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quarta-feira, 30 de junho de 2021

Da atitude mental do Espírita - Parte IV e final

 


Da atitude mental do Espírita - parte IV e final
por Boanerges da Rocha (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Junho 1961

           A qualidade natural do verdadeiro espírita é a alegria, a esperança, a confiança, a paciência e nunca o desânimo, a tristeza e o desespero.


           Sabemos que a vida tem dois planos: o material, visível, e o espiritual, invisível ao comum dos homens. Não desconhecemos os problemas do ser humano em face dos outros homens, assim como em face do seu passado espiritual. Não ignoramos as responsabilidades de cada criatura humana, principalmente no que toca ao passado e ao que diz respeito ao presente e ao futuro. A  importância da reencarnação em nossa conduta atual é infinita. A ação corretiva da "lei de causa e efeito" mostra-nos qual dos caminhos devemos preferir, se pretendemos realmente alcançar o aperfeiçoamento moral.

           Muito do que nos acontece é proveniente da nossa falsa posição mental. emos forte propensão para criticar os atos alheios e uma condescendência admirável para com os nossos próprios atos. Andamos de olhos bem abertos quando se trata de fixar erros e culpas alheias, mas continuamos de olhos fechados quando temos de ver as nossas deficiências, não raro bem mais graves do que aquelas que intentamos censurar e condenar. Não poderemos progredir, subir a escala evolutiva, se não nos esforçarmos em desenvolver moralmente o nosso espírito.

          Muitas vezes, a ambição de ganho fácil torna o homem áspero, seco, insensível e duro.Em certas horas do dia, ele se apresenta com essa personalidade. Em outras, mostra-se afável, acessível, brando, compreensivo, tolerante, prestante, amigo. Essa "dupla personalidade" apenas revela incompreensão dos ensinamentos doutrinários do Espiritismo. O homem espírita não pode ser agora uma coisa, e, logo mais, outra. Terá de ser sempre o mesmo homem de elevação moral suficiente para não tornar a vida de seus semelhantes mais insuportável.

           O espírita tem o dever de ser franco, mas também o de ser justo, sem rudeza nem agressividade. Deve respeitar o seu semelhante como gosta de ser respeitado. Para ser digno não necessita de evidenciar atitudes formais, cerimoniosas ou secas. Pode ser afável sem familiaridade, fraterno sem excessiva intimidade.

           A atitude mental de cada um de nós é bem importante na vida. Independentemente da posição social que ocupe, qualquer homem pode ser amigo dos outros homens. Se não devemos ser escravos de ninguém, do mesmo modo não devemos escravizar ninguém. O homem que abusa de sua posição social, do seu dinheiro, do seu poder público ou da sua força física para humilhar ou sacrificar outro homem, esse jamais será um legítimo cristão, nunca poderá ser considerado um espírita, na acepção do termo.

           Portanto, precisamos todos, vocês e nós mesmos, ter muito cuidado com a nossa atitude mental, desde a hora em que despertamos até o momento em que fechamos os olhos para o sono reparador de energias. Isso de se alegar haver cometido tal ou qual ato "por acaso", é uma forma de dizer incompreensível no Espiritismo, porque o acaso não existe, é uma ficção. Dotado do livre arbítrio, cada ser humano é responsável por tudo quanto diga ou faça, ostensiva ou ocultamente. A "lei de causa e efeito" está sempre em ação, mesmo quando dormimos. Se alguém supõe que tal ou qual ato possa ficar impune, porque ninguém o viu ou dele tomou conhecimento, engana-se. Nenhum débito fica sem resgate. Todos responderemos pelo mal que fizermos. Não é preciso esperar, para isso, o dia do Juízo Final dos católicos. A "lei de causa e efeito" está sempre presente a cada um dos nossos pensamentos e atos. Assim como seremos beneficiados pelo que fizermos de bom, seemos responsabilizados pelo que de mal praticarmos. Essa lei é inexorável e indefectível. Acompanha-nos no mundo terreno e no mundo espiritual.

           O Espiritismo tem por fim educar o homem para uma vida melhor, dando-lhe a instrução de que carece para compreender perfeitamente as relações existentes entre o mundo físico e o mundo espiritual, assim como a correlação permanente da vida terrena com a vida no plano invisível. Assim como somos influenciados pelo mundo espiritual, também somos influenciados pelo mundo espiritual, também podemos influenciá-lo. Está em nós tornar essa influência um bem ou um mal. Nossas ações agem como o "boomerang" dos silvícolas australianos, com a diferença única de que, mesmo que o alvo seja atingido, recebemos, de retorno, o bem ou o mal que a ele houvermos dirigido.
  • Fazemos nossas estas palavras de Léon Denis, em "Depois da Morte": "A vida não é mais do que a evolução, no tempo e no espaço, do Espírito, única realidade permanente."

Da atitude mental do Espírita - Parte III

 

Da atitude mental do Espírita - parte III
por Boanerges da Rocha (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Março 1961

             Já dissemos algo sobre a necessidade de mostrar-se a nocividade do conformismo sistemático, que engendra o servilismo e anula as qualidades nobres da personalidade humana.

           Temos de nos esforçar para que a Terra não continue sendo um vale de lágrimas, mas uma senda de esperanças, escorados na ação dinâmica.Em vez de irradiarmos tristeza, devemos suscitar bem-estar, tranquilidade, confiança no presente e no futuro, valorizando a existência terrena, encorajando os fracos e os infelizes, para que eles, contagiados por essa confiança, reajam salutarmente, vencendo primeiro o desânimo que os abate, para, passo a passo, poderem recuperar-se e formar conosco o grupo que quer e já vai transformando a Humanidade para melhor.

           A maior luta do espírita, além da sua própria reforma, consiste em levar a seus semelhantes a esperança em dias felizes, a confiança no futuro, porque, para quem conhece a Doutrina e tem a certeza do que os espera, o dia de amanhã poderá ser menos áspero que o de hoje.

           Ninguém tem o direito de intoxicar a vida alheia com os seus queixumes e lamentações.

           Todos nós sofremos, todos temos dias mais felizes e menos felizes. Não é por isso, no entanto, que devemos viver chorando e pontilhando de lágrimas as mais tristes lamentações, multiplicando aflições. Ninguém vem a este mundo para divertir-se. Há deveres a cumprir e esses deveres serão cabalmente executados, hoje ou amanhã, nesta ou em outra vida. Ninguém se iluda a tal respeito. Entretanto, isso não importa em abandonar as boas e corretas alegrias que podemos e devemos gozar. O mal não está em tirarmos honestamente proveito do que a vida terrena nos ofereça de útil e vantajoso, desde que não esqueçamos dos deveres morais que nos apontam os verdadeiros rumos. O perigo não está no uso, mas no abuso.

           Se cumprirmos as obrigações que a Doutrina Espírita nos assinala, jugulando o egoísmo maldoso, pondo freios `vaidade, anulando o orgulho, e se ao mesmo tempo nos tornarmos altruístas, procurando ajudar os nossos semelhantes naquilo que nos for possível, orientando-os, assistindo-os, renunciando a benefícios, vantagens e conveniências, sempre que essa renúncia puder constituir ajuda para alguém, estaremos com a consciência tranquila.

           Não nos devemos entregar a alegrias adiáveis, ou inoportunas, quando o dever nos aponta a necessidade de socorrer alguém que precisa da nossa palavra amiga ou da nossa ajuda material, para mitigar-lhe as desditas e os sofrimentos.

           Nós, espíritas, devemos provar cada vez mais que a nossa Doutrina é um doutrina de ação, um doutrina de confiança, uma doutrina de trabalho permanente em prol do bem ao próximo, de auta-evolução e, sobretudo, de integraçãoabsoluta nos princípios da sincera fraternidade.

           Quando vemos, em determinadas reuniões, um ambiente excessivamente sombrio, que mais parece um velório do que verdadeiramente uma sessão espírita, compreendemos o imenso trabalho de doutrinação que o Espiritismo tem de realizar pelos anos afora. Isto porque seu objetivo é fazer cada criatura humana alcançar o ideal do aperfeiçoamento ético, baseado na experiência moral, mais precisamente, baseado na conduta diária do homem, na exemplificação permanente dos deveres doutrinários à luz do Evangelho do Cristo.

           Não devemos, por mal compreendida tolerância, permitir que a Doutrina seja deturpada ou corrompida, com a introdução de hábitos e práticas estranhos a seus princípios. É o que se vê com facilidade. Elementos egressos de outros credos, que não se desvencilharam de costumes lá adquiridos, vão insensivelmente implantando, em centros espíritas mal orientados, "novidades"  perfeitamente dispensáveis.

           O Espiritismo não tem ritos, não admite liturgias, dispensa imagens, não realiza "batizados" e "casamentos", não participa de solenidades mundanas, não benze armas destinadas a homicídios nem casas comerciais para que façam bons negócios. Tudo quanto se faça a esse respeito colide inteiramente com  a Doutrina Espírita. Daí não há fugir.

           Anteriormente, referimo-nos à conveniência de se evitar o conformismo sistemático. Aquele que se curva passivamente a tudo, sem reação digna, acaba por se anular, destruindo a própria personalidade, tornando-se, em vez de elemento útil, participante da vida ativa e fecunda de seus semelhantes, um estorvo para o progresso da sociedade. Lemos algures: "Mais vale ser livre no inferno que um sem vontade na glória."

           O conformismo doentio é fruto, às vezes, de má compreensão da humildade. Temos o dever de ser humildes, mas também temos o dever de não ser servis. Quando a humildade perde o sentido de si mesma, o servilismo toma seu lugar. Ninguém foi mais humilde que o Cristo, mas também ninguém foi mais claro, positivo e enérgico do que ele, sempre que se fazia mister agir mais dinamicamente. Ninguém teve uma personalidade tão forte. A humildade verdadeira não é incompatível com a energia e a franqueza, não nos deve levara uma passividade total. Temos de aprender todas essas coisas na vida de todos os dias. Disse Ituarte que "a vida é uma escola em que aprendemos lições, e, aprendendo, evoluímos." Em toda escola, o prêmio de haver aprendido uma lição é que nos deem outra lição de coisas. Aprende-se a andar, andando, e não com teorias de equilíbrio; a escrever, escrevendo, e não ouvindo conferências sobre o particular; Aritmética,à força de resolver problemas; Química, no laboratório, e História Natural, no livro da Natureza, e não repetindo de memória o que diz o livro de texto." Doutrina é agir. O Espiritismo é ação.

