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domingo, 27 de janeiro de 2013

75. 'Doutrina e Prática do Espiritismo'






75

            Abandonando Marte, rumo das zonas progressivamente mais afastadas do nosso astro central, e antes de alcançar a órbita de Júpiter, encontramos um vastíssimo espaço que por muito tempo se acreditou deserto. Desde 1801 começaram, porém, a ser descobertos minúsculos planetas, cujo numero, à medida que se multiplicavam as observações, foi gradualmente crescendo, até exceder em muito a quatrocentos.

            Quatrocentos e muitos asteroides dotados de movimentos próprios, circulando em torno do Sol como os demais planetas e apresentando uma variedade considerável de diâmetros, que decrescem de 400 a 30 km e provavelmente menos, encarregam-se assim de demonstrar que ali, onde o homem supunha existir a vazia imobilidade, palpita a vida como por toda parte, até aos inexistentes confins do universo. Que formas dessa vida ilimitada e inextinguível se ostentarão naqueles liliputianos viajores do céu? Serão habitados por seres, naturalmente microscópicos, adaptados às condições de sua, relativamente, minúscula superfície?

            A razão nada tem que opor a essa probabilidade irrefragável. Mas também a prudência nos aconselha, dada a escassez de dados positivos, colhidos pela observação, acerca desses longínquos asteroides, a não insistir demasiado a seu respeito, tanto mais que, alguns milhões de léguas adiante, vamos encontrar "o gigante dos mundos," que muito mais vasto campo e superiores motivos oferece à nossa consideração.

            Júpiter circula a uma distância média do Sol de 192 milhões de léguas (mais de cinco vezes a que nos separa do astro-rei) e faz o seu percurso em 11 anos e 10 meses e 27 dias dos nossos. Pesa 309 vezes mais que a Terra e o seu volume é 1.279 vezes maior, correspondendo a sua superfície à de 144 Terras. Tem 4 satélites. Dada a distância a que gira do Sol, o disco deste fica reduzido a menos da quinta parte do diâmetro que nos apresenta e a menos da 25ª parte da superfície. A luz e o calor que dele recebe, em media, são 27 vezes menos intensos que o que recebemos.

            Essa considerável diferença de intensidade luminosa e calorifica deve ter produzido o efeito de organizar a vida em condições muito diferentes das que presidiram à organização da vida terrestre.

            Como a inclinação do seu eixo é insignificante, de sorte que o giro se efetua quase verticalmente, resulta não haver em Júpiter variedade de estações nem de climas: os dias têm a mesma duração todo o ano; o sol descreve o seu aparente movimento diurno quase no plano do equador; não há zonas tropicais nem círculos pobres; é um equinócio perpétuo, uma primavera constante para todas as regiões do globo, pois que a temperatura decresce harmoniosamente do equador aos polos.

            Mas, ao mesmo tempo que percorre muito lentamente a sua órbita em torno do Sol, gira com extrema rapidez sobre si mesmo, a tal ponto que a sua rotação se efetua em menos de 10 horas, tendo assim o dia cerca de 5 horas, e a noite cerca de outras cinco . Como o seu ano é igual a quase doze dos nossos, a rapidez dos dias faz que em Júpiter o ano se componha de 10.455 dias.

            “Essa rápida sucessão de luz e trevas - diz Flammarion - deve exercer uma grande influencia no modo de viver dos seus habitantes."

            Mas já estará efetivamente habitado, ou apenas percorrendo fases preparatórias desse desideratum culminante?

            Se a razão nos diz que não pode deixar de ser excelente habitação um planeta como esse, em que tão favoráveis condições se acham reunidas, como extensão gigantesca, suavidade de luz, igualdade de estações e climas, apropriadas a seres cuja delicadeza de sentidos não carece, para se desenvolver e exercitar, de contrastes violentos, as observações astronômicas já efetuadas, apesar da considerável distância a que estamos dessa esfera colossal, sugerem dúvidas, entretanto, senão quanto a sua futura habitabilidade, pelo menos quanto á atualidade desse fato.

            Aquelas observações têm, com efeito, revelado a presença de faixas mais ou menos largas, mais ou menos intensas e de diverso colorido, não fixas na superfície, que se não vê, como se vem, por exemplo, em Marte, os continentes e os mares, mas na sua atmosfera, de que, como as nuvens, parece fazerem parte, as quais passam por constantes e rápidas modificações. É verdade - observa C. Flammarion – “que essas perturbações atmosféricas podem se efetuar no imenso envoltório aéreo de Júpiter, sem que a superfície do planeta se encontre num estado de correspondente instabilidade." Mas certas manchas como, entre outras, uma de forma oval muito alongada e de cor avermelhada escura, observada desde 1877 e que, com variações de matiz, se conservou até 1889, apresentando uma extensão de 40.000 km (três vezes mais que o diâmetro do nosso mundo), parece indicarem um continente que se está formando e que emite vapores flutuantes acima dele.

