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sábado, 31 de outubro de 2020

Correspondência Póstuma de Allan Kardec - 2

                    

Correspondência Póstuma de Allan Kardec -2

Reformador (FEB) 1º Setembro 1917

 Bruxelas, 15 de Junho de 1858

 Caro Sr. Kardec,

             Recebo e leio com avidez a Revue Spirite e recomendo aos meus amigos, não a simples leitura mas o estudo aprofundado do vosso ‘Livro das Espíritos’. Muito sinto que minhas preocupações físicas não me deixem tempo para os estudos metafísicos; mas já os levei bem longe para sentir quanto estais perto da verdade absoluta, sobretudo vendo a coincidência perfeita que existe entre as respostas que me foram dadas, e as vossas. Aqueles mesmos que vos atribuem pessoalmente a redação de vossos escritos, estão estupefatos da profundeza e da lógica que neles encontram. Ter-vos-íeis elevado, de um só golpe, ao nível de Sócrates e de Platão, no que concerne à moral e à filosofia estética; quanto a mim, que conheço tanto o fenômeno quanto a vossa lealdade, não duvido da exatidão das explicações que vos são dadas e abjuro todas as ideias que publiquei a esse respeito durante o tempo em que creditei, com o Sr. Babinet, não passar tudo de fenômenos físicos ou de forças indignas de atenção dos sábios.

            Conto brevemente ir a Paris, onde tenho tantos amigos e tantas coisas a fazer, mas tudo farei para ir apertar a vossa mão.

                                               Jobard  Diretor do Museu Real de Indústria  

 

                                          Allan Kardec à Eugène Nus

             Venho agradecer o mimo que tivestes a bondade de me fazer, enviando-me a bela e sábia obra: ‘Les Grands Mystères,’ e muito penhorado me sinto pelo testemunho de simpatia que nele se acha expresso.

            Não pude ler ainda senão uma parte, mas isso me basta para apreciar-lhe o alcance e não duvido nela encontrar preciosos documentos.

            Permiti-me que vos ofereça, por minha vez, a última obra que acabo de publicar: “O Céu e o Inferno” ou a justiça de Deus segundo o Espiritismo.

            Muito senti não estar em casa quando vos deste ao trabalho de me procurar: teria tido o prazer de vos conhecer; mas espero que isso não tenha sido senão um adiamento. Quando puderdes dispor de vosso tempo, às sextas-feiras, de três às cinco horas, podeis estar certo de me encontrar e se desejardes assistir a uma das sessões da Sociedade Espírita, terei muito prazer em vos dar uma carta de apresentação.

            Nossa sessão de amanhã é uma das em que admitimos algumas pessoas estranhas. Rogo que vos digneis receber a expressão de meus mais distintos sentimentos.

  Allan Kardec

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                                        Eugène Nus à Allan Kardec

 Paris, 10 de Dezembro de 1865

             Acabei a leitura de vosso livro. Tenho curiosidade de saber o que os doutores católicos poderiam responder aos vossos raciocínios tão claros e tão lógicos, tão sensatos: mas creio que não responderão.

            Desde muito tempo acompanho a sua obra cujo valor moral aprecio e verifico neste momento, como previra, que, mal ou bem, a despeito talvez de vossas intenções primitivas, e, pela força das coisas, cada vez mais vos separais das igrejas cristãs existentes e que o Espiritismo tende a tornar-se uma igreja cristã nova, à qual não falta senão a liberdade dos cultos para se manifestar plenamente.

            O culto do dever deve consistir em grandes comunhões, reunindo em um mesmo ato de adoração e de amor todas as almas de um mundo, encarnadas ou desencarnadas. Entrevejo festas grandiosas e tocantes, de que vossas reuniões atuais não são senão os germens preparatórios e onde se entremearão, em um surto comum, as manifestações das duas vidas.  

            Entretanto, coisa estranha, não me sinto atraído por esses fenômenos da realidade, dos quais estou convencido.

            Será porque me pareça humilhante para a minha espécie que grande número de nós tenha ainda necessidade de ver uma mesa levantar-se ou um lápis ser levado por mão inconsciente, para crer na perpetuidade do seu ser?

            Será por causa desta séria objeção que faço às minúcias de vossa doutrina: que senão a liberdade, ao menos a espontaneidade humana desaparece quase completamente, só, como ensinais, os espíritos nos dirigem, nos suscitam, nos escolhem para tal ou qual obra terrestre a executar?

            Creio muito na comunicação dos Dois Mundos, mas não posso admiti-la subordinando assim um ao outro.

            O ser tem, segundo penso, funções de ordem diferente em cada modo de vida: esses dois gêneros de atividade devem ser distintos, e, me parece, ou compreendi mal, que vós fazeis reger, quase inteiramente a atividade das almas encarnadas pelos espíritos livres da matéria.  

            Sinto nisso uma espécie de fatalismo que me atemoriza e repele.

            Mas conversaremos a respeito de tudo isso, porque tenciono ir ver-vos. Com mais ou menos divergências prosseguimos a mesma senda e servimos a mesma causa.

            Creio, quanto a mim, que minha obra está quase acabada. Dei-lhe tudo quanto tenho, erro ou verdade; e as necessidades de vida material me forçam, em todo caso, a mudar a direção de meu trabalho e de meus pensamentos.

            Quanto a vós, Senhor, estais a tratar de um movimente útil e fecundo.

            Vi, por mim mesmo, o bem que fazem em certos espíritos as doutrinas que propagais com tanta coragem e zelo a, se bem que não aceitando todas as tonalidades de vosso credo, aperto-vos a mão com fraternal simpatia.

             Vosso etc,

                                                   Eugène Nus  

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             Eugène Nus (1816-1896) poeta e literato, escritor muito distinto, foi um dos primeiros propagandistas do Espiritismo.  

