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sábado, 30 de março de 2013

Quaresma em plena Páscoa




Quaresma em plena Páscoa  



         No mesmo dia, iam dois deles para uma aldeia de nome Emaús, distante de Jerusalém sessenta estádios. Vinham conversando um com o outro sobre tudo o que acabava de suceder. Enquanto assim falavam e conferenciavam entre si, aproximou-se deles o próprio Jesus e foi com eles. Eles, porém, estavam com os olhos tolhidos, de maneira que não o reconheceram. Perguntou-lhes ele: “Que conversas são estas que entretendes um com o outro pelo caminho?”

            Calaram-se eles, tristes. Um deles, de nome Cléofas, respondeu: “és Tu o único forasteiro em Jerusalém e ignoras o que aí se passou nestes dias?”

            “Que foi?” – inquiriu ele.

            “Aquilo que Jesus, o Nazareno – responderam-lhe. – Era um profeta, poderoso em obras e palavras, diante de Deus e de todo o povo. Mas os sumos sacerdotes e os nossos magistrados entregaram-no à pena de morte e crucificaram-no. Nós, porém, esperávamos que fosse ele o salvador de Israel. De mais a mais, já é agora o terceiro dia que se deu tudo aquilo. Verdade é que algumas das nossas mulheres nos aterraram; tinham ido ao sepulcro, mui de madrugada; mas não acharam o corpo. E voltaram com a notícia de lhes terem aparecido anjos que declararam que ele estava vivo. Ao que alguns dos nossos foram ao sepulcro, e encontraram confirmado o que as mulheres tinham dito; a ele mesmo, porém, não o viram.” Lucas  24, 13ss



         Que dissestes, solitários viandantes?... Esperáveis que fosse o Nazareno o Redentor?... E agora vos desiludistes?... por que?... por que sofreu e morreu?

            Que é da vossa filosofia, insensatos pessimistas?...

            Redentor seria o Nazareno se a si mesmo se redimisse do sofrimento e da morte?

            Redentor, se expulsasse para além das fronteiras o invasor estrangeiro?

            Redentor, se reestabelecesse a independência política de Israel e o esplendor do reino davídico?

            Quando compreendereis o absurdo desta vossa filosofia?

        
Huberto Rohden
in “Em Espírito e Verdade”
Edição da Revista dos Tribunais, SP – 1941  



quarta-feira, 27 de março de 2013

Aprendizes e Adversários



Aprendizes
e Adversários
Irmão X
por Chico Xavier
Reformador (FEB)  Julho 1955

Jonathan, Jessé e Eliakim, funcionários do Templo de Jerusalém, passando por Cafarnaum, procuraram Jesus no singelo domicílio de Simão Pedro.

Recebidos pelo Senhor, entregaram-se, de imediato, à conversação.

- Mestre - disse o primeiro -, soubemos que a tua palavra traz ao mundo as Boas Novas do Reino de Deus e, entusiasmados com as tuas concepções, hipotecamos ao teu ministério o nosso aplauso irrestrito. Aspiramos, Senhor, à posição de discípulos teus... Não obstante as obrigações que nos prendem ao Sagrado Tabernáculo de Israel, anelamos servir-te, aceitando-te as ideias e lições, com as quais seremos colunas de tua causa na cidade eleita do Povo Escolhido... Contudo, antes de solenizar nossos votos, desejamos ouvir-te quanto à conduta que nos compete à frente dos inimigos...

- Messias, somos hostilizados por terríveis desafetos, no Santuário - exclamou o segundo -, e, extasiados com os teus ensinamentos, estimaríamos acolher-te a orientação.

- Filho de Deus - pediu o terceiro -, ensina-nos como agir ...

Jesus meditou alguns instantes, e respondeu:

- Primeiramente, é justo considerar - nossos adversários como instrutores. O inimigo vê junto de nós a sombra que o amigo não deseja ver e pode ajudar-nos a fazer mais luz no caminho que nos é próprio. Cabe-nos, desse modo, tolerar lhes as admoestações, com nobreza e serenidade, tal qual o ferro, que após sofrer, paciente, o calor da forja, ainda suporta os golpes do malho com dignidade humilde, a fim de se adaptar à utilidade e à beleza.

