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domingo, 27 de setembro de 2020

Eflúvios Luminosos


 Eflúvios Luminosos

por Canuto Abreu

Reformador (FEB) Maio 1930


             Recebemos de Caxias, Maranhão, datada de 27 de março de 1930, a carta seguinte:

             Fraternais saudações,

                 Objetiva a presente carta, o seguinte fato para o qual solicito a vossa atenção:

                De certos dias para cá, a Exma. Sra. D. Guilhermina Verás, ou Sinhá Veres - como é mais geralmente conhecida nesta cidade, onde nasceu e reside à rua Senador Benedito Leite, em casa sem número, começou a notar que, pela madrugada, ou depois de já ter dormido um pouco, de seu corpo levemente tocado por suas próprias mãos ou pelas de outra qualquer pessoa, dimana luz numa espécie de fagulhas ou irradiações luminosas que, às vistas das inúmeras pessoas que as têm observado, se assemelham às ligeiras cintilações do relâmpago! Como vedes, trata-se de um fenômeno que me parece tão empolgante e extraordinário, quanto desconhecido pela ciência, quer médica como filosófica. E é por isso que o submeto à vossa apreciação e estudos, fazendo jus aos esclarecimentos que vos solicito sobre a sua causa ou origem, se devido à influência de qualquer substância orgânica em superabundância, ou se devido à intervenção de um poder oculto.

                Certo de que haveis de vos interessar em dar-me qualquer explicação sobre o caso, ansioso aguardo a vossa resposta e, agradecido, subscrevo-me vosso irmão em crença.                                                                                                             Eurides Augusto de Moura

             O comunicado acima põe-nos diante dum fenômeno insólito, que “parece”, ao caro missivista, “desconhecido pela ciência, quer médica, como filosófica.”

            Com muita satisfação atendemos-lhe ao pedido de “qualquer explicação sobre o caso” não só por dever epistolar, como principalmente por desejar que outros confrades ou simpatizantes, imitando o Sr. Eurides Augusto de Moura, nos deem sempre a honra de comunicar os fatos fora do comum que porventura presenciem. Será um relevante serviço prestado ao Reformador e que nos deixará particularmente penhorado ao repórter.

            Cumpre, entretanto, que as informações venham em relatório circunstanciado, no qual o registro simples da manifestação sobrepuje às expressões de surpresa ou entusiasmo e se desdobre em detalhes, até mínimos, principalmente no que se refere

à pessoa do médium ou suposto causador do fato, seus antecedentes morais, idade, profissão, residência, estado mental e físico, suas crenças e o rol das testemunhas presenciais, com individuação completa de cada uma. E tanto melhor se com o relatório vierem documentos autenticados e fotografias.

 *

             Dos termos claros, mas sucintos, com que nos vem a informação do Sr. Eurides Augusto de Moura, é impossível concluir que se trata dum fenômeno espirita. Parece antes um fenômeno bioquímico, supranormal, chamado por isso mesmo metapsíquico.

            O fenômeno é espírita, quando produzido por Espírito desencarnado, com auxílio de um médium. Para que haja fenômeno espírita, é necessário o concurso do Espírito e do fluido mediúnico. E, nos casos como o do presente estudo - em que a manifestação é física - um terceiro requisito de importância capital e “sine qua non” - se impõe: a utilidade moral do fato.

            Assim, preliminarmente, só temos como “espírita” o fenômeno físico que possui estes três elementos:

             1º) vontade ativa ou passiva do Espírito desencarnado;

            2º) vontade ativa ou passiva do médium;

            3º) utilidade, justiça ou graça imediata da manifestação.

             Faltando um desses elementos, o fenômeno poderá ser “espiritual” mas não será “espírita”.