            Escreveu um livro muito notável: “Coisas do outro mundo”, no qual dá curiosos pormenores de experiências de tiptologia que fez com alguns amigos.

            Obtiveram comunicações muito curiosas.  

            Eis uma delas: é uma definição de Mestre:

            “A morte não é o túmulo humano.

            Ela limita a forma do ser material: fim do indivíduo, liberta o elemento imaterial. A morte inicia a alma em uma nova existência. Confiai em um destino que será vossa obra !”  

            Uma série de comunicações análogas, encontradas nessa mesma obra, oferece a curiosidade de apresentar definições redigidas em doze palavras. Essas doze palavras caíam rápidas como flechas a pedido das pessoas presentes e acreditamos firmemente em E. Nus, quando ele nota que é impossível a um mortal ordinário chegar ao mesmo resultado no mesmo tempo.

            Eis algumas dessas definições em doze palavras:

          AMOR     Peão das paixões mortais, força atrativa dos sexos, elemento ainda da continuação.  

            BEM        Harmonia do ser; associação das forças passionais de acordo com os destinos.

            MAL        Perturbações em os fenômenos. discórdia entre os efeitos e a causa divina.

      RELIGIÃO FUTURA     O ideal progressivo por dogma, as artes por culto, a natureza por igreja.

           Da Revue Spirite 

Correspondência Póstuma de Allan Kardec - 1

 

Correspondência Póstuma de Allan Kardec - 1

Reformador (FEB) 16 Agosto 1917

                 Allan Kardec a Theophilo Gautier     

             Theophilo Gautier escreveu uma obra notável: “Espírita” cujo enredo é baseado evidentemente nas doutrinas espíritas.

            Nesse livro ele se faz intérprete da teoria do Espiritismo em uma espécie de romance espírita, como ele o chama. Supõe dois seres que se amaram: um deles nunca pode confessar esse sentimento enquanto vivo; uma vez morto seu espírito, por meio de reencarnações sucessivas, manifesta sentimentos que teve de calar durante sua vida mortal.

            Allan Kardec dirigiu a Theophilo Gautier a seguinte carta:

             Paris, 1º de junho de 1857.  

            Peço-vos que aceiteis a homenagem de um exemplar do “Livro dos Espíritos”, que acabo de publicar:  

            O ponto de vista novo, eminentemente sério e moral, sob o qual a doutrina dos  Espíritos é encarada, explica o interesse que ligo a essa questão, ao mesmo tempo de futuro e de atualidade e ao qual creio que não sois estranho.

            Notareis, sem esforço, o passo imenso que esta teoria deu desde as mesas girantes; não se trata mais, com efeito, hoje, de fenômenos de simples curiosidade, mas de um ensinamento completo dado pelos próprios Espíritos sobre todas as questões que interessam a humanidade e que eu elevo à altura das ciências filosóficas.

            A aprovação de um homem como vós, ser-me-ia infinitamente preciosa, se eu tivesse a felicidade de obtê-la.

            Peço-vos que vos digneis receber a expressão de minha mais alta consideração.

 Allan Kardec

Rue des Martyrs, 8

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Carta de Jules Favre

             Tive o desgosto de ficar retido ontem, em virtude de trabalhos que não podia adiar. Tive assim o desprazer de ficar privado da sessão a que me tínheis convidado. Espero ser mais feliz de outra vez e peço-vos aceiteis a expressão dos meus mais distintos sentimentos.

                                               11 de Novembro de 1858

                                         Jules Favre

             A personalidade de Jules Favre não podia passar despercebida: pareceu-nos necessário assinala-la aqui, a fim de provar que vários homens de valor se interessaram pelos trabalhos de Allan Kardec.

            A propósito do Livro dos Espíritos, cremos dever recordar aqui as duas primeiras cartas seguintes, já insertas no primeiro número da Revue Spirite, em 1858.

                         Senhor,  

                                                           Bordeaux, 25 de Abril de 1857

             Tende posto minha paciência em bem grande prova pelo retardamento da publicação do Livro dos Espíritos, anunciado desde tanto tempo; felizmente não perdi em esperar, porque ele ultrapassou todas as ideias que imaginara pelos prospectos. Pintar-vos o efeito que ele produziu em mim seria impossível; estou como um homem que saiu da obscuridade; parece-me que uma porta fechada até hoje acaba de ser subitamente aberta; minhas ideias engrandeceram em algumas horas! Oh! Quanto a humanidade e todas as suas miseráveis preocupações me parecem mesquinhas e pueris em face desse futuro, do qual eu não duvidava, mas que estava para mim tão obscurecido pelos prejuízos que apenas podia sonha-lo.

            Graças ao ensinamento dos Espíritos, ele se apresenta sob uma forma definida, assimilável mas grande, bela e em harmonia com a majestade do Criador.  

            Quem quer que seja a ler esse livro, como eu, meditando-o, nele encontrará tesouros inesgotáveis de consolações, porque ele abrange todas as fases da existência. Sofri em minha vida perda que me afetaram vivamente: hoje elas não me oferecem nenhum desgosto e toda minha preocupação é empregar utilmente meu tempo e minhas faculdades para apressar o meu adiantamento, porque o bem tem hoje um objetivo para mim e compreendo que uma vida inútil é uma vida de egoísta que não nos pede consentir dar um passo no caminho do futuro.

            Se todos os homens que pensam como vós e eu, e ... muitos encontrareis, espero-os por honra da humanidade, pudessem entender-se, reunir-se, agir de acordo, que potência não teriam para ativar essa regeneração que nos é enumerada? Quando for a Paris terei a honra de vos procurar, e se não fosse abusar do vosso tempo, pedir-vos-ia alguns desenvolvimentos sobre certas passagens e alguns conselhos sobre a aplicação das leis morais e circunstâncias que me são pessoais.

            Recebei a expressão de todo o meu reconhecimento, porque me proporcionastes um grande bem, mostrando-me o caminho da única felicidade real neste mundo e talvez venha a vos dever, além disso, melhor lugar em outro.