              Os visitantes entreolharam-se, perplexos, e Jonathan retomou a palavra, perguntando:

- Senhor, e se somos injuriados?

- Adotemos o perdão e o silêncio - disse Jesus. - Muita gente que insulta é vítima de perturbação e enfermidade.

- E se formos perseguidos? - indagou Jessé.

Utilizemos a oração em favor daqueles que nos afligem, para que não venhamos a cair no escuro nível da ignorância a que se acolhem.

- Mestre, e se nos baterem, esmurrarem? - interrogou Eliakim. - Que fazer se a violência nos avilta e confunde?

- Ainda assim - esclareceu o brando interpelado -, a paz íntima deve ser nosso asilo e o amor fraterno a nossa atitude, porquanto, quem procura seviciar o próximo e dilacerá-lo está louco e merece compaixão.

- Senhor - insistiu Jonathan -, que resposta oferecer, então, à maledicência, à calúnia e à perversidade?

O Cristo sorriu e precisou:

- O maledicente guarda consigo o infortúnio de descer à condição do verme que se alimenta com o lixo do mundo, o caluniador traz no coração largas doses de fel e veneno que lhe flagelam a vida, e o perverso tem a infelicidade de cair nas armadilhas que tece para os outros. O perdão é a única resposta que merecem, por que são bastante desditosos por si mesmos.

- E que reação assumir perante os que perseguem? - inquiriu Jessé, preocupado.

- Quem persegue os semelhantes tem o espírito em densas trevas e mais se assemelha ao cego desesperado que investe contra os fantasmas da própria imaginação, arrojando-se ao fosso do sofrimento. Por esse motivo, o socorro espiritual é o melhor remédio para os que nos atormentam...

- E que punição reservar aos que nos ferem o corpo, assaltando-nos o brio? - perguntou Eliakim, espantado. - Refiro-me àqueles que nos vergastam a face e fazem sangrar o peito...

- Quem golpeia pela espada, pela espada será golpeado também, até que reine o Amor Puro na Terra - explicou o Mestre, sem pestanejar. - Quem se rende às sugestões do crime é um doente perigoso que devemos corrigir com a reclusão e com o tratamento indispensável. O sangue não apaga o sangue e o mal não retifica o mal...

E, espraiando o olhar doce e lúcido pelos circunstantes, continuou:

- É imperioso saibamos amar e educar os semelhantes com a força de nossas convicções e conhecimentos, a fim de que o Reino de Deus Se estenda no mundo... As Boas Novas de Salvação esperam que o santo ampare o pecador, que o são ajude ao enfermo, que a vítima auxilie o verdugo... Para isso, é imprescindível que o perdão incondicional, com o olvido de todas as ofensas, assegure a paz e a renovação de tudo...

Nesse ínterim, uma criança doente chorou em alta voz num aposento contíguo. O Mestre pediu alguns instantes de espera e saiu para socorrê-la, mas, ao regressar, debalde buscou a presença dos aprendizes fervorosos e entusiastas.

Na sala modesta de Pedro não havia ninguém.



27. "Fenômenos de Materialização"



27
Fenômenos de Materialização
por   Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942


Conclusões Gerais

            Escrito deliberadamente para um Congresso internacional, este trabalho haveria de conter particularidades e minúcias que o alongaram e que, supérfluas e até pueris se tornam, em sua atual aplicação e destino.

            Lá, entre irmãos estranhos ao nosso ambiente psíquico e despercebidos dos nossos hábitos e costumes; dos valores em jogo para formar um padrão novo de religiosidade, o nosso esforço bem poderia ficar encerrado com o último capítulo. Aqui, entre falangiários de têmpera mais harmonizada, porque filhos natos ou adotivos da mesma Pátria, educados e evolvidos por fatores variáveis na forma, porém idênticos no fundo e na finalidade global; aqui, ele, o nosso trabalho, carece do acréscimo de algumas considerações que o aclarem e justifiquem.

            Aceito e admitido sejamos um povo fadado a transformar o mundo pela difusão maior do Evangelho cristão à luz do Espiritismo, forçoso é cogitar dos meios mais práticos e eficientes no desempenho da grandiosa tarefa, tão certo é que, se, nesse escopo, a melhor parte diretiva pertence aos nossos Guias, nem por isso nos forramos à contribuição de nossa quota, tanto mais legitimada quanto bem entendida.

