As Razões
do Movimento
Quando o Consolador foi derramado
sobre a humanidade, sintetizado pela breve palavra de Allan Kardec, ninguém no
mundo poderia suspeitar do que de magistral envolviam seus princípios.
Houve, na época,
ainda mesmo de parte de alguns dos que militavam no pioneirismo espiritista,
uma imperfeita noção da amplitude da Revelação.
Cada qual, sendo
uma individualidade autônoma, pintava com as cores em que vivia as tendências e
os postulados do Espiritismo. Alguns chegaram até mesmo a enxergar dogmatismo e
ortodoxia. Não é estranhável que tal se passasse: nem sempre o homem esteve vinculado
ao plano superior.
Allan Kardec, no
entanto, junto com a equipe que lhe secundava os esforços indizíveis, permanecia
sereno e seguro, o leme à mão, dominado, embora as ondas tentassem destroçar-lhe
a embarcação. Agia Kardec conforme o lúcido comandante, em cada porto revistando
a tripulação, colocando o óleo na maquinaria, examinando a bússola e levando em
consideração as necessidades de cada passageiro, como legítimas e respeitáveis.
O navio, contudo, precisava prosseguir intacto, em meio aos ventos que a
abominação da treva soprava pelos condutos da vaidade e do orgulho.
O comandante -
Kardec - permanecia no posto de máximo zelador da integridade da obra deposta
em suas mãos. Cada um, no entanto, conservava sua liberdade, liberdade essa a
que não eram permitidas quaisquer ingerências na sala de máquinas, na
utilização da bússola e nas decisões do comandante. Respeitava-se a liberdade
alheia, mas a liberdade alheia deveria sempre respeitar a inteireza do conjunto.
Assim agia
Kardec, consciente do papel que lhe cumpria desempenhar, ainda sob a tormenta
de pedras, que lhe fustigava a alma. Comandante, no entanto, não lhe cabia estabelecer
privilégios ou concessões. Todos contribuíram com seus pontos de vista, mas
Allan Kardec - com ordens que transcendiam os conceitos pessoais e mesquinhos -
continuava a fiscalizar o desenvolvimento do que lhe havia sido confiado.
Assim foi que
entregou ao mundo o arcabouço firmado da Doutrina Espírita, junto a toda a
equipe, onde trabalhavam Roustaing, Léon Denis, Gabriel Delanne e Camille Flammarion,
os imediatos pressurosos, prontos a atender ao superior, a qualquer momento.
No entanto,
passado o tempo terreno, o homem se encontra mergulhado num mar de confusões intensas. O navio, na Terra, não mais tem Kardec ao
leme. Foi, porém, criada a instituição que leva o navio à frente, ainda que em
mares revoltos.
Eis a edificação
de lsmael, incólume, com a qual todo o movimento, repetimos, tem ligação, ainda
a mais distante e imperceptível. A Casa de lsmael, sempre nos mares da Terra, tem
o seu comandante, com seus imediatos, com seus colaboradores diretos e
indiretos, com seus auxiliares, com sua maquinaria, sua
bússola e seu leme. Neste, no timão de seu proceder, está - no
plano do espírito - Ismael, por delegação do Comandante Supremo; e, na Terra,
na parte mais grosseira da manifestação divina do Universo, toda a equipe que
detém, em confiança, as diretivas do movimento.
O navio, todo
ele, é o movimento espírita.
As vontades e os
desejos - a liberdade - todos merecem o respeito máximo, sendo honoráveis ao
extremo. No entanto, a voz que fala mais alto não deve e não pode, decerto, permitir
ingerências quaisquer na rota traçada pelo Senhor.
Atualmente, ainda
Kardec dirige a parte ampla que lhe toca na caminhada dos discípulos da
Doutrina que codificou, da qual é, ele mesmo, um discípulo, porque o
Espiritismo é doutrina do Cristo.
Cada um,
portanto, investigando sinceramente a própria consciência, presta favor imenso
a todo o movimento, porque, se todos estiverem compenetrados do dever a cumprir,
o navio - que já ancorou em centenas de portos, no qual já embarcaram milhares
de novos integrantes - singrará, em meio a cânticos de louvor, os mares agitados
que por certo virão. Mas, se bem poucos apenas desejarem contribuir para a paz
que precisa ser instalada, os mares se encapelarão mais e os homens criarão
vagalhões destruidores que, embora jamais logrem levar o barco ao naufrágio, exigirão mais
dores e sacrifícios do timoneiro e de toda a equipe, porque, para produzir ao
máximo, nada como a paz criada na bigorna íntima, onde vivem flores, onde cantam
as vozes dos anjos, auxiliando a vencer os obstáculos criados pela vaidade
extrema, que grita, que mata como a letra, cegando os indivíduos, suas vítimas
impenitentes, e impedindo-os de perceber o que é o Espírito.
Sayão
por
Gilberto Campista Guarino
página
recebida na FEB, em reunião pública em 07 de Junho de 1974
in
“Reformador” (FEB)
Julho 1974.
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