            Vosso muito devotado,

                                                                       D... capitão aposentado

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Lyon, 6 de julho de 1857.

             Senhor,

             Não sei como vos exprimir meu reconhecimento pela publicação do ‘Livro dos Espíritos’, que estou relendo. Como o que ensinais é consolador para a nossa própria humanidade! Confesso-vos que, por minha parte, sinto-me mais forte e mais corajoso para suportar as penas e as decepções ligadas à minha pobre existência. Tenho feito partilhar os meus amigos das convicções que tenho haurido na leitura de vossa obra. Eles se tem mostrados muito satisfeitos com isso, compreendem agora a desigualdades das posições na sociedade e não murmuram mais contra a Providência: a esperança de um futuro mais feliz,  se procederem bem, os consola e lhes dá coragem.  

            Desejaria, senhor, ser-vos útil; não passo de um pobre filho do povo que alcançou uma pequena posição pelo trabalho mas a quem falta instrução, tendo sido obrigado ao  trabalho muito moço; entretanto, sempre amei a Deus e tenho feito tudo quanto podido por ser útil a meus semelhantes: é por isso que procuro tudo quanto pode ser útil à felicidade de meus semelhantes: Muitos adeptos que estão esparsos vamos nos reunir e faremos todos os esforços para secundar-vos: levantastes o estandarte, temos o temos p dever de seguir-vos: contamos com o vosso apoio e os vossos conselhos.

            Seu muito devotado.

                                                                                  C ...

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A. Pezzani à Allan Kardec  

 Lyon, 27 de Dezembro de 1865

 Caro e augusto mestre,

             Sustento sempre a causa espiritual, embora doente e oprimido por este tempo de nevoeiro. Espero reunir alguns irmãos espero também que A Verdade continuará a aparecer com denominação diferente: Jornal do Espiritismo Independente, título proposto pela unanimidade dos espíritos lioneses, exceto vosso dedicado servo.

            Que significaria esse título?

            Que existe um espiritismo autoritário e dependente, numa teocracia entre nós, o que não é verdadeiro: para confirma-lo apelo para todas as vossas obras que não cessam de preconizar o livre exame de consciência de cada um; preferiria: Jornal do Espiritismo e do Livre Pensamento, combateria até o fim pelo que creio ser a verdade e o bem.

            O que vos quero, porém, dizer, caro e digno mestre, é os votos ardentes que faço por vós ao renovar-se este ano, por vossa saúde tão preciosa à causa e por vossa constante prosperidade. Se não puderdes responder pessoalmente duas palavras, pedi a vosso secretário que m’as escreva para me tranquilizar nesta época em que os bons se retraem e desaparecem em um abrir e fechar d'olhos, como o testemunha M. Didier.  

            Apresenta também a vossa digna companheira os meus mais sinceros votos. Cuidai bem de vós, não saíeis nesses dias desastrosos. Vede bem que um de nós que nada é, poderia desaparecer, sem que a causa com isso sofresse, ao passo que seria isso diferente para convosco, o chefe superior. Assim, peço do fundo do coração a Deus e aos bons Espíritos que vos conservem em sua santa graça.

            Crede em meu devotamento,

                                                                                  A. Pezzani (1)  

                 (1) André Pezzani, advogado em Lyon, foi um dos mais vigorosos lutadores de que se pode orgulhar o Espiritismo; é o autor do livro “A Pluralidade das Existências da Alma”.

                                                            ........................................

 Pensamento de Victor Hugo sobre a Vida Futura

             “A borboleta é a lagarta metamorfoseada. Tanto é a lagarta, que, pela análise, vamos encontrar uma parte do ser rasteiro no alado animal; mas a metamorfose é tão completa que se julga ver uma nova criatura. Assim, em nossa existência de além túmulo, não seremos puros espíritos, porque isso é um termo vazio de sentido tanto para a razão quanto para a imaginação. Que é uma vida sem órgãos da vida? Que é uma personalidade sem a forma que a define e que a fixa? Mas teremos verosimilhantemente um outro corpo irradiante, divino e por assim dizer espiritual, que será a transformação do nosso corpo terrestre.”

            (Extraído dos ‘Anais Políticos e Literários’, Junho de 1885.)  

             Carta publicada na Revue Spirite de 1859.

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O ‘Livro dos Espíritos’ entre os selvagens

             Prezadíssimo Senhor Allan Kardec,

             Desculpa-me por não vos escrever em francês, compreendo essa língua pela leitura, mas não posso escreve-la correta e inteligentemente.  

            Frequento há muito mais de dez anos as populações aborígenes que habitam a vertente oriental dos Andes, em terras da América, nos confins do Peru. Vosso Livro dos Espíritos, que adquiri em uma viagem a Lima, acompanha-me nestas solidões; dizer-vos que o li com avidez e que o leio sem cessar, não vos de admirar; assim, não viria vos interromper por tão pouca coisa, se não tivesse o desejo de obter de vós alguns conselhos que espero da vossa bondade, não duvidando que os vossos sentimentos humanos não estejam de acordo com os sublimes princípios de vosso livro.

            Esses povos que chamamos selvagens, não o são tanto quanto o julgamos geralmente; se se quer dizer que habitam cabanas em lugar de palácios, que não conhecem nossas artes e nossas ciências, que ignoram as práticas das pessoas civilizadas, são verdadeiros selvagens; mas quanto ao que diz respeito à inteligência encontra-se entre eles ideias de uma justeza maravilhosa, grande finura de observação e sentimentos nobres e elevados. Eles compreendem com surpreendente facilidade e tem um espírito, sem comparação, menos pesado que os camponeses da Europa. Desprezam o que lhes parece inútil em relação à simplicidade suficiente ao seu gênero de vida. A tradição de sua antiga independência é sempre vivaz neles e por essa razão tem invencível aversão a seus conquistadores; mas embora odeiem a raça em geral, ligam-se aos indivíduos que lhes inspiram absoluta confiança...

