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segunda-feira, 22 de junho de 2015

Centenário de nascimento de Leopoldo Cirne


            Quem, na Terra, acende a lâmpada do amor e da verdade, alimentada com o azeite da fé e da humildade, e a coloca bem alto, jamais será esquecido por seus pósteros, porque os luminosos lampejos dessa lâmpada o farão sempre lembrado a todos os instantes, lampejos que cantam suavemente no íntimo de nossas almas, concitando-as a sentirem Deus e a meditarem sobre os esplendorosos ensinamentos do Cristo à luz da Terceira Revelação.

            Em sua romagem terrena, esta figura verdadeiramente angelical, que se chamou Leopoldo Cirne, e cujo primeiro centenário de nascimento ocorreu a 13 de Abril último, assim procedeu em sua vida.

            A ele coube a responsabilidade, não pequena, de ser o sucessor, na presidência da Casa de Ismael, do querido e inesquecível apóstolo do Espiritismo: - Dr. Adolfo Bezerra de Menezes, quando da sua desencarnação, nesta cidade, a 11 de Abril de 1900.

            A Federação Espírita Brasileira não sofreu qualquer solução de continuidade no seu trabalho, com a atuação de seu novo presidente, porque Leopoldo Cirne outra coisa não fez que seguir as pegadas de seu ilustre antecessor, que não admitia a Doutrina Espírita sem o vínculo religioso, isto é, sem o entrelaçamento dos princípios normativos do Evangelho.

            Leopoldo Cirne nasceu na Paraíba do Norte a 13 de Abril de 1870, e por dificuldades financeiras não pode concluir o estudo de Humanidades.

            O Dr. Leoni Kaseff, que teve o privilégio de, por alguns anos, privar da intimidade de Leopoldo Cirne, ao prefaciar o último livro desse seu amigo - O HOMEM COLABORADOR DE DEUS, obra que só em 1949, portanto, oito anos após a sua desencarnação, foi dada à publicidade, informa-nos que “Cirne lia muitíssimo e anotava, com sobriedade, suas impressões; que as melhores obras de religião, filosofia, ciência, arte e literatura eram-lhe familiares; que conhecia profundamente a Bíblia e a Imitação de Cristo, e que poucos terão estudado, como ele, esse “quinto Evangelho”; e mais ainda, que depois dos Evangelhos propriamente ditos, era, talvez, o livro que mais o atraía. Guardava-lhe capítulos inteiros e aplicava-lhe as máximas, até em situações imprevistas, com a segurança com que recorria às citações do Velho e do Novo Testamento.”

            Leopoldo Cirne veio para o Rio de Janeiro lá pelo ano de 1891, quando, portanto, contava mais ou menos 21 anos de idade, incorporando-se logo ao lado de Bezerra de Menezes, com ele trabalhando ardorosamente no aprendizado e difusão do Espiritismo, e por isso granjeou imediatamente a simpatia e a estima de seus companheiros de ideal. A Federação Espírita Brasileira a ele é devedora por inúmeros serviços prestados, não só como eficiente administrador, senão também como magistral condutor dos trabalhos evangélicos e doutrinários.

            A sua sede na Avenida Passos foi, por assim dizer, obra sua, a qual lhe exigiu esforços sem conto, no propósito de sua conclusão ser prontamente atingida, sem jamais dar mostras de desânimo na concretização desse seu acalentado ideal, qual o de ver a instituição, a que presidia, instalada num prédio próprio e condizente com a magnitude da obra espiritista em terras guanabarinas. E no prazo de dezessete meses, isto é, a 10 de Dezembro de 1911, esse prédio era inaugurado, de cujo acontecimento, aliás, todos os periódicos desta Capital, sincera e espontaneamente, deram extraordinária cobertura. Pela manhã desse dia, o jornal  O P AIZ, em longo artigo, fazia, entre outras considerações, a de que “a nova sede da Federação Espírita Brasileira tinha, considerada no seu ponto de vista particular, o valor, já hoje raro, de exprimir uma dedicação extraordinária dos homens agremiados naquele centro de atividades, dedicação praticada em uma quase penumbra, sem alarde, sem benemerências conclamadas, sem nomes postos em foco, com a modéstia efetiva dos crentes sinceros e dos generosos por dever; que em cada pedra, em cada bocado de argamassa da sua construção, havia um pouco de coração e de consciência, dominados por um alto sentimento e um sugestivo dever”.

            E Leopoldo Cirne, no ato solene da inauguração, profundamente emocionado, sem, todavia, se afastar daquela simplicidade que lhe era peculiar, a ela presidiu, no vasto salão de conferências, que estava superlotado . De sua oratória, destacamos este trecho: “Era tempo de que o Espiritismo tão malsinado, tão pouco compreendido por uns e tão mal julgado por outros, oferecesse este testemunho da sua força e capacidade organizadora. Era tempo de que esta obra, que avulta pela sua significação moral para a propaganda da verdade espírita, viesse dar lugar à aproximação, cada vez mais ampla, entre os que a ignoram e os que já desfrutam os seus salutares benefícios.”

