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terça-feira, 19 de abril de 2011

A Mediunidade de Chico Xavier e a Crítica


A mediunidade de Chico Xavier e a Crítica
por  Sylvio Brito Soares
Reformador (FEB) Setembro 1967

            “Ao comemorarem agora, os quarenta anos ininterruptos de trabalhos mediúnicos de Francisco Cândido Xavier, acreditamos seria interessante lembrar uma crítica então feita no tocante a supostas inverdades contidas no romance escrito mediunicamente pelo Espírito de Emmanuel, e intitulado “Há dois mil anos...”

            Resumia-se essa crítica no fato de que jamais existiu Públio Lêntulus, uma das encarnações de Emmanuel, e que, portanto, jamais poderia ter sido ele ‘governador da Judéia’, ao tempo de Jesus.

            Foramos, na época, entrevistado a respeito pelo redator de um vespertino desta Capital, quando, então, tivemos ensejo de lhe prestar os seguintes esclarecimentos: Quem lê “Há Dois Mil Anos...”[1], verifica que, nesse romance, não há qualquer referência a Publio Lêntulus como governador da Judéia. É que o crítico ouviu cantar o galo, sem, entretanto, saber onde.

            Foi Públio Lêntulus, de fato, senador romano, mas, por motivos de ordem particular, viveu longos anos na Palestina. César, para justificar sua ausência de Roma, confiara-lhe missão especial, talvez de caráter reservado, permitindo-lhe, assim, direito à percepção de subsídios.

            Consta mesmo do relato de Emmanuel que Públio Lêntulus escrevera longa carta a um amigo seu residente na Capital dos Césares, com vistas ao Senado Romano, sobre a personalidade de Jesus, encarando-a serenamente, sob o restrito ponto de vista humano, sem nenhum arrebatamento sentimental.

            Por ocasião da célebre Páscoa do ano de 33, encontrava-se Públio Lêntulus em Jerusalém, quando Pôncio Pilatos, embaraçado com o julgamento de Jesus, solicitara ao Senador o obséquio da sua presença no palácio do governo provincial, a fim de solucionar um caso de consciência.

            Públio Lêntulus estava, pois, investido de amplos poderes, na qualidade de emissário de César e do próprio Senado; a ele, portanto, todas as autoridades da província, inclusive o próprio governador, eram obrigadas a prestar obediência.

            Até aqui, evidentemente, utilizamo-nos, apenas, dos subsídios históricos contidos no livro “Há dois mil Anos...”.

            Agora, preciso se faz esclareçamos que, durante os primeiros séculos do Cristianismo, os Pais da Igreja viviam desejosos, como era natural, de conhecer o retrato físico de Jesus. As informações que então colheram não foram satisfatórias, por imprecisas.

            Apelaram, por isso, para as profecias, e, mal interpretando o verdadeiro sentido do versículo 2 do capítulo LIII [2] de Isaías, concluíram eles ser Jesus completamente destituído de beleza física.

Na opinião de Celso [3], era Jesus de pequena estatura, feio e disforme.

Santo Agostinho [4] confessava: “Como seria o seu rosto, ignoramo-lo inteiramente.”

E diz Daniel-Rops [5] que, se tivermos em conta o rigor com que a ortodoxia judaica proscrevia qualquer representação da figura humana, pouco nos deve surpreender o fato de não poder ser encontrado o retrato autêntico de Jesus. E esperar-se das verdadeiras testemunhas - dos evangelistas - que nos descrevessem a aparência carnal do Mestre, é estar equivocado, tanto a respeito da psicologia deles como dos seus objetivos: não será significativo que a única descrição de Jesus, que se encontra nos quatro textos, é a do Cristo glorificado, no momento da Tranfiguração?
            Nestas condições, parece bastante inútil pretender retomar uma discussão que animou extraordinariamente a Igreja, sobretudo nos primeiros séculos, para saber se Jesus teria sido belo ou feio.

Ao passo...

que Justino, o Mártir [6], o diz ‘sem aparência, sem beleza e com aspecto desprezível;

que Irineu [7] (o mesmo que declarava ‘ignorada’ a imagem carnal de Jesus-Cristo) o classificava de ‘enfezado’;

que Orígenes [8] o tinha por ‘pequeno e sem graça’;

que Cômodo [9] fazia dele ‘uma espécie de escravo’, de figura abjeta’;

que certas lendas, mesmo, o davam como leproso, -

outros comentadores, pelo contrário, pronunciavam-se firmemente pela sua beleza, tais como

Gregório de Nissa [10],

João Crisóstomo [11],

Ambrósio[12],

Jerônimo e tantos outros.       
           
Clemente de Alexandria [13] exprimia, no entanto, uma profunda verdade, ao escrever:

 ‘Para nós que desejamos a verdadeira beleza, só o Salvador é belo’ e,

sob uma forma paradoxal, os apócrifos ‘Atos de Pedro’ [14] queriam, sem dúvida, dizer a mesma coisa: ‘era ao mesmo tempo belo e horrendo’. A verdade é que as duas teses procuravam dar força aos vaticínios da Escritura.

