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segunda-feira, 18 de novembro de 2019

O Protestantismo e o Espiritismo - Parte 6






28    “O Protestantismo e o Espiritismo”
por  Benedito A. da Fonseca
Edição da Federação Espírita Brasileira    1941

                                                                                  
CAPITULO III


Foi Samuel mesmo, por ordem de Deus, o Espírito que se comunicou com Saul;
 não foi nenhum enviado de Satanás.
(Página 10 do folheto da Califórnia).



VOLTEMOS AO CASO DA MÉDIUM DE ENDOR

            Segundo as palavras acima, do folheto protestante, houve a comunicação de um Santo por intermédio da pitonisa.
            No capítulo XXVIII de I Samuel ou Reis, que descreve este fato, não se vê nem sortilégio nem adivinhação, nem magia, nem feitiçaria. Aquele foi um fato comum, tanto pode comunicar-se um Espírito bom, como pode igualmente se comunicar Espírito mau. A identidade poder-se-á verificar pelos seus discursos, pelas maneiras com que se apresentam, do mesmo modo que se pode avaliar o adiantamento moral e intelectual de um indivíduo desconhecido, que pela primeira vez fala conosco: seus sentimentos interiores se revelam por sua compostura, gestos e palavras.
            Saul estava familiarizado com Samuel, que, antes de morrer era um médium; ele sempre consultava aos enviados do Senhor por intermédio de Samuel (I Samuel, IX: 9 e versículos 18 e 19). Os profetas não querendo atende-lo, e devido à sua perturbação, não podendo receber comunicações por sonhos, desejando falar com Samuel, procurou a mulher de Endor, na certeza de obter uma revelação como todas as que haviam sido trazidas anteriormente, da parte de Deus, pelo seu médium de confiança, isto é, por Samuel.
            A sentença que Samuel pronunciou contra Saul não foi causada pela evocação de Espírito, pela pitonisa, nem por adivinhação, nem por encantamento, nem por ter feito passar a seu filho pelo fogo, porque, nada disso houve. A causa da sentença foi a sua desobediência aos conselhos dados por boca do próprio Samuel antes da sua morte. (Cap, XXVIII 17). Os exércitos dos seus inimigos guerreiros, (filisteus) nada poderiam fazer contra ele, se ele tivesse preenchido todos os requisitos do verdadeiro crente, servo do Altíssimo, e se tivesse posto em prática as determinações do Senhor, nada lhe aconteceria; os exércitos dos filisteus seriam derrotados, segundo estas palavras:
            "Mil cairão ao teu lado e dez mil à tua direita - mas não chegarão a ti". (Salmos, XCI: 7). A causa da derrota de Saul foi, pois, a sua desobediência: ele mesmo conquistou a sua situação penosa diante dos filisteus, que fatalmente iam sair triunfantes.
            O fato de lhe haver dito o Espírito de Samuel "Porque me desinquietaste fazendo-me subir, isto é - chamando-me pelo pensamento e pela vontade - por que a mim me perguntas, visto que o Senhor te tem desamparado e se tem feito teu inimigo? Tu não deste ouvidos à voz do Senhor, não executaste conforme foi ordenado; desobedeceste a Deus, atraíste o mal para ti, por isso o teu reino passará às mãos de outro". Com estas palavras quis Samuel dizer que Saul tendo desobedecido ao Senhor e chamado a si um grande mal, perdeu o auxílio dos exércitos invisíveis e fatalmente teria de ser derrotado e morto às mãos dos guerreiros. Samuel queria poupar-lhe o desgosto e não desejava anunciar-lhe previamente o que lhe ia suceder. Outros médiuns não recebiam nenhum Espírito do Senhor para responder aos desígnios de Deus, não queriam causar um tremendo choque a Saul, que já se achava em grande angústia e estavam deixando que se realizassem os sucessos provocados ou causados pelo seu abuso ou incúria; porém, como Saul insistisse, deixando de consultar os profetas, (médiuns oficiais) porque tinha já perdido a confiança e também a esperança, foi procurar a pitonisa, (médium perseguido pela lei), porque bem sabia que Samuel podia lhe falar por profetas, homens, como por profetisas mulheres. Samuel lhe censurou o procedimento: "Por que insistes, teimando em querer saber antecipadamente o que tem de acontecer? Por que, pois, a mim me perguntas se o Senhor te há desamparado e feito teu inimigo? Pois bem, visto que insistes e queres forçosamente saber, vou dizer-te.
            Eu bem queria poupar-te este desgosto, este choque violento, esta sentença causada pela tua própria culpa:
            Como tu não deste ouvidos à voz do Senhor, por isso Ele fez isto: Entregará também Israel contigo nas mãos do filisteus e amanhã tu e teus filhos estareis comigo e o arraial de Israel o Senhor entregará nas mãos dos filisteus". (XXVIII: 19). I Livro de Samuel ou Reis - vulgata.