            Ora, sendo os médiuns, no sentido ortodoxo, doutrinário, os instrumentos por assim dizer vivos da Doutrina, é claro que para eles deve convergir todo o cuidado e proteção dos que se interessam pela causa da Verdade.

            Médiuns valiosos e valorosos não faltam em nosso pais; conscientes e conscienciosos de suas faculdades, máxime da aplicação dessas faculdades, poucos temos conhecido e daí o empirismo, a confusão, a arbitrariedade de métodos e processos, dos mais heteróclitos aos mais grosseiros, dos mais retumbantes aos menos honestos.

            Será uma triste contingência, uma dolorosa fatalidade radicada à natureza do Espirito, que se não corrige nem se modifica de jato - natura non facit saltus. (a natureza não dá saltos). Concordamos.              

            A ilação clássica, que os fatos e observações autorizam, é a de que os médiuns são, em tese, grandes devedores que pediram a prova do "fogo", para no fogo se depurarem.

            Por isso os vemos a miúde em luta com os maiores tropeços e dificuldades de ordem moral ou material, feridos no lar, zurzidos na sociedade, por vezes enlodados no escândalo.

            Comédias ridículas, tragédias pungentes, são frutos legítimos de mediunidades desviadas, subvertidas, em maior escala do que a muita gente poderá parecer. 

            As Sociedades e Grupos espíritas devem, portanto, cogitar primacialmente da cultura doa seus médiuns, fazendo deles e com eles um estudo especial.

            Inculcar métodos para tal fim seria pueril, de vez que cada núcleo e cada médium tem peculiaridade própria e definida, em relação com o meio ambiente.

            De resto, toda regra imposta e prefixada representaria uma coação, uma restrição dessa liberdade que é o mais belo apanágio do Espírito, e sem a qual não há mérito nem demérito. Entre nós, mesmo entre confrades esclarecidos, tem medrado a hipótese da criação oficial de regras e preceitos tendentes a legitimar o exercício da mediunidade.

            Outros procuram instituir escolas de médiuns. Respeitando-lhes o intuito, não somos de um tal parecer e neste, como em todos os problemas doutrinários que nos defrontam, achamos que um só processo se justifica e legitima, qual o do intercâmbio das boas ideias e princípios, a sua difusão intensiva em larga escala, inteligente, amorosa, persuasiva e clara... '

            Esclarecer, insinuar, convencer por todos os meios e modos ao nosso alcance, sobretudo pelo exemplo, mas nunca impor nem constranger.

             A obra real, a obra única, por assim dizer, do Espiritismo é a transformação do individuo por si e dentro de si mesmo.

            Toda arregimentação e toda cooperação deve ser espontânea, livre, consciente, natural; e tudo que o não seja será obra de artificialismo, armada ao fracasso, obra divisória e contraproducente.

            A Federação Espirita Brasileira, como entidade coletiva, propugna certamente, e tem na mais alta conta, a formação de bons médiuns, ou, antes, a adoção de processos que facilitem aos médiuns o aprimoramento e legitima aplicação de suas faculdades. 


11. "Ciência Religião Fanatismo"



11

Ciência    Religião   Fanatismo

por Mínimus
 (Antônio Wantuil de Freitas)
Ed. FEB
c.1938


            Quanto aos outros, os padres, não nos admiremos que se irritem com a difusão da medicina mediúnica. Eles vêm o povo procurar-nos, ansioso de se livrar de males que o afligem, e, como os sacerdotes do Judaísmo, condenam a nossa prática, filha dileta do Cristianismo, porque sentem que lhes fogem os lucros pecuniários das missas, bênçãos e comendas. Mas, tal como aconteceu aos sacerdotes judeus, nada conseguirão, visto que seguimos as recomendações evangélicas, dando completamente de graça o que de graça recebemos, enquanto eles mercantilizam tudo, desde os lugares no Céu até as bênçãos de espadas e de canhões, caluniando o Evangelho com essas normas farisaicas.

