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domingo, 31 de outubro de 2021

A lição aproveitada

 

A Lição aproveitada

por José Brígido (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) outubro 1964

             Conversavam aqueles dois homens há longo tempo, sem que parecesse haver concordância entre eles.

- O que o Espiritismo nos pede é muito difícil. Somente os santos podem cumprir a Doutrina. Vivemos num mundo de solicitações inferiores, acotovelados por gente de toda espécie. Por muito que desejemos resistir, acabamos cedendo e falhando.

- Concordo que a exemplificação real seja muito difícil. O pior, entretanto, é não realizarmos nenhum esforço sério para cumprir cada dia um pouco do muito que a Doutrina exige de nós, para o nosso bem. O que não está certo é que vivamos a achar difícil fazer isto e aquilo, sem fazer verdadeiramente nada de construtivo.

- Se você é tão claro nas lições que dá, deverei ser também eficiente na exemplificação, meu amigo... – tornou o outro, com certa ironia.

            - Não estou dando lições, mas apenas repito o que considero tão útil a mim como a você. Só Deus sabe a minha tristeza por não resistir às tentações do erro. Faço planos, estabeleço o propósito de não cair, mas a minha resistência nem sempre é forte. O pior de tudo é que somente me apercebo de que fali, depois de praticado o erro. Antes, tenho a noção de que vou errar. Armo-me para resistir, mas termino derrotado... Todos os dias recomeço a luta, honestamente empenhado em respeitar a Doutrina de alguma forma. Não desejo que você passe pelas provações que me assaltam. Você já experimentou a mágoa de haver cometido uma ação censurável, quando sabia antecipadamente que não deveria praticá-la, mas que, impotente, cedeu à sedução?   

            - Às vezes me acontece o mesmo. Por isso é que acho a exemplificação da Doutrina Espírita muito difícil. Para não me preocupar, prefiro não pensar nela.  

            - Discordo. A luta é grande. Somos seres inferiorizados pela ausência de coragem para realizarmos a reconstrução da nossa personalidade. Qualquer que seja o resultado de cada dia, devemos insistir no respeito e na exemplificação da Doutrina. Alguma coisa há de ficar dentro de nós e um belo dia veremos que estamos resistindo mais ao mal e cedendo mais ao bem. Estou aprendendo com dificuldade, mas quero levantar-me voluntariamente, sem forças para dele fugir.

            - Acho muito bonito o que você diz, mas muito pouco prático. Se os fatos demonstram que você luta em vão, ou quase em vão, e que ainda se mostra preocupado com os erros que comete, melhor situado estou eu, que já se não poder resistir e não penso na Doutrina, para não me criar maiores aborrecimentos.

            - Olhe quem vem aí: o Pedro. Ei, Pedro, Pedro!  

            E o recém chegado, que era excelente médium, saudou-os afetuosamente:

            - Bons olhos os vejam! Está bem, “seu” Anselmo? E o senhor “seu” Ivo?

            - Tudo bem, Pedro. Nós estávamos justamente falando da nossa dificuldade em cumprir a Doutrina. Acha o Anselmo que é melhor não nos preocuparmos com ela, a fim de não termos muito trabalho. Eu, que estou falhando dia a dia, reconheço, entretanto, que devemos continuar fazendo força para dar alguma exemplificação boa. Que acha, Pedro?

            - Acho que o senhor pensa acertadamente. O melhor, quando temos uma ideia negativa, um pensamento inferior a nos perseguir, é buscarmos um meio de derrota-lo. Se tivermos uma pessoa por perto, devemos procura-la e puxar conversa sobre matéria que nos faça esquecer o pensamento que nos vinha mortificando. Se não podemos fugir por esse meio, temos o recurso de uma leitura boa, elevada, que realmente nos interesse.

            Tirando o livro do bolso, Pedro prosseguiu:

            - A propósito. Trago aqui o livro “Ação e Reação”, de André Luiz.

            - Conheço-o de nome, Pedro – disse Ivo.

            Mas Pedro, você tem forças e conta com um “protetor” para ajudá-lo. É médium...

            - A melhor resposta que eu lhe posso dar, “seu” Ivo, é reler alguns trechos deste livro. Ouça: “Não me creiam separado de vocês por virtudes que não possuo...” “A ninguém devemos o destino senão a nós próprios. Entretanto, se é verdade que nos vemos hoje sob as ruínas de nossas realizações deploráveis, não estamos sem esperança...” Essas são palavras do Instrutor Druso.  

            Um médium não tem imunidades, meus amigos. Suas responsabilidades são até maiores e mais perigosas. Na realidade, ninguém tem o direito de se julgar livre, se continua prisioneiro de maus hábitos, de pensamentos sombrios e depressores. Nem os senhores estão sós nem eu. Ninguém está só. E por não estarmos sós, devemos estar mais vigilantes. Não resistir, demonstra que somos espíritas de boca, não de coração. Isto é o que eu penso de mim mesmo.

            Fechando e reabrindo o livro, Pedro frisou:

            - Até parece que foi escolhido este trecho. Aqui o Ministro Sânzio diz a André Luiz: “O “carma”, expressão vulgarizada entre os hindus, que em sânscrito quer dizer “ação”, a rigor, designa “causa e efeito”, de vez que toda ação ou movimento deriva de causas ou impulsos anteriores. Para nós expressará a conta de cada um, englobando os créditos e os débitos que, em particular, no digam respeito. Por isso mesmo, há conta dessa natureza, não apenas catalogando e definindo individualidades, mas também povos e raças, estados e instituições.”

            Anselmo não estava gostando da conversa. Interrompeu a leitura de Ivo e se despediu:

            - Bem. Vocês estão com a vida ganha. Preciso ir andando. Vou pensar no que leu, Pedro. Não gosto de fazer nada no ar...

            E saiu.

            Ivo e Pedro continuaram trocando ideias. Foram caminhando e, quando se separaram, Ivo levava o livro aberto entre as mãos, engolfado na leitura preciosa que Pedro lhe proporcionara.

            Cada lição representava um tijolo para a reconstrução da sua personalidade afetada. Dali por diante, a sua tranquilidade em face do futuro se acentuou. Ele não lia apenas por prazer: assinalava as lições, procurando aplica-las nas oportunidades que a vida lhe oferecia. Tornou-se até elemento útil no Centro que passara a frequentar com assiduidade.

            Nunca mais teve ocasião de rever Anselmo, que, certamente, preferia continuar desconhecendo os deveres determinados pela Doutrina Espírita, para não se preocupar...

 


sábado, 30 de outubro de 2021

"Milagres" Espíritas

 

“Milagres” Espíritas

Vinélius DI MARCO (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Agosto 1964

             Acabamos de reler interessante livrinho, de autoria de Dorothy Kerin, originalmente intitulado “The living touch”, editado em francês com a denominação “Une main me toucha” (“Uma mão me tocou”). Deixem passar o “mamão”, que a mim me “sabe” melhor que a indigesta contração “u’a”, tão em voga hoje em dia...