           Podemos acrescentar: aprende-se a Doutrina Espírita na vida diária, procurando-se adaptar a nossa conduta aos preceitos doutrinários. Só com a experiência poderemos progredir. Um preceito doutrinário é muito bonito, mas carecerá de importância se não puder ser praticado. É preciso, portanto, que exerçamos todos, praticamente, a Doutrina. Infelizmente, multiplicam-se os núcleos ditos espíritas, mas não se tem multiplicado na mesma proporção o estudo e principalmente  a exemplificação da Doutrina.

           Em nosso modo de entender, o trabalho mais necessário, urgente mesmo, é a pregação da Doutrina, comentários sobre os preceitos doutrinários e a exemplificação no dia a dia de todos nós.

Da atitude mental do Espírita - Parte II

 


Da atitude mental do Espírita - parte II
por Boanerges da Rocha (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Abril 1961

               Entre as primeiras providências que nos cabe tomar, no trabalho pelo próprio aperfeiçoamento, acha-se o "exame de consciência" diário, para que possamos ter uma ideia dos erros e acertos praticados em cada vinte e quatro horas, esforçando-nos por reduzir os primeiros e aumentar os últimos.

           Sem esse cuidado com a própria conduta, nenhuma criatura humana conseguirá verdadeiramente progredir no mundo moral. Temos de aprender que essa obra de auto-aperfeiçoamento, mais espinhosa do que pode à primeira vista parecer, é permanente e incessante, estejamos onde estivermos, sejam quais forem as circunstâncias que nos defrontarem. Mister se torna termos mais boa-vontade com os nossos semelhantes do que com nós mesmos. 

           Qualquer progresso que alcançarmos nesse esforço pelo próprio melhoramento se refletirá, sem que o percebamos, em nossas relações com o mundo exterior. Seremos mais calmos, ponderados, tolerantes, prestativos e, sobretudo, mais concordes com os princípios doutrinários do Espiritismo.

           Quem pensa e age de acordo com a Doutrina Espírita tem, forçosamente, de levar vida virtuosa. Isto é importante para o Espiritismo, pelas consequências benéficas que os bons exemplos sempre deixam. O espírita não é aquele que o diz sem o demonstrar espontaneamente a todo instante, através dos atos e das palavras. O espírita real é o que vive em seu procedimento cotidiano os ensinamentos hauridos na Doutrina. É espírita por estar absolutamente integrado na moral divulgada por Kardec, moral que se assenta na ética do Evangelho do Cristo.

           É, portanto, de enorme valia a observância dos preceitos doutrinários. Quem se afirma espírita, sem respeitá-los por meio de uma exemplificação tão completa quanto possível, em todos os instantes da existência, não passará, na realidade, de um hipócrita, a menos que o faça sem ter clara consciência de estar iludindo a si mesmo, mistificando-se a si mesmo, com o risco, portanto, de amarga decepção futura.

           Há quem pense que os cuidados com o espírito importam em abandono do corpo. Comete sério equívoco. Temos o dever de tratar carinhosamente do corpo, porque ele constitui o instrumento do Espírito nas tarefas do mundo material. Evitar quanto possa prejudicar a saúde, conservar o mais possível o poder vital do organismo e não cometer excessos capazes de afetá-lo.

          A alegria é outra faculdade necessária ao bem-estar do Espírito. Não formamos entre aqueles que fazem do Espiritismo a triste idéia de uma doutrina fúnebre, lamurienta, desvirilizante. Pelo contrário. O Espiritismo é doutrina e doutrina de luz de esperança, de bem-estar, de força de vontade e de vigor. Conclama e ensina os homens ao cultivo da mais ampla fraternidade, une-os, estimula-os a praticar o bem, congrega-os para a abençoada tarefa de operar a divina metamorfose de mal em bem. É doutrina de construção e reconstrução moral, de edificação e retificação do caráter humano, sem dogmas estreitos nem preconceitos estagnantes, homicidas ou desfraternos. Educa para a vida elevada, instrui o homem para que possa ter cada vez maior e mais elevada afinidade com a Natureza, para que compreenda e interprete, no sentido conveniente, a razão das disparidades encontradas na vida humana. Aumenta o grau de compreensão e tolerância esclarecida que todos devemos exercer. Torna cada criatura humana compatível com a finalidade do viver terreno, que é, sem dúvida, uma preparação para a vida espiritual.

           Um homem fiel aos preceitos doutrinários do Espiritismo tem conduta exemplar em todos os sentidos e em todas as ocasiões. Não se desmanda, não comete ações vis, não se faz joguete de vícios, não se abandona à preguiça, não engana, não rai, não calunia, não é maledicente nem se presta a ser instrumento maléfico contra quem quer que seja. 

          Temos de conservar o conceito do espírita, hoje sinônimo de honestidade, justiça e tolerância construtiva. Desenvolver a humildade, sem, no entanto, confundi-la com a atitude servil, que identifica o desprestígio da própria personalidade. O respeito que todos devemos ter à pessoa humana deve fazer-nos um defensor do homem humilhado, explorado, sacrificado, iludido e vilipendiado. Temos o dever de resguardar a pessoa humana, para que não a transformem em simples peça de máquina.

           Não. Segundo o que aprendemos na Doutrina Espírita, a individualidade humana terá de ser sempre respeitada, resguardada, defendida, sem o que a Humanidade se transformará num amontoado de seres inexpressivos, abúlicos, que pensam pela cabeça de dominadores nem sempre imbuídos de ideias fraternas, nem sempre inspirados por aqueles princípios que encontramos no Evangelho do Cristo e que constituem a estrutura da Doutrina Espírita. 

Da atitude mental do Espírita - parte I

    


Da atitude mental do Espírita - parte I
por Boanerges da Rocha (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Março 1961

            Nada é mais prejudicial à personalidade do indivíduo do que o conformismo sistemático. Ele esteriliza a capacidade criadora do homem, tornando a criatura um ser apático, incapaz de dinamizar-se na vida cotidiana.
           Devemos considerar o Espiritismo pelo que ele efetivamente é: uma religião construtiva, de realização no presente e de confiança no futuro. Não estando escravizado a dogmas irracionais, pode o Espiritismo permanecer fiel aos princípios da evolução, seguindo os passos da Ciência, sem jamais perder o contato com a Filosofia, justamente porque é, simultaneamente, Religião, Ciência e Filosofia. 
           Em se tratando de Doutrina liberal, dinâmica, positiva e absolutamente clara, não se amesquinha em ridículo sectarismo. Olha para as outras religiões como um irmão para outros irmãos, embora tenha que precatar-se contra a ação nociva daquelas que, alarmadas com o seu progresso e em desespero de causa, busquem coartar-lhe (reprimir) os passos, valendo-se para esse fim de inverdades e de recursos outros contrários aos princípios evangélicos.
           O espírita não deve ser pessimista, conformista nem mofino (infeliz). E é incompreensível possa alguém tornar-se indiferente aos seus dias terrenos, renunciando às aspirações naturais da criatura humana e aparentando a disposição de viver comtemplativamente com o pensamento preso ao Além, esquecido da Terra. Nada disso. O que o Espiritismo ensina é que tudo quanto vive está subordinado às leis da evolução e que, nesse sentido, temos que fazer sempre o melhor que pudermos na vida terrena, participando corajosamente de suas lutas e procurando dar à nossa personalidade o vigor necessário à melhoria das nossas condições morais, espirituais e físicas. Renunciar aos bens naturais da Terra, que podem ser honesta e comedidamente fruídos, para aguardar as alegrias do Além, através de uma existência voluntariamente levada à tristeza, significa incompreensão doutrinária, porque aqueles e estas não são incompatíveis, mas se completam.
           Recordemos este trecho de "O Livro dos Espíritos" (Introdução), que mostra claramente o caminho doutrinário que todos devemos seguir:

           "A moral dos Espíritos superiores se resume, como a do Cristo, nesta máxima evangélica: fazer aos outros o que quereríamos que os outros nos fizessem, isto é, fazer o bem e não o mal. Neste princípio encontra o homem uma regra universal de proceder, mesmo para as suas menores ações." 

           O Espiritismo não manda ninguém enclausurar-se na melancolia ou escravizar-se à tristeza, fugindo à alegria de viver. Não mata a capacidade de reação que todos temos em maior ou menor grau, nem nos induz a nos conduzirmos servilmente, renunciando sistematicamente aos nossos direitos legítimos, inerentes à vida humana. Ensina-nos a ser tolerantes, caridosos e pacientes. Aconselha-nos  a uma humildade digna, nunca ao servilismo que rebaixa ou anula a personalidade do homem. Revela-nos a necessidade de bem cumprirmos os nossos deveres, sem que, entretanto, nos obrigue a nos tornarmos apáticos ou abúlicos (sem vontade), indiferentes à defesa de interesses dignos, reconhecidos e assegurados pelas leis morais. Há muita gente que confunde todas as coisas, porque não penetrou suficientemente o espírito da Doutrina. Quando o Espiritismo fala em renúncia e humildade, não está querendo que o homem abandone aquilo que lhe é necessário ou justo na vida terrena, aquilo que lhe é necessário ou justo na vida terrena, aquilo que lhe é indispensável para se conservar num nível de respeitosa existência, sem o sacrifício de sua família e de seus semelhantes.
           Ele adverte-nos que as relações do mundo dos chamados vivos com o mundo dos chamados mortos devem ser cultivados sem nos engolfar nos no abismo da morbidez, como se estivéssemos em eterno luto, envoltos para sempre no sudário funéreo. Não! Os ditos mortos são para nós, espíritas, tão vivos quanto os encarnados. Porque a força que anima o corpo é a alma, que é o espírito, em última análise.
           Compreendendo o alcance da Reencarnação, podemos viver com alegria, desde que saibamos seguir o itinerário que a Doutrina nos traça, seguro e conducente à felicidade. Pautando nossas ações pelo bem  em todas as suas formas, evitando também o mal multiforme, estaremos melhorando as nossas condições atuais, construindo um futuro em bases mais sólidas, pois, na realidade, a grandeza ou a ruína do nosso amanhã dependerá exclusivamente de nós, do que fizermos hoje, do modo pelo qual estivermos saldando os nossos débitos de ontem, criados pela ambição perniciosa ou tangidos pelo egoísmo maléfico.
           Para demonstrarmos nossa condição de espírita, temos de agir  sempre bem, em qualquer circunstância, evitando o mal e procurando reduzi-lo pela prática de ações enobrecedoras.
           Mostrar a fisionomia apagada, de quem está em velório de defunto, ou esconder-se em estudada e excessiva timidez, nada disso define o espírita; pelo contrário, indica, muitas vezes, um espírito fraco, que não entende a vida terrena em face do Espiritismo. 

terça-feira, 29 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 3 e final

 


Teosofia e Espiritism- Parte 3 e final

por Pedro Richard
Reformador (FEB) 16 Fevereiro 1916 

        Meu caro amigo:
           Nessa terceira e última carta, cabe-me transcrever mais alguns trechos do Evangelho, referentes aos pseudos cristos. Comparando estas passagens com outras dos folhetos da Teosofia, que me ofereces-te gentilmente, fui levado a crer que esta doutrina era a fonte dos falsos profetas anunciados pelo Senhor. Se não, vejamos:
           Mar. Cap. XII.
           21. E se então vos disser alguém: reparai, aqui está o Cristo; ei-lo, acolá está; não lhe deis crédito.
           22. Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas que farão prodígios e portentos para enganarem, se possível fora, até aos mesmos escolhidos. 
           25.E cairão as estrelas do céu (1) e se comoverão as virtudes que estão no céu.
           (1) Descerão os espíritos.

