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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

XXIVa et b. 'Apreciando a Paulo'


XXIV a
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958


“Se vivemos em Espírito, andemos também em Espírito.
Não sejamos cobiçosos de vanglórias,
irritando-nos uns aos outros invejando-nos uns aos outros.      
Irmãos, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa,
vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão;
olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado.
Levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo.
Porque, se alguém cuida ser alguma coisa,
não sendo nada, engana-se a si mesmo.
Mas prove cada um a sua própria obra,
e terá glória só em si mesmo, e não noutro.
Porque cada qual levará sua própria carga.
E o que é instruído na palavra reparta
de todos os seus bens com aquele que o instrui.
Não erreis: Deus não se deixa escarnecer;
porque tudo o que o homem semear, isto também ceifará.
Porque o que semeia na sua carne ceifará a corrupção;
mas o que semeia no Espírito,
do Espírito ceifará a vida eterna.
E não nos cansemos de fazer bem,
porque a seu tempo ceifaremos,
se não houvermos desfalecido.
Então, enquanto temos tempo,
façamos bem a todos,
mas principalmente aos domésticos da fé.”
            (Paulo - Epístola aos Gálatas, 5:25 e 26 e 6:1 a 10)
           
            Ernesto Renan, que foi um grande estudioso das origens do Cristianismo, sobre cujo tema escreveu sete livros, um dos quais sob o título de “S. Paulo”, era um livre pensador, erudito e sincero. Teve expressões duras ou injustas a respeito do imortal cidadão de Tarso, mas não deixou de reconhecer que ele era “um espírito superior”, e “um excelente homem”. Renan chega a afirmar que as Epístolas de Paulo são a base da teologia cristã. Não vamos a tanto, porque, como o apóstolo das gentes mesmo proclamou em I Coríntios, 10:4: “a pedra é Cristo”. Realmente, funda-se no Divino Mestre a segunda revelação de Deus, assim como a primeira revelação se estriba no monoteísmo e nos dez mandamentos do povo hebreu, cujos profetas previram o advento do Messias da Redenção, que é Jesus de Nazaré.

            Mas Paulo legou à posteridade - e é isto exatamente o que impressiona - um manancial inesgotável de ensinamentos cristãos, vivos, profundos e sempre oportunos, cheios de encanto e de poesia, e que são talvez vigorosos e tradicionais como o Mar da Galileia, enquanto que o Cristo de Deus é como o próprio Oceano, de beleza e de majestade quase insondáveis, porque o Senhor Jesus transcende à nossa estreita visão espiritual e suas ideias se espraiam em todas as almas e em todos os continentes!

            Mas Paulo de Tarso como homem, como doutrinador e como cristão, foi inexcedível, porque compreendeu, sentiu e viveu as lições dos Evangelhos, legando-nos ainda uma série fecunda de ensinamentos, que se manifestam em epístolas admiráveis.

            “Se vivemos em espírito, diz ele aos Gálatas, andemos também em espírito.”

            Assim, se somos hoje espíritas-cristãos, tenhamos uma vida espiritual, cumprindo os mandamentos de Nosso Senhor. É justo que acreditemos e que não pratiquemos?

            É preciso darmos testemunho de nossa fé, através de nossas obras, porque, como Allan Kardec ensinou, de conformidade com as lições dos Espíritos superiores, “conhece-se o espírita pela sua transformação moral”.

            Devemos levar a sério as coisas de Deus, para nossa própria felicidade.

            E o apóstolo acrescenta:

            “Não sejamos cobiçosos de vanglórias, irritando-nos uns aos outros, invejando-nos uns aos outros.”

            Evitemos fazer política em nossos Centros ou em nossas reuniões. Nada de pretender posto de destaque para não sermos cobiçosos de vanglórias, pois Jesus também advertiu:

            “E o que a si mesmo se exaltar será humilhado; e o que a si mesmo se humilhar será exaltado.” (Mateus, 23:12)

            Consequentemente, também em nossa vida de relação, ou seja, na sociedade, não nos angustiemos por vanglórias ou por postos de destaque. Tudo está sujeito à lei do carma e não adianta querermos forçar os acontecimentos.

            Os postos de mando em toda a parte, e notadamente nos Centros Espíritas, implicam em maior responsabilidade moral e devemos honrá-las sempre com o trabalho fecundo e desinteressado, mas não com o prazer do destaque, que é mera vaidade, expressão inferior do sentimento.

            Aquele que varre um Centro e que o frequenta com amor e com o desejo de servir à Causa, às vezes vale mais aos olhos de Deus do que certo membro da diretoria, que se supõe importante e merecedor do cargo que ocupa.

