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quinta-feira, 27 de julho de 2017

O Espírito de Seita


Do Blog: Apesar de seus quase 75 anos de existência 
e colocado aqui fora do período do Natal 
permanece verdadeiro
e conforme até nossos dias.

A Paz e o espírito de seita
Reformador (FEB) Janeiro 1943

Como de praxe e como também o fizeram outros soberanos e chefes de Estado, à recente passagem do Natal, o Sumo Pontífice falou ao mundo, em geral, e ao mundo católico em particular, à comunidade religiosa que o tem por chefe supremo, tratando da paz que há de suceder ao tremendamente mortífero conflito em que na atualidade se empenham quase todas as nações da terra, exprimindo os anseios de sua alma de crente por que ela não tarde e apontando bases sobre que repouse, para não ser efêmera, para não se limitar apenas a uma acalmia durante a qual nova guerra se prepare, mais devastadora, de resultados mais terríficos.

Escrita com inegável elevação de vistas, com o senso da responsabilidade que lhe pesa sobre os ombros de chefe de uma das grandes correntes religiosas, com manifesta expansão da amargura que lhe vai no íntimo, ante os sofrimentos horríveis de que se acha presa a humanidade inteira, amargura idêntica a de quantos não têm vazios do sentimento de solidariedade humana os corações, a mensagem pontifícia do Natal é um documento expressivo, cuja leitura deixa grata impressão. Claro, pois, que não é com ânimo de crítica, ou com intuito de assinalar quaisquer possíveis discordâncias, que ali porventura se possam notar, entre uma que outra proposição e os postulados evangélicos em espírito e verdade, que traçamos estas linhas. Ao contrário, se tomamos a liberdade de algo dizer aqui acerca da mensagem a que temos aludido, é tão somente para ressaltar uma das assertivas que ela encerra e para extrair dessa assertiva as deduções lógicas e irrecusáveis que ao nosso ver contém, evidenciando estar nas mãos daquele que a redigiu constituir-se, em larga medida, fator de uma paz real, que não apenas aparente, de uma paz qual a que o mundo efetivamente quer, de uma paz que signifique o passo inicial para o surto de uma civilização de cunho nitidamente cristão. Diz a mensagem, segundo publicaram alguns o dos nossos diários:

"Todo o mundo deseja a paz; mas, esta paz não deverá ser externa entre as nações e sim interna, dentro delas todas. Dentro de cada país devem reinar a união e o amor."

Não há fugir a reconhecer o acerto dessa proposição. Cumpre, no entanto examiná-la em todo o seu alcance e tanto mais justo e necessário nos parece que isso se faça, quanto não pode padecer dúvida que, pensando e sentindo assim o chefe da Igreja católica, do mesmo modo é natural pensem e sintam os fiéis dessa Igreja. Ocorre-nos então ponderar que, para existirem no seio das nações a união e o amor, preciso se torna que este sentimento reine, embora em diversíssimos graus, dentro de cada um dos indivíduos que as formam e, articulada essa ponderação, perguntaremos como poderá ele coexistir com o espirito de seita, com o sectarismo ferrenho, que se caracteriza, em todos os seus gêneros, pela intolerância, pela exacerbação fanática, que uma das outras afastam, separam as criaturas, induzindo-as a se anatematizarem e excomungarem reciprocamente, a, por fim, se odiarem até com fúria.

Do sectarismo e do espírito de seita que o alimenta é que nascem, não há negar, mais do que de qualquer outra fonte, os dissídios entre grupos de homens, dissídios que originam os antagonismos individuais, donde as prevenções, as animosidades, os rancores entre os povos e as guerras que, vê-se assim, promanam, em última análise dos sectarismos sempre estreitos, atrofiantes: que somente destroem, sem nada jamais construírem. E de todos o mais maléfico é o religioso, por unicamente se comprazer em exercer a sua ação funesta no domínio da consciência. Nada, realmente, mais difícil de suportar-se do que a opressão da consciência, do que a pretensão, por parte de quem quer que seja, de a dominar ou subjugar. Sujeitá-la, seja em nome do que for, é instituir a mais intolerável de todas as escravidões.

O homem sente, a bem dizer, instintivamente, que a recebeu livre das mãos do seu Criador, se é um crente, ou, se não o é, que assim a recebeu da natureza ou de qualquer outra procedência. Atenhamo-nos a considerar unicamente o primeiro, pois que como crentes é que nos aventuramos a esta ligeira explanação do assunto. Além de sentir que o Criador lha concedeu livre, sente o homem e compreende cada vez melhor que lhe ela foi dada como guia capaz de conduzi-lo ao longo da trajetória do seu destino, regulado por leis sábias, imutáveis e eternas, porém guia oculto sempre nos recônditos mais íntimos do eu, precisamente para poder desempenhar em completa liberdade a sua relevantíssima função e arcar com a responsabilidade plena da sua ação, no encaminhar a criatura para o cumprimento dos deveres que lhe decorrem daquelas leis; ou no afastá-la deles. E não colhe questionar sobre quais sejam essas leis, para debuxar o quadro dos deveres que elas impõem, quando uma existe que a todas sobreleva, visto que a todas engloba, ou as consubstancia, como o disse Jesus, que a formulou nestes termos: amar cada um a Deus acima de tudo e ao seu próximo como a si mesmo, fazendo consistir nesse duplo amor, ou nesse amor constituído de duas partes perenemente conjugadas, conforme seu ensino à Samaritana, todo o culto de adoração devido ao Pai onipotente, porquanto, segundo também palavras suas, o Deus é Espírito e só em espirito e verdade deve ser adorado, que tais são os adoradores que Ele quer.

