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quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Resposta a Pilatos



Resposta a Pilatos
Redação 
Reformador (FEB) Abril 1924

Os agentes do sacerdócio hebraico, que, em grande tropel, armados de varapaus e espadas, haviam efetuado a prisão de Jesus e o conduzido, após as audiências dos pontífices, ao tribunal romano, não entraram no pretório para evitar a “contaminação”, (João, XVIII, 28). Estavam também presentes sacerdotes judeus, denunciantes e acusadores.

Era na sexta feira (parasceve) da semana pascoal.

A morte do Justo martirizado poderia ser desejada, exigida e conseguida, como foi, pelo clero e seus sectários.

A religião, como eles a entendiam e praticavam, não lhes opunha obstáculos; mas, adstritos ás exterioridades do culto, ficariam maculados ou contaminados, se penetrassem na casa de um gentio, no tribunal de Pilatos,

Se o fizessem, estariam impedidos de celebrarem a festa comendo o pão ázimo e o cordeiro da páscoa.

No pretório, onde não tiveram ingresso os acusadores pelo motivo exposto, Pilatos interrogou a Jesus.

Não há, parece-nos, frase evangélica mais citada e vulgarizada, embora pouco compreendida, do que a resposta do Senhor, segundo João:

“O meu reino não é deste mundo.”

Em contínuas revoltas, como as de Teudas (morto em 46 d.C., foi um rebelde Judeu do século I)  e Judas Galileu, mencionadas nos Atos dos Apóstolos (V. 36, 37) os Judeus, que se consideravam povo privilegiado, aguardavam um grande libertador, suscitado pela Providência, para a restauração do reino de Israel.

Eça de Queiroz pôs em relevo esse pensamento, em um trabalho literário, publicado por ocasião da sua viagem à Palestina.

O autor fantasia o convite para um movimento insurrecional na Judeia, dirigido a Jesus por Eleziel.

Fala o imaginário protagonista, a quem perseguia a ideia de pátria: “És um homem mandado providencialmente, num tempo humilhado e vil, para erguer as almas, desmascarar as hipocrisias, vingar a pátria!

“Penso que, se tens uma ação no mundo, essa deve ser insurgir-te contra a aristocracia do templo, contra este espírito estreito de Jerusalém, contra este culto pagão das tradições, contra o fariseu e contra o romano, ser o consolador e ser o vingador!..

“De que servem essas parábolas, essas ironias, essas respostas excelentes, se elas não vão ferir a riqueza do saduceu, a hipocrisia do escriba, a vexação do romano?

“Queres abster-te da ação? Imaginas que as prédicas do templo e o ensino sobre as montanhas, só pela sua verdade abstrata, podem combater, vencer um mundo completo, organizado, civil, rico, amado?.. Crê tu que um mundo inteiro, tribunais, templos, edifícios, mercados, sacerdócios, escolas, tudo fortemente ligado, se dissipe como uma visão, porque um homem simpático se ergueu num caminho e diz: - Amai-vos uns aos outros e sereis amados do Pai celeste? Não...

“Deixa esses galileus simples, liga-te aos homens que têm a força, a ciência e o segredo das coisas humanas: nós seremos a ação, sê tu o novo Messias.” (1)

(1) Eça de Queiroz – “Prosas bárbaras”

Jesus teria respondido: “Meu reino não é deste mundo.”

Ele veio dar testemunho da verdade, ensinar a lei do amor e salvar almas.

*

Pedindo desculpe ao leitor, vamos indicar o motivo que nos levou a fazer a transcrição acima, um pouco longa.

Os fundadores e diretores da igreja romana pensavam, até certo ponto, como o personagem de Eça.

Não acreditavam na eficácia do singelo ensino de Jesus, exposto nos Evangelhos.

Houve, em consequência, a substituição por demais conhecida e da qual nos temos ocupado, em outras ocasiões.

Como entenderam as seitas religiosas o pensamento do Cristo, expresso na resposta a Pilatos?

Prevaleceram os interesses mundanos.

Abandonada a religião espiritual, chegaram até ao ponto, sob o pretexto de que o homem é composto de alma e corpo, de santificar a matéria grosseira e faze-la objeto de adoração, como provam a instituição dos sacramentos, o culto das imagens e relíquias, as práticas da liturgia.

Na resposta a que nos referimos o Senhor afirmou: “mas agora não é daqui o meu reino – nunc autem regnum meum non est hinc.” (João, XVIII, 36.)

Aberta a era auspiciosa da revelação espírita, anunciada pelos celestiais mensageiros, podemos alcançar o sentido dessa palavra profética.

Submetidos o planeta e seus moradores à lei do progresso, relegados, em seu cumprimento, para mundos inferiores os espíritos insubmissos e endurecidos, a Terra passará à categoria de mundo regenerado, onde ficará estabelecido o reino de Jesus, seu Diretor.

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