           26. E então verão o Filho do homem, que virá sobre as nuvens (2) com grande poder e magnitude.
           (2) Não por ventre de mulher.

           32. A respeito, porém, deste dia ou desta hora, ninguém sabe quando há de ser, nem os anjos do céu, nem o Filho, só o Pai.
           Mat. Cap. XXIV (Vê os vs. 4,5,11, 23, 24, que são iguais aos transcritos acima).
           27. Porque, como um relâmpago que sai do oriente e se mostra até ao ocidente, assim também há de ser a vinda do Filho do homem.
           Luc. Cap. XXI, vs. 5 a 19; XVII, vs. 22, 23, 24. 
                                                                                     *
           Pelas transcrições que aqui ficam, o Cristo, na sua alta pré ciência, nos avisou do que se está passando e de que só voltaria à Terra sobre nuvens. E virá para o que é seu, quando este mundo for o seu reino. Isto acontecerá apenas numa época apenas conhecida do Pai... e dos profetas teósofos que, mais do que Jesus e os anjos do céu, o sabem. 
           O Cristo voltará ao planeta, é verdade, mas em espírito, quando o nosso mundo estiver purificado e em condições morais de ser habitação dos bons, dos espíritos sem pecados. Seus corpos não serão grosseiros como o nosso, mas corpos fluídicos, compatíveis relativamente com a pureza do Cristo.
           No entanto, a Teosofia anuncia e espera para já um cristo; é claro que este pode ser senão o falso cristo.
           Será crível que para os teósofos o nosso tenebroso planeta já se encontre em condições morais de receber o Cristo em toda a sua pureza?
           Neste mundo, então, não impera mais o crime e só o habitam os bons e os puros?
           Não, os teosofistas não esperam o Cristo que vem para o seu reino, viver com os seus: os teosofistas esperam um instrutor. Cristo, porém, não prometeu voltar como instrutor. A sua doutrina aí está para todos os que desejem sinceramente ser os seus discípulos; a mesa do banquete do Senhor está posta e todos são convidados, até mesmo os coxos e os estropiados.
           O cristo, já esperado pelos nossos irmãos teósofos, não é o que virá - segundo a frase evangélica - em todo o seu esplendor, sobre nuvens, do mesmo modo que um relâmpago, que sai do oriente e se mostra até o ocidente, porque, como é  óbvio, o nosso planeta desgraçadamente ainda está muito longe de ter conseguido os requisitos morais necessários para receber o Cristo autêntico, o mesmo Cristo de Nazaré.
           Em verdade, Ele virá, mas quando houver na Terra elementos compatíveis com o seu adiantamento e a sua natureza espiritual. 
           O que é lógico e o bom senso nos aconselha, meu bom amigo, é que de acordo com os ensinamentos evangélicos e os conhecimentos dados pelo espiritismo sobre o sentido das palavras do divino Mestre, nós nos acautelemos contra os falsos cristos. Perdoa-me se te magoo com a rudeza da minha expressão, chamando falso ao cristo que tu esperas como legítimo. Lembra-te de que sou espírita cristão e falo deste ponto de vista. Tu consideras o Cristo como um missionário qualquer, como o instrutor de uma raça; eu o tenho em conta de Chefe deste planeta, a cuja formação Ele presidiu, o Senhor desta humanidade, rebanho de que Ele é o único Pastor.  
           Dirás que o advento esperado não é o do Cristo. Mas os teosofistas estão convencidíssimos dessa - para ti e os teus confrades - auspiciosa visita. O ilustrado representante em nosso país da "Ordem da Estrela do Oriente", espírito que por muitas formas se tem manifestado altruísta e superior, e cujo nome tenho a honra de citar nesta obscura e despretenciosa missiva - o Dr. Raymundo Seidl, assim se exprime no 'Teosofista' de 7 de abril de 1915, pág. 190: 
           "Como sabem os leitores, o fim da "Ordem da Estrela do Oriente" é reunir aqueles que acreditam que um grande Instrutor espiritual virá proximamente ajudar a evolução da humanidade. Para conseguir tão alto "desideratum" os membros da Ordem devem fazer a seguinte evocação à hora certa: para o Rio de Janeiro e Bahia às 6 horas. "Eis a evocação: "O Mestre de Grande Loja Branca, Senhor das religiões do mundo! Volta!  Volta de novo ao mundo! Volta! Volta de novo à Terra, que por ti anseia! Volta e vem ajudar as nações que aspiram pela tua presença! Dize a palavra de fraternidade que unirá numa só família as classes e as castas que entre si lutam! Vem! Vem com o esplendor de todo o teu poder e salva o mundo que aspira pela tua volta! Tu, que és o Instrutor dos anjos e dos homens! Que assim seja!"
           Mestre da Grande Loja Branca, Senhor das religiões do mundo, Grande Instrutor dos anjos e dos homens - nem se duvide que não seja o Cristo, mesmo porque não é necessário inferir das expressões do preclaro representante da Ordem - respeitável e erudita teosofista senhora Anne Besant, positivamente anuncia num artigo traduzido para a simpática revista Amor, da Bahia (edição de 11 de abril de 1913). O Grande Instrutor esperado e desejado é o Cristo. 
           Aludindo à invocação transcrita eu te digo: A palavra da paz que fará cessar as lutas, já foi pronunciada por Jesus quando disse: "Ama teu inimigo".
           Estas três palavras, que encerram uma epopéia e que constituem a pedra angular sobre a qual repousa todo o monumento da paz universal, foram desenvolvidas e profundamente explicadas pelos espíritos na Revelação da Revelação dada ao Sr. Roustaing.
           A palavra de fraternidade também já foi dita e ensinada por Jesus no seu Evangelho (João, cap. X, vers. 1 a 10).
           A fraternidade, meu amigo, é condição indispensável, sine qua non, para só aspirar a ser discípulo de Jesus, que quer que todos, toda a humanidade, constituam uma só família. "Um só rebanho com um só pastor" na frase do Evangelho de João.
             Enfim, meu Rodrigues, que viria fazer aqui o Cristo em pessoa, quando Ele já está conosco representado pelo Consolador, que é o Espírito Santo, o Espírito de Verdade, "que nos ensinará todas as coisas?" (João, Cap. XIV, vers. 13 a 31).
           Se o próprio Cristo nos anunciou que o Consolador (que é o Espiritismo) nos ensinaria todas as coisas, para que teria Ele de vir novamente para nos ensinar o que já nos ensinou, isto é, dizer-nos as palavras de paz e fraternidade?
           O que é lógico e concludente, meu preclaro Rodrigues, é que a seita ou religião que tem no seu programa e como um de seus principais objetivos provocar a vinda de Jesus Cristo para nos ensinar a adquirir virtudes e, do mesmo passo, nos liberar dos erros e crimes, desprezando assim os ensinamentos do próprio Jesus contidos nos Evangelhos - é anti evangélica, é numa expressão sintética, o Falso Profeta.  
           Tal seita ou religião será tudo quanto quiserem, menos espírita.
           Assim sendo, eu, espírita cristão, não posso caminhar contigo. Estarei laborando em erro? É possível, mas eu prefiro errar com Jesus. Que - eu te imploro - não me arranques do coração! 
           Que Ele nos ilumine, é o voto que de coração faz o dedicado amigo.






segunda-feira, 28 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 2

            

Teosofia e Espiritism- Parte 2

por Pedro Richard
Reformador (FEB) 1º Fevereiro 1916

 Ao bom Rodrigues,


           Meu amigo,
           Na primeira missiva, afirmei que a Teosofia é anti-espírita, porque a nossa doutrina foi revelada pelos espíritos  com o fim de provar que se comunicam conosco, dando-nos a conhecer as leis que presidem a esse fenômeno, instruindo-nos na maneira de bem fazermos esse comércio com eles, quer estejam livres e desembaraçados no Espaço, quer, mesmo, encarnados, contanto que se ache o corpo adormecido - caso este em que o espírito de certa forma também está livre. Destarte nos dão a conhecer o aparelho mediúnico em todas as suas modalidades e grandezas.
           Em uma palavra, a doutrina espírita foi e vai sendo dada aos homens pelos espíritos, - prepostos de N. S. Jesus Cristo para essa alta e nobre missão - e nos vem provar que os espíritos atrasados e infelizes se manifestam, tentando, por todos os meios ao seu alcance, dar batalha ao Evangelho, lançando para esse fim mão de embustes, mistificações, etc.. Para conseguir o seu "desideratum" esses infelizes promovem contra os seus irmãos todo o mal possível, dentro dos limites da lei das provas, dando com semelhante procedimento lugar à enfermidade moral que denominamos obsessão. É então quando devemos intervir no intuito caridoso de esclarecê-los e procurar modificar os seus sentimentos perniciosos. Isto devemos fazer principalmente com as nossas preces ungidas de fé, amor, caridade e humildade.
           O que acabo de dizer tenho para mim como verdade indiscutível, porque há anos venho com assiduidade investigando essa ordem de trabalhos, assistindo a muitas dezenas de curas de obsessão, havendo tido a ventura de ter para diretores de semelhante trabalhos os saudosos companheiros, hoje no Espaço, doutores A. Bezerra de Menezes,   Bittencourt Sampaio e A. Luiz Sayão, que foram e continuam a ser meus mestres.
           Para os espíritas, meu caro Rodrigues, toda a Criação é dirigida e governada pelos espíritos, sendo que o mundo espiritual é o mundo das causas e o material o dos efeitos. Tudo, pois, é dirigido pelos espíritos, que executam o plano arquitetado por Deus.
           A Teosofia, meu caro amigo, é a negação de tudo isso; não admite a comunicação entre encarnados e desencarnados, senão quando aqueles estiverem dormindo, visto como os espíritos desprendidos da matéria não nos escutam, não percebem as nossas ações físicas, de que se conclui que não podemos ser tentados nem dirigidos por eles.
           Não invento; relê um pouco do que diz o grande e conceituado teósofo Sr. C. W. Leadbeater no seu folheto: Aos que choram os mortos (1)

            (1) Diz a loja Teosófica 'Perseverança' nesse folheto: "O Sr. Leadbeater é diretor e instrutor no plano físico; foi protestante e estudou fenômenos mediúnicos e há mais de 30 anos vive uma vida de abstração, como viviam os eremitas da Idade Média".