            Mas também não julguemos! E que ninguém tenha “o orgulho da humildade”, se assim podemos dizer, porque, infelizmente, há irmãos que se jactam de ser humildes e parece-nos que só isto já é prova de vaidade.

            Cumpre-nos esforçar em busca da humildade, certos de que em tal terreno ainda temos muito que evoluir... Contudo, há pessoas que já o são, naturalmente, por uma questão de evolução inata; mas estas mesmas estão sujeitas às tentações, próprias de nosso plano. Foi por isto que o Divino Mestre recomendou: “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; na verdade, o Espírito está pronto mas a carne é fraca.” (Mateus, 26:41)

            Todavia, o problema em apreço, que é fundamental, a ninguém deve angustiar, convictos de que nossos propósitos sinceros de regeneração valem como o testemunho da fé.

            Paulo adverte os que irritam os outros, o que se verifica, seja através de brincadeiras de mau gosto ou com palavras fortes, isto é, com argumentos cheios de sinceridade ofensiva, e condena ainda a inveja, sentimento subalterno que precisa ser combatido em nós mesmos, sinceramente.

            Os que usam de franqueza rude, ofendem e revoltam em vez de corrigir, pois nem todos têm a humildade necessária para ouvir palavras contundentes, mesmo verdadeiras, sem perderem a calma. Dizem os psicólogos, que nada mais dói do que a verdade...Dai porque é aconselhável “o espírito de mansidão”, a que Paulo alude com acerto, nesta Epístola aos Gálatas, cuja autenticidade o próprio Renan confirma.

            Há pessoas sempre dispostas a pilheriar e muitas não medem a extensão das palavras, e a ironia às vezes fere profundamente, melindrando o irmão em seus sentimentos delicados, de vez que cada um tem lá seu grau de sensibilidade, que devemos respeitar, pois não nos é dado o prazer de faltar com a caridade.

            Também é comum observarem-se indivíduos que nos parecem inferiores, intelectual ou moralmente, ocupando posições de destaque ou possuindo bens materiais em grande abundância. É aí que surge a inveja.

            Mas nós, espíritas-cristãos, sabemos perfeitamente que “este mundo é de provas e de expiações”, como diz Kardec. É muito raro haver justiça na Terra. Mas assim é preciso, para aprendermos a ter humildade e resignação e também para pagarmos nossas culpas passadas sujeitos a certos vexames, já que o sofrimento purifica o Espírito.



XXIV b
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958

            Entretanto, muitos não concordam com o fato de uma pessoa cheia de imperfeições possuir uma posição social invejável. Mas, em primeiro lugar, não devemos julgar o semelhante, como Jesus mesmo recomendou. Às vezes, ele é melhor do que nós, apesar das aparências. Quem sabe se, com sua fortuna ou com sua posição social ou política, não seríamos piores?

            Ademais, se há reencarnações, conforme acreditamos, é preciso que a riqueza e que os postos de destaque mudem de mão, a fim de que em vidas sucessivas, tenhamos todas as experiências, tanto a do fausto como a da pobreza. E quando formos pobres, não devemos invejar os ricos nem os poderosos, porque isto não é atitude de cristão, mas inferioridade de espírito, que necessita ser corrigida. A inveja é uma desgraça, porque tira a paz do Espírito, gera a revolta intima contra a justiça de Deus. É sentimento que precisa combatido com todas as forças de nosso coração e de nosso entendimento, já que o invejoso é um infeliz, digno de  lástima.

            Quando alguém errar, mesmo que seja surpreendido em alguma ofensa, diz Paulo, encaminhai-o com mansidão. É cristão termos tolerância ou compreensão para com as faltas alheias e piedade até para com os criminosos.

            Nada de explosões temperamentais. Precisamos ter controle de palavras e atos, e alta dose de magnanimidade.

            Quem erra e reconhece que errou, já está em caminho da regeneração. Consoante ensina a sabedoria popular, “errar é humano, mas perseverar no erro é diabólico”. Destarte, se tivermos a oportunidade ou o dever de admoestar a quem erra, façamo-lo com brandura, isto é, com caridade, a fim de que possamos tocar em seu coração.

            “Se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo”, afirma o apóstolo dos gentios.