            Leopoldo Cirne, através de sua já citada obra -- O HOMEM COLABORADOR DE DEUS, deixou bem positivado seus nobres e alcandorados sentimentos cristãos, e sua inabalável fé e confiança na bondade e justiça infinita de nosso Pai Celestial, tanto que inicia o seu primeiro capítulo, dizendo: “Erguei o coração para o Alto e tende confiança no futuro que vem próximo. 

            “Porque eu vos anuncio a nova aurora de que são precursoras as sombras que de todos os lados nos envolvem neste angustioso crepúsculo da história e da existência humanas.”

            Sua arraigada convicção de que a finalidade precípua da Doutrina Kardequiana, através de suas teses de alta filosofia transcendental, era justamente a de recristianizar as criaturas, disse, ao iniciar a obra que ele intitulou ANTICRISTO -- SENHOR DO MUNDO: “Só o amor pode salvar o mundo, que se perde. O amor e a humildade. Porque o mundo evidentemente se perde, no sentido espiritual, transcendente, portanto, do vocábulo, por excesso de indiferença e de orgulho.”

            E ele foi o exemplo vivo, constante, da humildade, e esta humildade constituía a sua maneira de ser, era espontânea, natural, sem afetação, e por isso deixou consignado, em seu citado livro ANTICRISTO - SENHOR DO MUNDO (1) , que “O Espiritismo, convencendo o homem da sua contingente pobreza espiritual e adotando a doutrina tão animadora, do Anjo da Guarda, ou Espírito protetor, a toda a criatura proposto neste mundo, faz da humildade, que é o broquel por excelência contra as funestas sugestões do Espírito maligno, a pedra angular do seu aperfeiçoamento, humildade que foi a primeira lição dada por Jesus, no presépio de Belém, aos orgulhosos filhos deste mundo. Humildade, finalmente, sem a qual não pode haver no homem nenhuma outra virtude, nem fé, nem paciência, nem caridade, nem mesmo sapiência”.

                (1) Do Blog: Temos este livro parcialmente postado aqui.

            Leopoldo Cirne jamais ocupou a tribuna da Casa de Ismael sem que, durante cerca de uma hora antes de iniciar a sessão a que então presidia, permanecesse isolado de todos, em profunda meditação. E a sua oratória era um cascatear verdadeiramente admirável, cheio de belas imagens que tocavam fundo o coração de todos os assistentes. É que suas palavras tinham vida, respondiam às mais diversas e íntimas indagações que, em pensamento, eram feitas pelos assistentes. E quantas lágrimas rolavam dos olhos dessas criaturas!

            Conforme consta do substancioso livro organizado por Zêus Wantuil e intitulado GRANDES ESPÍRITAS DO BRASIL, “Cirne possuía o dom precioso de expositor da Doutrina Espírita, e ele mais se afirmou, presidindo a Federação Espírita Brasileira, exímio pregador e instrutor notável, a cuja penetração mental nenhum embaraço insuperável oferecia qualquer ponto da matéria que versava, por mais obscuro que fosse”.

            Durante toda a sua vida, foi um constante estudioso de tudo que lhe pudesse iluminar o espírito, que melhor lhe alegrasse o coração e lhe transmitisse forças para continuar a trabalhar com entusiasmo até os derradeiros instantes da permanência de seu espírito em corpo somático, tal como aconteceu a seu idolatrado mestre Allan Kardec, porque a vida na Terra nos foi concedida não para ficarmos indolentes, mas, sim, para, com nosso trabalho honesto, sermos úteis à coletividade.

            E seu fulgurante Espírito, há alguns anos, lá das etéreas paragens, disse-nos, através de uma mensagem medianímica: -- “Estudemos e trabalhemos, amemo-nos e instruamo-nos, para melhorar a nós mesmos e para soerguer a vida que estua, soberana, junto de nós. A obra gloriosa do Codificador trouxe, como sagrado objetivo, a recuperação do amor e da sabedoria, da fraternidade e da justiça, da ordem e do trabalho, entre os homens, para a redenção do mundo.” (*)

            Leopoldo Cirne foi um marido exemplar, de extremo carinho para com a sua companheira e esposa muito querida.

            E foi com os olhos postos nessa companheira que tão bem soube compreendê-lo, amá-lo e encorajá-lo na sua laboriosa vida farta de espinhos, e balbuciando uma doce e compassiva prece, que o Espírito de Leopoldo Cirne abruptamente partiu, em 31 de Julho de 1941, para essa pátria que ele tanto amou!

                (*) Instruções Psicofônicas, pág. 207. Edição da FEB, 1956.

Centenário de nascimento de
Leopoldo Cirne
Sylvio Brito Soares

Reformador (FEB) Junho 1970

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