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sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Ritualismos, sacerdotalismos, símbolos, etc


Ritualismos, sacerdotalismos, símbolos, etc.

Pgs. 160/164 do livro “O Atalho”- Análise Crítica do Movimento Espírita
de Luciano Dos Anjos
    1ª Edição - 1993   


Essas práticas estão se alastrando. Já há centros (ditos kardecistas!) que promovem casamentos, batizados e outras solenidades congêneres. Certa vez, a FEB recebeu carta dum confrade que, desgostoso, indagava se seria lícito realizar velório em centro espírita. É que a diretoria do centro por ele frequentado estava inclinada a fazê-lo e sua última esperança era a palavra da FEB. Outra correspondência consultava sobre a realização de cerimônia nupcial. O signatário estava assustadíssimo. Em seu centro (kardecista!), a noiva compareceu vestida a caráter, de véu, grinalda e buquê. Escusado dizer, aqui, o que lhe foi respondido...

Quanto às bênçãos de anéis, já não são poucas as entidades que as promovem. Anéis de grau, de noivado, casamento, bodas, etc.

Falou-se, há tempos, da criação de um símbolo-distintivo dos médiuns, para ser usado na lapela. Confesso que não cheguei a conferir se ele foi realmente cunhado. Mas, mesmo como projeto, é qualquer coisa do arco-da-velha. Faço minhas as palavras da revista que noticiou a idéia, criticando-a:

"A idéia de um distintivo dos médiuns é abstrusa e antiespírita." Bota abstruso nisso.

A doutrina espírita não acoberta nenhuma dessas práticas, que começam às vezes sutilmente. De concessão em concessão, a criatura se envencilha, quase sempre sem querer, nas teias do ritualismo. É uma toalha branca (não pode ser doutra cor) no culto do lar; é uma atitude que se padroniza (não cruzar os braços, colocar as mãos espalmadas sobre a mesa, etc.); é um chavão para sintonizar com seu anjo de guarda (uma prece decorada); etc., etc. Há o hábito de se formar "correntes", quando todos oram de mãozinhas dadas. Uma futilidade. As mentes e os corações é que devem estar unidos, e não as mãos. Há também a recomendação para que os médiuns fiquem, quando em exercício, com as mãos espalmadas sobre a mesa. É outro ritual sem qualquer valor ou importância. A esse respeito, convido o leitor a ler meu artigo intitulado "Médiuns estáticos e médiuns naturais", publicado no Reformador de abril de 1962, p. 80. Depois de cair nessas rotinas simbólicas, nesse ritualismo ostensivo ou disfarçado, pouco faltará para o altar, o incenso, a cantoria e outras mazelas mais. Ora, tudo isso não passa de ranço católico, do qual todos já deviam estar libertos. O tal do batizado então nem merece comentário. É ridículo nas religiões católica e protestante; no espiritismo é um crime de lesa-doutrina! Poder-se-á tolerar, no máximo, a realização de palestra ou conferência com tema específico, em se tratando de formaturas. Criaturas que vão iniciar sua vida profissional podem perfeitamente ouvir alguns conselhos doutrinários. Mas sem cunho solene, sem convites especiais, sem rapapés mundanos. Há centros que pegaram o hábito de fazer preces especiais para recém-desencarnados, em reuniões especiais, com a participação de médiuns especiais (geralmente videntes), com convidados especiais, tudo dentro da melhor especialidade. Uma verdadeira missa de 7° dia... (Não confundir com a prece que se faça na reunião habitual de que participamos, no lar ou no centro espírita; ou, ainda, com a que deve ser proferida pouco antes da inumação do corpo.) Inteirei-me de um centro aqui do Rio de Janeiro que distribui a pedintes o ... "pãozinho de Jesus". É um pãozinho que, antes de ser oferecido, passa por um ritual mediúnico (ou magnético) para ser fluidificado (?!). São fabulosos esses inventores de atração! Cada dia surgem com uma novidade diferente. Haja paciência para a gente se inteirar dessas macaquices!

Muito recentemente, respondendo sobre a moderna avalancha, nos centros espíritas, de hábitos oriundos de outras concepções religiosas, assim se pronunciou o inspirado médium Divaldo Pereira Franco:

É preciso ter muito cuidado com os enxertos. Há centros espíritas, onde às vezes tenho sido convidado, que se pergunta se é espírita, porque eles têm tanta formalidade, tanto ritualisrno. O Espiritismo nos liberta da ignorância dos atavisrnos negativos, é uma doutrina de libertação e nosso compromisso é com a verdade. Não há cultos, fórmulas ou rituais. Devemos ser coerentes, defendermos a casa espírita dos enxertos para preservarmos o movimento espírita, porque a Doutrina é inatacável. (244)
(244) Jornal Espírita, São Paulo, SP, nº 186, edição de fevereiro de 1991, pp. 4-5.

