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segunda-feira, 7 de maio de 2012

Maria e o corpo de Jesus




Maria
e o corpo de Jesus

escreve  Max     (pseudônimo do Dr. Bezerra de Menezes)

 Reformador (FEB)  Junho 1974

Lendo os piparotes antiespíritas do Sr. Senna Freitas, acudiram-nos ao pensamento estes versículos de João de Lemos, em sua lua de Londres: Eu e tu, casta deidade, padecemos igual dor.

É o tal ... mas de Mme de Staël.

Andamos bordejando em torno da polêmica mansa, mal detido pelo receio de nos chamarem intruso.

Mas ... o crítico de José Bálsamo, sem dúvida reputando-se blindado por seus triunfos, atirou-se, lança em riste, contra o Espiritismo e eis-nos a bater-lhe à porta, com melhor razão do que teve ele para bater à de Allan Kardec.

Um dos seus argumentos contra José Bálsamo foi ter este falado de coisas que não tinha estudado a preceito - e, de fato, não há maior perigo do que este para os que se atiram aos mares da publicidade. É igual ao que corre aquele que fala ou escreve contra o que sente e sabe que é verdade.

Se a crítica é justa a respeito de José Bálsamo, coisa é que não temos o direito de julgar, porque ainda não lemos atentamente seu opúsculo.

Que, porém, é bem talhada carapuça para a cabeça do talhador, isto, sim, podemos afirmar.

Em seus piparotes antiespíritas, o erudito escritor mete à bulha: afirmar José Bálsamo que os habitantes inteligentes dos mundos sem conta, espalhados pelo espaço, são ... perispíritos do nosso globo, ontem revestidos de carne e osso, hoje dotados de invólucros gasosos, astrais, sutis. E, mais abaixo, diz: felizmente ainda não cheguei a perispírito.

Não pode haver mais completa ignorância do Espiritismo!

Dado que José Bálsamo tenha dito tais coisas em seu livro, o crítico estava no pleno direito de zombar delas, como fez; mas dar por isto piparotes no Espiritismo, não, nunca, porque o Espiritismo não as ensina.

E daí uma de duas: ou S. Revma. não conhece a preceito a Doutrina Espírita, em que se mete a dar piparotes, ou a conhece, como é mister - e. .. e... e não sei de pena como o conte!

Estes piparotes não doem, até porque só Deus sabe quanto custam a quem os dá.

A questão das reencarnações que provocou outro piparote, em que pese ao ilustre crítico, nem ele nem os 258 papas reunidos lhe poderão pôr barreira.

É uma lei conquistada pela experiência, múltipla, multiplicada, aqui e além, agora ou logo.

S. Revma. não diz aos ateus que Deus não deixa de ser porque eles o negam?

Pois ouça o mesmo de um espírita, relativamente àquela excelsa lei - única que concilia a justiça com a misericórdia do Senhor.

Terceira questão, de que se gerou mais um piparote no Espiritismo: José Bálsamo atribui a Maria Santíssima outros filhos além de Jesus.

A propósito, lembramo-nos de um fato, cá dos sertões da terra, onde os pais nem talvez saibam que existe a doce língua de Petrarca e de Manzoni.

Foi um padre que substituía o vigário da freguesia em seus impedimentos; o que não lhe pesava, porque o rebanho era de lavar-se com uma selha d'água: Deus, no céu, e o padre vigário na terra.

Por desgraça, apareceu um tombador (agrimensor) que era ou se dizia ateu - e que tirou para seu barato dar piparotes na igreja romana, sabatinando o padre Joaquim.

O padre foi-se desenvencilhando como pôde, até que o velhaco saiu-lhe com esta:

Os concílios não são presididos pelo Espírito Santo?

Positivamente.

Logo, deles não pode resultar senão a verdade?

Positivamente.

Como, então, as resoluções de uns revogam as de outros?

Qual! Isso não pode ser.