            Segundo consta do ‘Dictionnaire de la Bible’, de Vigouroux, teve início, em terras egípcias, uma forte reação no tocante ao físico de Jesus, tanto assim que a partir do século IV a crença de que Nosso Senhor fora o mais belo dos filhos dos homens tornou-se predominante.

            Mas, a bem dizer, faltava um documento autêntico, capaz de firmar, entre os cristãos latinos, a certeza de que o físico de Jesus não era, absolutamente, o então revelado por esses Pais da Igreja. Daí, sem dúvida, o haver surgido a idéias de forjarem a célebre carta conhecida como  ‘Epistola Lentuli’, e isto por saberem, naturalmente, que o senador Públio Lêntulus se encontrava na Ásia Menor na época em que Jesus fora crucificado.

            Note-se que essa carta continha inicialmente apenas a assinatura de Públio Lêntulus; mas, diz Vigouroux, sacerdote de Saint-Suplice, em seu aludido ‘Dictionnaire’, que os copistas, ignorando qual o título a darem ao suposto autor dessa ‘Epístola’, resolveram, sponte sua, colocar, uns, o procônsul, enquanto outros o de governador. E é perfeitamente explicável usassem esses copistas, naqueles tempos e indistintamente, tanto procônsul como governador, por serem tais palavras de sentido equivalente.

            Se consultarmos o Vocabulário Histórico-Geográfico dos Romances de Emmanuel’, de autoria de Roberto Macedo, vamos saber que procônsul quer dizer Propretor: governador de província romana, escolhido pelo Senado dentre cônsules e pretores. 

            De maneira que foi a própria Igreja que, de maneira apócrifa, declarou ter sido Públio Lêntulus governador da Judéia.

            Para o que acabamos de expender, servimo-nos das seguintes obras:
The Catholic Encyclopedia, sob os auspícios de The Knights of Columbus; Catholic Truth Comittee (Nova York); Enciclopedia Europeo-Americana, editores - Hijos de J. Espasa, Barcelona; La Grande Encyclopédie, editores H. Lamiraut & Cie., Paris; Dicitionnaire de La Bible, de Vidouroux; Jesus no seu Tempo, de Daniel Rops.

            Disse alguém que ‘há críticas e mesmo censuras que honram mais do que os elogios’. Assim, as críticas ao “Há dois mil anos...” serviram para mais realçar essa obra de indispensável valor literário e histórico, e também para evidenciar a refulgência do seu autor espiritual e a magnífica mediunidade de um Francisco Cândido Xavier.”


[1] Copyright 1939

[2] Is 53:2 ‘Cresceu diante dele como um pobre rebento enraizado numa terra árida; não tinha graça nem beleza para atrair nossos olhares, e seu aspecto não podia seduzir-nos.’

[3] Celso, o pagão (filósofo)~145 – 225  Filósofo erudito pagão de origem judia, que se colocou em defesa da religião vigente e que mais tarde viria a ser dita pagã. Escreveu Alezés lógos, ou Sermão verdadeiro (178), em que expôs sobre a religião pagã e sua reação ao messianismo judaico e cristão, tentando desacreditar a fé bíblica afirmando "A raíz do cristianismo é sua excessiva valorização da alma humana, e a idéia absurda de que Deus se interessa pelo homem". Infelizmente o prevalecimento posterior do cristianismo fez desaparecer o livro e o documento não foi conservado. A resposta do patrístico do cristianismo primitivo Origenes (185-253) se fez tardiamente (245-250), sob o título Katá Celsou (Contra Celso), em 8 partes, seguindo passo a passo ao texto. Fonte: Wikipédia.

[4] Agostinho de Hipona ou  Santo Agostinho (Tagaste, 13 de Novembro de 354-Hipona, 28 de Agosto de 430) foi um bispo, escritor, teólogo, filósofo, pai e Doutor da igreja católica. Agostinho é uma das figuras mais importantes no desenvolvimento docristianismo no Ocidente. Agostinho foi muito influenciado pelo neoplatonismo de Plotino. Ele aprofundou o conceito de pecado original dos padres anteriores e, quando o Império Romano do Ocidente começou a se desintegrar, desenvolveu o conceito de Igreja como a cidade espiritual de Deus (em um livro de mesmo nome), distinta da cidade material do homem Seu pensamento influenciou profundamente a visão do homem medieval. A igreja se identificou com o conceito de Cidade de Deus de Agostinho, e também a comunidade que era devota de Deus. Agostinho nasceu na cidade de Tagaste atual Souk Ahras, Argélia, e sua mãe, cristã, se chamava Mônica. Foi educado no Norte da África e resistiu aos pedidos da mãe para se tornar cristão. Vivendo como um intelectual "pagão", ele tomou uma concubina e se tornou um maniqueísta. Posteriormente se converteu para a Igreja Cristã, se tornou um bispo, e se opôs às "heresias", como a crença que as pessoas possuem a habilidade de escolher fazer um bem tão forte que poderia merecer a salvação sem receber a ajuda divina (pelagianismo). Fonte: Wikipédia