            “Afinal, que somos?”, pergunta o confrade Pedro Granja, em interessante obra espírita. - Espíritos sofredores em provas redentoras, em processo de esclarecimento, e nada mais! As riquezas, a pobreza, a importância ou a nulidade que tenhamos aqui na Terra, tudo passará, como já frisava o Eclesiastes. A morte nivelará em sete palmos de terra, onde só haverá decomposição material. Somente o Espírito importa, só ele é divino e imortal! Beleza, luxo, conforto, feiura, miséria, dores, injustiça, tudo será consumido pelo tempo e basta termos paciência, de vê-lo passar. Portanto, se o que mais interessa são as coisas do Espírito, devemos cultivar as virtudes, transformar nosso procedimento, tendo o Evangelho como roteiro, porque é com amor que se adquire a perfeição, onde está a felicidade eterna.

            O Céu é sobretudo um estado da alma, pois o reino de Deus está dentro de nós mesmos, como disse o Senhor Jesus, e reside em nosso coração e em nossa própria consciência. Cada um é sacerdote de si mesmo, cada qual é artífice de seu futuro e de seu destino espiritual.

            “Mas prove cada um a sua própria obra, e terá glória só em si mesmo, e não noutro. Porque cada um levará sua própria carga.”

            Quando desencarnarmos, quando nos despirmos do fardo da matéria, cujo invólucro santo nos é dado para evoluir, levaremos nossa própria carga, teremos a densidade do perispírito compatível com nosso estado ou com nosso merecimento, maior ou menor, conforme o caso. Então, poderemos ascender às regiões superiores da espiritualidade, se tivermos procedido como cristãos, ou ficaremos chumbados à Terra ou ainda aos círculos infernais, pois que, na linguagem do apóstolo das nações, “levaremos nossa própria carga”, índice da evolução espiritual, produto de nossa fé e de nossas obras.

            A fé possui também significação para o progresso do Espírito, porque ela nos encaminhará para a prática das boas obras, verdadeira moeda com que se adquirem os céus.

            Vale a pena reproduzirmos aqui este pequeno trecho da comunicação de José, um Espírito protetor, transcrito de “O Evangelho segundo o Espiritismo”, obra imortal de Allan Kardec:

            “Inspiração divina, a fé desperta todos os sentimentos nobres que encaminham o homem para o bem. Preciso é, pois, que essa base seja forte e durável, porquanto, se a mais ligeira dúvida a abalar, que será do edifício que sobre ela construirdes? Levantai, conseguintemente, esse edifício sobre alicerces inamovíveis. Seja mais forte a vossa fé do que os sofismas e as zombarias dos incrédulos, visto que a fé que não afronta o ridículo dos homens não é fé verdadeira.
           
            “E o que semeia no Espírito, acrescenta Paulo, do Espírito ceifará a vida.”

            “E não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido. Então, façamos bem a todos, mas especialmente aos domésticos da fé.”

            A regra é semear, indistintamente, a palavra divina, como Paulo de Tarso a semeou aos gentios, levando a doutrina do Senhor da Ásia Menor à Europa, afrontando até a frieza enervante dos filósofos de Atenas, caminhando dezenas e dezenas de léguas a pé, sofrendo fome, sevícias, incompreensões e doenças, mas pregando sempre a Boa Nova para regeneração da Humanidade.  

            A Terra evoluiu e os perigos agora são bem menores. Portanto, é mister que preguemos com fé e com entusiasmo os ensinamentos do Redentor, mesmo porque nosso trabalho agora é bem mais fácil...

            O Novo Testamento baseia-se no Velho. Este possui seu lado moral ou religioso, único que nos deve interessar, verdadeiramente; como legítima base daquele, pois as revelações são sucessivas, conforme ensinam os Mensageiros do Senhor, que concretizam a falange bendita do Espírito Santo, o Consolador que o Divino Mestre nos prometeu como terceira revelação de Deus (João, 14:26 e 16:12 a 14;  “O Evangelho segundo o Espiritismo”, cap. I
Não vim destruir a lei”.

            Todavia, façamos o bem a todos, porque esta é a síntese da lição: e Paulo acrescenta: “principalmente aos domésticos da fé”. Mas isto não quer dizer que tenhamos ressalvas na prática do bem, pois a caridade é universal e, de todas, a mais excelsa virtude (I Cor., cap. 13).

            Aliás, nos sanatórios espíritas, em nossas casas de caridade, procura-se fazer o bem a todos, sem distinção de pessoas, de raça ou de religião. Particularmente, porém, é humano que nos preocupemos mais com os que privam conosco, cotidianamente. Se não dermos preferência a estes, certo que seremos injustos.


            Contudo, à medida que o Espírito se ilumina, ele não faz acepção de pessoas. Esta será nossa última expressão evolutiva amar a todos com a mesma intensidade - como o Cristo de Deus nos ama e como também nos ensina, a fim de sermos perfeitos em unidade com nosso Pai Celestial. 

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