Garanto-lho - e prová-Io-ei, se quiser.

O padre embuchou e, depois de muito meditar, sugeriu-lhe o bestunto esta explicação:

Nada mais simples, Sr. Lourenço: é que alguns concílios são presididos pelo diabo.

O tombador bateu palmas de contente, tinha dado um piparote na doutrina da igreja!

Releve-nos José Bálsamo a parte que na comparação lhe cabe; mas em verdade lhe diremos: o Espiritismo dá-lhe tanto direito para afirmar que Maria Santíssima teve outros filhos além de Jesus, quanto deu a igreja ao padre Joaquim para atribuir a presidência espiritual de concílios ao diabo.

O Espiritismo reforça, pelos ensinos dos altos Espíritos, as provas da imaculada conceição.

O Espiritismo considera Maria um altíssimo Espírito, que veio à terra em missão especial de servir de sacrário ao puro amor do Pai.

O Espiritismo não vê, nesse fato fenomenal, verdadeiro milagre para os que ainda não lhe conhecem a lei, nada que pudesse atingir a pureza virginal da mãe do redentor do mundo, quer antes, quer depois do parto.

Não pode aceitar a hipótese de ter mão humana tocado a esposa do Eterno; nem a explicação derivada dos cultos politéicos: de baixar sobre a carne humana o espírito do Senhor, como fazia Júpiter,

E é sabido que os hebreus entendiam por Espírito Santo o próprio espírito do Senhor.

Estamos, pois, distanciados, quanto à pluralidade dos filhos de Maria, o que aliás já está mais que satisfatoriamente explicado, principalmente com a significação geralmente dada, no hebraico, à palavra filho; não, porém, quanto à natureza do corpo de Jesus, no que ambos nós estamos com a Doutrina Espírita.

É neste ponto que está sensivelmente contido o nó da magna questão: ou uma encarnação comum, ou uma encarnação mitológica; qualquer das duas repugnante; digamos impossíveis.

Impossível, no primeiro caso, porque Jesus, o Deus da terra, espírito que só tem acima de si o Pai, não podia vir atafulhar-se na carne impura da humanidade terrestre, como qualquer lapuz.

Impossível, no segundo caso, porque, à parte o caráter mitológico, o fato dar-se-ia com transgressão das leis eternas postas por Deus para a encarnação no novo planeta - e Deus não seria Deus, se precisasse um dia alterar a ordem preestabelecida no Universo, para produzir um fato qualquer.

Dezenove séculos têm passado por sobre este fenomenal sucesso sem que se tenha podido compreender-lhe a lei, sendo sabiamente prudente o ensino da igreja: de considerá-Ia um milagre, não só porque milagre é tudo o que nossa razão ainda não alcança, como porque assim se cerca com tanta veneração o berço, como se cerca o túmulo do Redentor.

Tudo, porém, tem de passar pela luz da razão humana, na medida do seu progressivo aperfeiçoamento; e, pois, o mistério do passado será a revelação do futuro.

Pouco tem que rir dessas revelações, que já se fazem por toda a superfície da terra, os que acreditam e pregam que o característico da verdadeira religião é ser incompreensível, é não caber na tal selha d'água.

Todo este castelo vai por terra ao sopro de duas palavras, que, ligadas, constituem uma ciência infinita em extensão e em compreensão: perfectibilidade humana.

O corpo de Jesus, compatível com a virgindade de Maria e dispensando a geração segundo a carne e a mitologia, foi delineado segundo leis eternas e não por uma exceção.

A vontade soberana fez que se aplicassem aquelas leis àquele caso, e essas leis já são hoje conhecidas, embora pelo método que foi prometido por Jesus, de que não se fala senão com escárnio.

Vamos, Sr. José Bálsamo, deixe que riam: pueriludunt.



("Espiritismo - Estudos Filosóficos", Ed. FEB, 1907, vol 3, págs.449 a 454)



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