           "Os mortos então nos enxergarão? podem perguntar; escutarão o que dizemos? Indubitavelmente podemos  dizer que nos veem, pois estão sempre conscientes da nossa presença; sabem se estamos felizes ou se nos sentimos mal; mas não escutam as nossas palavras e não tem consciência das nossas ações físicas. (pág.30). Desenvolvendo a questão termina dizendo: "O que, portanto, o homem morto pode ver de nós é somente o corpo espiritual" (pág. 31). "Até agora só tratamos da possibilidade de alcançar os mortos, elevando-nos ao seu plano durante o sono, que é o caminho normal e natural. Há também, evidentemente, o método anormal e antinatural das evocações em que, momentaneamente, os mortos se revestem outra vez de seu véu carnal e se tornam assim mais uma vez visíveis aos nossos olhos físicos. Os investigadores do Oculto não recomendam esse método; em parte porque muitas vezes atrasa o morto na sua evolução e, em parte, porque há grande incerteza a esse respeito e muita possibilidade de ilusão e exibicionismo (pg.49).
           Entendeste, Rodrigues? Onde uma doutrina mais anti-espírita e mais contrária à nossa ordem de investigações do ue a Teosofia apregoada pelo Sr. Leadbeater?
           Eu te poderia citar milhares de fatos que atestam que os espíritos nos veem, nos escutam, nos respondem e muitas vezes sustentam longos diálogos conosco, o que prova que o Sr. Leadbeater não tem razão.
           Apenas para assentar ideias, vou citar-te um fato passado há trinta e tantos anos com o meu inolvidável mestre Dr. Bezerra de Menezes:
           Ei-la:
           Havendo, duma feita, o Dr. Adolpho Bezerra de Menezes, pelo médium Nascimento, pedido ao espírito do Dr. Dias da Cruz (que na Terra fora seu íntimo amigo, ao ponto de chamá-lo por Chico), umas consultas médicas para amigos seus, deixou, no entanto, de solicitar para si remédios - porque, tendo estado doente, se julgava já curado. O espírito do Dr. Dias da Cruz respondeu ao Dr. Bezerra: "O meu caro adolpho se esquece dum quisto que tem embaixo de sua espessa barba, que é uma manifestação do estado mórbido de seu baço."
           Disse-nos o Dr. Bezerra que nem a sua própria esposa sabia da existência desse quisto e que ele próprio tinha se esquecido de semelhante coisa.
           Percebeste? O espírito do Dr. Dias da Cruz viu o quisto e acusou positivamente a sua existência. Bezerra aceitou a receita, tratou-se e o quisto desapareceu. O que é verdade é que o espírito viu o quisto e, no entanto, a Teosofia prega que o espírito desprendido da matéria não nos vê o corpo!
           São fatos, meu Rodrigues, e estes falam com muito mais eloquência do que as teorias. Teorias destroem teorias; mas os fatos não: "contra eles não há argumentos". As teorias são abatidas e desaparecem: os fatos focam, são inexpugnáveis, indestrutíveis. Por isso é que sou espírita: porque sei por provas provadas que as teorias espíritas são confirmadas pela observação dos fatos, pelo melhor método da ciência - a experimentação. Na minha longa vida de espírita, observando os fatos, tenho verificado a exatidão de todas as teorias do Espiritismo.

                                                                                  *     
           A Teosofia é também anti-evangélica.
           Vejamos o que dizem os Evangelistas:
           Lucas - (C. I., vs. 1 a 25) - O Espírito Gabriel se manifestou no templo a Zacarias, fala-lhe, responde às suas objeções e anuncia-lhe a mudez. (idem, vs. 26 a 80) - O anjo Gabriel aparece à Virgem, sauda-a, previne-a da bendita concepção, responde-lhe às suas perguntas. - Mateus (C. XVI, vs. 13 a 20) - Jesus confirma  a revelação mediúnica  feita a Simão Pedro. (Idem C. XVII, vs. 1 a 19) - Jesus transfigura-se no monte Tabor aos olhos de seus discípulos Pedro, João e Tiago, os quais ouviam vozes.
           Poderia eu citar inúmeras passagens se não bastassem as que acabo de mencionar para provar-te que o Evangelho é oposto à Teosofia, a qual afirma - segundo declara o Sr. C. W. Leadbeater, nos transcritos que fizemos linhas atrás - que os espíritos desencarnados (mortos na linguagem teosófica) não nos escutam.
           Prossigamos:
           Jesus disse: Um só é vosso Mestre, o Cristo, vós todos sois irmãos. Não vos intituleis mestres. O que dentre vós é o maior, será vosso servo. (Mateus, C. XXIII, vs. 8 a 12) 
           Ao passo que assim se exprime Jesus, a Teosofia tem mestres, instrutores. Há membros de sociedades teosóficas e há teósofos, o que vale dizer que na Teosofia há 1º e 2º.
           Jesus também disse: "Quem não é por mim é contra mim. Quem não ajunta comigo, desperdiça". Estas dua frases são bem eloquentes e querem dizer que quem não representa a verdade é instrumento do erro e da mentira e retarda o progresso. Quem não ama a luz, vive nas trevas. Esses tais arrastam os seus irmãos ao vício, ao ódio e à vingança. 
            No entanto, o esquema circular organizado pela Sociedade Teosófica, mostra-nos que por todos os caminhos se vai ao centro do mesmo esquema, onde em círculo concêntrico  se encontram as palavras Teosofia - Fraternidade Universal como que ocupando a circunferência e no centro Deus - Amor - Verdade. Debalde aí procurei o Cristo: não O encontrei.
           Até o ateu vai ter à Teosofia e por intermédio da Teosofia a Deus. O caminho, pois, para se ir a Deus é para ti e teus confrades, a Teosofia. Todavia, no Evangelho por João (c. XIV, vs. 1 a 12) diz categoricamente Jesus: Eu sou o caminho, a verdade, a vida ; ninguém vem ao Pai senão por mim. 
           Já vês, meu caro amigo, que o esquema da Tua Teosofia é profundamente anti evangélico. Não traduz, portanto, nem o pensamento cristão, nem tampouco os ensinamentos deixados pelo Divino Mestre.
           Não me surpreende, fica certo, a doutrina teosófica, pois, para mim tenho que ela é o porta voz  do falo profeta tantas vezes aludido por N. S. Jesus Cristo.
           Dir-te-ei porque na terceira missiva. 
           Até.      

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Teosofia e Espiritismo - Parte 1

 


