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sábado, 2 de janeiro de 2016

Yvonne A Pereira - sua desencarnação


             No dia 9 de março corrente (1984), às 22 horas, aproximadamente, no Hospital da Lagoa, onde havia sido internada poucas horas antes, desencarnou a irmã e conhecida médium cujo nome dá titulo a esta página.

            Ao sepultamento, ocorrido no dia seguinte, 10 de março de 1984, às 16 horas, no Cemitério de Inhaúma, compareceram numerosos confrades e amigos, entre os quais se achava o representante da Federação Espírita Brasileira, na pessoa do seu Vice-Presidente Juvanir Borges de Souza, que representava também pessoalmente o Presidente Francisco Thlesen, a pedido deste.

            Momentos antes, os confrades presentes reuniram-se em torno do esquife mortuário para elevar a Deus uma prece. Usaram, então, da palavra o seu sobrinho, confrade Cesar Augusto Lourenço Filho, e o representante da FEB. O primeiro leu expressiva página deixada por D. Yvonne, escrita por ela para registrar as horas mais felizes da sua vida, dizendo aos seus irmãos que elas foram exatamente aquelas que pode dedicar ao trabalho na Doutrina Espírita. Juvanir Borges de Souza expressou admiração e reconhecimento à irmã cuja existência se extinguia após longo tempo de atividades benfazejas e, com sinceridade, acrescentou que todos, superando naturais sentimentos de pesar, como espíritas convictos, podíamos louvar a Deus pela libertação de um Espírito que, seguramente, reingressava na Pátria Espiritual redimido e merecendo a felicidade reservada aos que cumpriram na Terra os seus sagrados deveres e foram caridosos com os seus irmãos em sofrimento. Após essas palavras, o confrade Lauro de Oliveira S. Thiago fez a prece.

            Encerrou-se, assim, a existência terrena de D. Yvonne Amaral Pereira, médium dotada de valiosas faculdades, sempre postas a serviço do bem aos seus semelhantes e da Doutrina Espírita, à qual se consagrou com verdadeira devoção e plena consciência do seu imenso alcance.

            "Reformador", em seus números de janeiro e fevereiro de 1982, publicou os "Dados biográficos de Yvonne A. Pereira para a Federação Espírita Brasileira, em revisão feita em 1981, pela própria Autora, de escrito de 1973. Enviamos os nossos leitores, para maiores detalhes, a esse trabalho. Aqui desejamos apenas salientar, como homenagem de sincero afeto e admiração a esse Espírito de escol, os traços fundamentais da sua personalidade e a obra excelente que realizou como médium. Espírito de escol - dizemos - e o justificamos, pois duas coisas que caracterizam a distinção espiritual ela, inegavelmente, tinha: Inteligência e bondade. Não possuía senão a Instrução primária; no entanto, através de grande amor ao estudo e férrea vontade, que a levaram sempre a estudar "sozinha, até duas horas da madrugada", conseguiu adquirir Invejável cultura, conhecimentos literários, filosóficos, históricos, doutrinários, que lhe permitiram produzir obras em que, ao dom descritivo, se unem beleza e correção da linguagem. Escritora espírita de tão apreciáveis recursos, foi D. Yvonne Pereira a autora de dois livros sobre os aspectos da vida no Plano Espiritual, tal como os revelaram os próprios Espíritos, e sobre a mediunidade em si mesma e como, particularmente, ela a experimentou: "Devassando o Invisível" e "Recordações da Mediunidade". São duas obras interessantíssimas, em que o leitor, ao mesmo tempo que se deleita, instrui-se. Escreveu também muitos artigos para jornais do Interior e foi colaboradora de "Reformador", onde muitas vezes apareceu sob o pseudônimo de Frederico Francisco.