            Professando a religião anglicana, Dorothy Kerin, ao narrar fatos puramente espíritas, preferiu considera-los milagrosos, pois que obteve cura “diretamente de Deus, de Deus somente”, como se as curas propiciadas pelo Espiritismo tivessem outra origem. Depois de haver peregrinado penosamente pela vasta seara da Medicina, sendo desenganada, pois seu caso era considerado desesperador, diz ela, recorreu ao hipnotismo, a Espíritos benfeitores, à sugestão etc., sem alcançar a cura procurada, vítima que era da tuberculose consequente duma pleurisia.

            Dorothy assinala haver sua saúde começado a declinar a partir da morte de seu pai. Quatro anos andou às voltas com os médicos e no quinto adoeceu de difteria.  Mais tarde, uma pneumonia a encaminhou à pleurisia, que, então marcou a parte mais acidentada e dolorosa da sua existência. Tuberculosa, sofrendo crises agudas de hemoptise, perdeu as esperanças de sobreviver, quando o último dos vinte e oito médicos lhe disse que era humanamente impossível salvá-la. Uma peritonite tuberculosa lhe apontava o fim próximo.

            Foi quando começou a ter visões estranhas. Pareceu-lhe ver Jesus e formas vestidas de branco, tendo cada uma um lírio na mão. Acreditou ouvir de Jesus: “Dorothy, não poderás vir agora”, isto é, não desencarnarás agora. Sentiu que deslizava no espaço e ouviu uma voz gritar-lhe: “Dorothy! Dorothy! Dorothy! Estou escutando. Quem é?” Neste momento, viu-se envolvida em grande luz. Um anjo segurou-lhe a mão, dizendo: “Dorothy, teu sofrimento terminou. Levanta-te e anda! “Ele passou suas mãos sobre os meus olhos – narra a autora – e eu me encontrei sentada no leito.”

            Confessa não ter tido nenhuma explicação a dar a sua cura instantânea. O Dr. Norman, que a tivera sob os seus cuidados, declarou a um repórter do “Evening News” que já tinha perdido as esperanças de salva-la. “Suas enfermidades eram suficientes para matar meia dúzia de pessoas.”, ajuntou. Ela apresentava os mais graves sintomas de tuberculose avançada, de diabete e outras complicações. A curva térmica acusava os resultados mais inquietantes, subindo algumas vezes a 105 graus Fahrenheit. Tudo isso foi publicado no citado jornal inglês, em sua edição de 20 de Fevereiro de 1902.

            Em face da cura prodigiosa, o referido médico convidou várias sumidades da Medicina e realizarem rigorosos exames na ex-enferma e todos eles concluíram que ela estava curada, mas não podiam explicar como fora possível acontecer isso. “Quinze dia depois – acrescenta Dorothy Kerin – dois especialistas me fizeram passar pelos Raios X e reconheceram o meu estado de perfeita saúde. O Dr. Murray Leslie recorreu às reações de Von Parquet e de Calmette, mas ambas foram negativas. A partir desse momento, gozei de uma boa saúde, até o acidente que sofri em Paigton, em setembro de 1913”.

            Como nós sabemos, os fenômenos espíritas podem verificar-se em qualquer ambiente, seja ele católico, protestante, ateu, muçulmano, espírita, etc. O fato de haver a autora consultado “Espíritos benfeitores”, sem resultado, nada significa, porque talvez esses Espíritos não estivessem à altura da situação que a eles se apresentava. O fato de serem Espíritos não lhes confere onisciência e onipotência. Mas que ela foi curada através da intervenção espiritual, não há a mais mínima dúvida.  

            Tanto se tratava de manifestação espírita, que Dorothy Kerin narra, à partir da página 29 da edição francesa de seu livro: “No domingo, 11 de Março, fui despertada do meu sono por uma voz que me chamava “Dorothy!” Sentei-me na cama e percebi ao pé do meu leito uma claridade maravilhosa, da qual emanava o mais belo rosto de mulher que se possa imaginar. Ela tinha um lírio na mão e veio colocar-se a meu lado, esclarecendo:

            “- Dorothy, agora irás fazer o bem. Deus te salvou a vida para te atribuir uma missão importante e privilegiada. Graças às tuas preces e à tua fé, muitas doenças serão curadas. Consola os aflitos e incute a fé nos incrédulos. Conhecerás contratempos, mas supera-lo às, pois és três vezes abençoada. A graça de Deus te será suficiente, pois Ele não te abandonará jamais.”   

            E concluiu: “Depois de fazer, com o seu lírio, três vezes, o Sinal da Cruz sobre mim, ela desapareceu. No dia seguinte, quando despertei, o quarto estava impregnado do perfume de lírio.”

            Compreende-se sem esforço que Dorothy Kerin era médium, dotada de muita fé em Deus e habituada ao recurso consolador da prece.

            “A essa visão sucedeu um período de espera, durante o qual a minha alma aprendeu a se refugiar na paciência. Oh! Como foi difícil permanecer inativa e esperar, enquanto outros seres estavam mergulhando nas trevas espirituais eu ardia do desejo de participar com eles da alegria dessa saúde e dessa felicidade que recentemente eu obtivera! Enfim, a hora soou e fui convidada a participar de diferentes reuniões e a relatar as minhas experiências.”

            Em outubro de 1912, Dorothy sofreu sério desastre de ônibus, sendo lançada á estrada. Atingida na coluna dorsal, sentia-se desfalecer quando, nesse mesmo momento, foi envolvida por magnífica luz azul e ouviu distintamente uma voz gritar-lhe; “Deus é Amor”. Acrescenta; “Em menos tempo do que estou gastando para dizer estas palavras, fui erguida do chão por mãos invisíveis até a plataforma do auto-ônibus e, toda alegre, escalei depressa os degraus do veículo. Em seguida, o motorista procurou-me para saber se eu me encontrava gravemente ferida. Pude responder-lhe, com toda a verdade: “Não, e lhe agradeço sinceramente a atenção.” E continuei a viagem sem sentir coisa alguma.”

            Muitas provas teve ainda a autora, todas intrinsicamente espíritas. Duma delas, conta: “Pouco tempo depois do acidente no local referido, passava eu de bonde pela ponte Vauxhall, onde o tráfego é intenso, quando, de repente, justamente atrás de mim, pesado caminhão veio atingir em cheio o veículo em que eu me encontrava, pegando-o de lado. Os vidros voaram em estilhaços e eu fui alvo de fragmentos.  Mas saí ilesa, sem a menor contusão ou mesmo o menor arranhão.”

            Cita o ataque sofrido de um ladrão, do que lhe resultou fratura na base do crânio e rutura do tímpano do ouvido esquerdo. Teve uma visão de Jesus e salvou-se. Todavia, continuou a sentir dorida a cabeça e a surdez persistia. Pouco depois, era acometida duma crise de apendicite. Ia ser operada quando recebeu de novo a visita do Grande Médico e se sentiu feliz por não precisar mais da operação. Horas antes, a dor que sentia na cabeça se tornara mais intensa e durante toda a noite seu ouvido esquerdo sangrava abundantemente, tornando-se necessária a aplicação constante de tampões de algodão. Tornara-se totalmente surda e não ouvia som algum.   

            Nova visão começara. Ela se sentia como que transportada para fora do quarto, no espaço, cercada de legiões de Anjos, segundo sua expressão.