Teosofia e Espiritismo - Parte 1

por Pedro Richard
Reformador (FEB) Janeiro 1916

Ao bom amigo Rodrigues,

          Agradeço muito a fineza de teres mandado para mim alguns livros e folhetos de Teosofia, na louvável atitude de orientares o meu pobre espírito e me provares que os pontos de contato que, dizem os teósofos; há entre a Teosofia e a Revelação dada pelos Espíritos a Allan Kardec e a Roustaing são tais e tantos, que bem se pode considerar a Teosofia como sendo o Espiritismo evolvido.
            Pelo muito que te quero e pela pureza de tua intenção, pretendendo melhor nortear o meu espírito ávido de luz e de verdade, fiz meditada leitura de semelhantes livros com o fito de conhecer a verdade e até onde a verdade estava com o meu Rodrigues.
           Cheguei à conclusão de que estás elaborando em erro. E sabes porque andas em erro? Simplesmente pelo pouco conhecimento que tens das obras de Allan Kardec e do Evangelho em espírito e verdade. 
           Sendo o Espiritismo, como é, uma revelação dada pelos Espíritos, é óbvio que não consiste ele tão somente na crença no Deus uno, na manifestação dos espíritos ou, mesmo, nas reencarnações, pois, como sabes, tudo isso há de muito é conhecido e sustentado por escolas e seitas que já eram cultivadas antes do Cristo, inclusive o velho Testamento; nem mesmo é a "fraternidade" o seu alicerce, pois que a fraternidade é também apregoada e pregada por escolas que não cogitam de Deus nem de espíritos, como por exemplo a positivista, a evolucionista, etc.. Tudo isto já estava desde muito revelado.
           O Espiritismo, meu bom Rodrigues, é certo que sanciona todas estas verdades, mas ele não para onde as outras religiões estacionam. Não, ele trás para a arena da discussão todos os fatos, e estuda com profundeza e à luz da razão e da ciência as leis que os regem, as causas que os determinam. Ele nos fornece os meios seguros para as investigações de ordem moral ou científica.
          O Espiritismo, meu amigo, nos veio proporcionar as provas provadas de que as boas condições morais são indispensáveis a toda ordem de trabalhos que visam a regeneração dos espíritos encarnados ou desencarnados, o que o cultivo das virtudes lhes é sobretudo imprescindível. E isso porque só a nossa relativa pureza dalma e as virtudes podem atrair para junto de nós os espíritos de luz, os únicos capazes de ensinar-nos a verdade, (que é representada pelo Evangelho), isto é, a palavra santa de Jesus compreendida em espírito e vida. É nisso querido irmão, que consiste a nova revelação trazida à Terra pelos Espíritos, prepostos de Jesus para o desempenho dessa alta e santa missão; porque ele é o Consolador prometido por Jesus, que nos ensinará as coisas (João, Cap. XIV, núm. 26).
           Assim sendo, o Espiritismo é a chave que abre à nossa inteligência a compreensão progressiva do Evangelho, a fim de acelerar o nosso progresso nos tempos que são chegados, tornando-os destarte felizes e libertos do erro e da mentira. Ao mesmo tempo, ele destrói a imagem desse deus mau e rancoroso que só existe no cérebro daqueles entre nossos irmãos que o criaram para fins inconfessáveis.     
           O Espiritismo, enfim, nos veio fazer compreender o verdadeiro Deus - o Deus de amor e caridade - e provar-nos que só se vai ao Pai pelo cultivo da fé, do amor, da humildade e da caridade, notadamente pelo destas duas últimas virtudes, que limpam os nossos espíritos da lepra peçonhenta do egoísmo e do orgulho.
           Caro Rodrigues: a humildade, que é o nosso remédio máximo, só a encontramos no Evangelho de N. S. Jesus Cristo.
           Ah! meu Rodrigues, como se nos apresenta grandioso o Presépio de Belém! Aquelas palhas, que serviram de cama ao gado, como as vemos agora transformadas em leito de arminho para receber e nele repousar o Menino Jesus, o maior dos Espíritos baixados à Terra, o Enviado de Deus, o Seu Ministro, em suma! E, no entanto, Ele não teve uma casa, um casebre mesmo, para nascer! Como é nobre esse exemplo de humildade da família do simples e pobre carpinteiro que se chama José! Como é grandioso e sublime ver-se o Rabi da Galiléia recrutar seus discípulos entre os humildes pescadores e até mesmo entre os cobradores de impostos, os mal quistos e desprezados do povo! É que eles eram pobres de bens materiais e ricos de virtudes. Que sublimidade e que grandeza, meu amigo, vê-lo entre os publicanos e gente de má vida e repartir com eles a caridade e afastando esses espíritos do erro para os acomodar no seio bendito de Deus! É que eles eram pobres de bens materiais e ricos de virtudes. Que sublimidade e que grandeza, meu amigo, vê-lo entre os publicanos e gente de má vida a repartir com eles a caridade e afastando  esses espíritos do erro para os acomodar no seio bendito de Deus! Como é majestoso ver-se este Jesus sentado à mesa com os seus discípulos, associando-se a eles na ceia pascoal e com eles repartindo o vinho que simbolizava o Seu sangue, que deveria derramar em holocausto à humanidade escravizada ao erro, aos vícios e paixões! Que magnitude, caro Rodrigues, ver-se este Homem quase Deus tomar de uma bacia e toalha e lavar os pés aos Seus discípulos, inclusive do próprio Judas - o espírito fraco e desgraçado que, dali há pouco, teria de cometer o maior, o mais ignóbil dos crimes, a traição! Mas é que ninguém, absolutamente ninguém, estava excluído do seio amoroso de Jesus, nem mesmo os Seus mais encarniçados inimigos!
           E Jesus, o Mestre divino, assim procedendo disse aos seus discípulos, que representavam a humanidade: "Vós me chamais Mestre e Senhor, vos laveis os pés, deveis o mesmo fazer uns aos outros.(João, Cap. XIII, vs. 1 a 15).
           Ouviste, Rodrigues, o que disse o Mestre?
           Pois lava os pés dos teus inimigos, mas lava-os com tuas lágrimas e as enxuga ao calor de teu seio amoroso, porquanto, bem sabes que é preciso que faças do teu inimigo um amigo teu, e nem basta que fique sendo um amigo somente, senão que seja também amigo de Jesus, o Pastor bendito que recebe de braços abertos a ovelha tresmalhada que queira voltar ao aprisco.
           Meu caro Rodrigues, faze-te humilde e será discípulo de Jesus, o nosso divino Mestre e Senhor.
           Por caridade eu te peço: não me tires das mãos o Evangelho em espírito e verdade. Ele tem feito a minha felicidade de homem e, certo, far-me-á do espírito. Nele, somente nele, tenho encontrado o único remédio que cura a enfermidade geratriz de todos os males da alma: o orgulho que, semelhante ao cancro, me corrói o espírito.
           Se tu não sofres desse hediondo mal, que me chumba à Terra  me faz escravo do erro e das paixões; se pela educação primorosa da tua vontade tudo concedes e com tudo condescendes - feliz que és! - infelizmente eu não posso fazer o mesmo. Eu sou coxo e estropiado e só mantenho-me de pé amparado e defendido por meio anjo de guarda e protetores espirituais.
           Segue a tua Teosofia e com ela caminha. Sê feliz mas deixa-me agarrado ao meu Jesus, ao meu divino Mestre e Senhor, a meu Salvador, haurindo de Seu santo e divino seio a humildade de que tanto preciso para curar-me.
           Não me arranques do coração a imagem incomparável e santa de Maria,a Mãe santíssima, Espírito sublime a quem tanto devo e que é o enlevo de minha crença e o carinho dos meus afetos.
           Não posso seguir a tua Teosofia porque não posso servir a dois senhores.
           A tua Teosofia - perdoa-me, releva-me a franqueza - é anti espírita e não está de acordo com os ensinamentos do Evangelho; é o Falso Profeta. Não te molestes comigo. Não sou eu quem o diz, é o Evangelho, é o próprio Espiritismo codificado por Alan Kardec, como te provarei no meu próximo escrito.

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Continuidade

                

Continuidade

por FEB \ Humberto de Campos (Espírito)
Reformador (FEB) Abril 1947

          De tempos em tempos pessoas contrárias à orientação doutrinária da Federação Espírita Brasileira movem campanhas de imprensa ou pelo rádio; promovem congressos; fundam instituições em substituição à Casa de Ismael ou a algum dos seus departamentos de serviço. Depois, tudo passa, volta à calma; as novas instituições prestam algum serviço à causa, colaboram indiretamente com a Federação, mas não a fazem desaparecer, como eram os planos dos fervorosos fundadores.

          Vamos hoje recordar aos nossos amigos que essa continuidade da Federação não é obra humana de seu Diretores; é a orientação direta dos Espíritos que a fundaram e a dirigem com finalidades superiores. Sejam quais forem os administradores materiais que os Espíritos coloquem na direção, o programa é o mesmo de progresso calmo e firme, sem desfazer num dia o que se fez  no outro. É uma orientação muito progressista , que chegou mesmo à audácia de incluir o Esperanto no programa de trabalho, o que nenhuma outra instituição espírita até então ousara fazer; mas sem descontinuidade de nenhum dos setores de trabalho, encetados desde o início. Vamos dar a palavra a Humberto de Campos sobre o assunto. Em uma crônica recebida em 12 de junho de 1936 dizia o querido pensador patrício:

          "A obra da Federação Espírita Brasileira é a expressão do pensamento imaterial dos seus dirigentes do plano invisível, indene (ileso) de qualquer influenciação da personalidade dos homens. Semelhantes àqueles discípulos que partiram para o mundo como o "Sal da Terra", na feliz expressão do Divino Mestre, os seus administradores são intérpretes de um ditame superior, quando alheados (cedidos) de sua vontade individual, para servir ao programa de amor e de fé a que se propuseram. O roteiro de sua marcha é conhecido e analisado no mundo das verdades do Espírito, a sua orientação nasce da fonte das verdades superiores e eternas, não obstante todas as incompreensões e todos os combates. A história da casa de Ismael, nos espaços, está cheia de exemplos edificantes, de sacrifícios e dedicações." (Mensagens, pág. 119)
             "...Já tive ocasião de manifestar o meu respeito por essa instituição venerável, cujas portas se abrem generosas para os famintos do pão espiritual e para os necessitados do corpo..." (Id., pág. 216)

              As mensagens de Humberto de Campos confirmam muitas outras de Espíritos Superiores. Só assim podemos compreender que todas as lutas contra a Casa de Ismael se anulam por si mesmas, enquanto a velha Federação cresce,  lentamente, mas com uma firmeza exemplar, prestando os serviços a que  está destinada pelos seus Fundadores e Orientadores.

              Pessoas e instituições apressadas surgem, crescem, diminuem, desaparecem, mas a Casa de Ismael continua pacientemente a sua obra de levar a Doutrina a todos os rincões da Pátria e conservar quanto possível a unidade doutrinária, a pureza dos princípios espíritas.

               O alto Plano dos Diretores espirituais é longo, estende-se pelos séculos e milênios vindouros, porque tem raízes em séculos e milênios passados. Os projetos humanos são breves, nascem e morrem como seus autores.

quinta-feira, 17 de junho de 2021

Obrigado, Senhor!

 


     "Querida família, meu testemunho de amor à vida.

     Não sou de textões, mas quero agradecer ao Pai por eu e minha esposa termos passado pela Covid (hoje acabou nossa quarentena) sem maiores incoerências ou qualquer sequela. Agradecer que, em breve, possamos, todos por Ele nos manter vivos, na missão que é a encarnação. Que eu possa honrar a escolha Dele, perpetuando bem a ética do Sermão da Montanha, onde quer que eu passe. E que em breve possamos – todos vacinados – nos rever, abraçar e agradecer juntos pelo dom da vida.

                     Um beijo em cada um de vocês.

                                                  A...."


quarta-feira, 16 de junho de 2021

Olho por olho

 

Olho por olho

(Êxodo, cap. 21, v. 24)

por Geminiano Barboza

Reformador (FEB)    1916

 

            Eis um belo tema para estudo, esse dispositivo da lei mosaica. Seja-nos permitido toma-lo por objeto da presente meditação.

            “A letra mata, o espírito vivifica”, disse Jesus Cristo.

            “Tirai da letra o espírito” – aconselham os mensageiros do divino Mestre.

            Ora, conhecida como está hoje a crassa ignorância que dominava então o Senso humano; conhecido o alto grau de rebeldia que pesava sobre os sentimentos do homem; conhecida a ferocidade turbulenta e pertinaz dos povos daqueles tempos; concebe-se facilmente a razão de ser de um tal dispositivo de lei. “Para os grandes males os grandes remédios” – diz Perez Escrich.

            Isto explica a repugnante dureza das leis temporárias dadas a Moisés como garantia do seu domínio moral sobre o povo hebreu, confiado à sua jurisdição; leis que destoam da Lei Magna, a Lei das leis, o Decálogo.

            Consideremos, porém, que Moisés não legislava por conta própria, mas por inspiração.

            Médium em grau elevado que era, possuindo a intuição clara como possuía vidência e audição, o preposto do Altíssimo via os anjos do Senhor, ouvia a voz do Verbo de Deus e recebia inspiração dos mensageiros do céu.

            Daí dimanava a força moral de que dispunha e todo o seu poder sobre aquele povo indomável.

            Acresce a isso a circunstância de ser Moisés o iniciador da doutrina posteriormente fundada pelo Cristo, que é a mesma que hoje estudamos em espírito e verdade – a doutrina espírita.

            Como sabeis, Moisés foi o primeiro profeta do Cristianismo.

            Estas ligeiras considerações sobre a pessoa de Moisés visam apenas desviar a suposição de haver sido ele um pretencioso, um déspota, um rancoroso, um violento. Em vez disso, devemos ver nele o homem providencial, o restaurador do pacto de Israel especialmente escolhido pelo Soberano do Céu para guiar o “seu povo” na Terra, começando por tirá-lo do cativeiro em que se achava no Egito.

            Depois desse ligeiro esboço, basta atentar para o caráter corrupto e a índole rebelde daquele povo, pra nos convencermos da indeclinável necessidade de rixas e austeras leis de repressão e punição.

            Eis porque existe na legislação mosaica o aludido dispositivo – “olho por olho”.

            E porque se trata de legislação antiquíssima, de cuja época nos separa uma montanha de séculos, supõem muitos que aquele dispositivo caducou, é letra morta, é lei nula, sepultada pelos séculos. De fato, até certo ponto, essa ordem de ideias é incontestavelmente verdadeira; não devemos, porém, esquecer que o Cristo sancionou, se bem que veladamente, aquele “preceito” com outro preceito, que ainda hoje prevalece e domina o senso humano: “Quem com ferro fere com ferro será ferido.”

