos, portanto, asa passagens citadas para ver o que revelam quanto à data do nascimento do nosso Senhor.

1.         Lucas, I, 5: ‘Nos dias de Herodes, rei da Judéia.’ Herodes, o Grande, era filho de Antípater, o Idumeu, o qual fora feito procurador da Judéia por Júlio César, no ano 47 a.Cr. (707 A.U.C.). Até aqui o articulista acerta. Erra, entretanto, ao afirmar que Antípater morreu no ano 37 a.Cr. (717 A.U.C.). Antípater morreu envenenado no ano 43 a.Cr. (711 A.U.C.) (2)

            Herodes, o Grande, foi feito rei pelos romanos no ano 40 a.Cr. (714 A.U.C.), mas levou 3 anos para derrotar Antígono, o rei-sacerdote macabeu, e seus aliados, os Partas. Foi, portanto, no ano 37 a.Cr. (717A.U.C.) que Herodes começou a reinar sobre a Judéia. Morreu em Março ou Abril do ano 4 a.Cr. (750 A.U.C.)

            Pergunta o articulista: ‘Como foi possível tudo isso (relatado nos Evangelhos de Mateus e Lucas a respeito de Herodes), se já tinha falecido 4 anos antes? A resposta é óbvia: tudo isso foi possível porque ele não havia falecido 4 anos antes. O erro não é do Evangelista: como diria ele que Herodes fizera tudo aquilo depois de morto? O erro é do monge Exíguo, o qual calculou que Cristo nasceu em 754 A.U.C. Mas, como todos concordam, Herodes morreu no ano 750 A.U.C.; é evidente, portanto, que Cristo nasceu pelo menos alguns meses, ou até anos, antes da morte de Herodes - lá pelo ano 5 a.Cr. (749 A.U.C.), ou antes. Não culpemos o Evangelista do erro que cabe ao monge, fazendo seus cálculos cinco séculos depois.

2.         Lucas II, 1 e 2: “Naqueles dias foi publicado um decreto de César Augusto, convocando toda a população do Império para recensear-se. Este, o primeiro recenseamento,  foi feito quando Quirínio era governador da Síria.’

            Foi esse recenseamento de César Augusto que levou José e Maria a Belém para se alistarem, pois ele era da casa e família de David. Enquanto estavam em Belém, Jesus nasceu.

            Objeta o articulista a essa nota cronológica, dizendo que o recenseamento foi ordenado no ano 760 A.U.C. (7 d.Cr.). O articulista parece desconhecer a obra monumental do famoso historiador e arqueólogo inglês, Sir William Ramsay, o qual provou a exatidão histórica dessa nota cronológica em Lucas, II, 1 e 2. Ramsay, nos seus livros (3), demonstrou que os recenseamentos se davam  periodicamente de 14 em 14 anos. O do ano 760 A.U.C. (7 d.Cr.), foi um deles: o mesmo recenseamento em Atos, V, 37. Teria dito ele que o nosso Senhor nasceu no tempo deste recenseamento? Teria sido uma contradição flagrante.

            Pelo contrário, Lucas estabelece a diferença  entre os dois dizendo cuidadosamente que o recenseamento do tempo de Jesus foi o primeiro, quando Quirínio era governador da Síria. Ramsay mostra ainda, por meio de inscrições históricas, que Quirínio foi governador da Síria duas vezes. Foi durante o seu segundo período de governo que se deu o recenseamento do ano 760 A.U.C. (7 d.Cr.). O recenseamento anterior, quando Jesus nasceu, teria sido ordenado no ano 746 A.U.C. (8 a.Cr.), catorze anos antes. É fácil ver-se que, por uma ou outra razão, teria havido alguma demora antes que o recenseamento fosse levado a efeito nas províncias, especialmente na Palestina, onde o representante dos romanos sempre tinha que tratar com muito cuidado os seus súditos rebeldes. Portanto, não há nada que milite contra a suposição de que esse primeiro recenseamento se efetuou na Palestina um ou dois anos depois de ordenado, isso é, 746-748 A.U.C. (8-6 a.Cr.). Portanto, a data, em geral, concorda com a anterior.

3.         Lucas, III, 1 e 23. ‘No décimo quinto ano do reinado de Tibério César - tinha Jesus cerca de trinta anos ao começar o seu ministério.’

            Augusto morreu em 29 de Agosto, 767 A.U.C. (14 d.Cr.), sendo sucedido por Tibério, o qual reinou, portanto, de 14 d.Cr. até 37 da nossa era.   O 15º ano do seu reinado seria 781-782 A.U.C. (28-29 d.Cr.): se Jesus tinha, nessa data, cerca de 30 anos, há lugar para uma variação de 3 ou 4 anos: como diz o cônego Laurini, ele poderia ter de 28-32 anos de idade. Nesse caso, a data do seu nascimento cairia entre 750-754 A.U.C. (4 a.Cr. - 1 d.Cr.).

            Mas, é mais provável que Lucas date o 15º ano de Tibério, não da morte de Augusto, mas do começo do co-reinado de Tibério com Augusto, 2 anos antes da morte deste. Pois, conforme o testemunho dos historiadores Tácito e Suetônio, Tibério partilhou do reinado com Augusto uns dois anos antes da morte de Augusto em 767 A.U.C.

            Fazendo, pois, os mesmos cálculos, conclui-se que, segundo essa passagem, o Senhor Jesus nasceu entre 748-752 A.U.C. (6-2 a.Cr.). Novamente, essa data concorda com as duas anteriores.