            “Um deles se dirigiu a mim, dizendo: “Ainda tens confiança em Jesus? Respondi afirmativamente e, elevando os olhos, vi um grande círculo formado por Anjos e ao centro dele apareceu Jesus, que me disse: “Fiz muitas obras notáveis, mas eles não creram. Disse-lhes que os tempos chegavam. Então, retornei `Glória a fim de reunir os meus eleitos. E colocarei em meu seio, como cordeiros, aqueles que se mantiverem fiéis. Que a minha vontade seja o teu repouso, e eu te conduzirei.”

            “Muitas coisas – continua a autora – que não estou autorizada a divulgar me foram reveladas durante essa visão. Quando ela terminou reencontrei-me sentada em meu leito. Todas as dores haviam desaparecido e o meu ouvido estava completamente curado. Os meus amigos não haviam saído do quarto e disseram: “Estás curada, não estás? Nós também sentimos Sua presença”.

            “Retirei os tampões do ouvido e, desde esse instante, a hemorragia cessou inteiramente.

            “O Dr. George não podia crer em seus próprios olhos, tanto me achou mudada, e me declarou em perfeita saúde.”

            Evidentemente, se os fatos espíritas ocorrem em ambientes não espíritas, as impressões, interpretações e conclusões não podem deixar de trazer consigo os aspectos peculiares aos ambientes em que se verificam. Os católicos, protestantes e talvez outros falem em milagres. Se entendem por milagres os fatos que transcendem às leis naturais, discordamos, dentro da nossa posição simplesmente espírita, pois que tudo quanto sucede é perfeitamente normal e natural. Apenas não são tão comuns quanto ocorrências a que já nos habituamos a conhecer, analisar e qualificar. São tantas as leis naturais que permanecem desconhecidas da Ciência, que mais fácil se torna simplificar as coisas com a denominação de “milagres”.

            Os casos citados por Dorothy Kerin, realmente interessantes, mas perfeitamente banais no conhecimento espírita, não foram milagrosos, apesar de ela ter afirmado a presença de Jesus em suas visões. Não negaremos a possibilidade de essa presença se dar, em casos excepcionais, se grande for o merecimento moral daqueles que a afirmam. A familiaridade com a sua igreja, sem dúvida pode ter propiciado à autora a impressão de que estava cercada de anjos e que Jesus a visitava com a frequência citada no livro. Mas pode também acontecer que ela, em virtude de sua fé e do seu alto espírito de religiosidade, tivesse sido contemplada com a presença real do Mestre. Tudo isso, porém, é secundário, porque, agora, o que interessa à finalidade deste artigo é deixar claro que todas as visões assinaladas em “Une main me toucha” não foram milagres, mas, simplesmente, manifestações espíritas. Sob este aspecto, o livro é realmente interessante, ainda que, em tese, não ofereça nada diferente do que já consta de milhares de obras e testemunhos espíritas.

            Na visão a que nos referimos em último lugar, achavam-se no quarto outras pessoas, mas nenhuma viu Jesus nem os Anjos. Apenas sentiram, segundo disseram, a presença dele. Isto evidencia que Dorothy Kerin teve esse “privilégio” por ser médium e achar-se espiritualmente em condições de devassar o Invisível, tanto mais que a autora, segundo os documentos anexos em apêndice, teve uma vida verdadeiramente cristã e era dotada de grande fé. O testemunho dos médicos e enfermeiras que a assistiram, assim como de outras pessoas idôneas, demonstram de maneira irrefutável, uma vez mais, a espantosa realidade do Espiritismo.

 


sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Caridade

 

Caridade

por J. Fontoura

   Reformador (FEB) Maio 1919

Guardai-vos, não façais as vossas boas obras diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles, de outra sorte não tereis a recompensa da mão de nosso Pai, que está nos céus. Quando, pois, dás a esmola não faças tocar a trombeta diante de ti, como praticam os hipócritas nas sinagogas, e nas ruas, para serem honrados dos homens; em verdade te digo que eles já receberam a sua recompensa. Mas quando dás a esmola, não saiba a tua esquerda o que faz a tua direita.” (Mt., cp. VI vv. 1,2,3)


Longe está a humana gente de cumprir os ensinamentos de N. S. Jesus Cristo; longe estão os tempos em que a mão esquerda não saberá o que faz a direita; longe, muito longe estão os tempos em que o homem fará a caridade que será recompensada por Deus; longe estão os tempos em que as trombetas não se farão soar nos quatro pontos cardiais, todas as vezes que o homem, soltando de suas mãos egoísticas o ouro que o orgulha, não se faça conhecido para, cheio de vaidade, ouvir dos que o rodeiam e o adoram, elogios balofos, que o deviam envergonhar. “É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus”.

E não se pense que nos referimos somente a indivíduos isoladamente, não. Às massas constituídas em corporações religiosas; os grupos compostos de milionários, banqueiros, sociedades anônimas e também as que se formam para a organização de festas de caridade; a todas incluímos nestas linhas, nem de longe como um motivo de censura, mas como prova do ponto que tomamos como simples estudo sociológico em face dos Evangelhos.

Ainda há pouco (e está isto bem vivo na memória de todos que pensam nos motivos dos acontecimentos sociais ligando-os às coisas de Deus), abria-se uma subscrição para edificar-se um grande, um monumental edifício destinado a uma associação no Brasil.

Pois bem. Foi uma verdadeira califórnia (algo que traz ou propicia riqueza) em concha limpa, uma verdadeira corrida sensacional, onde cada capitalista fazia esforço para tirar o primeiro lugar. Dentro de uma semana, mais ou menos, já havia em cofre, apenas a quantidade de duzentos e tantos contos (de réis). Os jornais publicavam diariamente os nomes dos milionários que seriam de puro sangue nessa corrida.

            É rara a semana em que em cidades do vasto território descoberto por Pedro Álvares Cabral não se fazem festas em benefícios de templos onde brilham as colunetas de ouro, em que o som do grande órgão enche a nave, por onde se espalha o fumo perfumado do incenso misturado a ondulações sonoríssimas de vozes femininas. Durante os quatro anos da guerra (1ª Grande Guerra 1914-1918) que inundou de sangue o continente Europeu, não raro formaram-se sociedades anônimas para exploração de indústrias que deram em pouco tempo fortunas fantásticas aos principais acionistas. Homens houve, pobres, que de um momento para outro enriqueceram, tornando-se possuidores de fortunas incalculáveis.

            Estabelecimentos bancários emergiram e cresceram como cogumelos, às porções; nos grandes salões da aristocracia brasileira, enfeitados com esmero e gosto, senhoritas trajando vestimentas à fantasia, custosas e caríssimas, vibraram ao som dos tangos, em requebros de corpos, cada qual procurando melhor acertar o ritmo dessa música material em que se concentra a essência da volúpia, para fundos metálicos, com que pudessem socorrer os sofredores de outras nações; e seus nomes enchiam colunas de jornais, recebendo elogios que não elevam.

            No entanto, em nossas terras, em nossa própria casa, morrem milhares de irmãos, transidos de miséria.