29   “O Protestantismo e o Espiritismo”
por  Benedito A. da Fonseca
Edição da Federação Espírita Brasileira    1941

                                                                                          
CAPITULO IV

            Não se tem entregado a tais práticas senão homens maus e que todas as pessoas “tementes” a Deus as tem evitado cuidadosamente por serem de procedência satânica.”.
(4ª afirmação do folheto).


            Esta afirmação destrói as provas que o seu autor apresenta e contradiz todas as outras afirmações da página segunda.
            O leitor, que compare as teses dos II e III capítulos deste apêndice e raciocine sobre elas.
            Se as comunicações espiritas só são recebidas em congregações de pessoas más, como é que o Espírito de Samuel, enviado por Deus, atendeu à vontade de Saul?
            Examinemos o caráter e o procedimento da mulher de Endor, tão errônea e injustamente apelidada feiticeira, e vejamos pelo mesmo testemunho bíblico se ela era uma criatura rebelde, má, desobediente às leis emanadas do governo civil, e se faltava com a caridade; enfim, se procedia com malvadez ou malevolência; e vejamos também o procedimento de Saul, se era leal e sincero, se se submetia aos rigores da lei por ele mesmo sancionada, ponhamos na balança da razão e do bom senso o caráter moral de Saul e o da mulher de Endor, para vermos entre essas duas entidades qual a mais obediente e que melhor procedia, de acordo com uma consciência pura.
            1º) A mulher estava em sua casa e não chamou ninguém para juntos fazerem sessão espírita; não estava promovendo prática nenhuma de encantamento, feitiçaria ou adivinhação.
            2º) Quando lhe pediram uma concentração mediúnica, respondeu: "Eis aqui, tu sabes o que Saul fez, como tem destruído da terra os adivinhos e os encantadores, por que pois me armas um laço à minha vida para me fazer matar?" (versículo 9).
            3º) A mulher vendo Saul perturbado, abatido e fraco, porque não tinha comido pão todo aquele dia e toda aquela noite, disse-lhe: "Agora, pois, ouve também tu as palavras da tua serva, e porei um bocado de pão diante de ti, e come para que tenhas forças para te pores a caminho" (vers. 22).
           Consideremos que:
            a) a mulher não cometia abominações ao Senhor, e se fez a concentração mediúnica fê-la a pedido e insistência dos visitantes noturnos, (vers. 8).
            b) chamou a atenção dos visitantes, que queriam consultar espíritos, para o perigo que havia contra a sua vida, por causa da lei decretada pelos perseguidores dos médiuns. (vers. 9).
            c) matou um novilho, fez pães e preparou um jantar com o qual restaurou as forças perdidas, pelo abatimento moral e físico em que estava o seu hóspede real, alimentando também aos criados que acompanhavam o real visitante. (vers. 24-25).
             Analisemos agora o de Saul:
            1º) Ele havia decretado a deportação de todos os médiuns existentes no seu reino. (vers. 3).
            2º) entretanto, fugindo ao cumprimento da sua mesma lei, (que era uma lei iníqua contra a liberdade individual) mandou aos seus criados procurar uma mulher que consultasse Espírito familiar, e estes lhe indicaram uma mulher que habitava a cidade de Endor. (vers. 7).
            3º) Para mais facilmente enganar a mulher, ele despiu a vestimenta real e disfarçou-se, vestindo-se como qualquer burguês e assim, de noite, foi com seus criados a Endor, em busca da pitonisa para solicitar os serviços das suas faculdades mediúnicas, a fim de poder conversar com um amigo falecido, um santo em quem depositava a sua confiança. (vers. 8).

            Consideremos que:

            a) Saul cheio de remorsos, reconhecendo a injustiça da sua lei, que classificava os médiuns como réus dignos de desterro e morte, viu-se na necessidade de procurar uma pessoa por ele antes desprezada e perseguida.

            b) não foi sincero, porque tentou enganar a mulher, apresentando-se como um homem vulgar (1).