Crer, portanto, e estabelecer moldes estritos, determinados e inalteráveis para a observação daquele mandamento e para o culto de adoração a Deus, condenando por demoníacos todos os demais, como em seu orgulho pretende o espírito de seita, cortando largo na amplitude do preceito divino, é violar os direitos da consciência, livre em si mesma, é atentar, por conseguinte, contra o que não se pode deixar de reconhecer obra de Deus, é obrar em flagrante desacordo com o que prescreve a sua suprema lei. Não foi, sem dúvida, senão tendo em consideração os sagrados direitos da consciência que Jesus proscreveu a adoração ao Pai, assim no templo, como no monte, isto é, adstrita a fórmulas e ritos quaisquer, conforme o exige intolerantemente o espírito de seita. E tanto mais grave e violento é o atentado que este último comete contra a consciência humana, com manifesto desprezo da grandiosa e sublime lei de amor a Deus e ao próximo, prescrevendo determinados cânones para cumprimento dessa lei e para o culto de adoração da Divindade, quanto é certo, posto que lá está no Evangelho, que o Divino Mestre não se esqueceu de indicar e recomendar a única maneira, única porque só ela é segura e eficaz, para a consecução de tal objetivo, a prática do amor a Deus e ao próximo, como forma exclusiva de adorar-se àquele em espírito e verdade. Essa maneira, disse-o Ele, se resume em não fazer ninguém aos outros o que não queira que lhe façam e em fazer a todos o que deseje lhe façam os outros.

O espírito de seita, invertendo por inteiro tão sábio quão simples ensinamento, proclama como regra, em matéria de crença, o exclusivismo, abolindo com isso a caridade e a fraternidade, que não podem encontrar-se onde não haja bondade, benignidade, magnanimidade, tolerância, Para que haja caridade e fraternidade, como expressão de amor a Deus e ao próximo, necessário se torna, portanto, o banimento do espírito de seita, cuja estreiteza e subalternidade contrastam chocantemente com a amplidão infinita e a elevação inexcedível do amor, que Deus solicita de todos os seus filhos.

Assim, sem a destruição do espírito de seita e a supressão dos sectarismos que dele derivam, não haverá paz entre os indivíduos e, não havendo entre estes, não poderá ela reinar entre os povos, entre as nações, entre as raças humanas. Filho do orgulho e da presunção, o espírito de seita não consente aflore nas almas a virtude da humildade, refulgente aureola do verdadeiro cristão, como o demonstraram Jesus e os que com Ele colaboraram no desempenho da sua missão redentora. Somente, pois, resistindo a esse espírito, sob todos os aspectos que assuma, sobretudo nas suas ânsias de conquista das glórias e grandezas mundanas, de domínio pela aquisição de riquezas materiais, de sujeição das consciências; somente laborando pela erradicação de todas as ervas venenosas que ele semeia no campo do Senhor, que são as almas, se trabalhará pela implantação definitiva da paz na Terra. Fugaz e ilusória será ela, enquanto não tiver por alicerce a fraternidade, que implica tolerância e benevolência. Por isso mesmo, a fraternidade fenece e morre, onde quer que floresça o tacanho espírito de seita, seu maior inimigo.

Encastelado em proverbial e férrea intolerância, produzindo um sectarismo que oblitera a razão e dissipa toda noção de justiça, cogitando tão só de investir contra a consciência e os sentimentos espontâneos do espírito, ele desata perseguições morais de toda ordem, quando não físicas também, que dão causa a reações geradoras de indiferenças, de separações, de desarmonias e discórdias, de desamor e, por fim, de ódios, que a seu turno geram as lutas individuais e as guerras internacionais.

Ora, como no campo das religiões é onde medra com mais exuberância o espírito de seita, temos para nós que a ninguém cabe melhor, nem ninguém se encontra em posição mais propícia para livrar esse campo da germinação de tão danosa semente, do que os chefes das mesmas religiões, bastando, para o conseguirem, que prescrevam com a alta autoridade de que desfrutam a exemplificação da tolerância, da benevolência, da magnanimidade, em matéria de fé ou de crença, exercitando essas virtudes sob a égide e o influxo do amor a Deus e ao próximo, com o que restituirão ao termo religião o seu significado legítimo. Indubitavelmente, agindo nesse sentido, eles se tornarão os fatores principais, senão exclusivos, da paz por que anelam seus espíritos e os dos que, formando grande maioria entre os fiéis de suas igrejas, fortemente já propendem para a verdade e para o bem, que é da sua substância.

Praza àquele a quem daqui nos dirigimos, como a um irmão em Deus, relevar-nos o termos buscado para assento destas despretenciosas e rápidas ponderações algumas breves linhas da sua mensagem do Natal e tolerá-las benévolo, levando em conta ter sido esse mesmo Natal, o mais sublime dos eventos que os fastos humanos registram, por significar afirmativa iniludível da redenção da humanidade, o que nos moveu a escreve-las, pensando nos obstáculos imensos que a essa redenção creia por toda parte o espírito de seita, criando-os para a edificação do reino de Deus nos corações de seus filhos.

Certos de que as palavras daquelas poucas linhas serão compreendidas em espírito e verdade, de acordo com o sentimento cristão que as inspirou, certos também estamos de que os sinceros anseios de paz para a terra, que elas traduzem e que são os que, no atual momento, fazem palpitar vivamente os corações bem formados, constituirão nestes um antemural ao espírito de seita, que de tempos imemoriais perturba o mundo, e representarão, em consequência, um elemento de construção da verdadeira paz, da paz que resulte da efetiva cristianização dos espíritos.