            As águas dos rios avolumam-se, inundam cidades e lavouras, destroços de casas vão por água abaixo, levadas pelas correntezas, girogirando nos redemoinhos; ou sepultando no desmoronar, humanas e infelizes criaturas. Pais lamentam-se assistindo sem remédio a morte dos seus; mães arrancam os cabelos, desesperadas pelo infortúnio. “Rachel chorando a seus filhos sem admitir consolação pela falta deles.” Crianças órfãs correm em busca de abrigo, a procura da caridade, padecendo fome.

            Enquanto isso se dá num ponto do Brasil, em outros a seca produz as maiores calamidades. Retirantes esfaimados, pais e mães trazendo apertados ao peito os filhinhos esqueléticos, que nem forças tem para chorar, atravessam grandes campos desertos, em que só ossadas de gado se encontram espalhadas, por essas extensões sáfaras (desérticas), onde nem um pé de grama brota mais e donde sobe o rescaldo (calor resultante de cinzas) mortificante (1).

             (1)     Leia-se sobre o assunto “O Secular problema do Nordeste”, de Ildefonso Albano.

             A indiferença para com a desgraça desses nossos patrícios, no entanto, por parte nossa, é a mais acentuada possível.

            Porque? Bem sabemos que as provas coletivas são uma verdade. Mas, não temos o direito de ir ao encontro dos que passam por essas provas, procurando amenizá-las?

            Sim. Deus, em sua infinita misericórdia, permite que ajudemos a cumprir suas penas aos condenados, não só dando conforto material, mas também físico e moral.

            Mas então, porque a nossa indiferença para com esses patrícios que sofrem, quando ainda não há muito mostrávamos tanto interesse pelos nossos irmãos do estrangeiro?

            Porque, longe estão os tempos em que a mão esquerda não saberá o que faz a direita. Interesses banais de orgulho e vaidade ocultam-se nessa caridade apregoada aos quatro ventos. Que interesse pode haver para as sociedades promotoras de festas caridosas no socorrer pobres infelizes dos nossos sertões? Que medalhas ou brasões, essa miseranda gente pode mandar pregar ao peito daqueles que fartos, servem-se do nome bendito da caridade para divertirem-se com motivos justificados? Que agradecimento pode vir dessa gente paupérrima e anônima, que recebendo o óbolo, não sabe quem lh’o enviou e apenas humildemente ergue os olhos para cima e agradece a Deus, pensando ser do céu aquela esmola?

            Nenhum; ingratos. Socorre-los é atirar pérolas a porcos; não podendo agradecer, nem papel talvez tenham para mandar uma lista de nomes manifestando sua gratidão e que possa ser publicada nas gazetas indígenas.

Os pobres da Bélgica heroica, da França invencível, da Itália valente, e de outras nações, ah! Esses... outra coisa... uma esmola a eles pode estreitar a amizade entre os dois países, o nosso e o deles, resultar daí um grande intercâmbio comercial. Além do que eles sabem ser gratos e os agradecimentos vem escritos em papel pergaminho e por via diplomática... vale a pena gastar o tempo assim com gente boa e fina... gente que sabe agradecer... Longe estão os tempos e muito longe, em que o homem saberá praticar a caridade.


quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Reverência ao Codificador

 

“Reverência ao Codificador”  

por Indalício Mendes

Reformador (FEB) Outubro 1964

             Há cento e sessenta anos (*), na cidade francesa de Lião, encarnava um dos mais nobres Espíritos do século XIX: Hyppolyte Léon Denizard Rivail, o nosso queridíssimo Allan Kardec, figura apostolar escolhida pelos maiores do Alto para restaurar no mundo, através do Espiritismo, o Cristianismo do Cristo, tão desnaturado através dos anos por aqueles que se arrogam herdeiros exclusivos do Mestre de Nazaré.

 (*) Do blog:  Hoje... 2021 – 1804 = 217 anos.

 Foi realmente, a 3 de outubro de 1804 que nasceu Allan Kardec. Sua biografia, tantas e tantas vezes repetida, já se fixou na memória de todos os confrades. Portanto não iremos rememora-la aqui, por desnecessário. Queremos, isto sim, apontar a extraordinária significação dessa data, não somente para os espíritas como para a Humanidade em geral.

            O 3 de Outubro de 1804 constitui um marco na luta pela evolução moral do homem na Terra. Kardec teve uma preparação intelectual e moral relativamente longa, pois era preciso que se ilustrasse, que tomasse sólido conhecimento dos problemas humanos, que adquirisse larga experiência, antes de ser chamado ao cumprimento de sua missão. Assim, cinquenta anos depois, isto é, em 1854, teve, pela primeira vez, sua atenção atraída para o Espiritismo, mais precisamente para as “mesas girantes”.

Kardec, entretanto, não era homem fácil de convencer.   Só aceitava uma ideia depois de examiná-la séria e profundamente, esgotando todos os argumentos a ela contrários.

Ao lhe dizerem certos Espíritos que teria de cumprir uma espinhosa missão, respondeu que tinha “o maior desejo de contribuir para a propagação da verdade”, mas não se achava talhado para tão grande responsabilidade, pois confessara que dificilmente acreditava nessa missão.

O fato é que, ao convencer-se de que não lhe faltaria a assistência espiritual imprescindível ao seu trabalho, aceitou a incumbência.  

As lutas de Kardec, pela codificação, pela vulgarização dos livros doutrinários, pela defesa do Espiritismo, atacado pelo clero e pelo cientificismo pedante, foram tremendas. Não estivesse ele preparado para resistir a tantos ataques, não fora um homem de moral férrea e temperamento vigoroso, a iniciativa teria malogrado. Mas, se os Espíritos o escolheram foi porque sabiam que seria capaz de levar avante a ideia que aguardava há muito tempo o aparecimento na Terra de um homem com o conjunto de virtudes morais e intelectuais que ele representava.

O “Espírito de Verdade” prevenira-o de que se acautelasse, porque, “para lutar com os homens, são indispensáveis coragem, perseverança e inabalável firmeza. Também são de necessidade prudência e tato, a fim de conduzir as coisas de modo conveniente e não lhes comprometer o êxito com palavras ou medidas intempestivas.

Exigem-se, por fim, devotamento, abnegação, e disposição a todos os sacrifícios.”

Grande homem! Espírito eleito! Kardec, já forjado o caráter na vida que lhe havia sido reservada antes de aceitar a honrosa e grave responsabilidade, esteve à altura da confiança nele depositada.

E não falhou. Não esmoreceu. Não desmereceu. O Pentateuco Espírita – “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, “O Evangelho segundo o Espiritismo”, “O Céu e o Inferno” e “A Gênese” – atestam a grandeza da sua tarefa, monumental por seu conteúdo filosófico, científico e religioso, assim como por sua extensão.

Quantos benefícios têm sido feitos à Humanidade pelo Espiritismo? Quantas vidas salvas, retificadas, amparadas e iluminadas pelas obras assinadas pelo ilustre Codificador!