            E é exatamente por tudo chatinarem (mercadejar sem escrúpulo; traficar) que nada alcançam do Mestre, de quem pretendem os representantes, quando dia a dia mais separam d'Ele, "já por sepultarem a religião no mistério de uma língua morta, já por viverem com a boca cheia de Deus e a consciência cauterizada de interesses mundanos".

            Essa suposta representação gerou o ridículo dogma da infalibilidade papal, e como naturalmente desse dogma se deduz que todos os Santos Padres foram indefectíveis, não sabemos como se conseguem harmonizar as múltiplas incoerências das suas deliberações.

            A teoria de Copérnico, que afirmava mover-se a Terra em redor do sol, foi condenada como herege, absurda e ridícula pelo Concílio Tridentino, que pelo Espírito-Santo se dizia inspirado; todavia, Benedito XI, mais tarde, a mandou aceitar. Facilmente se concluirá que o Concílio não recebeu inspirações de Espíritos-Santos, mas de espíritos atrasados, e, assim, todas as deliberações do referido Concílio mereciam ser revogadas.

            Aliás, senhores, todos os dogmas criados pelo clero são oriundos de fontes suspeitas e gerados com o fito exclusivo de comércio, tal qual procediam os sacerdotes do ano 30 da nossa era. 

            Absorveram tudo que de mau possuía, o Paganismo e a Mitologia, veeiros (peliça delicada e fina) onde beberam inspirações para as suas fábulas ineptas, senis e falaciosas.

            A lenda do inferno e dos anjos mais se assemelha à de Zeus (Júpiter, dos Romanos), que expulsou Cronos do céu, arrastando-o para a região que se estende por baixo da terra e dos oceanos.

            A história de Noé, que tão bem compreendemos, explicam-na tal como a Mitologia, que nos diz só se terem salvo do dilúvio Decalião e sua mulher Pirra.

            A Mitologia tinha deuses secundários com o encargo de proteger certas classes sociais, determinadas profissões e certos fenômenos, e os padres aproveitaram a ideia, criando enorme série de santos canalizadores de vultosa renda para os seus áureos cofres, explorando com isso a credulidade humana.

            Lançaram anátemas sobre os Maniqueus que apresentavam o Bem e o Mal como criadores do mundo, para a eles se igualarem oferecendo-nos o mitológico Satã, com poderes sobre a quase totalidade das almas.

            Suas bênçãos, como as do Paganismo, são vendidas a preços tabelados, quais gêneros de feiras-livres, e muitas só são acessíveis a burgueses endinheirados, embora o Cristo sempre nos ensine que as bênçãos de Deus chovem igualmente sobre o rico, sobre o mendigo das ruas e sobre os infelizes dos cárceres.

            As reuniões da época inicial do Cristianismo foram substituídas por festas luxuosas, onde pontificam entrajados com roupas ricas e apalhaçadas, idênticas às dos sacerdotes judaicos, num ambiente de perfumes voluptuosos e de frêmitos de vestidos de seda, sem recato e sem respeito à presença do Cristo que eles supõem transubstanciado no cibório (vaso onde se conservam as hóstias) de ouro ou na custódia de pedras preciosas. Suas festas externas, com bandeirolas, charangas, foguetes e charolas (andor de procissão) carregadas por homens vestidos de vermelho, lembram, a um tempo, as festas do Paganismo e as do tríduo carnavalesco.

            Entretanto, riem-se dos "passes" espíritas, chamam-nos histéricos e endemoniados, confundindo os nossos "passes", que são transmissões de fluido do Alto, com os passes monetários das suas bênçãos, com os passes que passam maneirosamente o dinheiro da bolsa do passivo para as arquetas (arca pequena) da Igreja, dessa mesma Igreja que, há séculos, vive do embrutecimento das massas populares, vendendo graças que sabe não possuir, que não possue, e que evangelicamente, não são negociáveis.

            E essas cobiças irreplegíveis (insaciável) continuarão por muito tempo, com o apoio dos indiferentes, até que se possa extrair da consciência do povo o joio clerical, substituindo-o pelo trigo que alimenta, pelas verdades que rolam, pérolas desfeitas, dos ensinamentos de Jesus, até atingir os penetrais (a parte mais recôndita e interior de um objeto)  da alma da humanidade.