            (1) O Senhor Ernesto de Oliveira mandou um repórter com cara compungida, pedir a um Centro Espírita, remédio para curar um doente inexistente, Página 12 do folheto do Sr. Antônio Ernesto.
           
            c) quando a mulher lhe disse: "Eis aqui o que Saul tem feito, como tem desterrado as pessoas que consultam Espíritos familiares; por que pois, me armas um laço contra a minha vida para me fazer matar?"  Saul persistiu em ocultar a sua verdadeira identidade, conservando o orgulho e hipocrisia, com intenção espiritualmente criminosa de não se fazer conhecer por uma mulher sem nome, pobre, desprezada e perseguida.

30    “O Protestantismo e o Espiritismo”
por  Benedito A. da Fonseca
Edição da Federação Espírita Brasileira    1941

            Mal sabia Saul que a mulher possuía também a faculdade mediúnica da vidência perfeitamente desenvolvida, e ia desabotoar do seu rosto a máscara da hipocrisia, pondo à mostra a sua verdadeira identidade.
            Depois de um juramento solene:
            "Vive o Senhor, que nenhum mal te sobrevirá por isso", (versículo 10) (1) a mulher consentiu em prestar o favor solicitado.

            (1 ) Nenhum mal te sobrevirá por isso. É preciso notar que Saul sabia que o exercício da mediunidade para fins úteis e religiosos não constituía crime contra as leis civis e divinas; e as proibições eram violências arbitrárias.

            Quando ele lhe disse: "Faze-me subir a Samuel", a mulher gritou em alta voz, porque viu o Espirito de Samuel, que lhe contou imediatamente que aquele homem era o mesmo Saul disfarçado em burguês, o homem que contrariava as leis de Deus.
            "Não temas" lhe diz Saul, porém, que vês? (A mulher via Saul, porém este nada via e confiava no que lhe ela dizia; não supunha que fosse uma invenção sua: ela era um médium de confiança).
            "Vejo deuses que sobem da terra".
            Via o Espírito de Samuel luminoso, resplandecente, acompanhado de numerosa milícia de Espíritos felizes, que seguia o profeta.
            "Como é a sua figura?” - perguntou-lhe Saul:
            - "Vem subindo um ancião e este está envolto em uma capa" - respondeu-lhe a mulher.
            Entendendo Saul que era de fato Samuel, inclinou-se com o rosto em terra e se prostrou. (versículos 11-14).
            Temos lido nestes versículos os característicos de uma pessoa humilde e fiel, possuidora de extraordinária mediunidade, que serviu de instrumento, como intérprete de Deus, para transmitir as palavras vindas do espaço invisível, e também para ver a entidade que transmitia essas palavras, isto é - Samuel desencarnado.
            Saul confiou nesta mulher e não duvidou da sua honestidade; creu na veracidade das suas palavras.
            Ele estava familiarizado com as sessões espíritas e as havia já assistido, muitas, presididas pelo próprio profeta Samuel, antes da sua desencarnação. (I Samuel, XIX: 20-21).
            Está provada biblicamente a honestidade da mulher de Endor: a obediência às leis do seu governo, a sua fidelidade como humilde súdita do rei. E está igualmente provada a severidade da lei bárbara: o decreto da pena de morte, que era contrária à lei de Deus: - "Não matarás" - e todo o mundo conhecia essa lei, porque, certamente, tinham já matado muitos médiuns; prova a costumada malvadez assassina do rei iníquo: a mulher supondo ser qualquer pessoa de longe, sem saber que era Saul mesmo, disse: "Tu sabes o que faz Saul", portanto, todos os habitantes do reino sabiam das matanças dos médiuns em consequência daquele decreto assassino, (Levítico, XX: 27) e temos averiguado também o caráter moral de Saul em completo antagonismo com o da pitonisa.
            Demonstrei a obediência, a humildade, a fidelidade e a utilidade da mulher de Endor. Agora vou provar também a sua caridade e a bondade do seu coração e o amor do próximo, que ela mostrou pelo seu procedimento.
            Saul não se tinha alimentado todo aquele dia e toda a noite; estava fraco e perturbado com a notícia que recebeu da sua condenação, tomou um grande susto e caiu estendido, no chão. (vers. 20). A pitonisa condoeu-se da sua perturbação, do triste estado da sua alma angustiada, teve compaixão dele vendo o seu profundo abatimento, pediu-lhe que aceitasse pão e carne que lhe ela oferecia e que ele quis recusar, ainda por orgulho, e por fim aceitou. Ela, contente pela oportunidade que Deus lhe deu de praticar a caridade, alegremente dava louvores ao Criador por ter sido útil, matando a fome a Saul e aos criados que o acompanhavam. (vers. 21 a 25).