Transferimos para nós todos, neste momento, o exame da grandiosidade do labor de Kardec. Evidentemente, dele não foi todo o grande trabalho, porque superiores Espíritos realizaram a parte mais relevante da mensagem do Consolador. Todavia, coube a Kardec interpretá-la, pô-la em ordem, ajustá-la, codifica-la, enfim. E que serviço! Não houvesse ele podido contar com a assistência espiritual, talvez, nos momentos mais agudos, sentisse dificuldade em tomar a decisão certa.  Mas qual! Se não lhe faltava a assistência do Alto, também não lhe escasseava valor próprio para discernir e saber qual o caminho mais aconselhável a seguir em determinadas circunstâncias.

Os Espíritos, entre eles o “Espírito de Verdade”, sem perderem de vista o missionário, não interferiam em seu livre arbítrio, embora exercessem, quando oportuno, a crítica justa e construtiva, como quando cometeu um erro na elaboração de “O Livro dos Espíritos” e foi advertido por meio de pancadas ouvidas e interpretadas com acerto, tanto que Kardec revisou o que estava pronto, encontrando outros defeitos, sendo, assim, conduzido a refazer o trabalho.

Houve um tempo em que levou em que levou cerca de um ano sem receber qualquer comunicação escrita em sua casa. E confessou: “Somente fora da minha casa lograva eu receber comunicações.”    

Porque isso? Naturalmente porque o “Espírito de Verdade” não desejava que ele, em sua casa, só com o médium, pudesse ser involuntariamente induzido a qualquer equívoco que o fizesse, depois, vacilar quanto à segurança dos comunicados.

Em 1º de janeiro de 1867, com 63 anos, lembrava que a comunicação do “Espírito de Verdade”, entremostrando-lhe os percalços futuros, “se realizou em todos os pontos”. Ele sofreu todas as vicissitudes preditas. Foi traído por aqueles em quem mais confiava, caluniado, invejado, difamado, atacado por quem lhe devia muitos serviços.

Semelhante comprovação, em vez de constituir desânimo para esse homem admirável, ainda mais robusteceu a sua fé no Espiritismo, consolidando a confiança já enorme que tinha em o “Espírito de Verdade” e em outros Espíritos elevados.

Eis porque, espíritas que tendes a responsabilidade de direção de qualquer obra, qualquer serviço no Espiritismo, não vos deixeis quebrantar pelas traições, injúrias, mentiras, intrigas.

São coroas de espinho que os ineptos põem na cabeça dos que se sacrificam tudo de material pela realização de serviços humanitários, de propaganda de obras benéficas e salvadoras. A maldade dos homens espiritualmente atrasados constitui a cruz que todo homem evoluído carrega aos ombros.

Quantos companheiros nossos tem sofrido o mesmo? Sofrem calúnias, críticas soezes daqueles que nada realizam, a não ser o derrotismo. Mais tarde, quando chegar a hora do ajuste de contas, os que perseveram na luta bendita, apesar de todos os sofrimentos morais, ainda se curvarão bondosamente, na Espiritualidade, para levantar do chão os irmãos que tentaram enlameá-los infrutiferamente.  

Que grande significação tem para nós, espíritas, o 3 de Outubro!

 


quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Auto-de-fé em Barcelona

           

         Auto-de-fé em Barcelona

                            por Túlio Tupinambá (Indalício Mendes)

                                            Reformador (FEB) Outubro 1964

             Há cento e três anos (*), o mundo civilizado experimentava profundo golpe, em virtude de mais um grande crime de intolerância, verificado na católica Espanha. O episódio, embora conhecidíssimo, merece nova referência, pelo que encerrou de ensinamentos, numa época em que a liberdade religiosa é mais respeitada, embora, de quando em quando, repontem ocorrências demonstradoras de que a velha intolerância clerical não está de todo morta.

             (*) Do blog:  Hoje... 2021 – 1861 = 160 anos.

             O 9 de outubro de 1861 é uma data inesquecível nos anais do Espiritismo mundial. Retrata, em sua simplicidade, a revivescência da intolerância que se agrandou na Idade Média e aponta a saudade profunda de processos inquisitoriais, aquietada pela fogueira que queimou exemplares de ‘O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns” e da “Revista Espírita”, além de diversas obras e brochuras espíritas, num total de 300 volumes.

            Podemos imaginar o sentimento sádico com que foi ateado fogo nas obras espíritas. Não será excesso admitir que o odor do papel carbonizado pode ter recordado aos inquisidores o cheiro acre de carne humana queimada em nome de Deus, nas fogueiras que iluminaram principalmente a Europa, advertindo os povos de que a liberdade humana continuava a sua luta pela conquista integral de posições num mundo dito civilizado.

            Este trecho da ata de execução, transcrito em “Obras Póstumas” de Allan Kardec, é uma advertência permanente para que todos os espíritas continuem ativos e vigilantes, orando pela evolução dos espíritos trevosos que os acometem., em nome de Jesus, sem, entretanto, seguir lhe a trajetória fraterna e redentora:

            “Nesse dia, nove de Outubro de mil oitocentos de sessenta e um, às dez horas e meia da manhã, na esplanada da cidade de Barcelona, no local onde são executados os criminosos condenados ao derradeiro suplício e por ordem do bispo desta cidade, foram queimados trezentos volumes e brochuras sobre o Espiritismo, a saber: ‘O Livro dos Espíritos’ por Allan Kardec, etc.”

A Sociedade da Livraria Espírita de França ainda conserva, numa urna de cristal, “um pouco da cinza apanhada na fogueira, onde se encontram fragmentos ainda legíveis de folhas queimadas”.

Felizmente, as coisas tem melhorado, embora ainda, vez por outra, no interior, apareçam reminiscências inquisitoriais, através de pressões a espíritas, de coações a casas kardecquianas, etc. Os governos do Brasil têm, de um modo geral, procurado assegurar a todas as religiões a liberdade de culto e propaganda que lhes é garantida pela Constituição.

A História fixou o 9 de outubro de 1861 como data que assinalou a fereza com que o Espiritismo era perseguido. Entretanto, depois desse acontecimento, o Espiritismo cresceu na Espanha, até que a sua expansão foi sustada por influências idênticas àquelas que inspiraram o 9 de outubro. Não obstante, ele continua conquistando corações, porque nada consegue impedir o triunfo da Verdade que, mais dia, menos dia, quebrará os diques que obstam a sua expansão e se afirmará luminosamente nos lugares em que a intolerância está mais fortalecida.

O que todos os espíritas devem fazer, em bloco, é orar para que as barreiras cedam à pressão da Verdade, e esta, que é como o Sol, brilhe para todos, a todos levando o conforto do seu calor, que é vida, que é amor, que é esperança num futuro feliz.

 


Rosas e Espinhos

 

Rosas e Espinhos

José Brígido (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Agosto 1964

             Quando chegaram ao roseiral, disse o avô enternecido à neta meiga e atenta:

            - Estás vendo, amor, quantas rosas lindas e perfumosas?

            - Sim, vovô. Como são belas! Vou colher aquela ali, que tem a seu lado dois formosos botões...

            - Cuidado, menina. Não te deixes fascinar pela beleza das rosas a ponto de esqueceres os espinhos que as acompanham. Eu mesmo tirarei uma delas.

            Em seguida, o avô solícito se aproximou da roseira e com extrema cautela pôs-se a vergar pequeno caule para quebra-lo. Consegui-o logo, mas, não obstante o cuidado, foi picado por um espinho e de seu dedo saiu uma gotícula de sangue.

