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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Santo Agostinho e a Cremação


Santo Agostinho e a Cremação

por Osório Borba   Reformador (FEB) Setembro 1952

             O título está entre aspas porque não é meu. É o de um trabalho com que o ministro Ivan Lins me dá hoje a honra de preencher o espaço destes artigos. Enviou-me o ilustre ensaísta seu comentário, inédito, creio que por não ter conseguido publicá-lo em outra parte.

             É o seguinte:

             “Diversos filiados ao catolicismo vem se insurgindo contra os fornos crematórios previstos numa lei que acaba de ser votada pela Câmara Legislativa do Distrito Federal. Tratando-se de recurso meramente facultativo, a ser utilizado apenas por aqueles que prefiram esse modo de proceder com os seus próprios cadáveres, não se compreende o motivo da oposição dos católicos, porquanto a inumação continuará à disposição dos adeptos de sua crença. O que não se admite é que, num regime como o nosso, de plena separação entre a Igreja e o Estado, queiram os católicos impor, aos que o não são, o seu modo de tratar os seus próprios defuntos.

            O motivo da oposição provém - dizem - do Evangelho de São Mateus, onde se descreve minuciosamente a ressurreição dos corpos no vale de Josafá, por ocasião do Juízo Final. Mas, a ser verdadeiro e sincero esse motivo, somente põe a descoberto o ceticismo dos próprios católicos quanto a esse dogma de sua religião.

            E, de fato, se a onipotência divina é capaz de fazer com que sejam reincorporadas as partículas cadavéricas devoradas pelos vermes, peixes e animais ferozes, como não há de poder recompô-las das cinzas resultantes da cremação? E, qual será, então, a situação daqueles que involuntariamente, em consequência de incêndios e acidentes, forem carbonizados? Ou daqueles sepultados em terrenos que dissolvem até os ossos? Ou ainda, daqueles que a própria Igreja queimou nas fogueiras da Inquisição, como, entre outros, Joana D'Arc?

            Refutando, na Cidade de Deus, os pagãos de seu tempo, trata Santo Agostinho longamente da matéria e ventila semelhantes hipóteses. Se, Da, nas Sagrada Escrituras, o Eterno afirma que todos os nossos cabelos são contados e que nem um só desaparecerá – Capilli capitis vestri numerati sunt ommes; Capillus capitis vestri non peribit, como admitir que a dissolução dos cadáveres, qualquer que seja o seu processo, possa impedir à onipotência divina recompô-los em sua inteireza primitiva, ela que tudo tirou do nada?

            Os católicos de hoje devem ler, urgentemente, para rebustecerem a sua fé, o livro vinte e dois da “Cidade de Deus” e também o capítulo das “Confissões” de Santo Agostinho, onde este narra a morte de Santa Mônica. A princípio desejava ela ser sepultada na África ao lado de Patrício, seu esposo. Mas, ao falecer em Ostia, na Itália, de tal modo se aperfeiçoara na fé que nenhuma importância deu mais ao seu cadáver, porquanto - dizia. - qualquer que fosse o seu destino, o Eterno o ressuscitaria no Dia do Juízo.

            Sirva a lição aos nossos católicos de hoje e não procurem oprimir as convicções alheias manifestando a pouca solidez das suas próprias.”lvan Lins  

            (Ext. do “Diário de Notícias” 31-07-1952)

Do Blog: Hoje, mais do que outras correntes religiosas, são os católicos que mais buscam a cremação de seus mortos. Nada como o tempo para observarmos as mudanças de opinião...


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