            É a essa confiança que devo viver em sua intimidade e quando estou no meio deles, estou em maior segurança do que em certas grandes cidades. Quando os deixo, ficam tristes se não prometo voltar; quando volto toda tribo está em festa.

            Estas explicações eram necessárias pelo que se vai a seguir. Eu vos disse que tinha comigo “O Livro dos Espíritos’. Tive um dia a fantasia de lhes traduzir algumas passagens e fiquei muito surpreendido de ver que eles o compreendiam melhor do que eu pensava, em virtude de certas observações muito judiciosas que faziam. Eis aqui um exemplo:

            A ideia de reviver na Terra lhes parece perfeitamente normal e um deles me disse um dia: Depois que morremos, poderemos nascer entre os brancos? – Certamente, respondi-lhes. – Então tu és talvez um de meus parentes? É possível. É sem dúvida por isso que és bom para nós e que nós te amamos? É ainda possível. Então, quando encontrarmos um branco, não lhe devemos querer mal, porque talvez seja um de nossos irmãos.  

            Admirareis, sem dúvida, como eu, por essa conclusão de um selvagem e o sentimento de fraternidade que lhe fez aparecer. De mais a ideia dos Espíritos não é nova para eles: está em suas crenças, e eles estão persuadidos de que se podem entreter com os seus parentes mortos e que estes vem visitar os vivos. O ponto importante é que se pode tirar partido disso para moraliza-los e não creio que seja coisa impossível, porque não possuem eles ainda os vícios da nossa civilização. É esse o ponto em que tenho necessidade da vossa experiência. É um erro, na minha opinião, que não se pode influenciar as pessoas ignorantes senão falando-lhes aos sentidos; penso ao contrário que é entretê-los em ideias estritas e desenvolver neles a superstição.

            Creio que o raciocínio, quando se o sabe colocar ao alcance das inteligências, tem sempre influencia mui duradoura.

            À espera da resposta com a qual tereis a bondade de favorecer-me, recebei etc.

                         Don Fernando Guerrero (Da Revue Spirite)  


quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Enquanto

                

Enquanto  

Emmanuel por Chico Xavier       Reformador (FEB) Janeiro  1957

                      "...Não vem o Reino de Deus com visível aparência."  

                                                        Jesus (Lucas, 11:20)

 

            Dominarás a gramática, adquirindo fino lavor verbalista, na ciência da expressão, mas, enquanto não articulares a própria linguagem na luz da sinceridade e da compreensão, a tua palavra, conquanto primorosa, não renovará a ninguém.

            Indicarás a trilha exata da beneficência através de preciosos conselhos, mas, enquanto não te dispuseres a percorrer a estrada do desprendimento, no auxílio aos semelhantes, embora ajudes indiretamente a quem te ouça, andarás órfão de teus próprios avisos.

            Pregarás tolerância, movimentando conceitos sublimes, mas, enquanto não deres de ti mesmo, em abnegação e humildade, na desculpa que ofertas, não farás claridade no coração, a fim de acertar com o próprio caminho.

            Levantarás magnificentes construções terrestres, mas, enquanto não ergueres em ti próprio o templo da paz, alicerçado no dever nobremente cumprido, não encontrarás em teu benefício o pouso interior da genuína tranquilidade.

            Honrarás os teus familiares e amigos por seres extremamente queridos, mas, enquanto não compreenderes que as esperanças e as necessidades deles são iguais às do próximo, com o mesmo direito à bênção de Deus, não conquistarás, em favor de ti, a cidadania do Universo.

            Desfrutarás admiração e apreço, com espetáculos de prestígio e renome, mas, enquanto essas realizações não te repercutirem na vida íntima, em forma de alegria oculta pelas obrigações irrepreensivelmente atendidas, ainda mesmo à custa de supostos fracassos e prejuízos, no campo das experiências materiais, nenhuma demonstração de estima pública te adiantará no reino do espírito, onde, em verdade, se te vincula a vida real.

            Melhoraremos o mundo em derredor de nós, aperfeiçoando a nós mesmos. Capacita-te de que, depois das tarefas executadas no plano físico, possuirás tão somente a extensão e a quantidade de céu que houveres edificado dentro de ti...


quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Falta de fé

 


Falta de fé

Emmanuel por Chico Xavier         Reformador (FEB) Janeiro 1957

             “Acolhei ao que é débil na fé, não, porém, para discutir opiniões.”

                                                           Paulo aos Romanos 14:1

             Não se deve julgar a criatura sem fé pelo padrão moral daquela que a possui como não se pode considerar o enfermo à maneira de alguém que se encontre sem saúde porque assim o deseje. E, assim como não se extingue a doença com pancadas e sim à custa de amparo e remédio, não se remove a descrença a preço de controvérsia e sim pelo concurso do amor e da educação.

            Existem motivações diversas para a incredulidade, tanto quanto existem causas variadas para a moléstia.

            Em toda parte, onde se alinham seres humanos, encontramos aqueles irmãos que ainda se privam de mais amplo entendimento no domínio das questões essencialmente espirituais:

            - os que da infância à madureza tão-somente estiveram no clima da mais profunda ignorância acerca dos assuntos da alma;

            - os que se enredaram na inquietação, à face de compromissos inconfessáveis e temem o contato com as realidades do Espírito;

            - os que se apegam a preconceitos estéreis e fogem de incrementar no próprio ser o conhecimento da Vida Superior;

            - os que sofrem processos obsessivos, temporariamente incapacitados para raciocinar com segurança, em torno da orientação pessoal.

            - os que caíram em extrema revolta, ante as lides expiatórias que eles mesmos fizeram por merecer.