            - Está aí, menina. Observa bem que de nada valeram a minha prevenção e a minha experiência. Colhi a rosa, mas pague o tributo do sangue.

            Inquieta, a netinha comentou arrependida:

            - Fui culpada, vovô. Para me satisfazeres, sofreste essa espetadela.

            - Tudo tem uma razão para acontecer. Agora, ainda estás pequena, pouco sabes da vida. Doze anos quase nada representam no começo da vida.  Entretanto, deves prestar muita atenção às minhas palavras e guardar esta lição, que poderá ser muito útil a tua vida futura.

            Passando carinhosamente a mão pelos cabelos macios da menina, o avô continuou falando:

            - Mais tarde, quando já estiveres bastante crescida, sentirás a vaidade natural do teu sexo. Terás alegria em ser bonita e admirada. A beleza física, quando desamparada da beleza moral, corre perigo. Justamente porque é bela, a mulher é requestada. Experimenta secreto prazer por ser admirada.

            Ela se entrega aos desvelos de cabelereiros exímios, reúne cosméticos e ingredientes especiais para realçar lhe a beleza ou para apagar lhe os traços incompatíveis com os cânones do belo. Dentro em pouco, todo o seu tempo será empregado nesse mister. Se desatenta de seus deveres espirituais, acabará por esquece-los de vez. Toda a sua vida se resumirá em mostrar-se bela e elegante. Sem o sentir, torna-se prisioneira de si mesma, egocêntrica, fria e indiferente para tudo quanto não se relacione com a sua pessoa.

            Casa-se e, nos primeiros tempos, quando ainda não está estabelecida uma familiaridade mais completa com o marido, tudo irá aparentemente bem. Depois, ela cederá à tirania do ego. Se o esposo for sensato, poderá reeduca-la devagar, com ternura, e recoloca-la no bom caminho.  Mas se estiver deslumbrado com a sua beleza e fraquejar, então, minha filha, o pretenso amor do casal durará o tempo desse deslumbramento.

            Pode acontecer que o egocentrismo exagerado corrompa até o sentimento materno de uma esposa em tais condições. A ela pouco importará que os filhos estejam bem ou não, que se vistam convenientemente ou que andem sujos e quase desnudos. Ela cuida de si, apenas de si, deixando as crianças entregues a empregadas nem sempre pacientes e dedicadas.

            Enquanto isso, a rosa ostenta suas pétalas maravilhosas e exala extasiante perfume. Todos se encantam com a sua beleza e com o seu odor. Ela própria vive num mundo diferente, num mundo que é somente seu, porque se constitui exclusivamente de si mesma.

            Essa, minha querida neta, é a primeira parte da história.

            Tens mais, vovô?

            - Sim. É o mais importante também.

 ***

           - Já conversei contigo muitas vezes sobre pontos da Doutrina Espírita.

            - E eu gosto muito quando falas dela, vovô.

            - Então, ouve. Como sabes, somos Espíritos de passagem pela Terra, ainda em fase de aprendizado. Vimos do mundo espiritual para o mundo terreno; depois, saímos do mundo espiritual para o mundo terreno; depois, saímos do mundo terreno e voltamos para o mundo espiritual, para, de novo, retornar à Terra. Essas idas e vindas estão reguladas por leis muito sábias e corretivas, a mais importante das quais é a denominada “Lei de Causa e Efeito”, que alguns dizem “Lei do Retorno” e os orientais chamam “Carma”. Segundo essa lei, o nosso destino (deves entender “destino” como “futuro”) depende principalmente da nossa maneira de pensar e agir em todos os instantes da existência.

            Aquela criatura que se fez centro de gravitação universal, que somente pensa em si, que se tornou vítima de mórbido narcisismo, não resistirá à ação do Tempo. Quando, tal qual a rosa bonita que colhemos no jardim, a sua beleza começar a declinar, como a flor se irá despetalando, irremissivelmente, então ela verá, em torno de sua alma, não o vácuo, porque o vácuo não existe, mas entidades que lhe parecerão estranhas e incômodas. Depois que a rosa desaparece, o que dela fica é apenas a haste nua, eriçada de espinhos. Não há rosas sem acúleos perigosos, como não há vida sem problemas e preocupações sérias. Todavia, o destino da rosa é aquele: embelezar a Natureza que a criou e ceder sua vez a outras rosas para que se cumpra a sua finalidade.

            A mulher, entretanto, pode engrandecer-se, crescer, ganhar louvores por seu amor desinteressado e fecundo. Pode ser bela sem ser inútil. Pode cuidar de sua beleza sem olvidar as obrigações naturais da sua função na vida familiar e social. Se busca refúgio no culto à Espiritualidade, eleva-se, purifica-se, diviniza-se, principalmente quando ingressa na maternidade e se desvela pelos filhos e pelo esposo, encontrando ainda oportunidade para fazer algo de bom por seus semelhantes. Então, será uma rosa sem espinhos, cujo perfume se embalsamará com as bênçãos do Alto, e sua beleza, em vez de ser um tropeço, será um estímulo ao Bem, uma atração benéfica e redentora.   

            A netinha apertou mais o braço do vovô e o instigou:

            - Conta mais, conta, vovô.

            - Ainda não acabei. Aquela mulher bonita, que só vivia para sua beleza, começou a sofrer quando percebeu que de nada adiantavam os tratamentos a que se submetia para retardar os insultos da velhice que se aproximava. As rugas começaram a marcar lhe o rosto belo: o olhar foi perdendo aquele viço singular. Ela, então, redobrou em cuidados com a sua pessoa. Os filhos continuavam crescendo sem a sua assistência permanente, deseducados, hostis e inconvenientes. Seu lar, que era suportável enquanto eles eram pequenos, já mostrava uma diferença sensível para pior. Os filhos não tinham disciplina, eram exigentes e malcriados. Não respeitavam o pai nem a mãe e às vezes até, no auge de discussões inúteis, a destratavam. A rosa ia perdendo as pétalas e os espinhos se tornavam mais presentes do que nunca.

            Então, ela começou a pensar um pouco mais claramente. Abdicara há muito tempo do domínio do lar, porque nele quase não permanecia e, mesmo quando se achava presente, era como se estivesse longe, muito longe, omissa, alheia ao que se passava, ao que faziam os filhos, ao que se passava, ao que faziam os filhos, ao que acontecia com os filhos.

            Certa noite, indisposta, perguntou a si mesma porque tinha filhos tão ingratos. E uma voz lhe chegou aos ouvidos.  

            - A ingratidão não é dos teus filhos, mas de ti. Segundo a Lei, todos colhem o que semeiam. Todavia, lembra-te do Evangelho. Lá está escrito: “Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados.” Ainda terás muito tempo diante de ti. Aproveita-o corajosamente para o resgate de teus erros. Ninguém te libertará dos sofrimentos que te esperam, mas está em ti transformar esses sofrimentos em degraus para a reabilitação.