            Como é geralmente sabido, mas deve ser sempre lembrado, “as manifestações físicas têm por fim chamar-nos a atenção para alguma coisa e convencer-nos da presença duma força superior ao homem” (1) Kardec, ‘Livro dos Médiuns’ (trad. de Guillon Ribeiro). Os Espíritos inferiores não podem, por inidôneos, conhecer da moral do fenômeno que produzem por ordem superior, mas sabem que, se o fenômeno não fosse necessário naquela hora e naquele ponto, a sua produção lhes seria defesa, Eles, por sua natureza grosseira, são os únicos que podem fazer à manifestação física, mas agem sempre em obediência. Por isso é que o primeiro requisito é a vontade ativa ou passiva do Espírito desencarnado. É ativa, quando recebem permissão, e passiva, quando recebem ordem. Os Espíritos superiores jamais agem diretamente sobre a matéria, para produção de fenômenos físicos. “Servem-se dos Espíritos inferiores, como nos servimos de criados para as tarefas grosseiras (2) Idem, Idem. Não sendo possível uma só manifestação espírita, de natureza física, sem permissão ou ordem de Espíritos superiores, compreende-se facilmente que só a utilidade moral imediata dá lugar ao fenômeno. Quanto ao segundo requisito, carece de nenhuma justificativa...

 *

             O fenômeno narrado na carta acima, parece independente, senão dos três elementos, ao menos dos dois primeiros. Ele se produz após um estado sonambúlico; mas, por ação mecânicas, pelo roçar da mão sobre o corpo de D. Sinhá Verás e, talvez, sem interferência, notável pelo menos, de um ser invisível.

            Portanto, nos estreitos limites da comunicação, é preferível considerar o fato como metafísico, deixando a hipótese espírita para quando novos detalhes, que aqui pedimos, cheguem ao nosso conhecimento.

            Enquanto esta vai e aqueles vêm, conversemos um pouco.

            O nosso caro missivista fala em “ciência médica” e “ciência filosófica”.  

            Quanto à primeira, somos absolutamente incompetente para qualquer julgamento. Queremos, com tudo, supor que ela, chamada à presença de D. Sinhá Veras, se não encontrasse um fundamento patológico para o fenômeno, haveria de lhe descobrir um nome rebarbativo, capaz de manter à distância o vulgo ignorante, como, por exemplo, fotogenia ectoplasmática cuticular... 

*

             No que concerne, porém, à “ciência filosófica”, se nossa competência é ainda mais “clamorosa”, temos algumas tinturas, a que talvez sirvam para dois dedos de prosa barata, se é que o prezado epistológrafo quis visar com tal frase o Espiritismo.

            KARDEC, fundador do vocabulário espírita, chama de médium natural a pessoa que, sem intervenção de Espíritos, produz fenômenos supranormais, como aquelas que ele, na Revue Spirite e no Livro dos Médiuns estuda como “elétricas”.

            “As pessoas qualificadas de elétricas podem ser consideradas médiuns?

            -“Essas pessoas tiram de si mesmas o fluido necessário à produção do fenômeno e podem operar sem o concurso de outros Espíritos. Não são, portanto, médiuns, no sentido que se atribui a esta palavra. Mas, também pode dar-se que um Espírito as assista e se aproveite de suas disposições naturais (1).”

            (1) Idem, idem.

             O fenômeno fotogênico observado em D. Sinhá Veras é de natureza semelhante? Pode ser. O calor, a luz, a eletricidade são meras modalidades de vibrações. 

*

             Isso não significa que devamos pôr de lado desde logo a hipótese de se tratar dum fenômeno espiritóide. É ainda Kardec que, a propósito de luzes, interroga os Espíritos:

            - Não podem eles manifestar-se sob a forma de chama?

            “- Podem produzir chamas, clarões, como quaisquer outros efeitos para atestar sua presença; mas, não são os próprios Espíritos que assim aparecem. A chama não passa muitas vezes de uma miragem, ou de uma emanação do perispírito. Em todo caso nunca é mais do que uma parcela deste. O períspirito não se mostra integralmente senão nas visões.” (Livro dos Médiuns, n. 100.)

            O que se passa em Caxias, com D. Sinhá Veras, tanto pode ser produzido por Espíritos desencarnados, como pode ser resultado de combinações biológicas, sem a interferência deles.

            É até a hipótese mais provável.