            Mas foi, sobretudo, como médium que Yvonne Pereira produziu obras realmente notáveis, entre todas destacando-se "Memórias de um Suicida", devida ao Espírito Camilo Castelo Branco. É obra de inegável valor doutrinário e de apoio e fortalecimento moral a todos que passam por dolorosas provações e expiações nesta vida, ante as quais poderiam ser levados a fraquejar. Além dessa, porém, podem citar-se: "Nas Telas do Infinito", devida aos Espíritos Bezerra de Menezes (Primeira parte) e Camilo Castelo Branco (Segunda parte); "A Tragédia de Santa Maria", devida também ao Espírito Bezerra de Menezes; "Amor e Ódio", ditada pelo Espírito Charles; "Nas Voragens do Pecado", romance mediúnico, como o anterior, mas fazendo parte de uma série de três e ao qual se seguiram "O Drama da Bretanha" e "O Cavaleiro de Numiers", devidos todos ao Espírito Charles; "Dramas da Obsessão", ainda de autoria espiritual de Bezerra de Menezes; "Ressurreição e Vida", belíssima obra devida ao Espírito Léon Tolstoi; e, finalmente, "Sublimação", contos devidos também a Léon Tolstoi (Espírito), com dois capítulos finais do Espírito Charles.

            Sua mediunidade despontou espontaneamente desde a Infância. Aos cinco anos já via os Espíritos e com eles falava, estando a isso de tal modo habituada que lhe era como, coisa natural. Caracterizou-se pela facilidade com que se desdobrava, passando, então, a médium, em estado de emancipação, a ver e a ouvir os Espíritos que, segundo o seu próprio testemunho, lhe apresentavam em quadros vivos as cenas que ela depois teria de descrever nos livros que ía psicografar. Multas vezes caiu em estado cataléptico, letárgico, pela profundidade do desprendimento que a sua modalidade mediúnica lhe proporcionava. Isso ocorreu, Inclusive, na mais tenra Idade, com apenas vinte e nove dias de nascida, escapando de ser sepultada viva, sendo salva pela intuição e a fé maternas, o que constitui fato singularíssimo, ao mesmo tempo que importante e de grande Interesse Instrutivo, mas que não pode ser aqui narrado com a extensão que merece, pelo que enviamos os leitores que ainda não o conheçam ao livro em que a própria médium faz a narrativa: "Recordações da Mediunidade", capítulo 2, pp. 23 e seguintes.

            Nascida em lar espírita, a 24 de dezembro de 1906, num sitio nos arredores da Vila de Santa Tereza, no Município de Valença, Estado do Rio de Janeiro - hoje cidade de Rio das Flores -, desde menina não teve "outra crença senão a espírita".

            Com seus pais, generosos de coração, que abrigavam em seu lar, para os assistir, enfermos e ate mendigos, apesar de não serem ricos, aprendeu a levar vida modesta e conformada com a sua humilde condição social, mas, mesmo assim, a servir com verdadeira caridade os ainda mais necessitados. Recebeu de seu pai, que já no seu tempo fazia reuniões doutrinárias com os filhos semanalmente, "as primeiras lições de Espiritismo e de Evangelho". "Aos doze anos - diz ela - meu pai pôs em minhas mãos "O Evangelho segundo o Espiritismo" e "O Livro dos Espíritos", de Allan Kardec, os quais me acompanharam na travessia da vida e que estudo até agora, sem nunca me cansar da sua leitura. Aos 13 anos, comecei a assistir às sessões práticas de Espiritismo, as quais muito me encantavam, pois eu via os Espíritos se comunicarem, inclusive Bezerra de Menezes e demais assistentes espirituais. Fiz, assim, um grande aprendizado de prática espírita desde a adolescência, o qual muito tem valido aos meus variados desempenhos na seara espírita".

            Como médium psicógrafo trabalhou durante cinquenta anos, desde 1926 até 1980, quase a vida inteira.

            Foi médium receitista durante todo esse tempo e praticou muitas curas espíritas com auxílio de receituário homeopático, bem como através de passes e de preces.