            Quando te vejas defrontado pelos companheiros sem fé ou portadores de confiança ainda muito frágil, compadece-te deles e auxilia-os; quanto possas. Segundo a solicitação do apóstolo Paulo, saibamos acolhê-los ao calor da bondade, nunca ao fogo da discussão.


A lição da água poluída

 

A lição da água poluída

João Marcus (Hermínio Miranda)     Reformador (FEB) Janeiro 1967

 

            Antes de alcançar o quilômetro zero da Rodovia Presidente Dutra, a Avenida Brasil atravessa na altura de Manguinhos, um canal de águas poluídas que escorrem preguiçosamente para o mar. Aquela água fétida me ensinou uma lição que talvez valha a pena transmitir ao leitor.

            Aquela água, pensava eu, não foi sempre suja. Estou certo de que, se remontarmos às suas nascentes, a encontraremos pura e fresca como a inocência. Foi no seu curso, rio abaixo, que a contaminaram com detritos, lixo e podridão.

            Também nós, espíritos, somos criados puros, como diz a boa doutrina, e seguimos o nosso curso. Se não nos defendermos e não nos preservarmos, vamo-nos contaminando com os detritos espirituais, colhidos ao longo do nosso caminho. Insensivelmente, vamo-nos tornando imprestáveis para nós mesmos e para o nosso semelhante. Passamos a ser meros veículos de poluição. Não fomos sempre assim: as fontes das quais emanamos são puras e nobres, mas, se não escolhemos os caminhos por onde andamos, a cristalina beleza, que nos foi dada, no início, se tolda na impureza das nossas paixões, no ímpeto das nossas vaidades.

            Isso, aliás, acontece também com quase todas as grandes doutrinas que nos legaram eminentes espíritos. De tempos em tempos, vem das alturas um grande vulto espiritual trazer-nos a sua contribuição para o progresso da Humanidade. Aquilo que prega aos que têm a ventura de ouvi-lo, em primeira mão, é belo e simples corno a verdade, mas o que se transmite depois, por tradição oral ou escrita, começa logo a se mutilar e contaminar-se de ideias impuras; o que era amor se transforma, pouco a pouco, em ódio; o que era caridade turva-se pela intolerância; o que era fraternidade, mancha-se de rivalidade. E enquanto o rio, como o tempo, segue o seu curso implacável, os sedentos que buscam nas águas um refrigério encontram-na maculada, conspurcada, imprestável para aplacar a sede da alma que sonha com a paz divina.

            Tal como os rios, porém, as doutrinas poluídas podem ser alcançadas, ainda puras e frescas, nas suas origens. A água pode estar suja aqui, mas é límpida e cristalina, lá, onde nasceu e onde continua a jorrar generosamente, incessantemente. A impureza não lhe é própria - é estranha, espúria, provêm de detritos que lhe atiraram ao longo do curso. A água que escorre pejas matas, onde ainda não chegou a “civilização”, chega pura ao seu destino. Nela vivem multidões de peixes e de seres. Nela se dessedentam todos os animais da criação, Nela se mira a face tranquila da Lua e nela acende o Sol fulgores inesperados. Ela canta entre as pedras, aprofunda-se nas represas, espadana-se nas cachoeiras irisadas, É difícil, porém, senão impossível ao mais modesto riacho, atravessar uma cidade, ou mesmo um lugarejo, e continuar puro como entrou. Impiedosamente, retiramos a sua água limpa e lha devolvemos maculada.

            Nem por isso, no entanto, elas deixarão de seguir o seu destino e prestar o seu serviço.

            Há outras lições, porém, nas águas que escorrem inexoráveis. É que elas também renascem. Uma boa parte se evapora, numa imitação de espiritualização e sobe para o céu, de onde desaba transmutada em chuva generosa sobre a terra. Vai impulsionar a germinação e o crescimento das plantas, vai ajudar um novo ciclo de vida. Vai infiltrar-se pelo chão a dentro e renascer alhures, purificada nos imensos filtros da Natureza.

            Lição prodigiosa essa, que precisaria, para explaná-la, a erudição e a oratória de um Vieira renascido. Diria ele, na riqueza das suas imagens e na pureza do seu verbo, que a água renascida é água purificada; é água que veio servir de novo, na humildade do seu mister; é água que se recuperou às angústias da podridão e recomeçou a sua tarefa, incansável; é água que não teme atravessar cidades e não teme receber detritos, porque a mão invisível de Deus a conduz e a faz filtrar-se e renascer tão pura e fresca como dantes; é água que mata a sede; é água que banha; é água que limpa; é água que recebe fluidos espirituais e se transforma em veículo da recuperação; é água sobre a qual flutuam embarcações, fatores de comunicação, entendimento e comércio entre os homens; é água que serve sem queixas, sem mágoas, sem ressentimentos, sem angústias, ao bom e ao que ainda não descobriu a bondade: é água que, à semelhança do Sol, nasce para o justo e para o injusto, como diz o Livro.

            Depois dessa inesperada meditação, não mais tive desgosto ao contemplar as escuras águas do canal, em Manguinhos. Sei que, nas suas origens, continua virginal; sei que, mesmo impura, contínua a servir, arrastando para longe os detritos que atiraram à sua face, sei que o seu destino é purificar-se novamente para novamente servir.


terça-feira, 27 de outubro de 2020

Ainda um pouco de tempo

 Ainda um Pouco de Tempo         

  16,16  “-Ainda um pouco de tempo, e já não Me vereis e, depois, mais um pouco de tempo  e Me tornareis a ver, porque vou para junto do Pai” 

16,17  Nisso, alguns de seus discípulos,  perguntavam   uns   aos   outros: -Que é isso que Ele diz: Ainda um pouco de tempo e não Me vereis, e, depois, mais um pouco de tempo e Me tornareis a ver?  E que significa também: -Vou para o Pai! 

16,18 Diziam então: -Que significa este “pouco de tempo” de que fala? -Não sabemos o que Ele quer dizer! 

