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sábado, 9 de janeiro de 2016

"Sokrato" de Richet, pelo Rádio

Sócrates bebe a cicuta

             Em 31 de janeiro deste ano (1938), foi irradiada a tragédia em quatro atos, de Charles Richet - "Sokrato" - pela Rádio-Paris, que vem transmitindo regularmente uma peça teatral, em Esperanto, por semana.

            Os estudiosos de Espiritismo conhecem bastante o nome do prof. Charles Richet, sabem da sua bravura na defesa dos médiuns e dos fenômenos espíritas, ao tempo em que esses fenômenos eram sistematicamente negados pela ciência oficial. Alguns lhe conhecem também a fé no futuro do Esperanto e a energia férrea com que defendia a língua internacional contra toda sorte de ataques.       .

            Como médico, metapsiquista, fisiologista, esperantista, o autor de La Grande Espérance é muito conhecido dos leitores do Reformador; talvez não o seja, porém, como poeta e filósofo, qual aparece na tragédia que acaba de ser ouvida por muitos milhares de esperantistas.

            O protagonista da tragédia, Sócrates, nos discursos que faz diante dos juízes e na prisão, expõe nitidamente a doutrina da sobrevivência e da responsabilidade:

            "A morte, para o sábio, é a fonte da vida e os nossos brilhos vaidosos são apenas andrajos, quando do além-túmulo se esperam os raios luminosos. Eis por que não sinto cólera, estou sem ódio algum. Mesmo com suas culpas, amo a Atenas. Se os juízes me puderam levar à morte, não puderam, porém, gerar em mim um sentimento Indigno. Passageiro de um dia pela terra em que estamos, sinto imensa piedade pelos erros dos homens."

            "A morte é somente uma passagem, terrível para o mau; libertadora para o sábio.

            "As almas têm seus destinos secretos; a alma do justo, como a do ímpio. Mas, um ritmo profundo governa o mundo e seria quebrada esta imensa harmonia, se um ficasse sem punição e o outro sem recompensa."

            Belíssimo ensinamento sobre a ilusão do prazer vem no apólogo feito para o carcereiro, no momento da execução. São versos e só um poeta poderá traduzi-los. Vamos limitar-nos a resumir o pensamento:

            "Quando foi aberta a caixa dos bens e dos males destlnados aos homens, todo o seu conteúdo voou para o céu. Só ficou uma coisa - a Esperança. Ricamente vestido, o Prazer subiu para o Olimpo, onde foi festejado, amado, sempre bem recebido, até divinizado! - Mas, bem cedo se descobriu o erro a que induzira o brilho desse desconhecido. Arrogante, falando alto, imperioso, de tudo se apropriando, queria tudo governar. De dia, de noite, à mesa, no leito, ruidoso se fazia ouvir. O tinir dos seus guizos, porém, expulsava do coração a paz serena e implantava a maldição e a tristeza. Por Isso, Zeus o expulsa do Olimpo, projetando-o na terra.

            "Na queda perde ele o luxuoso manto que é encontrado pela Dor, desdentada e feia, sempre repelida e detestada. Vestindo com o belo manto do Prazer a sua repelente carcaça, a Dor orgulhosamente se fez receber até nos luxuosos palácios, porque os homens, seduzidos pelo manto, julgam ver o Prazer e recebem a Dor."

            No momento da execução, quando o Espírito fala pela última vez a Sócrates, manda-o contemplar quadros futuros que se preparam: O martírio de Jesus, os tormentos da Inquisição. 'Sócrates interroga quem são os que tanto sofrem e o Espírito responde: "São os teus irmãos, Sócrates!"

            Durante o julgamento, Sócrates procura esclarecer que a ciência do seu tempo é muito incompleta e não pode encerrar o universo em seus livros. Explica que outros virão revelar domínios desconhecidos e nunca cometerão a loucura de traçar limites humanos ao Universo; mas, seu discurso é tachado de herético e interrompido pelos juízes. Não estão dispostos a ouvir coisas insensatas. Ele próprio confessou que conversa com um Espírito e as leis, os livros e os padres não permitem isso!

            Ordenam aos guardas que retirem o réu e passam logo a votar a sentença.

            A votação é a mais desarmônica: uns votam pela libertação, outros pelo exílio, outros pelo encarceramento e a maioria dos juízes pela morte. Não há convicção alguma. Reina absoluta inconsciência, irresponsabilidade completa no julgamento.
(Transcrito de "Reformador", de maio de 1938, pp. 136 e 137.)

"Sokrato" de Richet, pelo Rádio
Ismael Gomes Braga

Reformador (FEB) Maio 1976


Ismael Gomes Braga

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