            Não admitem as nossas comunicações psicofônicas e psicográficas, classificam como obras de Satã os fenômenos produzidos pelos Espíritos; todavia, quando os fatos se passam com freiras, insuladas em conventos, esperam que os anos corram e, então, após a morte da freirinha, baseados na sua mediunidade, elevam-na à categoria de santa, para que assim o seu comércio sacrílego apresente novidades aos compradores de bênçãos e de indulgências.

            E a nós, senhores, que não vemos na mediunidade sintoma, indício ou cheiro de santidade, que não exploramos esse dom oferecido por Deus às suas criaturas para beneficiar o próximo; a nós, que explicamos sem mistérios a origem e o fim da mediunidade, procuram acusar-nos como representantes de um cerebrino diabo, no receio, infundado e louco, de que lhes possamos fazer concorrência nos exorcismos com defumadores de incenso.

            De graça damos tudo que de graça recebemos, e mais ainda, pois todos, nós contribuímos para a manutenção de asilos, enquanto eles, nada oferecendo, ainda cobram, dos que se deixam embair (enganar, seduzir) pela sua lábia, ordenados de freiras e de capelães de asilos, de hospitais e de irmandades.
           




terça-feira, 26 de março de 2013

Obsessão e Cura



Obsessão e Cura
Albino Teixeira
por Chico Xavier
Reformador (FEB) Dezembro 1969


A reencarnação solicita cerca de nove meses no claustro materno, e, a fim de que venha a estabelecer domínio sobre o corpo, não se requer do Espírito nada menos de sete anos sucessivos de esforço e de ensaio, para que se lhe consolide a segurança na experiência física.

*

Um certificado de competência nas profissões liberais custa habitualmente quase quatro lustros de estudos incessantes.
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Uma árvore frutífera deve aguardar a passagem de muitas estações, até que consiga fornecer os frutos da própria espécie.

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O carvalho ou a peroba, para oferecerem material de construção, necessitam de muitas décadas de trabalho silencioso, na organização da própria estrutura.

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O carvão, para converter-se em diamante, requisita séculos de apoio no laboratório da Natureza.

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Se em qualquer progresso ou desenvolvimento de aquisições do mundo nada se obtém sem paciência, amor, educação e serviço, como quereis, meus irmãos da Terra, que a obsessão, que é frequentemente desequilíbrio crônico da alma, venha a desaparecer, sem paciência, amor, educação e serviço, de um dia para outro?



10. 'Ciência Religião Fanatismo'



10

Ciência    Religião   Fanatismo

por Mínimus
 (Antônio Wantuil de Freitas)
Ed. FEB
c.1938




            Falamos em linguagem clara, sem ambiguidades, procurando esclarecer as verdades que nos foram legadas sob a forma alegórica pelo Cristo de Deus, e, por isso, recomendamos o cultivo da mediunidade curadora, por Ele praticada e por Ele ordenada aos seus discípulos. Não conseguimos tanto como o Cristo, porque Ele era intermediário de Deus e nós outros, simples e imperfeitos médiuns de Espíritos.

            E é exatamente por se dedicarem os nossos médiuns a socorrer o próximo, que se insurgem contra nós os mercenários que vêm suas rendas diminuídas - os padres e os médicos sem clínica. Dizemos sem clínica, visto como os que a possuem não são os que desejam inibir-nos de praticá-la, sendo até conhecida a frase do príncipe Miguel Couto: "Ai da pobreza do Rio se não fossem os espíritas!" Os que têm clínica, nasceram com esse dom de médiuns receitistas ou de médiuns curadores, recebendo intuições que lhes facilitam no diagnóstico e na terapêutica, enquanto os outros, que não receberam essa dádiva, vêm afastar-se os doentes pela razão de que, mal possuindo os conhecimentos humanos, não podem exercer satisfatoriamente a Medicina.

            Porque estudaram Medicina? Que culpa temos nós de não terem eles nascido médiuns? No entanto, são os nossos maiores inimigos, quando desejávamos que eles possuíssem e cultivassem essa mediunidade, de que não auferimos lucro material e que preferíamos existir somente com os médicos, pois eles seriam melhores receptores da obra benéfica dos Espíritos.

