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sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Orígenes





Coletânia
por Joseph Fabre
Reformador (FEB) Setembro 1917

Orígenes

            Discípulo e sucessor de S. Clemente, Orígenes foi espírito erudito, gênio brilhante, alma austera e entusiasta.

            Havia estudado todos os sistemas de filosofia, especialmente as doutrinas de Pitágoras e de Platão, que o inspiraram.

            A exemplo de S. Clemente, tendo porém, mais profundeza e ousadia, procurava firmar o dogma cristão em princípios racionais.

            Entendendo que não deve ater-se às noções vulgares quem pode elevar-se ao conhecimento das causas, Orígenes, como os Cabalistas, como Fílon, sustentava que uma interpretação inteligente devia ser dada à primitiva narração das Escrituras e a seus preceitos, Dizia ele:

            Se fosse obrigado a cingir-me a letra da lei, entendendo-a, como as palavras soam, teria vergonha de proclama-la como obra divina, achando que maiores e mais racionais foram as leis humanas, como as de Atenas, da Lacedemonia e de Roma. Sendo assim, onde encontrar um espírito medíocre e grosseiro para nos dizer que Deus se entregava a exercícios agrícolas, plantando árvores no Jardim do Éden? que uma delas era a árvore da vida e uma outra podia produzir a ciência do bem e do mal?
            Ninguém pode ver aí, cuido eu, senão figuras que ocultam mistérios.

            Liberto da letra da lei, Orígenes nos falava em Deus como um Ser supremo, cuja existência podemos afirmar, sem saber quem seja Ele, visto como a sua natureza está acima de a natureza de todas as categorias do pensamento humano, Pretendia explicar a formação do universo, não como criação absoluta, mas por ato inefável da Divindade, da qual tudo procede. Deus revela-se pelo Verbo.

            Segundo Orígenes, éramos perfeitos e felizes, mas decaímos desse estado, porque abusamos da liberdade, indóceis aos ditames da razão. Professava a doutrina da preexistência e transmigração das almas, que, conforme as suas culpas, ocupariam corpos mais ou menos grosseiros. A situação atual das almas encarnadas só poderia ser explicada e justificada pelos atos praticados durante as vidas anteriores.

            Depois das provações múltiplas e expiações, de acordo com as exigências da justiça, Deus, em sua bondade, acolherá todas as almas, ainda as que mais se degradaram. Quando soar a hora da redenção final, ficarão aniquilados os corpos, que são a negação do ser, sinais da nossa inferioridade e causa ocasional das faltas.
  
            Acreditava que desapareceria então o próprio princípio do mal e Satã estaria regenerado pela influência vitoriosa do Verbo. Seria o triunfo completo do espírito sobre a matéria, havendo comunhão eterna do amor entre todos os seres reunidos no seio de Deus.

            A elevada filosofia de Orígenes apaixonou o Oriente e assombrou o mundo. A igreja excomunhou o homem e condenou-lhe a doutrina. Foi anatematizado, principalmente, porque desprezava o corpo e pugnava pela reabilitação universal das almas.

            A sua última tendência foi a fusão do Cristianismo com o helenismo, a conciliação entre a fé e a razão. Os criadores do dogmatismo católico repudiaram, como era de prever o ousado comentador da Escritura. Doutos teólogos, porém, em várias épocas, o admiravam.  

            Quando faleceu, fizeram-lhe o elogio S. Panfilo e Eusébio de Cesaréia, o pai da histeria eclesiástica.

            Abelardo, no século XI, repetia de continuo que Orígenes foi o primeiro entre todos os filósofos cristãos.

            Extraído de “La pensèe chretienne”.

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