Bem hajam todos quantos, não apenas por palavras, mas pela mobilização de grandes, alevantados e nobres de sentimentos substancialmente cristãos, trabalhem a prol de tão sublimado ideal, de união e amor entre os homens e as nações, trabalhando, do mesmo passo, por que dentre as criaturas banido seja, graças ao poder do espírito do vero Cristianismo, esse "príncipe do mundo", o espírito de seita. Reservado lhes estará gozarem do jubilo indizível de verem seus nomes escritos nos céus em letras luminosas, como o tiveram os seus aqueles que, outrora, invocando o de Jesus, expeliam dos possessos os "demônios".





Como se justificar


Como se Justificar
Reformador (FEB) Dezembro 1943

Simeão, homem justo e temente Deus, declamou no templo, com Jesus nos braços, quando este foi levado para apresentação de primogenitura, em obediência à Lei: "Agora é, Senhor, que deixareis morrer em paz o vosso servo segundo a vossa palavra; pois que os meus olhos viram o Salvador que nos dais; e que destinais para ser exposto à vista de todos os povos, como a Luz que iluminará as nações e a glória de Israel, o vosso povo. É este menino para ruína e ressurreição de muitos em Israel e para ser exposto à contradição dos homens; e a vossa própria alma será traspassada como por uma espada a fim de que os pensamentos ocultos, no coração de muitos, sejam descobertos." - Lucas, 2:25 a 35.

Saulo de Tarso, com sua inteligência, seu profundo conhecimento da Lei e seu entranhado ardor religioso elevado ao pináculo da intolerância, representava ou encarnava em si todo o orgulho farisaico de sua época. Ele tomou a si o encargo de apagar a Luz que se levantara para espancar as trevas que encobriam a trama maravilhosa da verdade, que se encontrava e se encontra nesses livros extraordinários do saber religioso do povo eleito de Israel.

Ele foi o perseguidor implacável da nascente igreja cristã, que se apoiava na cristalização dos ensinos antigos; "Amar a Deus sobre todas as coisas" - e dos ensinos modernos, a saber: "Amar ao próximo como a si mesmo" -, que é a eterna rocha do amor, fundamento da felicidade humana.

Saulo de Tarso tropeçou na "pedra de escândalo", e tocado pelo amor que dela se irradia, ressurreto na estrada de Damasco, se transforma em Paulo, o indômito Apóstolo do Cristianismo, enquanto o orgulhoso príncipe dos sacerdotes desaparecia nas sombras do esquecimento. A queda do príncipe dos sacerdotes representa a ruína de muitos e a transformação de Saulo a ressurreição de outros.

Depois veio a negra noite da Idade Média, ... dos césares, e as feras e as tochas eram alimentadas pela fé que brotava das catacumbas. O Cristianismo nascente foi a "pedra de escândalo" onde se veio chocar o paganismo propagado pelas lanças das invencíveis legiões romanas. A queda dos orgulhosos césares representa a ruína de muitos e o martírio de Sebastião a ressurreição de outros.

Depois veio a negra noite da Idade Média e o véu trevoso de sua escuridão era rasgado aqui e ali pelas sinistras claridades das fogueiras inquisitoriais. Paganizava-se o Cristianismo; substituindo-se a pureza de suas pregações pela orgulhosa imposição do "crê ou morre". O Evangelho de Jesus foi a "pedra de escândalo", onde o fanatismo religioso, na sua incompreensão evangélica, veio esbarrar, na ânsia ambiciosa do poder temporal. As guerras empreendidas pelos exércitos papalinos representavam a queda de muitos e Francisco de Assis, a ressurreição de outros.


quarta-feira, 26 de julho de 2017

O pão é nosso


O pão é nosso
Vinicius (Pedro de Camargo)
Reformador (FEB) Janeiro 1943

O pão nosso de cada dia, dá-nos hoje... eis o que Jesus nos ensina a pedir diariamente.

O pão nosso, notemos bem. Não é o meu, nem o teu, nem o dele, nem o vosso: é simplesmente o "nosso". O possessivo "nosso" quer dizer que é de nós, que respeita aos homens em geral. Solicitamos, portanto, a parte que nos toca daquele pão que é de todos, que é próprio e natural da terra onde nascemos, ou seja do planeta que ora habitamos. O adjetivo "nosso" tem acepção genérica e não particular.

O pão, pois, que vem da terra é nosso, é do gênero humano, por isso que constitui necessidade inalienável de todos, sem distinção de raça, nação, povo ou classe. É Deus quem no-lo dá, porquanto, a germinação do grão no seio da terra importa noutros tantos milagres da multiplicação dos pães, prodígio esse que se opera à revelia nossa.

"O homem semeia, Deus dá o crescimento". O homem ingere o pão, Deus o transmuda em sangue, base da vida animal. Daí por que devemos pedir o pão a Deus e não a outros homens. Cumpre, pois, reconhecer com humildade que o pão vem de Deus para todo o gênero humano. Rogamos que nos seja dada a parte desse pão, necessária à nossa subsistência. A parte procede do todo, desse "todo" que é de todos, não constituindo, por conseguinte, propriedade exclusiva de ninguém.

O pão para o corpo, como o pão para o Espírito, isto é, tudo o que concerne às necessidades humanas sob seu duplo aspecto - material e espiritual - constitui um bem que vem de Deus, uma dádiva do Pai celestial a todos os seus filhos, indistintamente, por isso que "Ele faz nascer o seu sol sobre bons e maus, e vir as chuvas para fecundar o campo dos justos e dos injustos."

Não existe diferença fundamental entre o pão do corpo e o da alma. O pão simboliza os reclamos do homem, tanto em sua matéria, como no seu Espírito. Por isso, na santa ceia, Jesus tomou o pão inteiro e, partindo-o, deu a cada discípulo a parte que lhe tocava, dizendo: Tomai e comei. Na justa distribuição do pão está a divina eucaristia; pois em tal importa o cumprimento da soberana Lei do Amor.