16,19 Jesus notou que Lho queriam perguntar e disse-lhes: “-Perguntais uns aos outros acerca do que Eu disse: Ainda um pouco de tempo e não Me vereis, e depois mais um pouco de tempo e Me tornareis a ver. 

16,20  Em verdade, em verdade vos digo, haveis de estar tristes mas, a vossa tristeza se converterá em alegria. 

16,21 Quando a mulher está para dar a luz, sofre porque veio a sua hora mas, depois que deu a luz à criança, já não se lembra da aflição, por causa da alegria que sente de haver nascido seu filho 

16,22 Assim também vós, sem dúvida, agora estais tristes, mas hei de ver-vos outra vez, e o vosso coração se alegrará e ninguém vos tirará a vossa alegria. 

16,23 Naquele dia não Me perguntareis mais coisa alguma. Em verdade, em verdade vos digo, o que pedirdes ao   Pai  em   Meu  nome,   Ele  vo-lo  dará”

        

         Para Jo (15,20) -Alegria Cristã -  vejamos  “Caminho, Verdade e Vida” (Ed. FEB), de Emmanuel, por psicografia de Francisco C. Xavier:

             “Nas horas que precederam a agonia da cruz, os discípulos não conseguiram disfarçar a dor, o desapontamento. Estavam tristes. Como pessoas humanas, não entendiam outras histórias que não fossem as da Terra. Mas,  Jesus, com vigorosa serenidade, exortava-os: “Na verdade, na verdade, vos digo que vós chorareis e vos lamentareis; o mundo se alegrará e vós estareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria.”

            Através de séculos, viu-se no Evangelho um conjunto de notícias dolorosas - um Salvador abnegado e puro conduzido ao madeiro destinado aos infames, discípulos debandados, perseguições sem conta, martírios e lágrimas para todos os seguidores...

            No entanto, essa pesada bagagem de sofrimentos constitui os alicerces de uma vida superior, repleta de paz e alegria. Essas dores representam auxílio de Deus à terra estéril dos corações humanos. Chegam como adubo divino aos sentimentos das criaturas terrestres, para que de pântanos desprezados nasçam lírios de esperança.

            Os inquietos salvadores da política e da ciência, na crosta planetária, receitam repouso e prazer a fim de que o espírito chore depois, por tempo indeterminado, atirado aos desvãos sombrios da consciência ferida pelas atitudes criminosas. Cristo, porém, evidenciando suprema sabedoria, ensinou a ordem natural para a aquisição das alegrias eternas, demonstrando que fornecer caprichos satisfeitos, sem advertência e medida, às criaturas do mundo, no presente estado evolutivo, é depor substâncias perigosas em mãos infantis. Por esses motivo, reservou trabalhos e sacrifícios aos companheiros amados, para que se não perdessem na ilusão e chegassem à vida real com valioso patrimônio da estáveis edificações.

            Eis por que a alegria cristã não consta de prazeres de inconsciência, mas da sublime certeza de que todas as dores são caminhos para júbilos imortais.”

 


domingo, 25 de outubro de 2020

Eliéser Rosa: "...o Bem não faz mal!"

 


Eliézer Rosa: “... 0 Bem não faz mal!”

por Indalício Mendes    Reformador (FEB) Janeiro 1976  

                                                                                        

            Vem de ser divulgada pela imprensa “A Notícia” e “O Dia”, ambos do Rio, edições de 29-11-1975, inspirada sentença proferida pelo eminente magistrado Dr. Eliézer Rosa DD. Juiz da 8ª Vara Criminal, que absolveu médiuns acusados de prática de curandeirismo. De tal maneira S. Ex. penetrou o âmago da delicada questão que a situou, sábia e brilhantemente, em plano superior, fundamentando-se numa lógica invulnerável e em argumentos ao mesmo tempo simples, serenos e seguros, para concluir com profunda acuidade e meridiana clareza, pela ausência de crime a punir.

            Seu consistente raciocínio veio como que estabelecer novo e salutar clima em face do que poderíamos denominar “a mediunidade e a lei”, título, aliás de expressiva obra de Carlos Imbassahy, a respeito justamente da “mediunidade curativa”. Longe de nós subestimar a importância e a utilidade da Medicina tradicional, os benefícios que tem trazido à Humanidade. Todavia, devemos humildemente compreender que a infalibilidade não é, infelizmente, atributo comum ao homem terreno. “Justifica-se o esforço dos experimentadores da Medicina tentando descobrir um caminho novo para atenuar a miséria humana; todavia, sem abstrairmos das diretrizes espirituais, que orientam os fenômenos patogênicos nas questões das provas individuais, temos necessidade de reconhecer a imprescindibilidade da saúde moral, antes de atacarmos o enigma doloroso e transcendente das enfermidades físicas do homem.” (“Emmanuel” – Dissertações Mediúnicas – de Emmanuel por Francisco Cândido Xavier, cap. XXIII). Hoje, através da psicossomatologia, já se reconhece a procedência da afirmativa espírita de que, não raro, “as chagas da alma se manifestam através do envoltório humano” (isto é, o corpo físico). E é ainda Emmanuel quem esclarece: “O corpo doente reflete o panorama interior de espírita enfermo. A patogenia é um conjunto de inferioridades do aparelho psíquico” (“O Consolador” de Emmanuel por Francisco Cândido Xavier, Questão nº 96).                 O mesmo autor espiritual prossegue: “A saúde humana nunca será o produto de comprimidos, de anestésicos, de soros, de alimentação artificialíssima. O homem terá de voltar os olhos para a terapêutica natural, que reside em si mesmo, na sua personalidade e no seu meio ambiente. Há necessidade, nos tempos atuais, de se extinguirem os absurdos da fisiologia dirigida. A medicina precisa criar os processos naturais de equilíbrio psíquico, em cujo organismo, se bem que remoto para as suas atividades anatômicas, se localizam todas as causas dos fenômenos orgânicos tangíveis”. (“Emmanuel”, cap. XXllI). Além do mais, é princípio pacífico e irreversível no Espiritismo Cristão, a gratuidade dos benefícios mediúnicos, sejam eles de que natureza forem, princípio esse baseado nas palavras de Jesus-Cristo: “Dai de graça o que de graça receberdes” (Mateus, X: 8). E está em “0 Evangelho segundo o Espiritismo”, cap. XXVI, p. 379, 63ª edição, FEB, 1975: “Com esta recomendação, prescreve que ninguém se faça pagar daquilo por que nada pagou. Ora, o que eles haviam recebido gratuitamente (refere-se o Mestre a seus discípulos) era a faculdade de curar aos doentes e de expulsar os demônios, isto é, os maus Espíritos. Esse dom Deus lhes dera gratuitamente, para alívio dos que sofrem e como meio de propagação da fé; Jesus, pois, recomendava-lhes que não fizessem dele objeto de comércio, nem de especulação, nem meio de vida.”