            Decorrerá daí um direito outorgado ao homem para ferir seu semelhante?

            Se assim é, se Jesus concede ao homem o direito de ferir seu irmão, não é muito que lhe conceda o de tirar-lhe o muito que lhe conceda o de tirar-lhe o olho. Mas, o absurdo deste conceito é palpável e vossas consciências sabê-lo-ão repelir com dignidade, porque vós bem o sentis que não é assim, porque o Cristo pregava a fraternidade, o amor ao próximo, a caridade, o perdão. Aí está a razão porque dizem muitos que a doutrina do Cristo é eivada de contradições.

            Fatalmente, meus amigos, sempre que a interpretação não for além da expressão da letra, surgirão contradições, atropelando o pensamento, transfigurando a verdade e estabelecendo a dúvida.

            Mas, não mandou o próprio Cristo restabelecer a Verdade – pela Revelação Espírita, pela Revelação Evangélica e sucessivas revelações que trazem seus mensageiros?

            Cumpre-nos abandonar a interpretação material, que já venceu sua época e preencheu o seu fim, e ocuparmo-nos com a interpretação espiritual, única que nos pode conduzir à Verdade e destruir as s contradições.

            Dos textos tradicionais daqueles tempos, ressalta a feição característica do regime moral dos povos de então; regime tumultuário e desordenado, onde dominava a cegueira da ignorância e imperavam as paixões, os vícios, os preconceitos e hábitos extravagantes; consequência natural da voluntariosa rebeldia que avassalava aqueles obscuros espíritos inveterados no erro.

            Como conter um tal povo? Como chamá-lo à ordem e incutir-lhe a ideia do respeito individual, da moral pública e privada, princípios de civismo e regime doutrinário? Como?

            Por meio de leis austeras, princípios terroristas, preceitos atrozes, dispositivos assombrosos daquele povo e da imensa responsabilidade que passava sobre seus ombros. Em compensação, recebia ele a intuição dos meios coercitivos e regeneradores que devia pôr em prática para garantir o êxito da sua árdua missão.

            Foi assim que, moralmente sustentado pelos poderes celestes, de quem se fizera dócil instrumento, conseguiu manter até ao fim sua autoridade sobre aquele povo, através de inúmeras peripécias.

            Mas aquela época passou; os séculos sucederam-se; a humanidade progrediu e o senso humano melhorou, através de penosas existências. Outro é o aspecto da humanidade em nossos dias; outras são as condições que nos envolvem. 

            Ora, a humanidade nunca esteve esquecida ou abandonada, antes esteve sempre sob a tutela dos poderes divinos, que lhe garantem a “assistência espiritual”.

            O Pai, porém, continua a ser indulgente e magnânimo. Por isso, quando julgou oportuno, fez baixar à Terra arautos do Céu, mensageiros do Cristo, a fim de despertarem a humanidade dessa letargia fatal que a vem aniquilando através dos séculos e de inúmeras existências.

            Assim, vieram as revelações e a Verdade foi restabelecida, até onde devia ser, na hora presente.

            O restabelecimento da Verdade, meus amigos, é, para nós, uma forte projeção de luz sobre as sombras dos mistérios, permitindo ver longe, através das escrituras, a fim de compreendermos a razão porque “a letra mata e o espírito vivifica”.

            Tentemos, pois, com o auxílio dos arautos da Verdade, extrair da letra o espírito, a fim de gravar no presente estudo o cunho de verdade, que deve ser a nota vibrante em todo e qualquer estudo espírita.

            No versículo 24 do capítulo 21 do “Êxodo” está escrito: - “olho por olho, dente por dente, mão em mão, pé por pé”.

            Ora, o pensamento ali é claro e pode ser assim traduzido: - mal por mal, violência por violência.” Mas, estes princípios, bem o sabemos, são anticristãos.

            Esta aparente contradição tem, naturalmente, sugerido a muitos a ideia de que Moisés, em um momento de arrebatamento, indignado contra a rebeldia do povo hebreu, cedendo à paixão humana, “tornara-se violento”, formando princípios que tão desumanos nos parecem.

            Mas quem nos disse que Moisés autorizou alguém a “utilizar” aquele instrumento de justiça?!

            Aquele formidável espantalho que figura no versículo 24, é um simples “exemplo”, meus amigos, a propósito da pena indicada no versículo 23 para o homem que ferisse uma mulher pejada, “se daí lhe resultasse a morte”. Pena: “vida por vida”.” Segue-se o exemplo – “olho por olho”, etc...

            Naquele tempo, como hoje, não podia ser dado ao homem o direito de trucidar o homem; porquanto já era vigente o Decálogo, o estatuto da família humana, dada no Monte Sinai e sancionado pelo Verbo divino, para garantia e uso de toda humanidade. O homem nunca foi autorizado à violência. Entretanto, o homem sempre foi e continua a ser violento, em consequência dos defeitos que motivaram a queda do Espírito e hoje o arrastaram ao jugo da matéria, sob o influxo do nosso ambiente “violento por sua natureza.”

            E como necessário se fizesse colocar junto ao homem fortes motivos de terror, fora Moisés inspirado no sentido de conter, ao menos em parte, a ferocidade do homem contra o homem.

            Não esqueçamos, porém, que Moisés era também profeta e iniciador da doutrina que veio a nós; Moisés pressentia em visão o futuro. Por isso mesmo, não é curial interpretar hoje aquele preceito como sendo “letra morta”, antes devemos tomá-lo por advertência permanente, traduzindo o modo por que é executada a lei providencial da Justiça Suprema.

            Se é verdade que Deus escreve o Direito por linhas tortas, o dispositivo da lei mosaica um preceito de Deus, não do homem.

                                                                                                                                                                                                                                                                                 

 

 

domingo, 6 de junho de 2021

"A Reencarnação" - Parte 1

 


                                     " A Reencarnação

- estudo sobre as vidas sucessivas."

por Aurélio A. Valente 

Editora: Moderna - Ano: 1946

Biblioteca Espírita Brasileira

 

"Não vos admireis do que vos digo:

é preciso nascer de novo." 

Jesus em João Cap. 3, vv. 1\15


  “Nascer, viver, morrer, renascer ainda; progredir sempre, tal é a lei.”  

Allan Kardec

 

        “Este livro é uma afirmação incontestável da influência e assistência dos espíritos sobre nós. Algum tempo depois de terminarmos a assistência dos espíritos sobre nós. Algum tempo depois de terminarmos “Sessões Práticas e Doutrinárias do Espiritismo”, tivemos desejo de escrever este livro. Ocorrências diversas impediram-nos de trabalhar imediatamente, mas, para não perder tempo, íamos colhendo fatos, concatenando ideias, armazenando tudo na memória apenas, como um homem pobre, que vai adquirindo conforme as suas posses, areia, tijolos, telhas, cimento, ferro, para construção de uma casa, para depois pensar nos operários.

           Um dia, os obreiros do Senhor advertiram que a hora do serviço era chegada. Iniciamos a nossa tarefa em fevereiro e em abril estava terminada. Vezes havia que quinze, vinte e mais folhas eram escritas de uma vez, sem que houvesse tempo de grafar convenientemente cada palavra. Deste modo, leitor amigo, o que houver de bom é proveniente dos bons espíritos, mensageiros de Jesus, o que tiver de falho é nosso.

           Esses amigos do Alto são ainda aqueles, bem o sentimos, que carinhosamente, nos encaminharam na senda da Verdade, em Belém do Pará, no jamais esquecido “Grupo dos Filhos Pródigos”. A eles, portanto, manifestamos a nossa imorredoura gratidão, e aos velhos companheiros que naquela cidade ainda mourejam (vivem), o nosso abraço saudoso e fraterno.
Rio, Fevereiro-Abril, 1944
                                                                                            A. A. V.         

 Introdução

           Fracassaram, lamentavelmente, as doutrinas religiosas, filosóficas e políticas no objetivo de fraternizarem os homens. As lutas mais cruentas se desenrolam; as cidades que suportavam sítios de meses e anos debaixo do fogo da artilharia, arrasam-se em horas sob os bombardeios aéreos; no mar, os tranquilos e confiantes passageiros mudaram o rumo da sua viagem, para o fundo das águas, obrigados pela guerra mais desumana e covarde dos submarinos. Tem-se a impressão que a inteligência do homem está possuída pela volúpia de descobrir os segredos da natureza, para usá-los como meios de destruição dos infelizes.

           A miséria e o egoísmo sob todos os prismas dominam a humanidade. Cada um cuida exclusivamente de si, esperando o momento oportuno para obter algo, com ou sem direito. Não lhe preocupa se os meios são lícitos, se alguém fica prejudicado, pois, primeiro a sua posição e os seus proventos, segundo os seus caprichos e paixões, terceiro ainda os seus gozos, o seu estômago insaciável, e para os outros... nada.

          As minorias audazes e inescrupulosas em numerosos países dominam prepotentes, porque as massas ignaras (incultas)  não têm sentimento de solidariedade.

            Por toda parte, as corporações mais numerosas, as instituições mais respeitáveis têm as suas leis e regulamentos violados, sem que uma só voz de protesto se faça ouvir. Todos sentem-se prejudicados, entretanto, ninguém reclama porque teme descontentar os superiores e, assim, a subserviência tornou-se um culto consagrado.

           De dia para dia, cresce o número de assassínios, suicídios, roubos, estelionatos, seduções, desmoronamento de lares, em consequência de vidas de ostentação, de luxo desmedido, de frequência de cassinos onde campeiam os vícios elegantes.

           Os medíocres, à custa de sindicatos de elogios mútuos, aparecem no cenário mundano como capacidades extraordinárias e insubstituíveis, mas aqueles que conhecem os bastidores sorriem de escárnio da nudez sórdida desses personagens de ópera bufa. E tudo isso acontece porque aqueles, que mais quiseram sufocar o materialismo, foram justamente os que mais contribuíram para dar-lhe vida e vigor. A humanidade tornou-se materialista por completo. Desapareceu a verdadeira espiritualidade.
O romanismo com o seu cortejo de pompas deslumbrantes, rastejante e acomodatício para viver bem em todos os climas, a ciência orgulhosa, encastelada na fortaleza dos seus princípios teóricos e dogmáticos, tais são os culpados da situação atual da humanidade. 