A Terra é nossa, o pão é nosso, o planeta é nosso, o sol é nosso, as chuvas são nossas, o ar respirável é nosso; as possibilidades são nossas, as faculdades de melhorar, subir e crescer nos conhecimentos e na virtude, no bem e no belo são, igualmente, nossas.
Enquanto os homens não compreenderem essa sublime verdade e não se orientarem por esse critério, não haverá paz nem felicidade neste mundo.

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A crença cega é morta, comparável à luz mortiça dos ambientes fechados.
É preciso ler, estudar, perquirir sempre, como quem sabe que o progresso e a verdade são infinitos.

Procurem os bons livros e terão adquirido um cabedal de vida eterna, patrimônio da alma.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Saibamos ser Espíritas


Saibamos ser espíritas
Djalma de Matos
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

Procurar conhecer-se a si mesmo, com a preocupação constante, quotidiana, de corrigir os próprios defeitos, constitui o dever precípuo de todo verdadeiro espirita.

De que serve ao crente conhecer a fundo a doutrina e observar teórica e exteriormente os seus ensinamentos, se, no que diz respeito a alma, ao próprio eu, não faz esforço por melhorar-se, para dar a demonstração de que o Espiritismo não é como a figueira estéril do Evangelho, mas, sim, árvore fecunda e frondosa, que dá bom fruto e acolhedora sombra?

Não pretenda ninguém ser perfeito, sob pena de se lhe turvar a visão - porque a perfeição, neste mundo, como o motu-contínuo e a pedra filosofal, ainda não houve quem a alcançasse. Pela terra, um único Espírito perfeito já passou: o de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Muito já faz quem mantiver o propósito sincero e diuturno de melhorar-se, observando e corrigindo as próprias imperfeições, perdoando, fazendo por esquecer as faltas que provêm das imperfeições alheias. E. para não fraquejarmos, não nos sujeitarmos a falir, neste meritório intento, devemos apelar sempre para a humildade, sem jamais esquecermos a sábia e salutar recomendação do Mestre: - Orai e vigiai para não cairdes em tentação!

Se, quando o procedimento alheio nos causasse ofensa ou prejuízo, quer direta, quer indiretamente, antes de irrogarmos ao nosso irmão censuras e recriminações, de levantarmos a voz para o acusar, nos detivéssemos um momento a raciocinar e, atentando nas imperfeições do nosso ser, nos puséssemos um momento na posição do que cometeu a falta, no mesmo grau de adiantamento moral ou intelectual em que ele se encontra, haveríamos de ver que, na maioria dos casos, a revolta se transformaria em compaixão e a acusação nos inspiraria uma prece em benefício daquele que faliu por ignorância ou por fraqueza.

Se este é o critério aconselhável no cultivo das relações mundanas, muito mais será de observar-se nas coisas que dizem respeito propriamente ao Espiritismo.

Não podemos, por isso, concordar com alguns confrades que, animados, aliás, de boas intenções, entendem que se deve hostilizar a todos aqueles que praticam as diversas modalidades do baixo, ou, melhor, do falso espiritismo, vigiando-os e denunciando-os à polícia, sob à alegação de que desacreditam o verdadeiro Espiritismo. Discordamos deste modo de pensar, porque temos como certo que a missão dos espíritas não é acusar, nem delatar, mas aconselhar e moralizar pela exemplificação dos preceitos evangélicos, sem jamais recorrer aos métodos coercitivos da violência e do escândalo.

Não julgueis para não serdes julgados - disse Jesus.

E qual será o mais culpado - aquele que por ignorante (que outro qualificativo se não pode dar) pratica a feitiçaria, a macumba, etc., sob o rótulo de Espiritismo, ou o que, tendo-se por conhecedor da verdadeira doutrina e da moral evangélica, não faz o que nelas se ensina, isto é, perdoar para ser perdoado, não fazer ao próximo o que não quereria que lhe fizessem?

A resposta não é difícil... Mais censurável é aquele que, tendo o caminho iluminado à sua frente, dele se desvia, do que o que pouco enxerga e se precipita no lodaçal.

Encarada assim a questão, sob o justo critério da relatividade, cuidemos em que não nos caiba a increpação de Jesus aos fariseus, que viam o argueiro no olho do vizinho e não percebiam a trave no próprio olho.

Não há, a nosso ver, o menor perigo para o Espiritismo legitimo - que não é obra dos homens, e sim dos invisíveis mensageiros do Senhor - de ser prejudicado pelo falso espiritismo porque a verdade jamais se podem confundir com a impostura, assim como o azeite se não contunde com o vinagre. Bem saberão extremar um do outro as pessoas sensatas, esclarecidas e criteriosas, cujo juízo tão somente nos deve preocupar - porque o das de má fé, das de cérebro entenebrecido pelas teias de aranha dos prejuízos e preconceitos, não devemos recear, nem dele cogitar.

O nosso pensamento sobre o assunto é este: - Tenha cada espírita o firme e constante propósito de corrigir as próprias imperfeições, procurando ser bom e justo, para combater, pelo conselho e pelo exemplo, o erro e a ignorância, dentro do âmbito arejado da caridade e da tolerância, sem julgar necessário recorrer aos meios compulsórios da repressão oficial.

Foi recorrendo a esses meios que começaram aqueles que chegaram, na Idade Média, a criar, de conivência com os poderes temporais, os tribunais do Santo Oficio, a acender as fogueiras da lnquisição - como se, para demandar as coisas de Deus fosse mister apelar para a espada de Cesar.

Saibamos, pois, ser rigorosos para com os nossos próprios defeitos e tolerantes para com as faltas alheias.

                     Só assim seremos dignos de nos dizermos espíritas.

