Maria
e o corpo de Jesus
escreve Max (pseudônimo do
Dr. Bezerra de Menezes)
Reformador (FEB) Junho 1974
Lendo os piparotes antiespíritas
do Sr. Senna Freitas, acudiram-nos ao pensamento estes versículos de João de
Lemos, em sua lua de Londres: Eu e tu, casta deidade, padecemos igual dor.
É o tal ... mas de Mme de Staël.
Andamos bordejando em torno da
polêmica mansa, mal detido pelo receio de nos chamarem intruso.
Mas ... o crítico de José Bálsamo,
sem dúvida reputando-se blindado por seus triunfos, atirou-se, lança em riste,
contra o Espiritismo e eis-nos a bater-lhe à porta, com melhor razão do que
teve ele para bater à de Allan Kardec.
Um dos seus argumentos contra José
Bálsamo foi ter este falado de coisas que não tinha estudado a preceito - e, de
fato, não há
maior perigo do que este para os que se atiram aos mares da publicidade. É
igual ao que corre aquele que fala ou escreve contra o que sente e sabe que é
verdade.
Se a crítica é justa a respeito de José Bálsamo,
coisa é que não temos o direito de julgar, porque ainda não lemos atentamente seu
opúsculo.
Que, porém, é bem talhada carapuça para a
cabeça do talhador, isto, sim, podemos afirmar.
Em seus piparotes antiespíritas, o erudito
escritor mete à bulha: afirmar José Bálsamo que os habitantes inteligentes dos
mundos sem conta, espalhados pelo espaço, são ... perispíritos do nosso globo,
ontem revestidos de carne e osso, hoje dotados de invólucros gasosos, astrais,
sutis. E, mais abaixo, diz: felizmente
ainda não cheguei a perispírito.
Não pode haver mais completa ignorância do
Espiritismo!
Dado que José Bálsamo tenha dito tais coisas
em seu livro, o crítico estava no pleno direito de zombar delas, como fez; mas
dar por isto piparotes no Espiritismo, não, nunca, porque o Espiritismo não as
ensina.
E daí uma de duas: ou S. Revma. não conhece
a preceito a Doutrina Espírita, em que se mete a dar piparotes, ou a conhece,
como é mister - e. .. e... e não sei de pena como o conte!
Estes piparotes não doem, até porque só Deus
sabe quanto custam a quem os dá.
A questão das reencarnações que provocou
outro piparote, em que pese ao ilustre crítico, nem ele nem os 258 papas
reunidos lhe poderão pôr barreira.
É uma lei conquistada pela experiência, múltipla,
multiplicada, aqui e além, agora ou logo.
S. Revma. não diz aos ateus que Deus não
deixa de ser porque eles o negam?
Pois ouça o mesmo de um espírita, relativamente
àquela excelsa lei - única que concilia a justiça com a misericórdia do Senhor.
Terceira questão, de que se gerou mais um piparote
no Espiritismo: José Bálsamo atribui a Maria Santíssima outros filhos
além de Jesus.
A propósito, lembramo-nos de um fato, cá dos
sertões da terra, onde os pais nem talvez saibam que existe a doce língua de Petrarca
e de Manzoni.
Foi um padre que substituía o vigário da freguesia
em seus impedimentos; o que não lhe pesava, porque o rebanho era de lavar-se com
uma selha d'água: Deus, no céu, e o padre vigário na terra.
Por desgraça, apareceu um tombador (agrimensor)
que era ou se dizia ateu - e que tirou para seu barato dar piparotes na igreja
romana, sabatinando o padre Joaquim.
O padre foi-se desenvencilhando como pôde,
até que o velhaco saiu-lhe com esta:
Os concílios não são presididos pelo Espírito
Santo?
Positivamente.
Logo, deles não pode resultar senão a verdade?
Positivamente.
Como, então, as resoluções de uns revogam
as de outros?
Qual! Isso não pode ser.
Garanto-lho - e prová-Io-ei, se quiser.