            Tempo virá em que os pais só matricularão, nas Escolas de Medicina, os filhos que possuírem tais mediunidades. E então, não haverá mais necessidade dos médiuns, a quem tanto combatem hoje.

26. 'Fenômenos de Materialização'



26
Fenômenos de Materialização
por   Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942


            "Deve haver alguma razão para essa tão profusa irrigação, essa fertilidade de solo, essa salubridade de clima.

            "Nenhum pais tropical é tão elevado como o Brasil. Essa grande elevação, combinada com os ventos alísios, produz um clima mais fresco e mais salubre do que o das latitudes correspondentes da África e da Ásia Meridional."

            R.R. TANNES, C. FLETCHER E KmER - Narrativas de viagens ao Brasil, 1857 e 1862.

            Este conceito nós o extraímos da apologética de William Stead, nosso confrade, ao papel de Ruy Barbosa no Congresso da Haia, versão portuguesa de Artur Bomilcar, sob o título de - O Brasil em Haia.

            Ainda na mesma obra se nos depara, do célebre geógrafo Eliseu Reclus, um paralelo interessante entre os Estados Unidos do Norte e os do Sul, quer em sua potamografia (estudo, descrição dos rios) , quer na sua orografia (estudo ou tratado a respeito do relevo terrestre), quer no seu desenvolvimento histórico.

            Esse confronto vem de molde a corroborar nossa tese, que abrange de cimo o desdobramento dos povos na laboração do planeta e a elaboração, nele, de tarefas progressivamente ampliativas do alvo imanente e providencial - o amor universal.

            Porque, de resto, o que se verifica é o seguinte: se lá, como aqui, os elementos originários foram idênticos - o branco, o índio, o negro - lá esses elementos cedo se extremaram, com predominância do anglo-saxão e outros ádvenas (pessoa que chega a um lugar. O que não é nascido no país. Estranho, forasteiro; adventício), sem dar os pródromos (primeiros indícios de alguma coisa)  de uma alma coletiva.

            O índio, hoje escassíssimo em seus remanescentes, se ainda existe porventura, é como valor negativo; e o preto, não só psicológica como socialmente considerado, é qual corpo exótico enquistado no organismo nacional.

            Por isso, lá, o problema racial é um espantalho, uma incógnita a desafiar desde já os estadistas providentes e previdentes. Aqui, esse problema está, de há muito, praticamente resolvido e já agora as correntes migratórias, por volumosas, não absorverão a índole psíquica, caldeada em quatro séculos de ininterrupta aproximação e transfusão.

            Expliquemo-nos: o crioulo, seja ele oriundo de sangue europeu, ou asiático (não esquecer a numerosa colônia árabe aqui derramada), seja produto outro mestiço, de qualquer raça adventícia, para logo se revela mais brasileiro, na mentalidade e na cordialidade, do que sírio, italiano ou alemão.

            Nem já as influências da educação doméstica, o extremismo dos costumes têm a força de lhes reter o caráter atávico, o ascendente original.

            No passado, o Visconde de Montezuma e o Barão de Cotegipe, para só falar destes, deram- nos o expoente exato da nacionalidade em floração; hoje, Rodrigues Alves, de origem portuguesa, Lauro Muller, de origem alemã, e Pandiá Calógeras, de origem grega, são figuras que se confundem no mesmo padrão nacional, psiquicamente sintonizadas na compreensão dos nossos destinos políticos e internacionais.

            E os que mais resistem à absorção como, ao que dizem, os alemães, não ultrapassam a resistência da segunda geração.

            Mas, como se dá, afinal, essa identificação psíquica? 

            Pela hereditariedade biogenética, pela influência mesológica, pela comunhão social, civil, política? Absolutamente ...

            O fenômeno aqui evidente assume proporções infirmativas de todas as teorias clássicas da hereditariedade e só a realidade das reencarnações, dentro da nossa tese, pode explicá-lo e mais - justificá-lo.

            Figuradamente, retrocedendo aos primórdios de nossa história, o colono, o conquistador, o guerreiro, ou simplesmente o flibusteiro, aqui aportou ávido de fortuna, de aventura, ou apenas de paz e liberdade.

            O seu primeiro contato com a terra úbere e opulenta, florida e luminosa, foi um deslumbramento!