Prêmios


Prêmios
por Lino Teles (Ismael Gomes Braga)
Reformador (FEB) Maio 1943

Para que as crianças estudem, cumpram suas tarefas escolares, os pais e mestres estabelecem notas e prêmios para as provas. O estudante esforça-se, cansa-se, luta, não para adquirir ciência, mas para adquirir prêmios, louvores, boas notas nos exames. Só muito mais tarde, ao aplicar sua ciência na vida prática, percebe o estudioso que o único prêmio real é o conhecimento mesmo que ele adquiriu e não as medalhas e diplomas, que passaram a ser quinquilharia inútil.

Nos cultos religiosos, dá-se o mesmo com os adultos em corpo, mas crianças em espírito. O homem estuda sua religião, frequenta-lhe as solenidades, pratica-lhe a moral, recebe os sacramentos, a fim de receber prêmios, de salvar a alma, obter as boas graças de Deus e dos seus anjos. Interessam-lhe somente os prêmios que lhe são apontados fora e depois do culto e não o culto em si mesmo; o culto não lhe parece uma compensação, mas, ao contrário disso, uma tarefa para obter prêmios. A prece não é um prêmio, mas o meio de pedir o prêmio. O prêmio deve ser mais material, mais concreto do que a alegria da alma ao elevar-se ao seu Deus. Longe de nós pensar que os prêmios escolares ou as promessas das religiões sejam inúteis ou desnecessários. São absolutamente necessários e utilíssimos, porque a inteligência da criança é demasiado limitada para alcançar as finalidades superiores do estudo que está fazendo e desanimaria, se não visse uma compensação imediata para os seus esforços. Igualmente a concepção da vida espiritual é muito vaga para a maioria dos habitantes da terra, que não a julgariam digna de seus esforços e sacrifícios, se não pudessem conceber um prêmio mais próximo e mais concreto como pagamento de seus esforços. Lutam por um salário e querem concebe-lo bem claro e bem próximo. São ilusões necessárias. Muletas indispensáveis. Retira-las fora deixar ao desamparo, sem rumo, sem forças, em pleno desespero, as pessoas que só com elas podem movimentar-se e orientar-se.

A finalidade do Espiritismo não é arrancar essas muletas a quem quer que seja, mas simplesmente socorrer aqueles que já as perderam e se sentem desalentados. Mais cedo ou mais tarde, todos as perdem, assim como o adulto perde o interesse pelos prêmios escolares que o entusiasmavam tanto na infância. Nesse momento, o Espiritismo apresenta-se como a grande tábua de salvação. Não promete prêmios, porque ele mesmo é o prêmio.

Com o conhecimento do Espiritismo, tudo se esclarece e a segurança se estabelece para todos. Em vez de contemplarmos uma curta existência de dores e erros, vemos uma longa, interminável série de existências, da qual esta, penosa e triste, é pontinho morto que se perderá para sempre na eternidade futura, é o minuto que voa e desaparece para sempre, num passado que nunca mais há de voltar.

Tudo se transforma a luz do Espiritismo, de cultura, Porque o ponto de observação se eleva para o eterno e o infinito. As coisas mais odiosas, capazes de desencadear todas as fúrias, quando encaradas do ponto de vista limitado de uma encarnação, passam a ser compreendidas como processos necessários de evolução e proveitosas em seu conjunto eterno. Deixam de ser o mal e transformam-se em bem, talvez um bem conquistado com muitas dores, mas por fim um bem real.

Figuremos um exemplo.

Certo povo julga-se de uma raça superior e por isso invade o território de outro menos armado, faz-lhe guerra de extermínio, apropria-se de suas terras, escraviza os sobreviventes da raça vencida e estabelece novo império, aparentemente todo seu, sobre os escombros do território conquistado. A raça vencida desaparece, sobrevivendo somente a vencedora, como se deu em quase todos os territórios de nossas Américas. Do ponto de vista materialista da existência única; houve uma injustiça imensa, irreparável em toda a história. Mas, o Espiritismo nos demonstra que essa injustiça é apenas aparente, porque a raça extinta continua vivendo e progredindo em seus antigos domínios, somente em outros corpos. Os invasores e vencedores orgulhosos, que exterminaram os vencidos, que jamais permitiriam a um deles viverem em seus lares, vão pagar o tributo à lei universal da harmonia. Seus filhos bem amados vão ser os mesmos Espíritos dos vencidos, reencarnados em suas esposas, irmãs e filhas. Todo o passado fica esquecido. As ternas crianças, hoje tratadas carinhosamente nos lares suntuosos dos vencedores, nada mais são do que os vencidos do passado agora em novos corpos.   
     
Surge realmente um novo mundo nesses territórios; mas, uma parte grande de sua população é a mesma antiga. As duas raças se fundem em uma única, cada uma colaborando com o fruto de suas experiências para o bem comum.

A reencarnação vence todas as veleidades de raça, de fortuna, de cor.

Ainda outro exemplo.     

Uma raça realmente superior vive dispersa pelo planeta, sem pátria, sem segurança, ajudando o progresso de todos os povos e por todos eles perseguida. Sua vida é dolorosa missão através dos séculos e milênios: é o sal da terra; mas, a sua superioridade desperta ciúmes, rivalidades, perseguições, injúrias. De tempos a tempos surgem verdadeiros organizadores da perseguição para aumentar as dores da raça missionária.

Parece que ficam impunes os perseguidores; dispõem de força e fazem quanto lhes apraz. Puro engano! Esses perseguidores nascem na mesma raça perseguida, sofrem a justa punição de suas faltas e colaboram inconscientemente com ela para o progresso de todos.

Passam pelas mesmas dores que já fizeram sofrer, são incompreendidos, mas aprimoram-se em moral e fazem jus à felicidade real e inalterável dos Espíritos superiores, quando terminam suas penosas tarefas.

