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domingo, 28 de novembro de 2021

Em defesa do Velho Testamento

 

Em defesa do Velho Testamento

por Alfredo C. de Farias

Reformador (FEB) 16 Maio 1937     

             Na literatura espírita, quer em livros ou jornais de propaganda doutrinária, fácil é deparar-se com frases e conceitos, em referência ao Velho Testamento que se não coadunam com a relevância da grande obra dada por Deus à humanidade. São frases e conceitos bem urdidos para causar efeito, quando, por melhor acentuar a desestima em que é tida a citada obra, não os acompanham outros cheios de irreverências e depreciações infundadas. É de admirar que a pena dos espíritas desconceitue uma obra que, além de ser um monumento de sabedoria oculta, a refletir-se pelos séculos afora, é um dos maiores sustentáculos do edifício religioso erguido misericordiosamente no planeta pela Providência, apto a proporcionar benefícios morais e espirituais em todos os tempos. Alegam-se, em justificativa do seu desprestígio, as sinuosidades criminosas pelas quais ingressou a humanidade, seguindo os ditames colhidos ali. No entanto, não percebem, os que invocam, que qualquer que fosse a clareza do ensino moral, as gerações, idólatras por natureza, defeituosas em consequência de vícios e paixões arraigados, haveriam de seguir a trilha de seus predominantes e pervertidos pendores, agravando suas responsabilidades. É preciso, porém, ter-se em memória que a luz mais pura, mais refulgente, nenhuma claridade dá aos cegos.  E cegos há os de corpo e de espírito. Sebre estes conceituou Jesus: “Vim a este mundo para exercer um juízo, a fim de que os que não veem vejam e os que veem se façam cegos.” (João, 9:39)

            Parece que há o propósito irrefletido de relegar-se a dita obra ao esquecimento, senão o de afastá-la das lides e fundamentos doutrináros trazidos pela Terceira Revelação. Assim, porém, não quer o preclaríssimo Diretor de nosso planeta e assim não querem os altos Espíritos que sob a sua orientação trabalham em prol do nosso progresso.

            O Velho Testamento não é obra de ficção, nem foi coordenado impensadamente. O homem é, bom ou malgrado seu, um instrumento do Criador. Dentro das suas deficiências e incorreções, segue sempre a diretriz que Ele, Pai amantíssimo, a tudo assinou no princípio das coisas.

            Do Velho Testamento, além de fluir a lei moral, acorde com as capacidades das sucessivas gerações, por uma exegese comum, seguida da interpretação em espírito, dimana a sabedoria dos fatos religiosos soberbamente produzidos e dos acontecimentos prodigiosos que nesse campo nos reserva o futuro.

            Como obra profética para dilatados tempos, outra mais perfeita não existe no mundo, capaz de lhe empanar o brilho.

            Foi, assim no sentido da lei moral, como também no de reservatório de edificantes premissas, consideradas igualmente leis, por traduzirem a vontade e os desígnios de Deus, que o querido Mestre sentenciou, quando em missão, na Palestina: “Não penseis que eu tenha vindo destruir a lei e os profetas; não os vim destruir, mas cumprir.” Com efeito, ele assim o fez durante toda a sua incomparável missão. Além do ensino moral, sabiamente ministrado, o Divino Mestre, para cumprimento dos anteriormente traçados na grande obra que hoje conhecemos sob o nome de “Velho Testamento”, surgiu entre os homens como israelita, tendo, por isso, que se sujeitar a um nascimento aparente, do seio de uma virgem da estirpe de Israel; teve que se sujeitar à consagração do Templo, no oitavo dia desse nascimento; teve que se referir, inúmeras vezes, às Escrituras, mostrando que a sua alta missão correspondia ao que se achava nelas escrito; teve que se transfigurar no Tabor para, apresentando-se ao lado de Moisés e Elias, comprovar a ligação da revelação que viera trazer ao mundo à primeira, de que foram instrumentos aqueles dois patriarcas: teve que se submeter à morte aparente na cruz e aparecer depois como ressurgido – tudo sempre no propósito de confirmar a lei, que define, em seus pontos essenciais, o papel que lhe coube desempenhar.

