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domingo, 28 de novembro de 2021

Por quê?

 L. Zamenhof

Por quê ?

por Cristiano Agarido(Ismael Gomes Braga)

Reformador (FEB) Outubro 1946

                 Há oitenta anos o vibrante movimento espírita mundial, chefiado por Allan Kardec e veiculado numa grande língua de cultura universal, como era então o francês, parecia destinado a uma vitória imediata, dentro de poucos anos. Essa vitória próxima contra toda a oposição se evidenciava aos mais prudentes e Kardec, a encarnação mesma da prudência, como escreveu um sábio seu contemporâneo, escreveu em O Evangelho segundo o Espiritismo estas palavras de sublime otimismo:

             “O Espiritismo vem realizar, na época prevista, as promessas do Cristo. Entretanto, não o pode fazer sem destruir os abusos. Como Jesus, ele topa com o orgulho, o egoísmo, a ambição, a cupidez, o fanatismo cego, os quais, levados às últimas trincheiras, tentam barrar-lhe o caminho e lhe suscitam entraves e perseguições. Também ele, portanto, tem que combater; mas, o tempo das lutas e e das persiguiçõe sanguinolentas passou; são todas as de ordem moral as que terá de sofrer e próximo lhe está o termo.  As primeiras duraram séculos; estas durarão apenas alguns anos, porque a luz, em vez de partir de único foco, irrompe de todos os pontos do globo e abrirá mais de pronto os olhos aos cegos.” (Cap. XXIII, parágrafo 17.)

             Ninguém poderia sensatamente pensar de outro modo em 1864, mas vemos hoje que a vitória está longe  e as lutas não cessaram em alguns anos nem em vários decênios, mas terão de continuar por muito tempo. Quanto o mundo se modificou nesses oitenta anos, e na aparência para pior, porque as perseguições sanguinolentas e más ideias ressurgiram com o Comunismo e o facismo e banharam de sangue o Velho Mundo! Repugnante perseguição de raças trucidou milhões de seres humanos indefesos. De dois terços do território europeu o Espiritismo foi banido pela violência, sem admitir discussão alguma, e isso pelos dois grandes partidos em luta: Nazismo e Comunismo, ambos furiosamente materialistas. Sabemos que o mundo piorou só na aparência externa, porque a uma grande onda de mal sucede outra maior de bem e esta conquista sempre o futuro. Por quê falhou assim a lógica mais severa?

            Bem simples e por isso mesmo muito difícil de aceitar-se a explicação.     

            A universalidade da língua francesa deu à França uma supremacia cultural indiscutível no século XIX e desencadeou os ciúmes nacionais dos imperialismos diversos e cada povo tentou elevar seu próprio idioma às culminâncias que havia atingido o francês. A língua única dadiplomacia foi violentamente afastada e todos os povos tentaram introduzir o seu idioma, chegando-se rapidamente a plena Babel nas relações internacionais que por mais de um século haviam gosado os benefícios da unidade linguística com o francês como língua diplomática mundial. Chegou-se ao absurdo de redigir tratados internacionais em tantas línguas quantos fossem os contratantes e todas elas como originais.

            Inglês, alemão, italiano, russo, espanhol, todas as línguas da Europa, foram impostas pelos diferentes  povos como possuindo direitos iguais ao francês e este caiu rapidamente das funções de língua de cultura mundial para o lugar de simples língua nacional de minorias.

            O Espiritismo sofreu toda a desarticulação da falta de uma língua comum. As mensagens descidas do Alto ficaram limitadas a regiões linguísticas, a verdadeiras ilhas inabordáveis para os outros povos. A Revelação continua sendo mundial, porque os Espíritos falam em todas as línguas do planeta, mas os homens estão privados da universalidade das comunicações e limitados exclusivamente às suas fronteiras linguísticas. Em vez de um Espiritimo mundial único, como ao tempo de Kardec, elaboram-se centenas de pequenos movimentos espíritas desligados uns dos outros  e ignorantes até da existência de outros núcleos. Surgem grandes médiuns, maiores do que existiam ao tempo de Kardec, mas sua obra provisoriamente  permanece fechada em cada região lingística. Quem conhece na França a obra de Rosemary ou de Francisco Cândido Xavier? Nem os brasileiros conhecem  as obras da grande médium inglesa, nem os ingleses conhecem a dos nossos médiuns, e assim sucede a todos os povos. Falta a língua comum que reúna todo esse imenso tesouro, que, realmente, quando ligado em um todo, venceria o mundo em poucos anos, como previa Kardec sem poder imaginar a falência da língua francesa, queda inteiramente imprevisível em 1864, mas totalmente consumada em 1919, quando, pela primeira vez, numa conferência de diversas Potências, o francês foi excluído, porque os estadistas declararam que não sabiam francês.

            A falta de um língua mundial de cultura que reuna tudo quanto recebem os médiuns espalhados pelo mundo, para restituir tudo a todos como patrimônio comum de todos e de cada um, retardou de modo impressionante o movimento espírita mundial; mas o que perdemos em um século reconquistaremos em outro para toda a eternidade futura.

            Já os espíritas iniciaram em escala mundial a obra do futuro. O Congresso Espírita Panamericano adotou o Esperanto como uma de suas línguas oficiais; na Inglaterra, fundou-se a Londona Esperanto-Spiritista Societo; no Egito, está-se trabalhando com ardor pelo Esperanto entre os Espíritas; no Brasil, a Federação Espírita Brasileira iniciou o duplo trabalho de divulgar o Esperanto entre os espíritas e o Espiritismo entre os Esperantistas, e neste sentido já publicou vinte e poucos livros.

            Não sabemos quando, mas sabemos que um dia a  situação será muito melhor do que no tempo de Kardec; porque o Espiritismo terá uma língua mundial de todos e nela reunirá essa imponente biblioteca descida do Alto; são obras que se completam pela diversidade dos aspectos tratados pelos Espíritos e, quando reunidas, terão a força necessária para se imporem irresistivelmente a todos os pensadores do mundo.

            Trabalhemos, pois, com a certeza de que o grande ideal está em marcha e seu eclipse será muto passageiro.

                 Do blog: 75 anos são passados da publicação deste artigo. O que foi feito do Esperanto?


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