            Julgava-se, até há poucos anos, que a temperatura da superfície de Júpiter fosse inferior à da nossa atmosfera, em consequência de estar esse planeta muito mais afastado do Sol. Mas a existência do vapor de água que satura a sua atmosfera e os formidáveis movimentos que daqui vemos lá se efetuarem e que a ação calorífica do Sol, enfraquecida como é, não bastaria para determinar, induzem a crer, pelo contrário, que Júpiter tem mais calor que a Terra; deve ter à superfície muito mais calor que o que o Sol lhe pode dar. Talvez tenha vulcões e nascentes de vapor; será talvez a sede de revoluções capazes de produzirem  os fenômenos que em sua atmosfera se observam; talvez que a eletricidade intervenha nessas variações e também que aquela atmosfera se incendeie em inúmeras auroras boreais."

            Tudo indica que, enquanto Mercúrio, Vênus e Marte se parecem mais ou menos com o nosso mundo, o mesmo não sucede com Júpiter. Lá, os materiais constitutivos, o estado molecular físico e químico, as forças locais, a eletricidade e o calor estão em condições muito diferentes das que apresentam nos outros quatro mundos.

            Deste modo - acentua o mencionado autor - o regime metereológico de Júpiter, tal como da Terra o observamos, induz à conclusão de que a atmosfera desse planeta passa por variações mais consideráveis que as que, por si só, produz a ação do Sol; que essa atmosfera é muito densa; que a sua pressão é enorme e que a superfície do globo parece não te chegado ao estado de fixidez e estabilidade a que já chegou a Terra. É provável que, apesar de formado antes desta, tenha conservado muito tempo depois o calor originário, em virtude do seu volume e da sua massa."

            Daí as seguintes interrogações: será esse calor bastante elevado para impedir qualquer manifestação vital, e estará esse globo atualmente no estado de sol escuro e ardente, inteiramente liquido ou apenas coberto por uma crosta condensada, como esteve a Terra antes que começasse o aparecimento da vida em sua face? Ou terá a temperatura do nosso período geológico quando a vida começava a se manifestar, com formas estranhas, em seres vegetais e animais de extrema vitalidade, no meio das convulsões e das tempestades de um mundo então nascente?

            Nada se pode, por enquanto, saber de positivo. Flammarion contudo inclina-se pela última hipótese, "como a mais racional que se pode inferir das observações," mas tem o cuidado de prudentemente advertir: "como, todavia, não conhecemos todos os recursos que a potencia virtual da natureza encobre, a lógica nos obriga a admitir que esse mundo tão diferente do nosso poderia muito bem, apesar da nossa ignorância, ser atualmente habitado por organismos extraterrestres."

            De todo modo, a habitabilidade de Júpiter nos aparece como um fato incontestável: atual para seres organizados de modo apropriado às suas, aparentemente ao menos, instáveis condições, que estamos, entretanto, longe de conhecer com exatidão; subsequente a essa fase preparatória em que nos parece estar, se é isso o que acontece, e em tal caso, estabelecido o equilíbrio nos seus magníficos elementos, será a ditosa morada de espíritos aptos a utilizá-los e dignos de fruir os seus esplendores.

            Saturno move-se a uma distância media do Sol de 353 milhões de léguas e faz a sua revolução em torno desse astro em 29 e meio anos dos nossos: mas, como a rotação em torno de si mesmo se efetua em 10 horas e 14 minutos, o seu calendário é de 25.000 dias.

            A sua superfície é igual à de 80 Terras reunidas e o seu diâmetro equatorial mede 30.000 léguas. Tem um volume 719 vezes maior que o da Terra e corresponde a três quintas partes do gigantesco Júpiter, que é o maior de todos os planetas do sistema.

            Um a das mais notáveis curiosidades de Saturno são os anéis que o circundam, formados de substancia cósmica ainda não definida, e que têm um diâmetro de 71.000 léguas, medindo 11.800 léguas de largura e 60 a 70 quilômetros de espessura. Por fora desses anéis giram 8 satélites de tamanhos diferentes.