            A transparência das aguas, o matiz das selvas adustas, a suavidade azul do céu, a policromia dos horizontes, o canto das aves, o perfume das flores, a orquestração dos insetos, a alma dos seres e a alma das coisas, enfim, eis o primeiro abalo de sua alma.

            Ele o sentiu e ficou. Se não ficou, também não se esqueceu jamais.

            Digamos, porém, na generalidade, que ficou e triunfou, ou sofreu, foi vencido e aqui morreu.  Morreu? Não! ninguém morre... Enquanto o arcabouço vigoroso tombava em plena refrega, ou arrefecia naturalmente entre comparsas indiferentes, o Espírito liberto, já afeiçoado ao meio, iluso ainda dos sonhos que o derrancaram do lar e da pátria, erra, circunvaga, paira entre e sobre aquelas grandezas fascinadoras, até que refeito para sondar o passado e balancear o próprio destino.

            E a consciência lhe diz que já não é o cidadão de uma pátria confinada no planeta, mas o cidadão do Universo, o itinerante do Infinito, o filho de Deus!

            Ou ainda: a consciência não lhe diz coisa alguma, nada, e ele apenas sente que pode e deve continuar ali, viver e lutar ali.

            Consciente ou inconsciente, pois, ei-lo a buscar uma lapa, uma furna, uma choupana, uma feitoria, um berço enfim.

            Se era, lá na pátria de antanho, um sonhador, nada lhe impede continue a sonhar aqui: simplesmente, o que sonhou e não realizou lá, pode sonhar e realizar aqui.

            O potencial do Espírito como que se subtiliza na luta e já elementos novos do ambiente novo lhe tonalizam a vontade, lhe apuram, lhe virilizam as faculdades.

            Guerreiro de ontem, arcabuzando, monteando impiedoso o selvícola, que defende galhardo, a peito nu, a taba dos seus maiores, pode ele tornar-se amanhã o defensor heroico dessa mesma taba, para que nele se cumpra a irrefragável, a iniludível quão benéfica lei da reparação.    

            E viverá escravo ou viverá senhor; e virá humilde ou grande, sucessivamente, mas a ficar aqui, a gravitar aqui, a realizar aqui, na esfera de sua capacidade, na gradatividade do seu esforço e do seu mérito, a cooperação de mais altos desígnios morais, sociais, políticos, históricos, cada vez mais identificado com essa aura espiritual que afina, burila, estratifica a alma das nacionalidades, o espírito das raças, até que, finalizada a sua missão, essa alma se dispersa, ou se desloca, na consecução de novas conquistas planetárias, ou para novos planos siderais...

            Assim é que, um povo insignificante mas psiquicamente sintonizado - o hebreu, nos legou o Monoteísmo prático (1).

            (1) Sobre a destinação do povo hebreu em perfeita identidade com este nosso ponto de vista, decorridos que são 15 ans da fatura deste nosso trabalho, vale recomendar o que a respeito aduz Emmanuel em – A Caminho da Luz.

            Assim é que a Grécia unida nos deu o patrimônio da Ciência, da Filosofia, da Arte.

            Assim é que Roma nos deu, na unidade da sua força, o Direito e a Política.

            Assim é que a França elaborou a consciência da Liberdade humana.

            Assim é que a Inglaterra nos deu, e ainda mantém, um grande império colonial.

            Assim é que os Estados Unidos da América esboçam a construção - uma nova construção político-industrial, um progresso material tendente a suavizar as agruras da vida física planetária.

            E assim é que o Brasil - a terra de Santa Cruz, nos vaticina uma civilização original, uma pátria de comunhão espiritual, na qual todos os patrimônios e conquistas se confundem e se amolgam à improvisação de um Novo Estado, que assinale à Humanidade enferma o início de uma Nova-Era, de uma Égira-Nova.

            Sim! nós o cremos e pressentimos: daqui, ao influxo de Espíritos elevados, partirá o exemplo de que essa entressonhada e tão violentamente requestada Democracia só deixará de ser aspiração teórica, quando os homens assimilarem e praticarem, em espírito e verdade, os Evangelhos de N. S. Jesus Cristo.



segunda-feira, 25 de março de 2013

No Campo da Vida





No Campo da Vida
por    J. Alexandre
in Reformador (FEB) Dezembro 1969


            Você está desalentado pela crítica.

