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sábado, 9 de março de 2013

17. 'Fenômenos de Materialização'

17

Fenômenos de Materialização
por     Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942


            Se do Egito passarmos a Grécia dos oráculos, teremos com Pitágoras a sanção de um princípio universal, que entretêm a harmonia da eternidade da alma e da pluralidade das existências, como para provar que em todos os graus da escala ontológica, da planta mais ínfima até o homem, o principio da vida é idêntico.

            Para dar uma ideia da identificação da Religião com a Ciência, digo com a Medicina, no passado, basta lembrar os Templos de Esculápio, o Deus da Medicina, todos mais ou menos célebres e celebrados pelas curas que neles se produziam.

            De um desses Templos, o de Égea, na Silícia e que subsistia ainda no 4º século, fala um doutor da Igreja - Orígenes - nos seguintes termos:

            ‘‘Estava sempre cheio de gregos e de bárbaros, que atestavam ter visto o deus, não aparente mas realmente, assinalando sua presença por meio de curas e oráculos."
             
            Uma prova, a mais, de que o pretensioso, autoritário e dogmático catolicismo contemporâneo não passa de paganismo adulterado e disfarçado, é que, nas sacristias dos seus templos, se ostentam os mesmos quadros, votos, relíquias, pernas de cera, tranças de cabelo, etc., que se colgavam aos vestíbulos dos templos pagãos.

            Orígenes conta-nos, ainda, ter sido o templo de Égea arrasado por Constantino, a pretexto de que ali se adorava o demônio...

*

            Entra em cena o Sr. Diabo - outro arremedo do Masdeísmo - o ‘Arimahan’ dos Persas, esse Sr. Diabo que haveria de encher a Noite Medieval, longa de nove séculos, com a sua figura macabra, e que ainda hoje figura de proa e "banca" o comandante na desarvorada galera da beatice raiventa, ou simplesmente ingênua e lastimável!

            Mas, antes dele e das suas incursões pelos conventos, provocando exorcismos inanes e aspersões solenes, responsos e esconjuros com imposições de mãos, que se poderiam considerar legítimas fórmulas de Magnetismo para efeitos do Sonambulismo, lancemos um rápido olhar à grandiosa Roma, à esplendida retorta em que se caldeavam todos os sonhos, todas as ideias do mundo avassalado ao gládio de suas indômitas legiões.

            Aí, não só a Medicina dos templos existia, senão que os próprios imperadores curavam pelo tato.

            Roma foi o viveiro das sibilas e dos augures... E que foram umas e outros, à luz dos conhecimentos que hoje possuímos, senão legítimos médiuns?

            E não sabemos que o prestígio desses augures era de tal monta que sustentava e anulava as assembleias do povo, as decisões de seus representantes?

            Os imperadores curavam, disse: para não falar de Marco Aurélio e também para não alongar esta palestra, citaremos resumida uma narrativa de Tácito, referente às curas de um cego e de um paralítico, operadas pelo imperador Vespasiano.

            "O cego procurou Vespasiano em Alexandria, dizendo-se aconselhado por Sérapis, e concitava o imperador a umedecer-lhe a face, nada mais nada menos que com saliva. O paralítico, esse, conjurava o imperador apenas a pisar-lhe o braço atrofiado. 

            "O imperador, a princípio, riu-se muito. Tantas, porém, foram as rogativas, que ordenou aos médiuns examinassem e decidissem se havia possibilidade de êxito. Os médicos discutiram (cá para nós, eles discutem sempre) e responderam, afinal, que convinha experimentar."

            Pois o cego viu e o paralítico sarou!

            Dion Cassius, autor de uma História Romana (fins do século lI), também conta que o imperador Adriano, quando na Panônia, curou um cego por meio de passes.

            Quanto aos médicos propriamente ditos, Asclepíades, Celso e Galiano, prescreveram contatos e fricções.

            De magnetizadores; bastaria citar o célebre Apolônio de Thiana e Simão o mágico.

            Do primeiro, diz Filóstrato que ressuscitou uma jovem a caminho do cemitério.

            E os doutores da Igreja?

            S. Justino, Arnobio, S. Jerônímo, Santo Agostinho, todos eles admitiam a realidade das curas, mas, já se vê, atribuindo-as à malícia do Diabo.

            Com o advento do Diabo, levaram o diabo as práticas livres do Magnetismo curador, da medicina religiosa, nas quais reconhecemos hoje simples modalidades desse mediunismo que, como lei universal, graduado à evolução da nossa humanidade, é dela apanágio inalienável de todos e para todos os tempos.

            Mas, rechaçado então, perseguido, asfixiado de morte pela Teocracia Católica - desnaturada filha do Cristianismo, este sim, em seus primórdios considerado a consagração legitima daqueles mesmos princípios em sua mais alta finalidade e aplicação - o mediunismo deslocou-se, de um lado, com esse caráter de ciência experimental, para os Árabes e, de outro, para os conventos.