             Passemos, pois, a transcrever a luminosa sentença do egrégio Dr. Juiz Eliézer Rosa, revestida de admirável eloquência cristã:

             "Oscar Wilde Oliveira Silva, Danacê Gehrke e Maria da Conceição Queirós dos Santos foram denunciados, o primeiro e segundo réus nas penas dos arts. 282 e 264, I, do Cód. Penal combinados com o art. 25 do mesmo Código, e a terceira acusada como incursa no art. 284, I, combinado com o art. 25, ambos do Cód. Penal, porque o primeiro acusado receitava remédio e a segunda ré colaborava com ele, a terceira acusada porque colaborava com o primeiro réu, na prática do curandeirismo e exercício ilegal da Medicina.  Expõe a denúncia que, no dia 22 de junho deste ano de 1975, na Rua Presidente Barroso, 130, onde funciona o Centro Espírita Caboclo Pedra da Mata, foi preso em flagrante o primeiro réu, porque, ali, exercia ilegalmente a medicina, além de praticar o curandeirismo, auxiliado pela segunda acusada que escrevia as receitas médicas, enquanto que a terceira acusada organizava as filas e recebia as importâncias em dinheiro. Acrescenta a denúncia que, no momento da prisão, o primeiro réu fazia uma operação em Roberto Pereira dos Santos, usando um canivete, a uma bucha contendo um líquido vermelho, “idêntico a sangue”, pressionando-a sobre o olho do paciente, do mesmo passo que a segunda ré descrevia e traduzia a operação realizada pelo primeiro acusado. Prossegue a denúncia dizendo que Maria José de Oliveira, Selma Santos e Ana Martins da Rocha foram operadas pelo primeiro réu que dizia “estar incorporado ao Dr. Fritz”.

             O processo teve curso legal.

            Foram os réus interrogados a fls. 60, 61 e 62. Defesa a fls. 64 a 68. Testemunhas a fls. 80 a 84. Na audiência de julgamento, foram ouvidas as testemunhas da fls. 90 a 93, seguindo-se os debates orais. O Dr. Promotor pediu a condenação do primeiro e segundo réus, e a absolvição da terceira. A defesa, pelo magistério de ilustres advogados, pediu a absolvição dos três acusados, requerendo, a juntada de um memorial Ilustrado oferecido pela testemunha de um memorial ilustrado oferecido pela testemunha e médico Dr. Kroner.  

             Foi tudo visto e examinado.

             A denúncia atribui aos três acusados a prática de curandeirismo, e ao primeiro réu e à segunda ré também o crime de exercício ilegal da medicina.

             No que concerne ao delito de curandeirismo imputado aos três réus, faltam-lhe os elementos que formariam figura do curandeiro emprestada aos três acusados. Por definição, curandeirismo é a atividade ou a prática do curandeirismo, isto é, daquele que cura sem títulos nem habilitações, utilizando-se de rezas e feitiçarias, ou no verbete do consagrado filólogo e dicionarista Antenor Nascentes. “indivíduo que se mete a curar, sem títulos nem habilitações, usando, às vezes, de meios charlatanescos”. Os acusados não praticavam nem rezas nem feitiçarias, nas atividades a que se entregavam na ocasião, e a que se propõe, desde há muito, o “sensitivo”, “médium” ou "aparelho" do Dr. Fritz, como é o primeiro acusado.

             Não receitam, não prescrevem, inculcam o uso de vitaminas e que tais, coisas que se usam sem indicação médica, as mais das vezes.

             Quanto ao exercício ilegal da medicina, crime atribuído ao primeiro e segundo réus, não ocorre, no caso. O primeiro réu é um dos da grande família dos “sensitivos”, desses novos “iniciados” em conhecimentos que escapam à observação e à experimentação. É o primeiro réu - Oscar Wilde Oliveira Silva da mesma linhagem espiritual de José Pedro de Freitas (Zé Arigó), Evaldo de Oliveira Silva, Lourival Freitas. Salvino Mariano da Costa, Antônio José Sales, lzaltina e outros, cujos nomes só a gratidão sabe guardar. São eles “aparelhos” de grandes médicos do passado e, em estado de transe, fazem o que lhes ditam os que deles se servem como seus instrumentos ou na linguagem exata dos entendidos, como seus “aparelhos”. Operam por meios e métodos espirituais, “fluidicamente”. Não é a cirurgia comum de técnicos e consagrados cirurgiões. São emanações de energia consciente, são forças para psicológicas que resultam da liberação de energia consciente e de que se utilizam esses chamados “médiuns” ou “aparelhos” de egrégias figuras da medicina do passado, como o cirurgião Ambroise Paré, ele quem se dá como “aparelho” o sensitivo Lourival de Freitas.