            Esta mulher possuía um coração sensível aos sofrimentos de outrem; pagava com o bem o mal que lhe faziam os seus perseguidores. (S. Mateus, V: 44). Provou-o dando comida ao rei perseguidor, vencido, condenado e humilhado.
            Eis aí a prova, segundo o próprio testemunho bíblico, de que não são os homens maus ou mulheres más, que se entregam às práticas do Espiritismo!
            Maus não serão, porventura, os que os perseguem, maltratam, caluniam e maldizem? Não serão os herdeiros do caráter e dos sentimentos do coração de Saul, rei de Israel, que, imitando os seus atos de outrora, cometem tais iniquidades, nesta atualidade?
            O próprio testemunho bíblico destrói a falsa afirmação protestante e demonstra quais são hoje os imitadores do rei Saul!
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            Só não veem os que não têm olhos...


31    “O Protestantismo e o Espiritismo”
por  Benedito A. da Fonseca
Edição da Federação Espírita Brasileira    1941


CAPITULO V

Que estas comunicações são abomináveis a Deus e proibidas por Ele, e que, consequentemente, os espíritos com quem se tem relações,
 não podem ser senão demônios.
(2ª  Afirmação do folheto).

             Há um fato universalmente conhecido, que o protestantismo tem glosado em todos os tons, censurando, comentando e lançando ao ridículo, formulando em torno dele objeções apimentadas contra o clero católico-romano.
            Este fato é o acontecimento de Ruão, em 23 de Maio de 1431: a carbonização de Joana d'Arc, nascida em Domremy, na Lorena, em 1412, apelidada a Donzela de Orleans, condenada e executada por ordem de um bispo católico-romano, com o consentimento do clero (1).

            (1) João Calvino, o fanático reformador protestante, mandou queimar vivo, em Genebra, no dia 26 de Outubro de 1553, ao teólogo-médico Miguel Servet.

            O protestantismo pergunta: "Quando é que a igreja fala a verdade; quando queimou Joana d'Arc por feiticeira e herética, ou quando canonizou-a como Santa?" (1)

            (1) 18 de Abril de 1909.

            A igreja romana queimou o corpo da virgem de Orleans e depois, mais tarde, reconhecendo o crime que havia praticado, apresentou-a como candidata a dois títulos: sujeitou-a a um rigoroso exame, que durou muito tempo, e há pouco passou-lhe um diploma de santa e uma patente de padroeira da França!
            Bela figura fez o clero!
            Realmente, o protestantismo tem razão:
            São fatos históricos que colocam o clero em posição desagradável, destruindo por completo a sua pretensa infalibilidade (2).

            (2) Joana d'Arc, médium de todas as faculdades, cumpriu a missão que Deus lhe havia confiado, conforme nos relata a História; , era já, portanto uma santa antes da igreja queimá-la viva, e não o ficou sendo só depois que lhe benzeram a estátua de barro! Jayme de Seguier. (Dicionário prático ilustrado. W. M. Jackson - Enciclopédia Internacional.

            Agora, neste caso da sessão espírita de Endor, o protestantismo está procedendo da mesma maneira que o romanismo para com a donzela queimada viva em Ruão (3).

            (3) O argueiro no olho do vizinho!... .

            A transcrição que fiz das páginas 10-11 do folheto protestante e que serve de epigrafe ao II Capítulo deste apêndice, está em completo antagonismo com a segunda afirmação do mesmo folheto, cujas palavras servem de título a este capítulo V.
            Diz esta que as comunicações espíritas são abomináveis a Deus e proibidas por Ele e que, consequentemente, não podem ser senão demoníacas.
            Assim são todas as afirmações protestantes. Mas o protestantismo afirma também, no mesmo folheto, que realmente foi Samuel comissionado por Deus mesmo, que deu a Saul a mensagem, por intermédio do aludido médium e acrescenta ainda mais, que não era nenhum enviado de Satanás e sim o próprio Espírito de Samuel que veio executar o desígnio de Deus.
            Agora perguntamos nós: Quando é que o protestantismo fala a verdade?
            São somente os demônios que se comunicam pelos médiuns, ou podem comunicar-se também os santos?
            Quando afirmam e quando negam?