            Na massa ignara e barbaresca, ele passou a chamar-se o "sabbat" a necromancia, a feitiçaria.

            Os médiuns, os sensitivos foram perseguidos a ferro e fogo, queimados vivos como Joana d'Arc, até que Gassendi pudesse provar que muitas dessas vítimas não passavam de pobres enfermos.

            Foi nessa época sinistra dos sambenitos, dos potros e dos autos-de-fé inquisitoriais, foi nesse período de agonias candentes, que o Sr. Diabo barafustou pelos conventos e deu à crônica religiosa todo um acervo de páginas burlescas, como esta que passamos a ler. 

            "As principais comunidades religiosas atingi das de possessão foram as de Cambrai (1491); Kinstorp um pouco depois; as do convento de Nazaré, em Colônia (1554), as das Ursulinas de Loudun (1632-1639) e as de Louvières ."

            Tratando destas últimas, diz Pierart em suas "Memórias sôbre os fatos de Louvières:

            "As alucinações principiaram logo: Uma freira ouve bater à porta, abre-a e se encontra face a face de uma aparição que se diz antiga irmã do convento, reclamando preces a fim de abandonar o purgatório. Advertida por uma sensação íntima, a alucinada reconhece o Diabo e o repele. Outra vê, de repente, na cela, um anjo que lhe fala tão pornograficamente, que a obriga a fugir clamando: "miserável embusteiro, que a virtude de Jesus Cristo te confunda".

            Depois, os fenômenos se intensificaram da maneira mais bizarra. As irmãs incólumes de invasão do Diabo viram o coro em polvorosa, tudo pelos ares. E daí, do coro, a sarabanda generalizou-se por todo o convento: eram panelas derrubadas, móveis que voavam, etc. Por vezes as pobres freiras eram arrojadas ao solo, mantidas em posições e atitudes inconcebíveis, por contrárias à natureza, enquanto mãos invisíveis lhes amarravam as sandálias e rosários à ponta dos véus. Por outro lado, brilhavam luzes, apagavam-se luzes, estrondos terríveis explodiam das chaminés, enquanto vozes másculas apostrofavam dentro dos dormitórios.

            Uma freira foi várias vezes arrebatada aos ares, para longe do mosteiro; outra foi precipitada no pátio, de onde a foram erguer deitando sangue pela boca; outra recebeu de mão invisível tremenda bofetada, ouvida pelas companheiras; ainda outra, forçada a provar um fragmento de patena (lâmina de metal um pouco convexa, sobre que se coloca a hóstia na missa), teve a língua em pústulas durante três dias, qual se houvesse provado ferro-em-brasa... Em compensação, uma outra freira curou-se instantaneamente de pústulas e verrugas causadas por picadas de urtigas e contusões. Uma freira, tomada por um Espirito, que dava o nome de Acarão, elevou-se a três pés do solo, a fim de espatifar o resplendor de ouro do "Santíssimo Sacramento" e, quando o Bispo d'Evreux  tentou impedi-lo, foi também ele derrubado ao solo.  Um outro Espírito, que acudia ao nome de Dagão, fê-la ainda melhor: assanhando-se contra a pobre Irmã Maria do Espírito Santo, meteu-lhe a cabeça e as mãos no fogo, sem queima-la, e, de outra feita, levou-a ao cimo de um muro alto de 10 pés, projetando-a de cabeça para baixo, sem lhe causar dano algum! 

            Um dia em que o Rev. Padre, ao falar ao Diabo, se entusiasmava fora do comum e dizia não passar ele - o Diabo, de uma mosca comparado às virtudes divinas, uma das assistentes, Madalena Bavent, jovem de beleza admirável, não se conteve e gritou: pois bem, nós veremos qualquer dia quem é que não passa de uma mosca! E nada menos de cinco religiosas começaram a sentir terríveis convulsões.

            Este fato - diz o cronista - foi qual raio de luz para as imaginações crédulas da confraria, que, acreditando no Diabo, queriam a todo o transe encontrar-lhe um preposto.

            Foi então lembrada uma circunstância na qual a bela irmã Madalena pedira socorro, queixando- se que o Diabo lhe batia e rojava ao assoalho dá cela.

            Daí, a conclusão; ela se havia votado ao Diabo, o Diabo tinha sobre ela um poder absoluto e fizera dela instrumento daquelas cenas que desolavam o convento.

            Pois bem: a repercussão destes fatos foi tão grande, que a Regente do Reino, Ana d'Áustria, houve de nomear uma comissão de sindicância, comissão essa que deu o seu laudo positivo, atestando a realidade das ocorrências ...

            Meus Senhores: que belíssima lição de mediunismo! Os famigerados candomblés não as teriam melhores nem mais cambiantes!

            Perdoai-me, entretanto, a estirada citação, pois eu queria apenas chegar a este benemérito ilogismo (falta de lógica):

            E dizer-se que nós, os espiritistas, temos hoje e sempre pela frente estes dois adversários: O médico e o... Padre!!!









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