           Triste, bem triste, véspera de trágica, podemos assim dizer, é a posição daqueles que tem os destinos dos povos nas mãos. Eles são acusados dos nossos sofrimentos, das nossas misérias, dos fracassos de certas doutrinas, quando tudo isso não passa de fatal consequência de erros acumulados durante séculos por gerações ignorantes, imprevidentes e fúteis. “Cada povo tem o governo que merece” – disse um célebre estadista do século passado, e assim é. Como poderá pois queixar-se dos seus dirigentes quem não coopera ativa e honestamente para o cumprimento da lei? Em geral, os que mais reclamam, que protestam mais alto, que falam em patriotismo, sabedoria, probidade, são justamente os mendigos da moral, de luz e de caráter. Em vez de fazer cada um por si para auxiliar os poderes públicos, pois do esforço individual de todos é que se forma a coletividade ansiosa de conhecimento e moralidade, cada qual só tem vistas para o argueiro do olho do seu semelhante,
Sofremos todos as consequências da nossa própria semeadura, e da dos nossos antepassados. Tínhamos que chegar ao ponto a que chegamos porque até agora só cuidávamos da matéria em detrimento do espírito. Quando líamos no Evangelho de Jesus a sua advertência de que não ficaria pedra sobre pedra, meditávamos e perguntávamos a nós mesmos como poderia ser isso se a consolidação do solo terráqueo havia afastado de há muito a possibilidade de terremotos em certos lugares? E como resposta temos as cidades seculares reduzidas a escombros, a cinzas fumegantes, pagando o pesado tributo de iniquidades de seus habitantes de outrora e atuais.

           O “princípio do fim” está se processando. Ouvimos falar de guerra, de fome, de miséria, de epidemia, tremores de terra.

          Aqueles que não tem guerra em seu território, ne por isso deixam de sentir os seus efeitos e tormentos de toda espécie, pois não haverá um só povo que não experimente a influência da transição de uma civilização decrépita para outra mais nova, idealista, espiritual que viverá numa era de luz e de verdade.

          Cada povo terá que pagar na razão direta dos seus feitos, e não vemos nenhum que esteja isento de culpas, que não tenha manchas de sangue na sua história.

         Ainda criança, ouvimos a vovozinha com aquela meiguice de segunda mãe pedir aos netinhos que nunca jogassem comida fora, mesmo que fosse um pedacinho de pão, porque isso faria falta aos pobres filhos de Deus. E contava, pata ilustrar, casos de pessoas ricas reduzidas imprevistamente à miséria, porque atiraram restos de comida ao lixo, negando-os até aos próprios cães.

           Muitos anos depois, vários exemplos encontramos na nossa peregrinação terrena, que vieram aumentar o número das histórias verdadeiras da vovozinha.

           Em certa cidade de grande vulto comercial, à porta de um hotel luxuoso, encontramos um homem em tal estado de pobreza física e moral, que era capaz de comover o coração mais endurecido. Quando ele se retirou, um empregado do hotel, aproximou-se e contou-nos a vida do desgraçado. Fora o melhor cozinheiro da zona e estava empregado no referido hotel. Anos antes, quando o dinheiro corria a granel, ele desdenhava das pequenas gorjetas e, todas as notas de cinco e dez mil réis atirava ao fogão dizendo: “para que me serve esta miséria?” Adoeceu inesperadamente e foi para um hospital, onde ficou muito mal, durante mais de dois anos, tendo esgotado todos os recursos. Ainda enfermo teve que deixar a casa de saúde e agora vive esmolando. Em outra cidade encontramos um pobre homem que havia sido riquíssimo fazendeiro, o qual acendia charutos finos com cédulas de quinhentos mil réis, sob as vistas assustadas dos matutos, para mostra que seu dinheiro era tanto que não fazia caso dele.

           Se isso acontece com os indivíduos, por que não acontecerá com as coletividades culpadas da aplicação de loucos princípios de economia política na destruição de produtos que dariam para mitigar a fome de milhares de necessitados? As coletividades responderão inexoravelmente pela cumplicidade nesse crime, porém, maior será a responsabilidade dos idealizadores dessas medidas e todos os interessados nos lucros. Aguarde, pois, cada um a sua parte, pois Jesus disse: “a cada um será dado de acordo com as suas obras”.

          E porque fracassaram religiões, ciência, política? As religiões, principalmente o romanismo, porque a casta clerical de todos os credos, em todas as épocas sempre foi exclusivista e exploradora da ignorância e boa fé do povo. Essa casta parasita teme perder o seu prestígio, o seu fausto, o domínio, e por isso entrava todo o progresso e persegue os inovadores e libertadores.

           Foi o clero quem crucificou Jesus – quem forçou Sócrates a beber cicuta – quem queimou Joana d’Arc – Giordano Bruno – Jerônimo de Praga, esquartejou Hypatia em Alexandria, foi ele ainda quem queimou a fogo lento Miguel Serveto. Foi ele o criador da Inquisição, quem sacrificou inúmeras vítimas na célebre noite de São Bartolomeu, quem exterminou os Albigenses, quem fomentou guerras de toda espécie. Entretanto, por ironia da Justiça, que terrível irrisão! O Tribunal da Inquisição não condenou ninguém por assassínio, roubo, adultério, incesto, violações. Para o clero só havia um crime: heresia – isto é, não aceitar, mesmo em sonhos, um só ensinamento que não fosse imposto por ele; bastava uma só dúvida, uma vacilação. Admitia-se delações de pais contra filhos, de filhos contra pais, e os testemunhos das rameiras eram de maior valor que os dos homens mais respeitáveis. Os denunciados nunca chegavam a saber quem os tinha acusado.

           Os mártires tudo sofreram porque queriam um Deus grandioso, Bom, Misericordioso, adorado e, Espírito e Verdade, sem a intromissão de castas intermediárias e parasitas. Jesus disse que ninguém iria ao Pai sem ser por seu intermédio, assim, não temos necessidade de quem se jacta de ser seu procurador, visto como todos nós não passamos de “sepulcros caiados de branco”.

          “Os méritos dos apóstolos de modo algum poderia ser automaticamente transferidos aos sacerdotes degenerados pelos interesses políticos e financeiros de determinados grupos terrestres, depreendendo-se daí que a igreja romana, a que mais tem abusado desses conceitos, mais uma vez desviou o sentido sagrado da lição do Cristo.

          Importa, porém, lembramos, neste particular, a promessa de Jesus de que estaria sempre entre aqueles que se reunissem sinceramente em seu nome”. Estas palavras encontramos no admirável livro “O Consolador”, ditado a Francisco Cândido Xavier por Emmanuel, pág. 155.
 
           A ciência, orgulhosa das suas conquistas, não quer aceitar nada que contrarie os seus conhecimentos. Os “doutos” esquecem que W. Harvey muito sofreu quando afirmou que o sangue corria em nossas veias, Pasteur foi ridicularizado com os micróbios, Erlich, Paracelso, Bacon, Galvani, Fulton, todos, enfim, que tiveram a coragem moral de apresentar coisas até então desconhecidas. O caso do fonógrafo apresentado na Academia de França pelo emissário de Edison, não causa somente riso, mas revolta. O homem sábio é humilde e simples, tudo deseja examinar e para ele não existe a palavra “impossível”, mas o seu número é bem pequeno; maior é o dos “sabichões”, pretenciosos, orgulhosos a tal extremo que se aproximam dos limites da estupidez. O seu lema é: “não creio, não é possível, é contrário a todas as leis conhecidas, logo não é verdade.

            A política, que é a arte de governar os povos, fracassou, porque ela sempre foi o reflexo da religião e da ciência da sua época.  Não poderia fazer melhor com homens tão descrentes e interesseiros, quanto néscios e pedantes.

           Todavia, Deus, o nosso Pai de Infinita Misericórdia; que enviou há dois mil anos o Seu Filho bem Amado – Jesus -, em Sua Onisciência, achou que havia chegado o momento propício para enviar-nos o “Consolador” prometido -, essa legião de espíritos mensageiros do Bem, sob a luminosa direção do Espírito de Verdade.

           Esses habitantes do Além espalharam-se então, desde o meado do século passado, por toda a Terra, para despertar na humanidade indiferente, sofredora e egoísta, o amor a Deus, ao próximo, o desejo de progresso, de sabedoria, de solidariedade e fraternidade.

          Eles vieram dizer-nos que erem as almas das pessoas que haviam estado neste mundo, dando vida a corpos de homens como nós e que eram felizes ou desventurados conforme as suas obras, que o paraíso celeste não era mansão de beatitudes místicas e improdutivas, nem o inferno lugar de penas eternas, pois a qualquer criminoso era dado ensejo paro resgate de culpas e acolhimento na casa do Pai Celestial, de acordo com a sublime parábola do Filho Pródigo. Assim, o céu e o inferno deixaram de ser utopias para transformarem-se em verdades mais consentâneas com a Bondade e Misericórdia Infinitos de Deus.

          Eles vieram afirmar-nos de maneira insofismável a sua existência, forçando-nos a não lhes chamar de “mortos”, visto que estão vivos quanto nós.  

          Na infância, quantas vezes ouvimos em certas casas, ao sair um enterro, parentes e amigos despedirem-se do cadáver com esta angustiosa frase: “nunca mais”, e apesar da nossa inexperiência, essas palavras não foram esquecidas até a juventude, quando a luz do Espiritismo iluminou a nossa inteligência. Frequentemente, triste, meditávamos na “morte”, o aniquilamento completo do homem que levava para o túmulo as suas ilusões, o seu patrimônio de sabedoria e probidade, o anseio de ser bom e também um rosário de misérias. 

           E hoje, o Consolador, o Espírito de Verdade, fez as lágrimas secarem, as dores suavizarem, trazendo-nos a Esperança para lançar sobre os sofredores do corpo e da alma, o seu manto de consolação. Os semblantes tristonhos transmudaram-se em fisionomias alegres, confiantes na luz que irradia da Doutrina de Jesus, que sempre foi para a humanidade o Pão, o Caminho e a Luz.
 Os Espíritos do Senhor continuam a sua faina de estimular o nosso desejo de redenção. Eles agem de todas as formas despertando a nossa atenção por meio de fenômenos, da dor e do amor.
 Mas... que tristeza atrás, como no tempo de Jesus, quando lhe pediam para produzir milagres uns após outros para convencer os fariseus, os desconfiados, os céticos duvidam da sinceridade das pessoas mais respeitáveis e desinteressadas de mundanismo e pedem também fenômenos e mais fenômenos.

           Os espíritos advertem-nos constantemente que o valor da Doutrina Espírita não tem alicerces nos fenômenos, mas na consequência dos seus ensinamentos, que transformam o homem mal e viciado, no homem bom e regenerado.  Apesar disso, insistem sempre: desejamos fenômenos, queremos ver. Entretanto, se ao menos tivessem a sinceridade de Tomé que viu e acreditou, ainda seria perdoável, mas infelizmente as suas vistas curtas e inteligência medíocre, o orgulho de um falso saber e a vaidade, não favorecem a compreensão de coisa alguma. Esses presumidos são aqueles de que nos falou Jesus, que tem olhos e não querem ver, tem ouvidos e não querem ouvir.