            Como a inclinação de Saturno sobre a eclíptica difere pouco da inclinação da Terra, é fácil concluir que as suas estações, posto que cada uma delas dure 7 anos, apresentam entre si - particularmente o inverno e o verão - um contraste semelhante ao que entre nós se observa. Os climas lá correspondem às zonas tórridas, temperadas e glaciais. Cada um dos polos e cada um dos lados do anel permanece quatorze anos e oito meses sem sol!  Quanto à luz e calor, como esse mundo está quase 10 vezes mais afastado do Sol que nós e o vê com um diâmetro 10 vezes menor e com uma superfície 90 vezes mais reduzida, dai resulta que recebe 90 vezes menos luz e calor que a Terra.  As suas condições de existência devem, portanto, diferir consideravelmente das nossas.

            A observação direta, de concerto com a análise espectral, revela a presença de uma atmosfera análoga à de Júpiter, tão densa e carregada de nuvens que, como nesse planeta, nunca se vê a superfície do solo, exceto nas proximidades das regiões polares, de ordinário mais brancas que as zonas temperadas e tropicais e que são provavelmente cobertas de gelo.

            A intensidade da gravitação na superfície de Saturno excede cerca de 1/10 à da Terra: mas a densidade das substâncias é 7 vezes menor, e como, pela forma esferoidal do planeta, essa densidade cresce da superfície para o centro, segue-se que as substâncias exteriores são de uma leveza inconcebível. Se, ao demais, essa atmosfera é tão profunda como parece, deve ser, na base, de uma forte densidade e de uma enorme pressão, mais pesada assim que os objetos da superfície. Conclusão: seres e coisas deveriam, ou devem, flutuar em vez de aderir á superfície, como entre nós sucede. Seres aéreos e objetos voláteis!

            As observações telescópicas, por outro lado, induzem a crer que há em Saturno uma quantidade de calor maior que a que resultaria, por sua distancia, do Sol, visto de lá, como ficou dito, 90 vezes menor em superfície e emitindo assim 90 vezes menos luz e calor que o que recebemos. Em tal caso, a água só poderia lá existir no estado sólido, ou de gelo, e o vapor d'água não se poderia produzir, formando nuvens semelhantes ás nossas. Ora, como se observam na sua atmosfera variações meteóricas análogas às de Júpiter, posto que menos intensas, é evidente que o mundo de Saturno tem uma temperatura pelo menos tão elevada como a terrestre, senão mais.

            A particularidade mais singular do calendário de Saturno é não somente a apontada circunstância de ter 25 mil dias o ano, mas serem de oito diferentes durações os seus meses, que variam de 22 horas até 79 dias, isto é, desde dois até 167 dias de Saturno . É como se aqui tivéssemos, do mesmo modo que os saturninos, 8 luas que girassem em 8 períodos diferentes.

            "Os habitantes de um mundo como esse - é ainda Flammarion quem o assinala - devem consideravelmente diferir de nós sob todos os pontos de vista. A leveza especifica das substâncias e a densidade da atmosfera de Saturno terão encaminhado a organização da vida numa direção extraterrestre e as manifestações da vida ter-se-ão produzido e desenvolvido lá sob formas inimagináveis.

            "Como lugar de habitação deve ser maravilhoso e não podemos duvidar de que a Natureza tenha sabido tirar o melhor partido de todas essas condições, como o fez aqui das medíocres condições terrestres. "

            Não passemos adiante, sem, contudo, fazer uma observação, humilhante que seja embora para a soberba e presunção humanas. Vista de Saturno, como também de Júpiter, a Terra é apenas um pontinho luminoso. É, todavia, o último planeta de onde pode ainda ser avistada. Invisível assim para o resto do universo, é como se de fato não existisse. Quanto mais as mesquinhas grandezas, as ambições, as gloríolas, de que tanto se ufana o minúsculo verme que é o homem!

            Urano dista do Sol 710 milhões de léguas e percorre a sua órbita em 84 anos dos nossos. Mas em virtude da rapidez da rotação, efetuada em 11 horas, o seu calendário é de 60.000 dias. Abrange 23.400 léguas o seu diâmetro, e o seu volume é 69 vezes maior que o da Terra, sendo muito maior que Mercúrio, Vênus, Terra e Marte reunidos. A sua massa excede 13 e meia vezes a da Terra e a sua matéria é muito leve, correspondendo à 5ª parte da nossa a sua densidade. Tem 4 satélites.

            A atmosfera de Urano, revelada na análise espectral, difere da nossa por sua faculdade de absorção; assemelha-se mais às de Júpiter a Saturno e contém gases que em nosso planeta não existem.