            Não interrompa, porém, a sua tarefa de ofertar migalhas aos famintos de pão e gotas de luz aos carentes de orientação e consolo.

            Excelente um dia sem fome e sem ignorância.

            Mas, até lá, enquanto alguns se restringem a traçar magníficos propósitos do Bem, outros a planear medidas saneadoras de extensão e profundidade, alguns a verberar por soluções definitivas - continuemos a servir, mesmo com pouco, a fim de garantir a própria sobrevivência dos menos felizes para que possamos juntos alcançar o panorama ideal.

            Se você não fizer o mínimo no campo da realidade, suportando as acusações dos que almejam o máximo na área da palavra sem ação, o mendigo de pão perecerá de fome e o ignorante se arrojará a tenebrosos abismos - e não terão olhos para o “mundo de justiça”, propagado em espalhafatosas paradas de ilusão.

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            Será caridade a assistência social?

            A indagação, respeitável e justa, sobre a atividade da benemerência, longe de ser articulada nos salões festivos, onde os convencionais trazem o corpo recoberto por generosos tecidos e o estômago abastado em seus reclamos imediatistas - deverá ser proferida dentro da choupana e da tapera, das favelas e dos casebres, junto a velhinhos trêmulos e criancinhas avitaminadas, mães de seio estéril incapazes de filtrar a seiva aos filhos, e pais enfermos temporariamente impedidos de esforços maiores.

            Vale mais o pão amanhecido que gravuras de pratos apetitosos.

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            A pobreza de opereta é mais amada.

            Na certa, no contato com o pobre de nosso mundo, carente de higiene e de letras, de roupa e de pão, poderemos lembrar as lições de amor ao próximo, quando idealizávamos os sofredores aromatizados em delicados perfumes ou revestidos de andrajos de cetins.

            Nosso mundo pode ser figurado como um palco, mas as suas personagens vivem um drama real...

            Abracemos a quem sofre, com piedade cristã.

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            Há várias maneiras de fugir da realidade.

            Uma das mais sutis, porém, é aquela em que a criatura se arvora a reformador do mundo, desconformando-se com todas as soluções em curso de realização, sem jamais se encorajar a arregaçar as mangas e partir para o campo de trabalho a favor dos que sofrem.

            A ginástica do verbo, bastas vezes, é um artificioso arco-íris com que se recobre a boca da furna em que nos refugiamos, egoisticamente, temerosos de confundir-nos, no vale da dor, com os que gemem e se agoniam.

            Preciso é a coragem de começar a ser útil.

            Dessa virtude o Espiritismo cristão se faz o apanágio, anunciando que, para chegar à caridade moral, redentora do homem, é urgente que iniciemos a benemerência que fará, ao socorrido, condições de aspirar a uma vida melhor.

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            No campo da assistência, vale lembrar a Espírita. 

            Após os primeiros ensaios de efetivo amparo social, cumpre-nos espiritizar nossos serviços, imprimindo-lhes as características regeneradoras da Religião dos Espíritos, ofertando orientação segura aos que sofrem.

            É fundamental, em Doutrina Espírita, o cuidado da alma.

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            Ponderável parcela dos que se alistam como Obreiros da Luz, foge de distribuir as bênçãos da orientação redentora, sob a alegação de que as vestes, a falta de cultura, o aparente desinteresse dos assistidos, diluem o ânimo de medidas saneadoras.

            Lembremos, porém, o pântano.

            Se, por inferir que a sua superfície jamais se tornará respeitável trato de terra, o trabalhador distanciar-se das medidas de drenagem, evidentemente não lhe caberá reclamar da falta de colheita, já que se negou ao plantio.

            Alegações são razoáveis - mas não constroem.

            Nem sempre o campo está preparado.

            Jesus, porém, não nos convocou para a colheita.

            Fomos chamados para aprestar o terreno e realizar a sementeira, com antecipado conhecimento do Ceifeiro Divino das dificuldades dos corações que receberiam o chamamento do Evangelho.

            Semeemos sempre, para que haja messe.