[5] Henri Daniel-Rops (Épinal, 19 de Janeiro de 1901 - Aix-les-Bains, 27 de Julho de 1965). Escritor e historiador francês. Seu nome verdadeiro era Henri Petiot. Fonte: Wikipédia

[6] Justino, também conhecido como Justino Mártir (100-165) foi um teólogo do século II.  Seu lugar de nascimento foi Flávia Neápolis, na Síria-Palestina, ou Samaria. Fonte: Wikipédia

[7] Ireneu de Lião, (ca. 130 — 202) foi um Padre da Igreja, teólogo e escritor cristão que nasceu, segundo se crê, na província romana da Ásia Proconsular - a parte mais ocidental da atual Turquia - provavelmente Esmirna. Fonte: Wikipédia

[8] Orígenes de Alexandria ou Orígenes de Cesaréia ou ainda Orígenes o Cristão (Alexandria, Egito c. 185- Cesaréia ou mais provavelmente Tiro, 253 d.C.) foi um teólogo, filósofo neoplatonístico patrístico. Um dos mais distintos pupilos de Amônio Sacas. Orígenes foi um prolífico escritor cristão, de grande erudição, ligado á Escola de Alexandria, no período pré-niceno.

Inspirados em Orígenes e na Escola de Alexandria, muitos escritores cristãos desenvolveram suas obras: Sexto Júlio Africano; Dionísio de Alexandria, o Grande; Gregório Taumaturgo, Firmiliano, bispo de Cesaréia (Capadócia); Teognosto, Pedro de Alexandria, Pânfilo e Hesíquio. Fonte: Wikipédia

[9] Cômodo Lúcio Aurélio Cómodo (português europeu) ou Cômodo (português brasileiro) Antonino (em latim: Marcus Aurelius Commodus Antoninus; Lanúvio, 31 de Agosto, 161 - Roma, 31 de Dezembro, 192) foi um imperador romano que governou de 180 a 192.  É frequentemente citado como tendo sido um dos piores imperadores romanos, tendo o seu reinado marcado o final da chamada era dos Cinco bons imperadores. Fonte: Wikipédia

[10] Gregório de Nissa (Cesaréia, Capadócia:330 -395): Teólogo, místico e escritor cristão. Padre da Igreja e irmão de Basílio Magno, faz parte, com este e com Gregório Nazianzeno, dos assim denominados Padres Capadócios. Fonte: Wikipédia

[11] João Crisóstomo, (349, Antioquia da Síria, hoje Antakya, no sul da Turquia - 14 de Setembro de 407) foi um teólogo e escritor cristão, Patriarca de Constantinopla no fim do século IV e início do V. Sua deposição em 404 produziu uma crise entre a Santa Sé e a Sé Patriarcal. Pela sua inflamada retórica, ficou conhecido como Crisóstomo (que em grego significa «boca de ouro»). Fonte: Wikipédia

[12] Ambrósio de Milão (Trier, Alemanha 340 - 4 de abril de 397),  foi bispo da atual Arquidiocese de Milão, e é considerado um dos Pais da Igreja. Foi ele quem ministrou o batismo a Agostinho de Hipona. É considerado um dos quatro máximos doutores da Igreja, aprendeu de Orígenes a conhecer e a comentar a Bíblia. Fonte: Wikipédia

[13] Clemente de Alexandria ou Tito Flávio Clemente (Atenas (?), c. 150 - Palestina, 215) foi um escritor, teólogo cristão grego nascido em Atenas. Pesquisou as lendas menos compatíveis com os valores cristãos. Sua abertura a fontes familiares aos não cristãos ajudou a tornar o cristianismo mais aceitável para muitos deles. Clemente foi um erudito numa época em que os cristãos eram geralmente pouco letrados e abertamente hostis a intelectuais. Fonte: Wikipédia

[14] Atos de Pedro - O texto datado do 2º século, é constituído de uma alegoria inicial, semelhante à descrita no Evangelho de Mateus, do negociante de pérolas (Mateus 13:44ss.) mas que aqui está vendendo uma pérola de grande valor. O negociante é evitado pelos ricos, mas os pobres vão a ele em grande quantidade, e descobrem que a pérola está guardada na cidade natal do negociante, "Nove Portões", e aqueles que quiserem a pérola deverão empreender a dura viagem até Nove Portões. O nome do negociante é Lithargoel, que traduzido é pérola, ou seja, o próprio negociante é a pérola. Por fim, o negociante se revela como sendo o próprio Jesus.




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