            Na distância a que está de Urano, o Sol apresenta um diâmetro 19 vezes menor que a nós e uma superfície 368 vezes menos extensa, o que equivale a dizer que esse mundo, comparativamente com o nosso, recebe 368 vezes menos luz e calor.  “A julgar pelas nossas impressões terrestres, deve ser um deserto de gelo, ao pé do qual as solidões polares e as neves e tempestades do Monte Branco seriam um Senegal ou um Saara."

            Temerário seria, contudo, concluir dai que seja inabitado ou inabitável. Devemos antes supor que, em suas infinitas possibilidades, ter-se-á organizado nesse mundo a natureza em condições tão propicias à existência dos seres na atmosfera frígida e eternamente crepuscular que o caracteriza, como o serão decerto as de Mercúrio, por exemplo, aos seus habitantes.

            Netuno, o último e mais longínquo planeta do sistema, gira a uma distância media de 1 bilhão e 112 milhões de léguas do Sol, em torno do qual efetua a sua revolução em quase 165 anos dos nossos, acompanhado apenas de um satélite (pelo menos ainda não foram descobertos outros) .

            O seu diâmetro é quase quatro vezes maior que o da Terra e o seu volume 55 vezes maior. A sua densidade corresponde a um terço apenas, mas a gravidade à sua superfície é quase igual. A rotação que sobre si mesmo efetua ainda não pode ser calculada, mas presume-se que seja muito rápida, como a de Júpiter, Saturno e Urano, devendo em tal caso ser extremamente curtos os seus dias.

            A análise espectral, apesar de ser muito fraca a luz que apreciamos em Netuno, chegou contudo a revelar a existência de uma atmosfera absorvente em que se encontram gases que não existem na Terra e que apresentam semelhança de composição química com a atmosfera de Urano.

            O Sol apresenta já um diâmetro reduzido 30 vezes; a superfície visível é, portanto, 900 vezes menor e assim o calor e a luz que fornece correspondem a 900 vezes menos  que os que nos fornece a nós .

            "Que valor - interroga Flammarion - tem uma luz e e um calor desses? Não há dúvida que não é o Sol simplesmente uma estrela para os netuninos, pois que ainda brilha mais que 40 milhões de estrelas de primeira grandeza. Mas deixar a Terra e ir para Netuno, seria como deixar a luz e o calor para penetrar nas trevas e no gelo."

            Não se deve, entretanto, só por isso concluir que esse mundo esteja, temporária ou definitivamente, privado de vida e de habitantes. Pode acaso conceber-se que haja no universo uma região inteiramente morta, quando vemos por toda parte esse fenômeno, a vida, palpitar em torno de nós, na terra, na água e no ar? E que estranhos e inusitados ritmos não apresentará fora dos restritos limites em que a apreciamos e nos é familiar!

            Nas profundezas do oceano, em que erradamente se supunha que só reinava a treva, e o silêncio, pacientes observações tem demonstrado que os seres, que as povoam, não somente fabricam uma luz fosforescente que os ilumina, como tem entre si meios de correspondência, o que quer dizer que emitem sons, imperceptíveis embora para nós, a não ser com o auxílio de delicadíssimos instrumentos. Porque não poderiam os espíritos em Netuno, se, como é presumível, são superiores, ter luz própria, luz astral, que ilumine a sua habitação?
           
            Seja-nos lícito, pois, concluir com Flammarion:

            "Do estudo e observação do universo físico uma verdade resulta e se impõe: é a presença de uma mesma força, de um mesmo movimento e de uma mesma lei que rege a harmonia de todos esses mundos." E, pois que são constituídos por uma substância originariamente idêntica - a matéria cósmica primitiva - a ideia da unidade de substância se impõe como a da unidade de força. A variedade das condições se sucessiva organização determinou uma variedade correspondente nos produtos definitivos. 

            "A unidade de origem - termina ele - não oferece dúvida e temos, de há muito, razões para acreditar que o hidrogênio é o corpo que mais se aproxima da substância primitiva, essencialmente simples . A análise espectral confirma hoje este modo de ver. As diferenças da nossa grande família solar não são, portanto, essenciais, são principalmente diferenças de graus, o que é ainda confirmado pela análise espectral. As estrelas, sois do espaço, são irmãs do nosso Sol. Unidade de origem, unidade de força, unidade de substância, unidade de luz, unidade de vida no universo imenso, através da variedade infinita dos aspectos e das gerações.




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