            Foi grande sua atividade com Espíritos obsessores, aos quais dedicava caridosa simpatia e, por isso, captando lhes a confiança, conseguiu muitas curas dos que, por eles, eram obsidiados. Assistiam-na Espíritos da envergadura moral de Bezerra de Menezes, Bittencourt Sampaio, Augusto Silva, Charles e muitos outros. Nesses trabalhos exercia também a mediunidade de incorporação, em sua modalidade psicofônica ou falante. Possuía ainda mediunidade de efeitos físicos e materialização, mas a ela não se dedicou, a conselho mesmo dos seus guias.

            Embora Yvonne Pereira tivesse exercido grande parte de suas atividades mediúnicas e espíritas independentemente e por estímulos próprios, exerceu-as também junto a vários Centros e Instituições espíritas aos quais prestou relevantes serviços, entre os quais podem citar-se: "Centro Espírita de Lavras" (mais tarde "Centro Espírita Augusto Silva" - um dos Espíritos que a assistiam), na cidade de Lavras, em Minas Gerais, o primeiro onde exerceu suas atividades, ainda muito jovem, como Secretária e como médium, responsável pelo "Posto Mediúnico", onde eram tiradas receitas homeopáticas e se processavam os trabalhos de passes e curas espíritas, em geral, dentro de um critério de modéstia e austeridade, sem alarde, e visando apenas à prática da mais pura caridade; "Casa Espírita", de Juiz de Fora, Estado de Minas Gerais, onde foi Secretária, Bibliotecária e Vice-Presidente; "Grêmio Espírita de Beneficência", de Barra do Piraí, no Estado do Rio de Janeiro, em que trabalhou como médium receitista, evangelizadora da infância e expositora da Doutrina; "Centro Espírita Luiz Gonzaga", em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, durante dois anos, em serviço de passes; "União Espírita Suburbana", no Rio de Janeiro, então Guanabara, em serviço de assistência a enfermos obsidiados.

            Não ficam nisso os trabalhos realizados por nossa Irmã, mas o que aí fica dá ideia de quão devotada trabalhadora foi ela da seara espírita, em cujas tarefas encontrava verdadeiro motivo de felicidade. Quem escreve estas linhas teve numerosas oportunidades de sentir isso nas conversas que com ela entretinha, na qualidade de seu médico, ao lado de outros colegas que também a assistiram. Praticando a Medicina de Hahnemann, administrava-lhe medicamentos homeopáticos, conforme seu desejo.

            Sempre a visitávamos em casa de sua Irmã Amália, onde residia, na Piedade. Íamos levar-lhe assistência médica, mas muito também recebíamos, em doação espiritual. Muito nos edificávamos ao constatar o verdadeiro enlevo que ela tinha, quando falava das coisas da nossa Doutrina. Por isso é com emoção que traçamos este registro; ele nos traz ao espírito uma grata lembrança da irmã que encerrou sua existência terrena após vivo testemunho de fidelidade a Jesus, o Mestre Divino.

            Grande foi a prova de D. Yvonne, em suas renúncias e sofrimentos; dolorosa, mas levada com firme decisão e grandeza de alma. Maior ainda foi a sua missão, consolando aflitos, elevando ânimos abatidos, tratando obsidiados e obsessores e, com especialidade, abrindo horizontes de redenção a suicidas, cujos testemunhos alentadores trazia também aos encarnados, ajudando estes a suportar com ânimo os seus fardos, sem desertar jamais dos caminhos da existência, sempre concedida por Deus para o progresso das suas criaturas.

            Paz e felicidade ao Espírito agora liberto é o voto que elevamos a nosso Pai Eterno.      


 Yvonne A. Pereira - sua desencarnação
A Redação - Reformador (FEB) Abril 1984


Do Blog: Yvonne Pereira escreveu inúmeros artigos em ‘Reformador (FEB)’ sob o pseudônimo  ‘Frederico Francisco’. Alguns desses artigos estão presentes neste blog.



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