A variedade infinita de caráteres, de graus de cultura, de inclinações morais, demonstra que a raça perseguida realmente já é a fusão de muitas ou de todas as raças do planeta. Só lhe resta da primitiva um número muito limitado de indivíduos, os condutores, guias da raça; a grande massa, porém, já é toda formada de antigos perseguidores vindos de todas as raças e reencarnados na perseguida e benfeitora.

Nenhuma injustiça fica sem reparação, porque a salvação é universal. Todos os filhos de Deus tem que ser salvos, porque essa é a lei; por isso mesmo nenhum pode permanecer sempre no pecado. A reparação da injustiça é a reabilitação. Vem fatalmente, inevitavelmente, através muitas vezes de pungentes dores, mas vem.

O conhecimento do Espiritismo nos enche a alma de serenidade e paz, dá-nos a segurança de que nenhum mal é sem remédio e que fatalmente o bem triunfa, de que uma justiça perfeita reina mesmo onde nos parece só haver caos e confusão, de que o nosso futuro será inevitavelmente feliz e tranquilo. Tudo melhora em torno de nós à luz do Espiritismo. A morte perde todo o seu terror e entra a ser vista como boa amiga. A pobreza, a desonra, humilhação, a enfermidade, a dor em todas as suas múltiplas modalidades, perdem seu aspecto lúgubre para quem sabe que tudo isso, como seus opostos, é passageiro e desaparecerá rapidamente, restando-nos sempre na frente a eternidade inteira e inalterável qual no-la apresenta o Espiritismo.

            O conhecimento deste nos coloca acima da aprovação ou reprovação do mundo, dando-nos, por isso, uma paz de espírito que se não pode comparar a todos os bens da terra.
           

Se as crenças do passado nos prometiam prêmios e esses prêmios eram necessários, o Espiritismo, abrindo-nos as cortinas que estavam cerradas sobre o mundo espiritual, não necessita prometer-nos nenhum prêmio, porque esse conhecimento mesmo é o maior de todos os prêmios. O espiritista não deveria nunca orar para pedir; deverá orar sempre para agradecer o muito que está recebendo, porque na verdade está recebendo mais do que todos os outros bens reunidos. Agradecer sempre até à mão benfazeja que nos fere, porque essa mão nos está reintegrando na lei de Justiça perfeita, nos está impelindo à felicidade.  Agradecer a quem pelo homicídio nos restitui à Pátria espiritual. A vida do espiritista deveria ser um hino constante de reconhecimento ao Criador, uma constante adoração. Se assim não acontece, é porque ainda somos muito pouco espíritas, ainda não sabemos avaliar o tesouro que recebemos.

Prece


Prece
de Mínimus (Antônio Wantuil)
Reformador (FEB) Dezembro 1943

Eu sou, amado Mestre, aquele Malco forte,
Que fraco se tornara ao ver-te frente-a-frente.
Minha orelha atingida, em bem profundo corte,
Deu luz à minha vida, à vida de um demente!

O sangue borbotante e que estancaste, oh! Cristo.
Iluminou-me o ser e deu-me esse desejo
De te servir na Terra, onde não foste visto
Na glória divinal que neste instante vejo!

Eu quero reparar o meu passado triste,
Sofrer pelo meu crime e por amor aos meus,
Sentindo o mal que fiz e a dor que em mim persiste.

Que teu perdão alcance os pobres corifeus,
Os soldados e os reis e todos que aqui viste,

Para que sigam, hoje, as pregações dos teus!

Doutrinas


Doutrinas
por Heitor Luz
Reformador (FEB) Março 1942

É o mundo um vastíssimo palco, onde se debatem inúmeras teorias, onde se entrechocam multidões de temas, visando cada prosélito impor como melhor aquilo que pensa, aquilo que conquistou pelo raciocínio, ou pelo estudo.  

Predominam, em toda essa confusão, o materialismo, conceitos maus, tirados de raciocínios doentios, aberrações de consciências que não querem submeter-se à verdade.

Observando ou apreciando esse tumulto de ideias, vê-se que muitos irmãos se deixam ir na corrente de doutrinadores inconsequentes e incongruentes, que só propagam, como é natural, erronias e absurdos.

No que respeita ao Cristianismo, as interpretações falsas de seus ensinos deram origem a grande número de seitas, cada uma das quais se fez paladina de um Cristianismo a seu modo em que as ações, as obras de nada valem para a salvação espiritual, que apenas decorre da fé, ou da observância de determinados cultos exteriores.

Ora, é claro que a salvação não pode achar-se adstrita a uma modalidade de proceder, ou de considerar superficialmente as coisas, mesmo porque, em realidade, não há salvação, mas evolução, progresso, aperfeiçoamento moral. Salvação somente se poderia aceitar, se o Espírito no mundo, estivesse adstrito ao esforço por escapar a penas ou condenações futuras, a essas prisões fantásticas a que as religiões dão os nomes de inferno e purgatório.

Como tais prisões não existem, visto que, fora da terra, só inumeráveis outros orbes e o espaço Infinito onde todos eles se movem, segue-se que a evolução dos seres se tem de operar ou nos planetas, ou nos espaços que os rodeiam, ou seja: em planos diversos, inferiores e superiores, onde o Espírito Iabora por adquirir a perfeição a que todos se destinam. É o que demonstra a Doutrina Espírita, baseada nas revelações que eles, os Espíritos, constantemente fazem, há quase um século.

Não há lugares circunscritos, de penas ou de gozos, quais seriam, se reais, o céu o purgatório e o inferno das religiões dogmáticas. E não há, porque a pureza e a impureza dos sentimentos, fatores dos gozos e dos sofrimentos do Espírito, estão no seu íntimo, não no ambiente em que ele vive.

