02-02
A Reencarnação
OBJEÇÕES E REFUTAÇÃO
***
Quer
agora o colega saber, em espírito e verdade, segundo o ensina o Espiritismo,
qual o alcance, a significação e o benefício da missão do Redentor? Ele,
personificação viva da lei divina que trouxe aos homens, e que pôs em prática
em todos os seus atos, veio ensinar-lhes o caminho da salvação, oferecendo-lhes
o modelo supremo em que se devem inspirar, até atingirem a perfeição.
Dando-lhes os seus ensinos, de amor,
de humildade, de submissão, de indulgência, de fraternidade, e exemplificando,
uma por uma, todas essas excelsas virtudes, traçou o roteiro luminoso pelo qual
há de seguir todo o rebanho, sejam embora indispensáveis, para alcançar aquele
ideal supremo, - e o são forçosamente para todos – as sucessivas reencarnações,
cuja necessidade abertamente proclamou a Nicodemos. Tão certo é que desse, e
não por outro modo, se há de cumprir a sua promessa feita ao Pai: “das ovelhas
que confiastes nenhuma se perderá”.
E essas ovelhas não são
exclusivamente, como o pretenderia a estreiteza de vistas dogmática, nem as que
se acham presas no redil do Vaticano, nem as que são apascentadas pelo cajado
de novos pastores, umas e outras declarando-se implacável guerra, e assim
mostrando quanto se acham divorciadas do espírito do Cristo. São todas essas e
mais as que com eles formam a totalidade do rebanho humano, disseminado no
planeta, quaisquer que sejam atualmente as insígnias exteriores do seu culto.
Porque, assim como Deus não exclui do seu amor a nenhum filho, por mais
aviltado que esteja, e sempre lhe oferece os meios de reparação de suas faltas,
cedo ou tarde, assim também o Cristo não deixará perder-se um só dos que lhe
foram confiados.
E se alguma vez os ditames da
sabedoria e da justiça impuserem uma
seleção, segundo os méritos e o endurecimento de cada um, essa separação será
apenas temporária.
É o que ressalta da seguinte
passagem do Evangelho, na qual mais uma vez se evidencia a imprescindibilidade
das obras, como condição sine qua non
da salvação.
O Divino Mestre figura a época em
que, segundo o Espiritismo, o planeta terá subido hierarquicamente da condição
de mundo expiatório, que é, a de mundo de felicidade e gozo, pelo duplo
progresso efetuado, quer em sua constituição física, quer na situação moral dos
seus habitantes, quando então o Cristo baixará a assumir a sua direção visível,
conservando consigo os espíritos purificados, e relegando os endurecidos para
as trevas exteriores de um mundo inferior, onde se irão depurar e preparar para
uma futura ascensão, em tempo próprio.
“Quando vier o Filho do Homem na sua majestade, e todos
os anjos com ele, então se assentará sobre o trono de sua majestade. E serão
todas as gentes congregadas diante dele e separará uns dos outros, como o
pastor aparta dos cabritos as ovelhas. E assim porá as ovelhas á direita e os
cabritos à esquerda.
Então, dirá o Rei que hão de estar á
sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possui o reino que vos está preparado
desde o princípio do mundo:
Porque tive fome, e destes-me de
comer; tive sede e destes-me de beber; era hóspede e recolheste-me; estava nu e
cobriste-me; estava enfermo, e visitaste-me; estava no cárcere e viestes ver-me.
Então lhe responderão os justos,
dizendo; Senhor, quando é que nós te vimos faminto e te demos de comer; ou
sequioso, e te demos de beber? E quando te vimos hóspede e te recolhemos, ou nu
e te vestimos? Ou quando te vimos enfermo ou no cárcere e te fomos ver?
E, respondendo o Rei, lhes dirá: Na
verdade vos digo que quantas vezes vós fizestes isto a um destes meus irmãos
mais pequeninos, a mim é que o fizestes. (Mateus, cap XXV v. v. 31 a 40)
Nesta enérgica e imponente alegoria do Julgamento, cuja
segunda parte apenas deixamos de reproduzir por desnecessária aqui, Jesus
estabeleceu de um modo claro e inconfundível o critério que presidirá a escolha
dos que forem dignos de ‘possuir a terra’, então regenerada, confirmando-se a
sua promessa feita aos mansos, no sermão da montanha. Não se lhe perguntará se
foram católicos ou protestantes, judeus, muçulmanos ou budistas ou se
professaram mesmo alguma seita particular, nem se acreditaram na virtude
mirífica de tal ou tal dogma. A escolha será feita daqueles que praticaram o
amor ao próximo, em sua mais ampla acepção, prestando-lhe carinhosa assistência
na fome, na sede, na nudez, na enfermidade, no encarceramento, em uma palavra, exercendo
a caridade moral e materialmente para com todos os aflitos e necessitados.
É, pois, a plena consagração da doutrina,
soberanamente justa, da salvação pelas obras que não pelo mérito do sacrifício
de outrem.
É, para dar uma ideia da sua solidariedade
com todos os desgraçados, sobre os quais Indistintamente se estende a sua
piedade, o Divino Mestre torna meridianamente claro o seu
pensamento:
“quantas vezes vós fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim
é que o fizestes.”
Se, pois, para o julgamento e a
salvação hão de prevalecer as obras, e esta doutrina está errada, porque anula
os méritos da paixão, morte e sacrifício de Jesus, quem erra não fomos nós, mas
o próprio Cristo.
Em vista do que, pode o nosso colega
do ‘Puritano’ persistir na sua teoria
da salvação exclusiva pela graça, com todas as responsabilidades que lhe dá o
seu papel de pastor de almas, de cuja sorte é seu dever curar.
Quanto a nós, entre a altiva ortodoxia
protestante e o meigo Rabi da Galileia, preferimos, modestamente, mas sem
hesitação, permanecer com este último.
E aqui damos por findo este debate.
in ‘Reformador’ (FEB)
Editorial em 15 de Novembro
de 1905
administrador
Pedro Richard
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