           Um dos mandamentos do código na Maçonaria, a Sublime Ordem, cuja admirável filosofia é puramente cristã pela identidade dos ensinamentos, ao ponto de apresentar Jesus como o símbolo do maçon perfeito, grau trinta e três, impõe a todo iniciado o dever de transmitir aos homens aquilo que houver apreendido, a fim de contribuir para expurgar do mundo os três grandes flagelos da humanidade: a ignorância, o fanatismo e a hipocrisia. 

           Eis a razão deste livro. Consideramos a nossa maior felicidade o batismo de luz da Doutrina Espírita nos primeiros anos da nossa juventude, e por isso temos tomado parte ativa, desde essa época, na propaganda do Espiritismo, porque desejamos partilhar com os nossos semelhantes a fortuna espiritual que Jesus já nos proporcionou.

          O Espiritismo dominará o mundo porque fala a tríplice linguagem do coração e do espírito. É amor – é inteligência, é partícula divina.

          A Doutrina Espírita não tem dogmas, se por tal entendemos postulados idênticos aos da igreja romana, impostos mesmo sem compreensão, ainda que absurdos. Entretanto, se considerarmos dogmas como pontos fundamentais de uma religião, firmados pela lógica, diremos que o Espiritismo tem três, sem os quais ele não existe: Deus, Alma – Reencarnação.
          
          Deus é a causa primária de todas as coisas, disseram em síntese os espíritos a Allan Kardec. Deus é infinitamente Bom, Justo e Misericordioso, reúne em si todas as perfeições imagináveis pelo homem. Onde houver falha não pode ser obra divina.

          Deus é a única incógnita para a qual o Espiritismo não procura solução. Para os seus adeptos basta acreditar na sua existência, respeitá-lo, venerá-lo cumprindo rigorosamente as suas sábias e imutáveis leis. Se Ele é infinito como poderemos compreende-lo? Como poderá o finito compreender o infinito? Que ele existe não há dúvida alguma. Por um princípio filosófico nós sabemos que “todo efeito tem uma causa e todo efeito é da mesma natureza da causa”- logo, um efeito inteligente é gerado por uma causa inteligente. Só uma força sumamente inteligente seria capaz de criar e dirigir a mecânica celeste, onde milhares de mundo de todos os tamanhos movimentam-se sem haver colisão, obedecendo a uma lei. Aqueles que estudam a natureza descobrem em suas leis uma sabedoria incalculável. Poderá o nada formar o nada?  Uma força cega formar alguma coisa bela e perfeita?

           Chame-se a essa força – Deus – Alá – Grande Todo – Desconhecido – Grande Arquiteto do Universo -, o fato é que sentimos a sua existência e somos beneficiados pela sua Bondade.
 
           Não podemos olhar para uma coisa sem termos logo a ideia do seu autor. Este livro é o atestado da existência de quem o escreveu. O leitor poderá não o conhecer. Não sabe se é magro ou gordo, jovem ou velho, jovial ou circunspecto, mas sabe que ele existe. E que são para nós os reinos mineral, vegetal, animal e hominal, senão obras admiráveis de beleza e perfeição de alguma força poderosa e Onisciente? Deus – a quem convencionamos chamar Pai – para fazer brotar em nossos corações o respeito e um meigo sentimento de amor. Ele está em toda a parte, integrado em tudo, como bem o entendeu o mavioso vate português Guerra Junqueiro, quando disse:
 
..”Deus, o Deus em que acredito,
“Essa luz que alumia essa noite – o infinito,
“Esse eflúvio d’amor que em tudo anda disperso,
“Cabe com todo o seu vastíssimo esplendor
“Num olhar de criança ou num cálix de flor.”

            Alma – eis o segundo dogma do Espiritismo. Ela anima todos os seres muito embora a nossa inteligência pouco evoluída não tenha da sua essência uma exata compreensão. “Atração no mineral, sensação no vegetal, instinto no animal, razão no homem, divindade no anjo” – eis a alma, assim disse Emmanuel no maravilhoso e instrutivo livro “O Consolador”.

          O Espírito não é, como julgam os nossos contraditores, uma abstração. É alguma coisa que tem vida própria limitada por um corpo de matéria quintessenciada que lhe dá forma, ao qual chamamos “perispírito”. A eletricidade também é alguma coisa. Embora indefinida, ninguém contesta a sua existência, devido às múltiplas aplicações na vida da humanidade.

           O magnetismo também já é admitido por numerosos sábios, apesar de também não conhecerem a sua essência.

           A criação da alma e a sua evolução, até alcançar a humanidade, não serão objeto do nosso estudo pela sua transcendência. Vamos apenas tentar a explicação, simples e intuitiva aos humildes, da trajetória da alma na terra e no além, no escopo de alcançar a perfeição relativa, justificar a razão da diversidade de dons intelectuais e morais, alegrias e sofrimentos, riqueza e pobreza, posições altas e baixas, vidas curtas e longas, problemas até hoje sem solução para todas as doutrinas conhecidas.

          A alma tem por toda parte liberdade de ação, a qual está na razão direta da sua evolução harmônica de saber e de amor, como para nós está a infância, a juventude e a maturidade. A criança goza de uma liberdade restritiva, o moço de forma relativa e o adulto de modo amplo. Este age como bem entende e lhe apraz, de acordo com a sua vontade, pois as leis humanas, por mais rigorosas que sejam, não tiram da mão do assassino a arma homicida, nem fazem parar à porta do lar honesto o miserável Don Juan.           

           Deus, o Nosso Pai de Infinita Misericórdia, favoreceu-nos com uma lei sábia que nos permite a conquista de tudo quanto é preciso para a nossa evolução – a Reencarnação. Submissos a essa lei, nascemos, morremos, tornamos a nascer tantas vezes quantas sejam necessárias para alcançar a nossa perfeição.
 
           “Nascer, morrer, tornar a nascer, progredir sempre, tal é a lei”, foi a frase com que Allan Kardec definiu a Reencarnação.
 
            O ensino da lei da Reencarnação é o meio mais seguro para forçar o homem à meditação sobre a Justiça Divina, à regeneração e ao progresso tal é a moral e intelectual. O conhecimento dessa lei por toda a humanidade revolucionará o mundo, porque os homens ficarão sabendo que não há predestinados para a felicidade, nem réprobos, que todos nós sofremos as consequências dos nossos atos, que não há falta sem punição, nem prejuízos sem reparo, pois Jesus avisou-nos que não entraríamos na casa do Pai sem havermos pago o último ceitil. Somente a divulgação da lei da Reencarnação facilitará a implantação no mundo, das doutrinas que nos parecem utopias, facultando-nos uma vida de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tão sonhada pelos homens de boa vontade e desejada pelos espíritos mensageiros do Bem, que nos exortam continuamente a termos por lema de vida o lábaro “Trabalho, Tolerância, Solidariedade”.

              A Reencarnação é o objetivo do nosso estudo. Procuremos aplica-la por todos os meios ao nosso alcance, apresentando sempre fatos que justifiquem a nossa dialética. Allan Kardec, Leon Denis e outros escritores espíritas dedicaram capítulos inteiros ao estudo da lei da reencarnação, tendo Gabriel Delanne publicado um livro exclusivamente sobre o assunto, e outro que se relaciona com o mesmo: “A Evolução anímica”, mas, a profundeza da sua exposição, a sua argumentação rica para os cérebros esclarecidos, talvez não tenham iluminado suficientemente o entendimento dos humildes, por isso, de há tempos vimos alimentando o desejo de escrever também algo, com a mesma simplicidade com que apresentamos o nosso livrinho “Sessões Práticas e Doutrinárias do Espiritismo”, sob a orientação dos nossos amados guias.

           Desejamos sinceramente que a “Reencarnação” tenha a mais vasta aceitação, pois só assim a humanidade tornar-se-á melhor. O perdão de Deus será compreendido de uma forma mais racional. Deus não cobre com o mesmo manto de piedade um passado de erros e crimes de toda espécie., equiparando os maus arrependidos aos bons perseverantes. Os arrependimentos originados pela dor e não pelo desgosto de haver cometido o crime levariam os culpados mais perversos e cínicos a serem nivelados, no paraíso, às almas simples, que sempre aceitaram com humildade as leis do Senhor.
 O perdão divino consiste nos meios de resgate de todo mal, proporcionando àqueles que se arrependem e querem expiar e reparar todo mal produzido.  O homem pobre de hoje é o mal rico de vida anterior; o trabalhador honesto e infatigável, que sofre injustiças, é o mesmo que anos antes, talvez no mesmo lugar, explorava miseravelmente os que estavam sob as suas ordens; o idiota, que causa riso e dó ao mesmo tempo, é a encarnação do sábio que fez mal uso das suas faculdades intelectuais; o surdo-mudo foi em vida passada o fomentador de discórdias e lutas sangrentas.

            Tudo isso procuraremos demonstrar e, confiantes na assistência dos nossos guias, é que empreendemos esta árdua tarefa. 

            O conhecimento da lei da Reencarnação mudará a face do mundo, pois os homens ficarão sabendo que praticando sempre o bem, nove sobre dez serão as probabilidades de uma vida ulterior melhor. Se hoje trabalhamos para ter uma velhice confortável e feliz, porque deixaremos de preocupar-nos com a próxima vida, sabendo que ela será boa ou má, conforme o nosso esforço presente?

            A vida de hoje é uma consequência das existências anteriores, como a de amanhã – a futura – será um reflexo da que estamos vivendo. Pratiquemos, pois, a maior quantidade de bem que nos for possível, pois o Espiritismo, ampliando o panorama da Fraternidade, ensina também que não sofremos apenas pelos males que fizemos, mas também pelo bem que deixamos de fazer. Resignemo-nos com a nossa dor sem deixarmos que o desalento se apodere de nossa alma, porque resignação não significa abatimento, desolação, mas simplesmente conformação humilde com a pena imposta pela Providência Divina, e o anseio de libertação do erro para a felicidade celestial.

          Quando moramos próximo de um rio sujeito a inundações, que tudo arrasta, o nosso apego ao mundo faz-nos lutar para arrancar das águas aquilo que ela pode carregar e, passada a tormenta, nós tratamos de reconstituir tudo, aproveitando a experiência para o futuro, assim, pois, temos o dever de fazer tudo que estiver ao nosso alcance em benefício do espírito, porque ele é que é imortal e não o corpo.
 
          Olhemos com mais amor para o nosso irmão e pratiquemos o sentimento da solidariedade que nos dá forças para defesa comum.