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IX
Referindo-se ao sacramento da Eucaristia, diz monsenhor Martins no seu livrinho: “Este sacramento consiste em Jesus Cristo achar-se realmente presente na hóstia consagrada, a fim de viver entre nós, e de servir de alimento espiritual da nossa alma. Este divino sacramento, como todos os outros seis, (não) foi instituído por Jesus Cristo. Na véspera da sua dolorosa paixão, reunido com os doze apóstolos no cenáculo, ele tomou o pão em suas sagradas mãos, e benzendo-o e partindo-o, foi distribuindo aos seus apóstolos e dizendo: Tomai e comei; isto é o meu corpo, que será entregue por vós. Jesus é Deus e as palavras de um Deus têm uma força e eficácia onipotente que realizam tudo quanto enunciam. E dizendo ele depois aos seus apóstolos: fazei isto em minha lembrança, deu com toda a certeza aos apóstolos (pelo menos é o que conviria à Igreja) e, em sua pessoa aos sacerdotes (se fossem) seus legítimos sucessores, o portentoso poder de (ganhar dinheiro para construir palácios), converter o pão em seu verdadeiro corpo.”
Presunção e água benta... Mas o que monsenhor ensina não é a expressão da verdade e a prova disto é que muito antes da ceia, como se lê no capítulo 6º de João, Jesus falou de seu corpo e do seu sangue no mesmo sentido usado na ocasião da ceia, dizendo: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu, se alguém comer este pão viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, a qual eu darei pela vida do mundo”. “Quem come a minha carne e bebe do meu sangue tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia”. “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele”. “O espírito é que vivifica, a carne para nada aproveita; as minhas palavras são espírito e vida”.
Sem esforço, depreende-se daí que Jesus na fala senão figuradamente em ser a sua carne comida, e que as suas palavras tinham um sentido todo espiritual. O seu corpo não pode representar outra coisa senão o corpo de doutrina que Ele trouxe ao mundo, a doutrina de amor e perdão que Ele pregou e exemplificou.
Também na ocasião da ceia, Jesus disse muito mais do que cita monsenhor, mas à Igreja não convém que o povo conheça o resto, pois lançaria logo a dúvida, mesmo nas inteligências menos esclarecidas, e isso é perigoso aos seus interesses.
Eis aí porque o Evangelho é trancado e ao povo só se serve a dose que é útil à Igreja. Senão vejamos: Diz o Evangelho: “E quando comiam, Jesus tomou o pão, e, abençoando-o, partiu, e o deu aos discípulos e disse: Tomai, comei, isto é o meu corpo. E, tomando o cálice, e dando graças, deu-lho dizendo: bebei dele todos, porque este é o meu sangue; o sangue do Novo Testamento, que é derramado por muitos, para remissão dos pecados.” (S. Mat., 26:26-28) E em S. João, 15:15: Já vos não chamarei servos; porque o servo não sabe o que faz seu Senhor. Mas chamei-vos amigos; porque vos descobri tudo quanto ouvi do meu Pai, “para ser a vida do mundo”.
Já vê monsenhor que Jesus ainda aqui se referia, não à transformação do seu corpo em pão, e sim ao seu Novo Testamento, que seria espalhado por muitos e a salvação daqueles que o aceitassem de coração.
Referia-se à fraternidade que Ele com os seus irmãos menores festejavam antes da sua paixão e recomendava-lhes fossem fraternos e comemorassem esta ceia. E tanto assim é que Ele lhes chamou amigos e, continuando, lhes disse: “Isto vos mando: que vos ameis uns aos outros”.
O ensino do Velho Testamento “dente por dente e olho por olho” foi no Novo revogado por: “Amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vos perseguem e caluniam”.
É esta a transubstanciação que Jesus pregou, e não aquela eucaristia que o Concílio de Trento decretou como dogma, em 1545, com o fim de iludir o povo e para gáudio e lucro do clero romano.
Jesus disse: “As minhas palavras são espírito e vida”, “tirai o espírito da letra”, e é isso que cumpria, não a nós, espíritas fazer, e sim, de todos os tempos, ao clero que deveria ensinar exemplificando. Se a Igreja assim tivesse procedido, quanto sofrimento teria sido evitado tanto aos encarnados como aos desencarnados e especialmente ao próprio clero no Além? Só Deus o sabe!
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