Assim, cada qual, na Terra, tem que procurar melhorar o seu eu, purificar o seu coração, reparando, segundo a doutrina de Jesus, os erros que haja cometido e não reincidindo neles. Se sente que lhe falecem as forças para essa obra de regeneração própria, tem ao seu alcance o recurso da prece, que lhe facultará as energias necessárias a vencer os seus impulsos para o mal e a dominar os seus instintos grosseiros.

Céu, inferno e purgatório são meras invenções dos homens, bem como a salvação unicamente pela fé, sem as obras: são criações humanas contrarias ao que se encontra nos Evangelhos.

Esta a verdade, fora da qual tudo são doutrinas fantasiosas, imaginadas pelos homens que, no seu comodismo, para não se darem ao esforço de trabalhar o seu íntimo, no sentido da evolução espiritual, pretenderam estabelecer um meio fácil de espalhar a bem aventurança e entraram a espalhar teorias contrárias às verdades evangélicas

Moral Espírita


Moral Espírita
por Arnaldo S. Thiago
Reformador (FEB) Março 1942

Quando, à falta de princípios, a criatura humana desce à prática de todos os atos, contanto que com eles sacie os seus desejos e resguarde os seus interesses, tem atingido ao mais baixo grau de degradação e servilismo, praticando os mais abomináveis crimes de lesa-majestade divina. Infelizmente foi a este horrível estado de degradação moral que chegou a espécie humana: daí a guerra de extermínio.

As células do corpo se renovam e não estereotipam os sinais do pecado; mas (e isto é que convém saber e o Espiritismo -veio demonstrar), conserva-os indelevelmente o corpo perispiritual.

O incesto, o adultério, como o roubo, o assassínio, a calúnia não deixam estigmas nos órgãos materiais: por isso, os que os praticam julgam poder oculta-los secretamente e continuam a viver como se fossem criaturas honradas. Ai deles! - praticado o delito, grava-o o perispírito, para abrir mais tarde, segundo aquele estigma, uma chaga, um câncer, uma deformidade no corpo somático... e, pior do que tudo Isso, as chagas morais que o remorso produz nas almas, paralizando-lhes o surto progressivo, anestesiando-as, insensibilisando-as por longo tempo.

Guardar os princípios é da essência da religião. Ai dos que pensam poder eximir-se ao pesado fardo das mutilações e das grandes dores, porque sabem guardar discrição e conservar em absoluto segredo os seus atos que, conhecidos, seriam reprovados e os envergonhariam! Ai deles! Que valor deram às palavras do Mestre: "Nada há oculto que não venha a saber-se, nem secreto que não venha a descobrir-se"?

Portanto, se a caridade e a humildade são elementos essenciais à salvação, serve-lhes de traço de união a sinceridade, sem a qual não existe virtude alguma no fazer bem, nem no parecer humilde.

Claro que se tem de praticar atos secretos e fazer muita coisa às ocultas. O próprio Mestre recomendou que se praticasse a caridade de modo que a mão esquerda ignore o que faz a direita; mas, são, esses, atos que se justificam, que, em sendo conhecidos, nos dignificam.

Por isso, o bom princípio determina que sempre se pratique, às claras ou às ocultas, aqueles atos que a moral pode justificar - porque a moral é o selo divino, é a voz de Deus que fala em nossa consciência.

Assentemos essa regra de conduta e estaremos sempre com Jesus guardando fidelidade a nosso Pai Celestial e dignificando-nos a nós mesmos.

Não podemos dispor do nosso corpo senão na medida dos princípios morais que nos elevam aos olhos de Deus e nos dignificam. Magdalena bem assim o compreendeu, ao sentir o olhar puríssimo de Jesus penetrar-lhe o íntimo da alma e, porque o amava sinceramente, nunca mais chafurdou no vício e, se outras encarnações teve, foram todas de dor e de renúncia, purificadoras, portanto, daqueles dolorosos estigmas que lhe ficaram no perispírito. Entretanto Jesus lhe disse: "Porque muito amaste, perdoados serão os teus pecados." Jesus falou no futuro: "Perdoados serão os teus pecados". E Magdalena foi obtendo esse perdão, essa redenção, através de outras encarnações de sacrifício e de angústia íntima que culminaram, segundo a revelação, naquela em que, como Tereza de Jesus, pode para sempre ficar livre do pecado.

Estes princípios da moral espírita, longe de terem por esteio a autoridade dos concílios e quejandas convenções dogmáticas, se baseiam em aquisições positivas da ciência da alma, postas em evidência por experimentadores sábios e acima de toda suspeição. O paraíso prometido perdeu o seu caráter fantasmagórico, místico, para adquirir a eloquência da verdade. Longe de sofrer, por esse motivo, qualquer diminuição de valor, ganhou em refuIgência e brilho o que perdeu em superstição e convencionalismo. 


A felicidade, aqui ou em qualquer dos planos do infinito, com o estar Integralmente nas divinas claridades do Amor, subordina-se às leis da moral eterna, que consistem em ter límpida a consciência, puros os costumes. 

O Quadro Negro


O Quadro Negro
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Janeiro 1943

"Mas, tenho-vos dito isto a fim de que quando chegar aquela hora vos lembreis de que já vo-lo tenho dito." Jesus (João 16:4).

Jesus se referia aos próprios testemunhos, entretanto, podemos igualmente aplicar seus divinos conceitos a nós mesmos, desencarnados e encarnados.

Cada discípulo terá sua hora de revelações do aproveitamento individual.