            Suas lágrimas se multiplicaram. Chorou compulsivamente. Foi quando novamente pareceu ouvir uma voz impressionantemente nítida que lhe dizia:

            - Será muito difícil, agora, retomares a autoridade que perdeste sobre os teus filhos. Eles são o que o teu descaso criou. Foram modelados conforme a tua indiferença por eles. O dever da mãe é sagrado. Nenhuma mulher é mãe apenas por imposição biológica. Cada uma traz um compromisso sério. Tem que educar e orientar os seres que põe no mundo. Nada é mais sério do que isso. Negligenciaste, presa da vaidade. Agora, que deverias ter em torno de si o carinho e a solicitude dos filhos, encontras neles frieza e alheamento. Fazem contigo o que com eles fizeste. É a lei de “Causa e Efeito” em pleno vigor.

            Entretanto, deves reagir e provar que estás disposto a ressarcir, desde já, os débitos que contraíste com a vida terrena e com a Lei. Se o fizeres, sem desânimo nem desespero, mas com humildade e convicção, transformarás os espinhos que agora te ferem em rosas ainda mais belas e perfumosas, porque terão as bênçãos do Alto. Chora, mulher! Tira o peso do teu coração arrependido! Faze, porém, que essas lágrimas adubem o roseiral da tua redenção, para que possas merecer a consolação anunciada no Evangelho!

***

            Voltando-se para a netinha, observou o vovô:

            - Que tens menina? Ficaste emocionada? Não chores. Vou te contar o fim da história.

            Essa mulher, que em sua mocidade fora tão fútil e vaidosa, compreendeu o erro praticado. Suportou estoicamente mil agonias criadas pelos filhos. Pode, no entanto, recuperá-los também. Eles, submetidos a atenções que nuca haviam tido, experimentaram uma mudança salutar. Quando a mamãe, velhinha e já vovó, fechou os olhos materiais e despertou para a vida na Espiritualidade, estava cercada de todos os filhos e netos. O que ela não fizera com aqueles, quando pequenos, pudera realizar com estes últimos. E o efeito do seu trabalho, cheio de amor e sacrifício, reconquistou para ela a ternura dos filhos. Todos eles, contritos, cercava, o seu leito de agonia, cheios de cuidados com o corpo frio e inanimado, e seu Espírito, liberto da carne, se rejubilava, confortando-os. A luz dos círios fora ofuscada pela aura brilhante que envolvia aquele Espírito redimido...

            Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados.”


terça-feira, 26 de outubro de 2021

Juventude Espírita e o Evangelho

 

Juventude Espírita e Evangelho

por Aluísio Feliciano Ramos

Reformador (FEB) Julho 1964

             Juventude espírita e Evangelho são inseparáveis: ambos jovens, apesar de mediar entre uma e outro dois mil anos. Na verdade, que representa esse espaço de tempo em face da Eternidade, quando o plano de sua atuação, no dobar dos séculos, é ensejar renovação a todas as almas que indubitavelmente o integrem no âmago do coração? É tão Boa Nova no século I quanto o é nos dias hodiernos. Poder-se-á dizer, como alguém, aliás, já o disse, que é qual céu noturno: quanto mais se contempla mais estrelas se descobrem.

            Juventude sem Evangelho é juventude irrenovável, estática, sem processo de integração real na vida.

            Jovens, é preciso romper a muralha de indiferença, afastar a sintomática omissão que se faz às coisas do Evangelho, geralmente levada a efeito por aqueles que limitam a existência humana à atual peregrinação terrestre. Por isso mesmo, algumas almas, ao fim de tal período e ao encetar a jornada na verdadeira vida, encontram-se adormecidas e letárgicas para tal fase.

            Com que entraremos na Pátria Espiritual? Quais os requisitos pra a plenitude dos direitos inerentes a ela? Somente a aplicabilidade que dermos aos ensinos contidos no Evangelho.

            Fenomenologia mediúnica sem Evangelho é navio sem bússola, sem aparelhos protetores à navegação; é barco desgovernado, sem porto de destinação.

            Evidências do “Mundo Maior”, sem Evangelho, é simples constatação de eventos sem maiores consequências no dinamismo direcionado do Plano Divino.

            Não foi por casualidade que a obra de Kardec engrinaldou-se com o livro “O Evangelho segundo o Espiritismo”. Caracterizado o fenômeno, elaboradas as leis que a ele presidem, ditadas as consequências decorrentes do mesmo, impunha-se a enunciação de sua finalidade, do alvo que nele se continha, que outra coisa não era senão a comprovação insofismável das verdades contidas no Evangelho de N. S. Jesus Cristo.


segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Doutrinar sempre

 

Doutrinar Sempre

Percival Antunes (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Julho 1964

             Nenhum trabalho é mais importante no Espiritismo do que o ensino adequado da Doutrina codificada por Allan Kardec. E nada consegue tornar a Doutrina Espírita mais positiva e convincente do que a exemplificação daqueles que se dispõem a ensiná-la, quer pela palavra falada, quer pela palavra escrita. Temos de partir do princípio de que o Espiritismo se destina a reformar o homem, para que o homem, espiritualizando-se progressivamente, possa contribuir para reformar a coletividade a que pertence. Isto, porém, não é obra para pouco tempo. É trabalho longo, que precisa de ser feito com método e tenacidade.

            O Espiritismo não é nem pode ser responsável por atos e ideias daqueles que, dizendo-se espíritas, não se subordinam às determinações da Doutrina Kardequiana. Por isto, não devem dar demasiada importância aos adversários da nossa religião, sempre prontos a explorar com escândalos ocorrências que de modo algum dizem respeito aos kardecistas: Já dizia o Codificador; “O Espiritismo não é solidário com aqueles a quem apraza dizerem-se espíritas, do mesmo modo que a Medicina não o é com os que se a exploram, nem a sã religião com os abusos e até crimes que se cometam em seu nome. Ele não reconhece como seus adeptos senão os que lhe praticam os ensinos, isto é, que trabalham por melhorar-se moralmente, esforçando-se por vencer os maus pendores, por ser menos egoístas e menos orgulhosos, mais brandos, mais humildes, mais caridosos para com o próximo, mais moderados em tudo, porque essa a característica do verdadeiro espírita.”

            Os que desconhecem a Doutrina Espírita estranham que as Organizações Centrais do Espiritismo não dirijam o movimento espírita, subjugando todos os grupos e centros ditos espíritas e obrigando-os a seguir suas diretrizes. Não. O Espiritismo tem uma doutrina que acata, respeita e resguarda o livre arbítrio da criatura humana. “Ele proclama – continua o Codificador – a liberdade de consciência como direito natural; reclama-a para os seus adeptos, do mesmo modo que para os seus adeptos, do mesmo modo que para toda a gente.  Respeita todas as convicções sinceras e faz questão da reciprocidade. Da liberdade de consciência decorre o direito de livre exame em matéria de fé. O Espiritismo combate a fé cega, porque esta impõe ao homem que abdique da sua própria razão; considera sem raiz toda fé imposta, donde o inscrever entre suas máximas: Não é inabalável, senão a fé que pode encarar de frente a razão em todas as épocas da Humanidade.”

            Por essas palavras do Codificador, claro se torna que a Doutrina Espírita faz da tolerância esclarecida e da compreensão elementos imprescindíveis à formação do caráter espírita. A doutrina, portanto, não tem ação dogmática, pois não impõe, mas expõe, ajuntando argumento simples e de irresistível lógica.

