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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

A maior tarefa

 


A maior tarefa

A Redação           Reformador (FEB) 1° Fevereiro 1930

             As melhores doutrinas em si, podem desvirtuar-se na aplicação e na prática, pelo conceito e erronia (equívoco) dos homens.

            O Espiritismo não poderá escapar à regra. Transcendentalíssimo em suas fontes, altamente benéfico em suas finalidades, ele se processa, contudo, na esfera mental dos seus adeptos, no círculo das possibilidades de cada qual, a produzir, assim, frutos heterogêneos e mesmo heteróclitos ou díspares, que só não se justificariam diante de um psiquismo uniforme e sintonizado pelos mais altos ideais humanos, sejam os de que se fez paradigma o Cristo de Deus, seu nato e fundamental patrono.

            Não há, portanto, como pretender sobrestar (descontinuar) nesse movimento aparentemente desarmonioso em aglutinados superficiais e convencionais, que o tempo não chega, as mais das vezes a consagrar, porque se resolvem em semi nulos de separatismo e discórdia entre os seus melhores propugnadores e expoentes, sem embargo dos melhores planos, propósitos e intenções.

            Esse malogro, essa flutuação inconsequente de energias, essa versatilidade e policromia de orientações serão, para observadores leigos e bisonhos, motivo de escândalo e desânimo, mas, para nós outros representam, apenas, aquele preliminar esboço da obra que se pudera comparar a da construção de um edifício a carrejar (carrear) e - dispor, em amontoado caótico, toda a espécie de materiais.

            Até que lhe sejam postos os alicerces, até que se lhe aprumem e ajustem paredes e traves, até que se lhe colme a crista (completar a cobertura) e tudo no traço perfeito da liga que o estruture e fixe em articulações mestras; e, finalmente, em remates ornamentais, ninguém lhe vislumbrará o efeito, a utilidade, a projeção, a estética.

            Todos somos, por mercê de Deus, operários do novo, majestoso edifício destinado às gerações futuras.

            Operários rudes, a carretearmos (transportar em carreta) o material bruto que lhe deve sustentar a arcabouço grande, enorme, imensurável como o ideal da humanidade para os preditos evos (eternidade).

            Pretendermos, só por nós superintender a tarefa ingente, sequer julgar-nos seus melhores quiçá únicos obreiros, fora insânia maior por colidir com a essência de todo o ensino, que prescreve, de modo iniludível, ser a obra de jesus e dela superintendentes e imediatos executores, os seus mensageiros.

            A estes, portanto, a prerrogativa das diretrizes superiores, como quem conhece o plano geral arquitetônico e o tempo necessário à consolidação de cada elemento utilizado.

            Não vai com isto dizer que possamos e devamos apassivar-nos (ficar passivos) de modo absoluto, abstraindo iniciativas uteis e dignas do nosso ambiente social: vai, porém, a explícita necessidade de nos precavermos para não imolar nesse escopo, sacrificando nas aras do cenáculo mundano em frutos de mera temporalidade transitória, o objetivo máximo do qual devem resultar todos os benefícios eternos, porque de projeção e realização no plano espiritual.

             Referimo-nos, é claro, ao saneamento moral que deve começar pelo sacrifício de nós mesmos, na imolação de todas as paixões inferiores.

            Em vez do prurido, das preocupações de parecer e aparecer fortes e unidos por combater os nossos detratores em obras de cunho material, o desejo imane de nos purificarmos intimamente aos nossos próprios olhos, à face de Deus.

            Esse trabalho profundo de mineiro precavido no âmago absconso (escondido) de caliginosas (sombrias) galerias, é o que nos há de fortalecer e levantar, diante do mundo cético e assombrado das próprias iniquidades.

            Unidos pela Fé, mas por essa Fé que identifica as almas porque fala antes ao sentimento que ao intelecto, aproximados, naturalmente, pela vibração e afinidade de nossas auras, no desejo insopitável (incontrolável) de imitar e servir ao Senhor, as nossas obras abrolharão também naturalmente e sem esforço, com a maleabilidade cantante e transparente dos veios fecundantes por, entre sebes (cercas) e pedrouços (montão de pedras).

            Sem essa obra preliminar, precípua (fundamental), por isso mesmo dificílima, todo o nosso afã resulta anódino (inócuo), incongruente e até contraproducente pelas críticas que suscita, pelo partidarismo que estimula, pelo personalismo que lisonjeia e desperta, a título mesmo de propaganda.

            De resto, é preciso redize-lo ainda e sempre, a propaganda espírita é apanágio (atributo) dos Espíritos, não dos homens, simples veículos na contingência, isso sim, de se tornarem bons veículos.

            Mas, para tanto, o que importa não é engrandecer o cenáculo terreno de monumentos materiais, fundações e asilos de dinamizada e precária beneficência moral e material.

            De monumentos tais, encontra-se referto o mundo, sem ter melhorado nunca, antes agravando sempre o seu pauperismo moral e material.

            Todas as seitas religiosas, maiormente a católica, todos os governos, todas as corporações leigas de caráter humanitário tem fundado asilos, creches, colégios e hospitais.

            E o que se verifica é o aumento de miséria por toda parte, a traduzir-se em tirania moral e indigência material - aumento de criminalidade, suicídios, roubos, adultérios, revoltas e desesperos - miséria, enfim, nos indivíduos, nas famílias, nas sociedades.

            Dir-se-ia que não pende do progresso material, do surto cientifico, da cultura intelectual a felicidade humana; mas, ao contrário, decresce esta na razão inversa da intensificação daquele.

            E daí a conclusão lógica, formal, absoluta de que a Doutrina Espírita como fórmula prática do Consolador Prometido apenas visa a reforma substancial das criaturas, ainda porque, realizada esta, tudo mais virá espontânea, incoercivelmente (irrepremivelmente), como fruto a tempo sazonado.

            Espiritualizar almas, afeiçoa-las à compreensão de si mesmas ao serviço da humanidade, eis o alvo maior, por não dizer único do Espiritismo.

            Construir na Terra o mais suntuoso monumento, será sempre entrega-lo às injúrias do Tempo, para os que na terra, em corpo, permanecem: - edificar nos corações é também construir na Terra, porém mais que para a Terra, porque é também realizar no plano espiritual, eterno e indestrutível para todas as gerações.

            O mundo passaria - disse Jesus, mas as suas palavras não passariam, por serem espírito e vida.

            Vivamos pois, e sempre, a palavra eterna, façamos de preferência, obra de espíritos para espíritos.


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