             Não é exercício ilegal da medicina, nos termos definidores de medicina humana. É um tipo de medicina medicamentosa e curativa mas de ordem espiritual. É para os que crerem e tiverem fé.

             Os fatos que estes autos mostram são daqueles que exigem interpretação e estudo detido pelos que lhes conhecem a importância e a transcendência. Diante deles, fica-se na fronteira do mistério, onde acaba a Ciência e começa a Fé. Não tenho por criminoso esse iniciado e sensitivo Oscar Wilde Oliveira Silva nem como crimes de curandeirismo e ilegal exercício da medicina o que ele realiza. Fazer o bem, diminuir as dores humanas, não podem ser consideradas atividades que incorrem na censura nem leiga, nem legal.

             Testemunhas maiores de qualquer suspeita e dúvida vieram dizer dos benefícios que receberam, das curas realizadas.

             Está o julgador diante de fatos que refogem ao ordinário, ao conhecido pelos sentidos do comum das criaturas humanas. São fenômenos espirituais que exigem estudo pelos homens de boa vontade e de fé, que respeitam os fatos e sua veracidade.

             Não encontro crime a punir na conduta de Oscar Wilde Oliveira Silva, e, pois, não o posso encontrar na segunda acusada, nem na terceira, para quem, aliás, foi pedida a absolvição pelo eminente Dr. promotor.

             Por derradeiro: se se houvesse de qualificar de criminosa a conduta do réu Oscar Wilde de Oliveira Silva, haveria primeiro de deixar-se provado o dolo, o que não seria possível porque os “sensitivos”, “médiuns” ou “aparelhos” como o primeiro acusado, agem em estado de transe.

             Absolvo os réus porque não encontro crime a punir. Não posso entrar nesse novo e maravilhoso mundo que será aquele onde dominar a liberação da energia consciente e seu aproveitamento para o bem dos homens; mas, embora fora dele, deixo manifestado o respeito que merecem os que procuram, por meio da fé, diminuir o sofrimento humano e fazer renascer nos rostos amargurados um largo e generoso sorriso, porque a dor passou, o doente melhorou e a paz retornou à casa do aflito. Eu também creio que o Bem não faz mal.  P. I.

            Rio de Janeiro, 26 de novembro de 1975. Eliézer Rosa - Juiz de Direito”

 


Ainda um pouco de tempo...

Ainda um Pouco de Tempo         

 16,16  “-Ainda um pouco de tempo, e já não Me vereis e, depois, mais um pouco de tempo  e Me tornareis a ver, porque vou para junto do Pai” 

16,17  Nisso, alguns de seus discípulos,  perguntavam   uns   aos   outros: -Que é isso que Ele diz: Ainda um pouco de tempo e não Me vereis, e, depois, mais um pouco de tempo e Me tornareis a ver?  E que significa também: -Vou para o Pai! 

16,18 Diziam então: -Que significa este “pouco de tempo” de que fala? -Não sabemos o que Ele quer dizer! 

16,19 Jesus notou que Lho queriam perguntar e disse-lhes: “-Perguntais uns aos outros acerca do que Eu disse: Ainda um pouco de tempo e não Me vereis, e depois mais um pouco de tempo e Me tornareis a ver. 

16,20  Em verdade, em verdade vos digo, haveis de estar tristes mas, a vossa tristeza se converterá em alegria. 

16,21 Quando a mulher está para dar a luz, sofre porque veio a sua hora mas, depois que deu a luz à criança, já não se lembra da aflição, por causa da alegria que sente de haver nascido seu filho 

16,22 Assim também vós, sem dúvida, agora estais tristes, mas hei de ver-vos outra vez, e o vosso coração se alegrará e ninguém vos tirará a vossa alegria. 

16,23 Naquele dia não Me perguntareis mais coisa alguma. Em verdade, em verdade vos digo, o que pedirdes ao Pai em Meu nome, Ele vo-lo dará”

             Para Jo (15,20) -Alegria Cristã -  vejamos  “Caminho, Verdade e Vida” (Ed. FEB), de Emmanuel, com psicografia de Francisco C. Xavier:

             “Nas horas que precederam a agonia da cruz, os discípulos não conseguiram disfarçar a dor, o desapontamento. Estavam tristes. Como pessoas humanas, não entendiam outras histórias que não fossem as da Terra. Mas,  Jesus, com vigorosa serenidade, exortava-os: “Na verdade, na verdade, vos digo que vós chorareis e vos lamentareis; o mundo se alegrará e vós estareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria.”

            Através de séculos, viu-se no Evangelho um conjunto de notícias dolorosas - um Salvador abnegado e puro conduzido ao madeiro destinado aos infames, discípulos debandados, perseguições sem conta, martírios e lágrimas para todos os seguidores...

            No entanto, essa pesada bagagem de sofrimentos constitui os alicerces de uma vida superior, repleta de paz e alegria. Essas dores representam auxílio de Deus à terra estéril dos corações humanos. Chegam como adubo divino aos sentimentos das criaturas terrestres, para que de pântanos desprezados nasçam lírios de esperança.

            Os inquietos salvadores da política e da ciência, na crosta planetária, receitam repouso e prazer a fim de que o espírito chore depois, por tempo indeterminado, atirado aos desvãos sombrios da consciência ferida pelas atitudes criminosas. Cristo, porém, evidenciando suprema sabedoria, ensinou a ordem natural para a aquisição das alegrias eternas, demonstrando que fornecer caprichos satisfeitos, sem advertência e medida, às criaturas do mundo, no presente estado evolutivo, é depor substâncias perigosas em mãos infantis. Por esses motivo, reservou trabalhos e sacrifícios aos companheiros amados, para que se não perdessem na ilusão e chegassem à vida real com valioso patrimônio da estáveis edificações.

            Eis por que a alegria cristã não consta de prazeres de inconsciência, mas da sublime certeza de que todas as dores são caminhos para júbilos imortais.”