            Jesus jamais surgiria no planeta para confirmar mistificações, ou desmpenhar um papel que não tivesse alcance grandioso e sumamente meritório. A sua revelação se liga estreitamente à revelação mosaica, com um cunho de unidade perene a completar-se através do Espiritismo: “Porque três são os que testificam no céu: O Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. (I Epístola de João, 5:7)

            Jesus, confirmando a lei e os profetas, demonstrou, ainda, ser, para todos os tempos, a figura mais proeminente na sequência dos fatos e prescrições condicionadas naturalmente por ele próprio e gravadas nos anais dos povos, como imponente realização.

            Para a humanidade do futuro, o Velho Testamento será um relicário de verdades e sabedoria, existentes nos seus inúmeros simbolismos e alegorias, a envolverem conceitos e acontecimentos.  

            Referindo-se à sabedoria divina ali contida e encoberta pelo véu da letra, assim se expressou o elevado Espírito de Imperator pelo médium Stainton Moses: “Antes que possais atingir essas distãncias, contentai-vos com aprender que uma significação espiritual está oculta sob cada coisa, de que  Bíblia está repleta. As interpretações, definições e glosas humanas, são a crosta material que envolve a divina semente da Verdade. Se retirássemos a crosta, o tenro grão murcharia e feneceria. Contentemo-nos, pois, com indicar-vos até onde podeis compreender a Verdade palpitante, que não vedes sob a face exterior que vos é familiar." (“Ensinos Espiritualistas”, de Stainton Moses, Sessão XVIII)     

            A fim de demonstrar que nem tudo a Bíblia é de origem divina e que, portanto, há ali muita coisa refletindo o pensamento do homem, sendo por isso necessária uma intuição poderosa para uma inteligente separação, foi que também disse o mesmo Imperator: “Não temos necessidade de repetir que a Bíblia contém páginas que não concordam com o nosso ensinamento, sendo uma mistura de erro humano transmitido pelo espírito dos médiuns escolhidos; somente podereis conseguir isolar a verdade, julgando a tendência geral" (Seção X). “Toda verdade está mesclada de erro; as fezes serão rejeitadas.” (Seção XXVII).

            Convém, do mesmo modo, dispensarmos atenção a estes dizeres de Allan Kardec:

            “Muitos pontos dos Evangelhos, da Bíblia e dos autores sacros em geral só são inteligíveis, parecendo alguns, até, irracionais, por falta da chave que faculte-se-lhes apreenda o verdadeiro sentido. Essa chave está completa no Espiritismo, como já o puderam reconhecer os que a têm estudado seriamente e como todos, mais tarde, ainda melhor o reconhecendo.”

            Já é tempo, portanto, de reconhecermos que no Espiritismo está a chave para a compreensão exata desses muitos pontos do Velho Testamento. Neles naturalmente sobrepujam os símbolos e as alegorias, cujo meneio interpretativo parece que não agrada a alguns confrades, donde, talvez, a ogeriza que votam ao Antigo Testamento.

            Embora se sustente e reconheça que a clareza é a característica dos ensinos da Terceira Revelação, julgamos que tal somente ocorre às lições morais, para melhoria de nossa conduta, pois, há muitas coisas sobre a vida ultra-terrestre que nos vem sob forma emblemática. Note-se ainda isto que diz Imperator: “É loucura sustentar-se a exatidão literal de qualquer ensinamento espírita.” (Seção IX).

            Eis agora uma visão simbólica muito interessante. À entidade espiritual que a produziu certamente a apresentou para ser interpretada.

            Conhecemos uma senhora católica, mas sem fanatismo, humilde, boa e ignorante, que tem tido vários sonhos simbólicos. Há pouco tempo sonhou com uma barca, mas escura, navegando em céu borrascoso, no qual se viam alguns homens com vestes sacerdotais, trazendo nas cabeças “chapéus altos” (segundo ficou esclarecidos, tratava-se de mitras), a fazerem os maiores esforços para romper as nuvens escuras que circundavam a barca e lhes obstavam a marcha. Essa senhora narrava habitualmente os seus sonhos em casa de certa família, que os interpretava para o jogo do bicho. De uma feita urpreendemo-la a fazer a narrativa deste último.

            Não têm conta fatos análogos a estes, verificados por toda parte, especialmente no Brasil.

            Se os Espíritos ainda se valem do mistério dos símbolos e das alegorias para nos darem certos avisos, como impugnar uma obra constituída de modo análogo, cuja finalidade séria ficou provada com a confirmação do Messias?

            O futuro revelará o valor do Velho Testamento, assim como na atualidade está sendo revelado todo o valor do Evangelho. Demos tempo ao tempo.


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