As escolas primárias não dispensam o habitual quadro negro, destinado às demonstrações isoladas do aluno. Frente ao professor consciencioso, o aprendiz mostrará o que aproveitou, sem os recursos do plágio afetuoso entre companheiros. Sobre a zona escura, o giz claro definirá fielmente a posição firme ou insegura do estudante. E não será isto mesmo que se repete na escola vasta do mundo? O homem, nas lutas vulgares, poderá socorrer-se indefinidamente dos bons amigos. O Pai permite semelhantes contatos para que as oportunidades de aprender se lhe tornem irrestritas. Contudo, lá vem aquela hora em que a criatura deve tomar o giz alvo e puro das realizações espirituais e caminhar em direção ao quadro negro das provas edificantes.

Alguns aprendizes fracassam porque não sabem multiplicar os bens, nem dividi-los; ignoram como subtrair a luz das trevas, somam as lutas e formam equações de ódio e vingança. Esquecem-se que Jesus salientou o amor em todas as situações, do apostolado evangélico e que, mesmo na cruz, depois de receber as parcelas da injúria, de perseguição, da ironia, do desprezo, somou-as na tábua do coração, estabelecendo a divina equação da serenidade, do entendimento e do perdão.

Oh! vós, que ides ao quadro negro das atividades terrestres, abandonai o giz escuro da desesperação! Escrevei em caracteres de luz o que aprendestes do Mestre Divino. Revelai o próprio valor! Lembrai-vos que instrutores benevolentes e sábios vos acompanham as mãos! Abençoai o quadro negro que vos pede o giz de suor e lágrimas, porque daí podereis conquistar o curso maior!..


sábado, 22 de julho de 2017

Novos Atenienses


Novos Atenienses
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Janeiro 1943

"E como ouviram falar da ressurreição dos mortos, uns escarneciam e outros diziam: - A cerca disso ouvir-te-emos doutra vez." (Atos, 17:32).

O contato de Paulo com os atenienses, no areópago, apresenta lição bem interessante aos discípulos novos.

Enquanto o apóstolo comentava as suas impressões da cidade célebre, aguçando talvez a vaidade dos circunstantes pelas suas referências aos santuários e pelo jogo sutil de seus raciocínios foi atentamente ouvido. É possível que a assembleia o aclamasse com fervor, se sua palavra permanecesse no quadro filosófico das primeiras exposições. Atenas reverencia-lo-ia, então, como sábio, apresentando-o ao mundo, na moldura especial de seus nomes inesquecíveis.

Mas, Paulo falou na ressurreição dos mortos, deixou entrever a gloriosa continuidade da vida, além das futilidades terrestres. Desde esse instante, os ouvintes sentiram-se mal e chegaram a escarnecer de sua palavra amorosa e sincera, deixando-o quase só.

O ensinamento se enquadra perfeitamente nos dias que correm. Numerosos trabalhadores do Cristo, nos diversos setores da cultura moderna, são atenciosamente ouvidos e respeitados como autoridades, nos assuntos em que se especializaram; mas, quando chegam a declarar sua crença na vida além da morte do corpo, se afirmam a lei de responsabilidade para lá dos sepulcros, recebem imediatamente o riso escarninho dos admiradores de momentos antes, que os deixam quase sozinhos, proporcionando- lhes a impressão de verdadeiro deserto.



quinta-feira, 20 de julho de 2017

Luta Inglória


São Jerônimo e as traduções da Bíblia



          









                   Luta Inglória
                    por João Passos
Reformador (FEB)    Dezembro 1943

Inúmeras têm sido as discussões em torno da obra de Roustaing. Elas, longe de provocarem o estudo consciente e sadio nas fileiras do Espiritismo, causam por assim dizer uma verdadeira confusão de ideias, uma perturbação que seria total, se não pudéssemos ressalvar um pouco de senso e de meditação. Seria de bom alvitre dar-se por encerrada essa contenda que tanto azo tem dado aos adversários da Doutrina.

Que se encontra na obra de Roustaing senão a interpretação do Evangelho de Jesus Cristo? Que há de mal ou pernicioso? Somente nos séculos da ignorância se admitia a condenação dos justos, dos sábios, dos cientistas.

Parece-me que alguns espíritas pretendem que só a Kardec coube a missão de divulgar o Espiritismo, pecando aquele que das suas obras se afastar. Eles se assemelham a católicos fanáticos que julgam os padres os únicos capazes de pregar aos homens as coisas de Deus.

Roustaing foi um iluminado e tudo que à humanidade legou partiu do Grande Manancial Divino. Estudem-no sem preconceitos, com paciência e a dúvida e a desconfiança desaparecerão.

Segundo Kardec, nem todos os Espíritas conhecem integralmente as coisas do invisível e. porque, se faz tanta praça a respeito do corpo de Jesus? Sem dúvida, os Espíritos assistentes de Kardec não receberam ordens superiores, ou, então, por não possuírem o respectivo conhecimento, deixaram de se manifestar sobre a personalidade do Messias, ao passo que, àqueles que a Roustaing assistiram coube a revelação e a explicação do corpo do Cristo.

Tomando Jesus um corpo carnal, por força das leis que regem este planeta, estaria sujeito às suas múltiplas sensações (refiro-me ao corpo) e, portanto, não suportaria, até ao fim, a brutalidade dos sofrimentos físicos de que fora alvo; por outro lado, sujeito às mesmas leis, este corpo haveria de putrefazer-se, o que não aconteceu, visto o seu desaparecimento do sepulcro.

Referi-me às leis, porque os Espíritos superiores afirmam não serem elas revogadas, e o corpo de Jesus, como se sabe, não obedeceu à lei.

É, portanto, digna de culto e estudo a obra de Roustaing. Ela não só proporciona o caminho da verdade como desenvolve, por sua vez, os altos ensinamentos contidos nas obras de Kardec, e de todos os outros propagadores da Terceira Revelação.

É o meu modo de ver.