            O corpo humano, principalmente o de certos nervosos ou sensitivos, contém uma capacidade de irradiação luminosa, descoberta em época remotíssima, pois a ela se referem os mais antigos registros de ocultismo. Pelo fato de possuírem essa capacidade radioativa, não se segue que sejam tais sensitivos médiuns, no sentido espirita. “Errado fora considera-las médiuns, porquanto a verdadeira 'mediunidade supõe a intervenção direta de um Espírito. Ora, no caso de que falamos, concludentes experiências hão provado que a eletricidade é o agente único desses fenômenos (pessoas ditas elétricas). Esta estranha

faculdade, que quase se poderia considerar uma enfermidade, pode, às vezes, estar aliada à mediunidade. Porém, as mais das vezes, de todo independe de qualquer faculdade mediúnica. A única prova de intervenção dos Espíritos é o caráter inteligente das manifestações. Desde que este caráter não exista, fundamento há para serem atribuídas a causas puramente físicas. (1).

                (1) Idem. Idem.  

             E Kardec tem razão. Há mais de 80 anos que vários experimentadores do psiquismo verificaram que do corpo humano sai um eflúvio, que existe também, em menor escala, nos animais, nos vegetais, em certas pedras preciosas, em vários minerais, nas substâncias radioativas, nos imãs, etc.

            O célebre químico austríaco Barão de Reichenbach (2) deu a esse eflúvio o nome de “ods”. Ele constatou em numerosas experiências o que antes dele outros vislumbraram o escapamento de luz do corpo humano.

                (2) Cartas ódicas e magnéticas.

             Verdade é que os raios “od” não são percebidos por todos os mortais e sim por certos sensitivos; mas, se existem para uns, é evidente que, num estado de maior condensação, podem ser vistos por todos. Para isso, basta que o organismo produtor seja privilegiado, como parece que é o de D. Sinhá Veras.

            Se dos metais, como o zinco, o chumbo, o mercúrio, o níquel, o estanho, se escapa uma força capaz de ferir uma chapa fotográfica (3); se do corpo animal irradia constante calor (que é simples modalidade da energia que produz luz ou eletricidade), porque não havermos de admitir que os raios “od”, o fluido magnético animal, o nosso “aura”, enfim, a energia que dimana de nosso organismo não possa, em determinadas condições mesológicas, produzir esses relâmpagos de que fala a carta do nosso amigo Moura?

            (3) Russel, Revue Scientifique, de 24 de dezembro de 1897.

                       O Dr. Maxwell, médico e advogado antigo de Bordéus, fez observações curiosas com os fluidos emanados das mãos humanas (4).

                (4) “Phenomens Psychicos, pag. 118

             De Rochas, o ilustre engenheiro francês a quem tanto devemos em conhecimentos psíquicos, chegou mesmo a provar que “a extremidade dos dedos ou dos polos de um imã poderoso, colocados diante da fenda do espectroscópio, dão lugar a colorações muito nítidas” (5).

            (5) “Exteriorização da Motricidade” pg. 22.

             Delanne, o incansável cientista espírita, diz: “Está hoje estabelecido que os corpos radioativos emitem partículas materiais infinitamente pequenas, que são carregadas de eletricidade negativa; podemos, pois, supor que o efIúvio é um fenômeno de radioatividade, tanto mais que o corpo humano é um laboratório no qual se processa sem interrupção um formidável labor químico, ao mesmo tempo que um desprendimento continuo de eletricidade (6).”

            (6) “Aparições”, Tom.1, pg. 337;

            Baraduc (7) também se acerca de nosso ponto com experiências notáveis, rigorosamente científicas, que demonstram dum modo categórico a existência de eflúvios luminosos em nosso corpo.

             (7) “A alma humana, seus movimentos, suas luzes”.

             E a existência de tais eflúvios não pode, por nós espíritas, ser posta em dúvida, quando é afirmada por um sem número de magnetizados, sensitivos, videntes e pacientes, atestada pelos Espíritos, demonstrada pela ciência de Rochas, Maxwell, Delanne, Le Bom, Reichenbach, Curie, Lodge, Crookes, Aksakoff; pelas chapas fotográficas de inúmeras categorias, pelas efluviografias de Luys e. tantos outros experimentadores antigos e modernos.      

                Basta seguir a Revue Métapsychique e ler os relatórios dos congressos metapsíquicos espíritas.

            Aguardemos, pois, os detalhes que nosso caro informante por certo nos remeterá e, noutra ocasião, com mais vagar, voltaremos ao assunto. 

            Por hoje, nosso agradecimento sincero ao Sr. Eurides Augusto de Moura e nosso voto de paz, saúde e alegrias a D. Sinhá Veras.

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