A FEB recomendou sempre toda a simplicidade nas práticas religiosas. Quanto maior a descontração, melhores os resultados. Espontaneidade sem desordem; naturalidade sem displicência; liberalidade sem desrespeito. E, para conferir, a palavra de Leopoldo Cirne:

O Espiritismo - insistimos nisso - não comporta símbolos. Vindo para restabelecer em toda a sua pureza e integridade o pensamento de Jesus, contido no Evangelho, e espiritualizar todas as crenças, tem, entre outras coisas, por missão emancipar os homens de preconceitos e superstições, como das escravizadoras restrições dos emblemas e alegorias, instituindo aquele culto puramente espiritual, anunciado à samaritana pelo Cristo. Nada será, portanto, mais contrário à sua essência doutrinária do que a obstinação de certos crentes em transplantar para suas práticas a bagagem ritualista de outras religiões, de que ainda não conseguiram libertar-se. (245)
(245) Doutrina e Prática do Espiritismo, vol. lI, p. 167.

É óbvio que não devemos generalizar, supondo-se que estou falando de todo e qualquer símbolo. Há-os adequados, como, por exemplo, os da pátria, os da formação profissional, os de controles científicos, etc. O próprio logotipo da FEB não deixa de ser um símbolo. As restrições são feitas aos símbolos religiosos e, ainda assim, quando são transformados em (inúteis) amuletos.

Quando os espíritos mandaram colocar, nos Prolegômenos de O Livro dos Espíritos, o desenho da cepa, traçado por eles próprios, e que tem valido a crítica da Igreja contra nós, não objetivaram transformá-la em símbolo religioso. Os padres chegaram a dizer que a cepa era a hóstia dos espíritas. Mas isso é mera distorção. E inglória. A cepa impressa não passa de simples registro gráfico, como o é a linguagem escrita. Se os espíritos houvessem feito dela uma simples descrição com palavras, valia a mesma coisa. Por isso, é ridícula a acusação e incorrerão em grave erro os espíritas que, desavisados, derem razão aos padres e começarem a fazer da cepa amuletos para pendurar no pescoço ou colar no parabrisa do automóvel. Aí, sim, começa o escorregão doutrinário. E nesse mesmo sentido se há de entender a cruz de Jesus, tolerada apenas no interior do lar, a título de registro histórico, como qualquer outro quadro ou fotografia.

É possível que, a essa altura, não falte quem esteja lembrando de que, na Federação Espírita Brasileira, se faz prece de pé. Ora, cada um rezará como quiser. Os dirigentes da FEB preferem ficar de pé, mas não obrigam ninguém a isso. E nem divulgam orientação nesse sentido. Nas sessões públicas, os dirigentes se levantam; se os do auditório desejarem, conservar-se-ão sentados. Não se trata, pois, de ritual, tanto que não é sequer aconselhado. Trata-se de mera preferência, de igual significado, por exemplo, quando nos levantamos ao sermos apresentados a uma pessoa mais velha.

Quanto ao hábito de, no Grupo Ismael, usar-se terno e gravata, isso nunca teve razão especial, senão a de acompanhar uma época em que todos assim se trajavam, nos ambientes respeitosos. Mas, hoje em dia, essa prática se tornou anacrônica, e comparece-se ao Grupo Ismael como melhor convier a cada membro. Geralmente, no entanto, a maior parte ainda é vista de terno porque ali estão após o expediente de trabalho e seguem diretamente para a reunião. Importante é que cada um vai como melhor lhe apraz, na época atual. Questão de gosto pessoal e nada mais.

Ainda dentro desse tópico, acho conveniente que se leia a nota "Missaria Espírita", publicada no Reformador de dezembro de 1951, p. 282. E, com maior atenção, o capítulo 16 de ‘Nos Bastidores da Obsessão’, de Manoel Philomeno de Miranda. Discorrendo exatamente sobre a cerimônia religiosa do casamento, o mentor espiritual ensina:

Não, não há qualquer culto externo no Espiritismo e se houvera teríamos a sua morte anunciada já para breve. (...) Mas evitemos hoje que a nossa emoção e a nossa festividade sejam transformadas amanhã num culto exterior, que tenhamos começado... (246)  Por derradeiro, o leitor poderá inteirar-se do conceito de Emmanuel sobre as missas católicas, lendo O Consolador, pergunta n? 300:" mistifório" é como ele a designa.(246)
(246) 'Nos Bastidores da Obsessão' , de ManoelPhilomeno de Miranda, FEB, 1970 pp. 268-270


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