Por isso é que temos sempre insistido na necessidade de uma difusão cada vez maior da Doutrina, através de pregadores que a conheçam suficientemente e possuam condições para explica-la, de maneira a torná-la rapidamente assimilável aos ouvintes de mais modesta faculdade de apreensão. Clareza e simplicidade, exemplificação e objetividade, eis o de que se precisa para que os princípios doutrinários do Espiritismo sejam logo aceitos, porque, na realidade, eles nada tem de complexo nem de difuso.

Mai do que nunca, o mundo precisa de Doutrina, Doutrina e Doutrina Espírita!   


Ingenuidade dos Espíritas

 

Ingenuidade dos Espíritas

Boanerges da Rocha (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Junho 1964

             Para aqueles que são realmente espíritas, nenhuma preocupação pode causar celeuma que se fizer em torno de fatos que todos sabemos verdadeiros, mas que os “sábios” negam por diferentes razões, muitas vezes “a priori”, sem que tais razões tenham base concreta Negam por negar, pois, para muitos deles, os espíritas não passam de uns simplórios, mais ou menos analfabetos, que acreditam em tudo e não possuem o dom do discernimento e da análise.

            Em certos casos, isso é até motivo para sorrir e devemos sorrir mesmo, porque estão perdendo tempo precioso, em lugar de se dedicarem ao estudo sério de assuntos dignos de atenção.

            Foi publicado, em 1962, que um psiquiatra norte-americano viria ao Brasil estudar a reencarnação. Veio de fato e a imprensa noticiou, meses depois, que algumas personalidades do grande país do norte se interessavam de perto pelos problemas psíquicos e por seu desenvolvimento em nosso País. Em 1963, outros estiveram aqui e alguns chegaram mesmo a visitar o médium Arigó, consultando-se o Espírito Dr. Fritz, por ele recebido. Dispensamo-nos de maiores considerações, pois os jornais divulgaram os resultados obtidos por duas dessas personalidades, uma das quais fora operado pelo Dr. Fritz, depois de haverem os médicos de sua terra se negado a fazê-lo, por se tratar de intervenção cirúrgica numa zona corpórea excessivamente melindrosa.

            Há de haver negadores da realidade, até que a luz da compreensão, filtrada pelo estudo imparcial, faça cair as escamas do preconceito ou da ignorância, que cobrem os olhos dos obstinados.

            Os espíritas não são tão crédulos quanto assoalham seus adversários. Todos desejamos rigor nas experiências e nas observações, e exigimos que elas sejam sempre cercadas de cuidados, a fim de se tornar impossível qualquer mistificação, porque esta existe sempre onde está o homem pouco afeito à conquista simples da verdade perseguida pelo homem honesto.

            Há algum tempo, lemos um telegrama de Niamei, na Nigéria (África), que “uma jovem nigeriana, de 25 anos, ressuscitou 24 horas depois de haver sido enterrada. A moça, chamada Badiza, vivia num povoado da selva, a 150 quilômetros de Niamei. Cega de nascimento, caiu doente e faleceu. Seu corpo foi envolto em tiras de pano, como é costume na região, e imediatamente inumado. No dia seguinte ao da cerimônia, sua irmã foi à sepultura, para ali depositar as roupas que haviam pertencido à defunta, e teve a enorme surpresa de verificar que a terra da tumba havia sido removida, deixando descoberto o corpo de Badiza.  Ao perguntar a si mesma, em voz alta, razão do mistério, ouviu, do fundo da terra, sua irmã responder: “Sou eu, Badiza; estou procurando sair daqui. Assustada, a moça correu ao povoado e avisou a população, que foi ao cemitério, donde retirou Badiza. Para os habitantes locais, trata-se de um caso de ressureição milagrosa, tanto mais que a jovem passou a  contar o que vira no outro mundo, onde os animais falam, os grãos de trigo são tão grandes como cabeças humanas, etc. Para os médicos, porém, tudo não passou de uma crise de letargia, ou catalepsia.” (O Globo, Rio, de 39-5-1962.)   

            Os espíritas recusam a ressurreição do corpo físico. Tal fato constituiria uma derrogação das leis naturais, que são imutáveis. “como imutável é a vontade de Deus, que as formulou desde toda a eternidade. Deus, portanto, nunca as derroga” (‘Os Quatro Evangelhos’, de Roustaing, III, p. 499). Os apóstolos creram na ressurreição de Jesus, porque, afinal, não estavam em condições de admitir outra coisa. “A crença dos apóstolos tinha que servir e serviu de base às controvérsias e às contradições humanas que se suscitaram no correr dos tempos. Essas controvérsias, que atualmente só conduzem ou à fé cega, ou à incredibilidade, prepararam, através dos séculos, os espíritos para receber e suportar a revelação nova. A crença numa ressureição corporal, pela volta do Espírito de Jesus a um corpo material humano, igual aos vossos, tornado cadáver por efeito da morte real, qual a sofreis, essa crença, transitória por natureza, como todas as opiniões e interpretações humanas, produziu seus frutos.

            “Hoje, constitui erro manifesto, em face dos progressos realizados, e se tornou inadmissível, condenada como está pelo princípio da imutabilidade das leis da Natureza, por todos os fatos evangélicos que iluminados com a luz da ciência espírita, servem de base e de fundamento à nova revelação para explicar, segundo o espírito, em espírito e verdade, o que foi a “ressurreição” de Jesus, como se operou aquele corpo, formado, segundo a letra, por obra do Espírito Santo, isto é: excluídas toda e qualquer ação, toda e qualquer obra humana, pela aplicação e apropriação de leis naturais diversas das que presidem á reprodução na Terra” (Ob. Cit. Ibidem, págs. 498/9).

            Consequentemente, o fato ocorrido em Niamei pode ser explicado como letargia ou catalepsia, nunca, porém, como ressurreição, pois fazer retornar a vida um corpo já desprendido do Espírito, isto é, um corpo realmente morto, é impossível, por significar uma derrogação das leis de Deus.

            É preciso não esquecer estas palavras do filósofo Leibnitz, repetidas neste trecho do estupendo livro “Bases Científicas do Espiritismo”, de Epes Sargent, traduzido e editado pela Federação Espírita Brasileira: “Nenhuma fé, diz Leibnitz, pode ser real ou inteligível, se não tiver a sua base na razão humana. A religião divorciada da razão do homem não pode firmar-se e sustentar-se.” A isto, acrescenta Epes Sargent: “A glória do Espiritismo está no seu apelo feito à razão por meio da Ciência, e no fato de nos fornecer elementos de uma religião, velha como o mundo, mas ao mesmo tempo, racional, científica e emocionante. Essa religião, porém, deve pelo próprio indivíduo ser deduzida dos fatos e ser assim considerada realmente dele, e não como um fruto da árvore da vida plantada por outro homem.” (p. 175)

            Não há razão, portanto, para se pensar que todos os espíritas ouvem cantar o galo sem saber onde. Supor sejamos ingênuos e incapazes de pensar, analisar e julgar, constitui prova evidente de que os que assim nos apontam vivem mais no mundo da fantasia do que no mundo da realidade, em que supõem encontrar-se.