O padre embuchou e, depois de muito meditar,
sugeriu-lhe o bestunto esta explicação:
Nada mais simples, Sr. Lourenço: é que alguns
concílios são presididos pelo diabo.
O tombador bateu palmas de contente, tinha
dado um piparote na doutrina da igreja!
Releve-nos José Bálsamo a parte que na comparação
lhe cabe; mas em verdade lhe diremos: o Espiritismo dá-lhe tanto direito para afirmar
que Maria Santíssima teve outros filhos além de Jesus, quanto deu a igreja ao padre
Joaquim para atribuir a presidência espiritual de concílios ao diabo.
O Espiritismo reforça, pelos ensinos dos altos
Espíritos, as provas da imaculada conceição.
O
Espiritismo considera Maria um altíssimo Espírito, que veio à terra em missão
especial de servir de sacrário ao puro amor do Pai.
O
Espiritismo não vê, nesse fato fenomenal, verdadeiro milagre para os que ainda
não lhe conhecem a lei, nada que pudesse atingir a pureza virginal da mãe do
redentor do mundo, quer antes, quer depois do parto.
Não pode aceitar a hipótese de ter mão humana
tocado a esposa do Eterno; nem a explicação derivada dos cultos politéicos: de baixar
sobre a carne humana o espírito do Senhor, como fazia Júpiter,
E é
sabido que os hebreus entendiam por Espírito Santo o próprio espírito do
Senhor.
Estamos, pois, distanciados, quanto à pluralidade
dos filhos de Maria, o que aliás já está mais que satisfatoriamente explicado, principalmente
com a significação geralmente dada, no hebraico, à palavra filho; não, porém, quanto
à natureza do corpo de Jesus, no que ambos nós estamos com a Doutrina Espírita.
É neste ponto que está sensivelmente contido
o nó da magna questão: ou uma encarnação
comum, ou uma encarnação mitológica; qualquer das duas repugnante; digamos impossíveis.
Impossível,
no primeiro caso, porque Jesus, o Deus da terra, espírito que só tem acima de
si o Pai, não podia vir atafulhar-se na carne impura da humanidade terrestre,
como qualquer lapuz.
Impossível,
no segundo caso, porque, à parte o caráter mitológico, o fato dar-se-ia com
transgressão das leis eternas postas por Deus para a encarnação no novo planeta
- e Deus não seria Deus, se precisasse um dia alterar a ordem preestabelecida
no Universo, para produzir um fato qualquer.
Dezenove séculos têm passado por sobre este
fenomenal sucesso sem que se tenha podido compreender-lhe a lei, sendo
sabiamente prudente o ensino da igreja: de considerá-Ia um milagre, não só
porque milagre é tudo o que nossa razão ainda não alcança, como porque assim se
cerca com tanta veneração o berço, como se cerca o túmulo do Redentor.
Tudo, porém, tem de passar pela luz da razão
humana, na medida do seu progressivo aperfeiçoamento; e, pois, o mistério do
passado será a revelação do futuro.
Pouco tem que rir dessas revelações, que já
se fazem por toda a superfície da terra, os que acreditam e pregam que o
característico da verdadeira religião é ser incompreensível, é não caber na tal
selha d'água.
Todo este castelo vai por terra ao sopro de
duas palavras, que, ligadas, constituem uma ciência infinita em extensão e em
compreensão: perfectibilidade humana.
O
corpo de Jesus, compatível com a virgindade de Maria e dispensando a geração segundo
a carne e a mitologia, foi delineado segundo leis eternas e não por uma
exceção.
A vontade soberana fez que se aplicassem
aquelas leis àquele caso, e essas leis já são hoje conhecidas, embora pelo
método que foi prometido por Jesus, de que não se fala senão com escárnio.
Vamos, Sr. José Bálsamo, deixe que riam: pueriludunt.
("Espiritismo - Estudos Filosóficos",
Ed. FEB, 1907, vol 3, págs.449 a 454)
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