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            Deixemos os protestantes pensando no que hão inventar para harmonizar as suas ideias heterogêneas e passemos a falar ainda do caso de Saul. 



 32   “O Protestantismo e o Espiritismo”
por  Benedito A. da Fonseca
Edição da Federação Espírita Brasileira    1941



            O folheto do Sr. Antônio Ernesto diz que os resultados das sessões espiritas são sempre maus e prejudiciais, tanto assim, que por sinal, a de Endor foi a causa do suicídio de Saul.
            Enquanto estamos tratando deste assunto, examinemos os atos de Saul, como ele tratava os súditos e como cumpria os seus deveres para com Deus e o próximo, a fim de, inequivocamente, sabermos a causa do seu suicídio.
            Saul, filho de Kis, nasceu na tribo de Benjamim, (uma das doze da Palestina) pelo ano 1115 antes do Cristo, foi designado aos hebreus por intermédio do profeta Samuel, (I Samuel, IX: 15-16-17) fortaleceu a realeza nascente libertando a cidade de Jabes Galaad, sitiada pelos amonitas; derrotou os moabitas e os edomitas, os sírios, os filisteus e os amalecitas. Sua capital, segundo dados históricos, parece ter sido a cidade de Galgala ou Gilgal.
            Sete filhos: Jonathan, Abinadab, Melchisna, Jessui, Esbaal, Armoni e Mefiboseth, pareciam assegurar o futuro da sua dinastia, mas Deus não tardou a rejeitá-lo por causa das suas frequentes desobediências às ordens que Ele encarregava Samuel de lhe transmitir, pelo que Samuel, por ordem de Deus, censurou por diversas vezes o seu procedimento incorreto, até reprovando as hipócritas orações que fazia ao Senhor. (I Samuel, XIII: 10-14).

            Dentre as principais causas das severas censuras de Samuel, destacam-se os seguintes atos de Saul.
            1º) Proibiu o povo de se alimentar um dia, a fim de exercer vingança, declarando maldito todo o homem que comesse naquele dia. (I Samuel, XIV: 24). 
            Jonathan, seu filho, reprovou tal maldição. (vers. 29).
            2º) Condenou seu filho à morte, pelo fato de haver chupado um pouco de mel. (vers. 43).
            O povo revoltou-se contra Saul e impediu a execução de Jonathan, em recompensa ao bem que tinha feito, libertando Israel das mãos dos inimigos.
            3º) Roubou descaradamente os despojos: vacas, ovelhas e cordeiros dos amalecitas vencidos na guerra. (I Samuel, XV: 9 e versículos 19-29).
            Daí por diante, os maus Espíritos começaram a atormentar Saul. (Cap. XVI: 14).
            Ele mesmo os atraía pela sua inveja, pela sua raiva e desejos de vingança; e por isso, perdeu a amizade dos bons Espíritos que lhe assistiam, a confiança de Samuel e a proteção de Deus.
            4º) Uma série de delitos praticou Saul, tentando matar a Davi, seu sucessor no reino, ungido rei pela autoridade de Samuel, por ordem de Deus.
            Saul percebeu que sua filha Michal amava a Davi, fingiu-se lhe amigo e para mais facilmente armar um laço contra a sua vida, consentiu em aceitá-lo como genro, para depois de realizado o casamento mandar assassinar o esposo da filha (I Samuel, XVIII: 17-19-20-21).
            Neste capítulo se vê em Saul o tipo do traidor e por isso, como médium que era, (1) atraiu Espíritos maus que se apoderavam dele e falavam por sua boca, e por duas vezes tentou encravar a Davi na parede, atirando-lhe raivosamente uma lança. (XVII: 10-11).

            (1) Saul era um médium. Vd. I Samuel, XIX: 23 e Capítulo XVI: 14; e idem X: 7; e XI: 6 do mesmo 1 Livro de Samuel, ou Reis (vulgata).