            Esse breve estudo demonstra, portanto, que nas três passagens Lucas concorda em afirmar que o Senhor Jesus-Cristo nasceu entre os anos 747-752 A.U.C., a saber, de 7-2 a. Cr. A maioria dos eruditos prefere os anos 748-749 A.U.C., isso é, 6 ou 5 a.Cr. como o ano em que Jesus nasceu.

            Ninguém - e, repetimos, ninguém exige dos historiadores antigos, nem mesmo dos bíblicos, a precisão científica com que se datam os eventos hoje em dia. Para tanto não tinham nem os recursos, nem o interesse. Dizer que ‘pouco os incomodaram com a verdade histórica de suas narrações’ por não revelarem eles essa precisão do historiador moderno, é, patentemente, uma decisão arbitrária e injusta.

            Afinal de contas, qual é o propósito do autor bíblico nessas três passagens? É o de fixar o ano em que Jesus nasceu? De maneira alguma. Na primeira passagem Lucas assevera que Jesus nasceu quando Herodes, o Grande, era rei da Judéia. Certo ou errado? Todos concordam que ele está certo. Na segunda passagem ele relata que foi um recenseamento, durante o tempo em que Quirínio era governador da Síria, que trouxe Maria e José a Belém, onde Jesus nasceu. Está certo o historiador bíblico? As descobertas arqueológicas dizem que sim. Na terceira passagem o autor afirma que Jesus, com cerca de 30 anos de idade, começou o seu ministério no 15º ano do reinado de Tibério (4). Ocorre em erro o autor sagrado? Não. Portanto, o valor histórico do seu relato não pode ser impugnado: pois a erudição bíblica moderna tem demonstrado serem autênticas todas as três asseverações.

            Nós, leitores do 20º século, é que perguntamos: coincidem essas notas cronológicas no seu testemunho quanto à data do nascimento do Cristo? E a resposta é que, em linhas gerais, elas, de fato, coincidem, dentro de um período de 4 a 5 anos.

            Lucas, portanto, está vindicado pela erudição bíblica quanto à exatidão histórica com que relata os fatos. Suas asseverações não são absolutamente, discordantes: não procede, portanto, a alegação de que ele cita ‘três épocas diferentes para sua narração do nascimento de Jesus’, ou de que há uma diferença de 10 anos entre as datas. Diga-se de passagem, aliás, que desde as investigações minuciosas e demoradas de Harnack, Ramsay e Streeter, poucos são os críticos bíblicos que se atrevem a atacar a historicidade do autor do 3º Evangelho. Descoberta após descoberta têm comprovado a verdade do que ele próprio afirma ter feito: ‘uma acurada investigação de tudo desde sua origem’.

            Mais duas observações:

            (1) Marcos VI, 14 não se refere a Arquelau e sim a Herodes Ântipas, tetrarca da Galiléia e Peréia. Nem um nem o outro recebeu o título de rei. A expressão ‘rei Herodes’ nessa passagem é usada no sentido lato de ‘governador’ (conferir ainda VI, 22, 25-27). Até o evangelista Mateus, que usa o título exato de ‘tetrarca’ (XIV, I), em qualquer lugar usa o termo ‘rei’ (XIV, 9). Portanto, não causa espécie que Marcos faça uso do título.

            (2) As palavras de Lucas no prefácio do seu Evangelho (Lucas I, 3,4) quanto à maneira em que se fez suas investigações, de maneira alguma invalidam, ou mesmo afetam, a doutrina que o articulista  denomina ‘a suposta e imposta inspiração da Bíblia’. Nenhuma formulação da doutrina da inspiração da Bíblia nega o elemento humano na composição das Escrituras: mas não é com um aparte superficial e capcioso que crítico qualquer eliminará o elemento divino da formação literária da Bíblia. 

            Em conclusão, devemos dizer que todos os estudos do último meio século, arqueologia, papirologia, história, paleografia, crítica literária, enfim, todas as disciplinas - têm contribuído para aumentar, e não diminuir, a autoridade das Escrituras. Hoje a Bíblia está em situação muito mais segura, no que tange à parte histórica, do que estava há meio século. A evidência histórica, em peso, testifica do valor histórico das Escrituras, demonstrando serem as suas asseverações dignas de toda a confiança. Outrossim, a experiência desse último meio século demonstra, sobejamente, que o texto original da Bíblia resiste, impávido, a todas as tentativas de apoucá-lo ou desprestigiá-lo. (Ext. do ‘Diário de Notícias’ de 11-1-53)

(1)       Bíblia Sagrada: Versão Clássica do Padre Antônio de Figueiredo, vol. XV, págs. 351-357.
(2)       Emil Schurer - ‘A History of the Jewish People in the time of Jesus Crist’, Divisão I. vo. I. pág. 386 (cfs Josefo, Antiguidades, XIV, 11, 4 e Guerra dos Judeus, I, 11, 4).
(3)       William Ramsay - Was Crist Born at Bethlehem?, e ‘Bearing of Recent Discovery on the Trustoworthiness of the New Testament’.
(4)       Cumpre notar que, a rigor, a data mencionada é a do início do ministério de João Batista; presume-se, entretanto, que João tenha pregado e batizado uns 6-12 meses antes do início do ministério do Messias. o 15º ano de Tibério, portanto, marcaria o início dos ministérios de João Batista e do Cristo.

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