            Por diversas vezes tentou matar o genro, procurando para isso todos os meios ao seu alcance. (XIX: 10-11).
            Michal, a esposa de Davi, temendo que seu pai pudesse atingir o marido e tirar-lhe a vida, fê-lo escapar por uma janela e colocou em sua cama uma estátua coberta. Chegando os soldados para prenderem a Davi e levarem-no à presença do rei, Michel lhes respondeu que o esposo se achava enfermo, guardando o leito. Levaram a Saul esta notícia, mas seu ódio era implacável e fez voltar os soldados com ordens severas de levá-lo mesmo na cama, dizendo:         
            "Trazei-o na cama para que o mate" (XIX: 12-15) .
            5º) Outro horrível crime cometeu Saul: Como os seus guardas recusassem matar Achimelech e outros sacerdotes que ele mandou chamar da cidade de Nob, obrigou a Doeg executar o seu mandato e este assassinou oitenta e cinco homens que vestiam roupas sacerdotais! (XXII: 17-18). Também mandou matar a fio de espada, todos os habitantes da cidade de Nob, não poupando nem mesmo as crianças de peito!
             Destruiu tudo que vivia naquela cidade, até os próprios animais irracionais, bois, jumentos e ovelhas. (XXII:19).
             Mais traições armou ainda Saul contra Davi, perseguindo-o para o matar. É escusado continuar a relatar estes fatos que estão claramente descritos no Capítulo XXIII do I Livro de Samuel, ou seja I Livro de Reis, conforme a tradução de Figueiredo, (vulgata).
            Os protestantes sabem tudo isto muito bem.
            Saul caindo no desagrado do Senhor, os bons Espíritos o abandonaram; os maus os substituíram e por isso tornou-se um louco, (um médium obsidiado): eis os motivos dos seus desatinos, das suas torpezas!
            Em casos tais, como é que o Senhor lhe poderia atender por profetas, por Urim (1) ou por sonhos?

            (1) Urim. Vd. nota final nas últimas páginas.

            Sendo véspera da batalha de Gilboé entre filisteus e israelitas, Saul ainda mantinha a pretensão de derrotar, mais uma vez, os filisteus; desorientado, porém, resolveu procurar um médium por meio do qual pudesse conversar com o Espírito de Samuel, esperando ouvir dele algo que lhe desse coragem e vigor para conseguir a derrota do exército inimigo; e assim, com seus criados encaminhou-se para a cidade de Endor, (2) a fim de conseguir o que desejava (contra a própria lei do seu governo) e, mui hipocritamente disfarçou-se, trocando as vestimentas reais para poder enganar a pitonisa... (até para isto mesmo, ele cometeu má ação!) Que é o que ele poderia esperar de Samuel, senão uma sentença de morte?

                (2) Endor. Cidade da Palestina antiga, tribo de Manassé, perto de Naim, a duas léguas do Tabor.

            Mas, seu orgulho inspirado pelos Espíritos obsessores, lhe havia cauterizado a consciência a ponto de fazê-lo desconhecer a sua triste situação.
            No dia imediato ao da conferencia com Samuel, Saul, no combate de Gilboé, vendo sucumbir seus três filhos, Jonathan, Abinadab e Meichisna, perdeu de vez a esperança: os flecheiros avançavam e fatalmente iam tirar-lhe a vida; seu orgulho, porém, lhe ditou o Pensamento de, que seria uma vergonha e um descrédito à sua memória o deixar-se matar por seus vencedores. Eis as suas últimas palavras: "Arranca a tua espada e atravessa-me com ela, para que, porventura não venham estes incircuncisos e me atravessem e se escarneçam de mim, porém, o seu pajem de armas não quis, porque temia muito: então Saul tomou a espada e se lançou sobre ela." (I Samuel, XXXI: 2-4) .

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            Eis aí, em poucas palavras, demonstrados com testemunhos bíblicos, os motivos da sua derrota: sua malevolência assinalada pelos seus atos. E a causa do suicídio: o orgulho desmedido em não querer sucumbir às mãos dos inimigos vitoriosos.
           "Se estes incircuncisos me atravessarem com a espada, rir-se-ão e escarnecerão de mim; portanto, tiro eu mesmo a minha vida, para que, quando eles chegarem, só encontrem o meu cadáver...  Não lhes darei, pois, este prazer!!!"
            Estas foram as suas últimas palavras. A sessão espírita de Endor não foi a causa do suicídio de Saul, nem tão pouco a de sua desdita. Só a má fé ou a supina ignorância dos fatos históricos narrados na Bíblia poderá induzir alguém a dizer tal disparate.
            Nestes fatos não há metafísica dependente de interpretações que podem ser erradas e mal explicadas; está claro, claríssimo, que a causa do suicídio de Saul não foi o resultado da sessão espírita de Endor, mas o orgulho do rei derrotado, sentenciado à morte inevitável, que não quis morrer às mãos dos filisteus.

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